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História Quase Sem Querer (Capítulos Extras) - É Verdade?


Escrita por: princetri

Capítulo 2 - É Verdade?


Lauren POV



 No momento nada pra mim parece real, Camila saiu da sala cirúrgica faz algumas horas, já está estável e no quarto, mas ainda não acordou, devido às altas doses de sedativos, e eu estou aqui, acordada, mas minha mente parece ter sido sedada junto a da minha esposa, eu não consigo pensar, eu não consigo falar, eu não consigo agir em nada, já ouvi umas 3 pessoas falando que estou em choque, mas nem isso consegui rebater. Dr. Ryan apareceu aqui após a conclusão do parto, e seus olhos azuis, estavam tomados completamente pelo vermelho, ele acompanhou todo processo para a gravidez da Camila, as dificuldades, e as séries de cuidados por ser uma gravidez de alto risco, mas no fim, de nada adiantou, nossos filhos estão mortos, e eu não sei como olhar para Camila depois disso. No meu lugar, o que ela faria? Escolheria as crianças? Ela vai me perdoar por isso? 


 Senti uma mão em meu ombro, e me obriguei a olhar pra cima, Sinu, no outro extremo da sala de espera eu pude ver Sofia com o rosto enterrado no Pescoço da Emma, chorando sem parar.


— Você precisa ser forte. - Sinu disse olhando nos meus olhos, e acho que é a primeira vez que ela faz isso, olha nos meus olhos. — Minha filha vai precisar como nunca de você nesse momento. 


— Ela vai me odiar. - Falei sentindo as lágrimas tomarem meu rosto. — Eu não consegui escolher eles ao invés dela, eu não consegui. 


— Ei. - Se sentou ao meu lado e me puxou para os seus braços, eu apenas fiquei, incapaz de recusar qualquer consolo. — Não foi sua culpa, ela vai entender isso. - Passou as mãos pela minhas costas, em movimentos contínuos de vai e vem. — Camila sempre levou jeito pra ser mãe, desde pequena ela cuidava da Sofia com uma ternura linda de se ver, e diferente de mim, ela seria a melhor mãe do mundo, quando ela acordar e souber o que aconteceu, isso vai destruí-la e vai ser seu trabalho ajudá-la a se reconstruir. 


— E se eu não conseguir?


 Sinu se ajeitou na cadeira, e segurou meu rosto entre as mãos, olhando diretamente pra mim.


— Você vai, e sabe como eu sei disso? - Neguei com a cabeça. — Eu vejo o amor no olhar das duas, e não há nada mais forte na vida, Lauren, do que o amor, o amor de vocês vai sarar essa ferida.


— Licença. - A voz da Emma veio ao nosso lado. — Desculpa atrapalhar, mas nós precisamos… - Emma não conseguiu concluir. 


 Me afastei de Sinu e sequei meu rosto. 


— Precisamos providenciar o enterro. - Falei já que Emma não se permitiu concluir. 


— Eu posso cuidar disso por você. - Se propôs. 


 Me levantei.


— Eu preciso fazer isso. - Falei, tentando me auto convencer. 


 Antes de me afastar, olhei pra Sinu ainda sentada e a deixei com um simples, mas sincero "obrigada".


 Meus passos nunca pareceram tão pesados quanto agora, meu corpo parece gritar para que eu não continue meu caminho. Estou indo ver meus filhos pela primeira e última vez, e sem vida. Já na porta eu travei, com Emma ao meu lado, ela segurou minha mão e apertou, na tentativa de me encorajar, mas me senti ainda mais fraca. Com a mão livre eu abri a porta, uma enfermeira olhou pra mim, pelas horas que estou chorando na sala de espera, acho que não tem ninguém nesse hospital que não saiba quem eu sou, ela baixou o olhar e olhou para o canto mais afastado da sala, então eu soube, ainda sentindo meus pés carregando enormes bolas de aço eu me aproximei, e era melhor não tê-lo feito, dois corpos miúdos, vestidos em uma roupinha amarela do hospital, os cabelos no mesmo tom do da Camila, minha mãe se ergueu, e só então percebi o quão trêmula estou, toquei, mas ao sentir a falta de calor, rapidamente afastei minha mão, embora pareça, não estão dormindo, essa certeza fez meus olhos inundarem de lágrimas pela milésima vez, essa cena doeu tanto em meu peito que cheguei a cambalear para trás. Não sei em qual momento saí, mas já me encontro no corredor do lado de fora da porta, mais especificamente no chão, sentada, chorando, ainda me sinto no mesmo abismo em queda livre, parece que não vou chegar ao fim nunca.


— Eu achei que era forte. - Falei, olhando pra poça de lágrimas que se forma no chão perto dos meus sapatos. — Mas não sou, eu não vou conseguir fazer isso, Emma.


 Ela se abaixou de frente pra mim, e me fez olhar em sua direção, só então percebi que ela também está chorando. 


— Você vai ficar aqui esperando sua esposa acordar, e eu e a Sofia vamos resolver isso, certo? - Confirmei com a cabeça e ela me puxou para um abraço. — Eu daria minha vida pra arrancar sua dor nesse exato momento. - Ela disse, e eu chorei ainda mais.


 Tentei voltar para a sala de espera, mas a ansiedade não me permitiu, perambulei para lá e para cá por todo o hospital, até pensei em comprar um cigarro, mas não quis sair das dependências do hospital, quero ver Camila assim que ela acordar, ao passar pela capela, vi Sinu ajoelhada, orando, fiquei parada, a observando de longe, ela está chorando. Existem milhares de religiões, existem milhares de deuses, nenhum deles foi capaz de se compadecer da nossa dor? Nenhum deles, por um segundo sequer, achou que duas vidas inocentes não mereciam morrer tão jovens? Balancei a cabeça para dissipar meus pensamentos e sai dali, obrigando meus pés a seguirem mais uma vez para a sala de espera. Olhei para o enorme relógio na parede, que já marca 22h, quase vinte e quatro horas que estamos aqui, e eu já vivi dores que não vivi em mais de 200 anos nessa terra.


— Srt. Jauregui?


 Olhei pra cima, uma enfermeira. 


— Sim. - Me levantei. 


— Camila está acordando, achamos melhor a senhora está lá nessa situação.


 Confirmei com a cabeça e fui seguindo ela pelos corredores, na minha cabeça milhões de pensamentos e no meu peito uma única dor.


— Oi, meu bem. - Dr. Ryan disse quando me viu se aproximando, me contive em apenas sorrir, ou tentar. — Nesse tempo, eu percebi que a Camila sempre foi muito técnica, detalhista, então estou aqui pra contar de forma biológica e científica o que aconteceu, você está de acordo ou prefere fazer isso sozinha?


— Por favor, eu… eu não sei nem o que falar pra ela, eu não vou conseguir. 


 Ele maneou a cabeça positivamente e virou para abrir a porta, mais uma vez senti meus pés pesarem, quando ele adentrou o quarto, eu pude ver Camila deitada na cama, pálida, piscando os olhos lentamente, ela sorriu quando me viu, da forma mais grogue possível. Parei ao lado da cama e segurei em suas mãos, meus olhos se encheram de lágrimas, mas não permiti que elas descessem.


— Que carinha é essa? - Ela perguntou, com um semblante preocupado e apertou minha mão.


— Camila. - A voz do Dr. preencheu o ambiente, e ela desviou o olhar de mim pra ele.


 Eu não consegui seguir seu olhar e prestar atenção no Ryan, eu não consegui desviar da mulher a minha frente, até as palavras dele parecem desconexas para mim, minha audição só capta os sons da respiração da minha esposa, acredito que se eu me esforçasse um pouco mais conseguiria ouvir até os batimentos do seu coração, o semblante cansada da Camila aos poucos foi se transformando em um de dor, agonia, aflição, tormento, inquietação, e todos outros sinônimos que essas palavras podem nos levar. Ela olhou pra mim, meu rosto já estava tomado pelas lágrimas, assim como o seu, ela chorou, eu chorei. Dr. Ryan saiu da sala. Camila gritou, chorou, chorou, chorou, chorou. Entrou uma enfermeira e aplicou um sedativo nela, eu continuei parada, a única coisa que se move em mim são as lágrimas pelo meu rosto, senti a mão de Camila ir perdendo a firmeza, então ela dormiu, de novo.


 Observei a enfermeira descartando a seringa. Será que se eu pedir uma dose de morfina ela aplica? Será que tal medicamento é capaz de arrancar essa dor no meu peito? Preciso de morfina, para mim, para Camila, para o mundo. Algo que possa sedar tamanha dor e tamanha impotência diante dos recentes acontecimentos. A enfermeira saiu, uma Camila desacordada ficou ao meu lado, me recusei soltar sua mão, fiquei ali, parada, como se minha vida dependesse disso, olhar para Camila.



Camila POV



 Senti meu corpo ser puxado, e como em um pesadelo, acordei em um solavanco, com a respiração alterada, olhei ao redor, constatei que não estou em um pesadelo, é a realidade, meus olhos se encontraram com o de Lauren, parada ao lado da minha cama, ela estava aqui quando eu dormi, e continua aqui, me pergunto se ela se moveu em algum momento. 


— É verdade? - Perguntei em um fio de voz.


 Ela afirmou com a cabeça e me acolheu em seus braços. Meu peito está vazio, minha barriga está vazia, meus filhos não resistiram, e antes mesmo de contemplar a beleza da vida, foram tomados de mim, sinto que a ferida que está aberta em meu peito, nunca irá se fechar, tamanha a profundidade da dor que estou sentindo. Sempre encarei o mundo como um lugar belo, com coisas belas para serem vistas, mas no momento, ele me parece o pior dos lugares.


— Me desculpa. - A voz da Lauren veio em um soluço. — Me desculpa, Camz, a culpa é minha.


 Segundo o Dr. Ryan, a única alternativa para meus filhos sobreviverem, seria fazer o parto mesmo com meu corpo se recusando a suportar tal procedimento. O que eu diria se eu estivesse acordada? Tire agora meus filhos de dentro de mim, e os salve, sim, eu daria minha vida por eles, qualquer coisa pra não está sentindo esse buraco em minha alma. Mas eu culpo a Lauren? Não! Como posso culpá-la pela fragilidade do meu próprio corpo? Como posso julgá-la por não querer me perder, se eu estou abrindo mão de uma longa existência, para não ter a hipótese de perdê-la um dia.


— Olha pra mim. - Pedi, e assim ela fez, seus olhos vermelhos, indicam que ela está chorando há muito tempo. — Nunca mais repita isso, está me ouvindo? Nunca mais, você não tem culpa de nada, de nada. - A puxei mais uma vez pra mim, as lágrimas parecem larvas de fogo descendo pelo meu rosto. 


 Devido a posição, senti minha barriga doer, pra ser mais exata, o local da cirurgia, afastei Lauren, e pedi pra ela se deitar ao meu lado naquela minúscula cama, a dor de dentro já é o suficiente para me fazer sofrer, não preciso forçar ainda uma dor física. Com todo cuidado, devido a alguns fios ligados ao meu corpo, e a dificuldade de me mover sem sentir dor, eu fiz Lauren deitar a cabeça em meu peito, assim como suas lágrimas, as minhas também não param. Hoje é dia 25 de dezembro, data na qual se comemora o nascimento de Jesus, minha mãe sempre foi muito religiosa, sendo assim, acabei herdando tais crenças, se assim se pode dizer, nascimento de Jesus, morte dos meus filhos, se tudo tem um propósito, qual será esse? Meu peito se contorce dentro do meu peito, sou mãe de duas crianças que nem tive a oportunidade de conhecer. 


 Batidas na porta me tiraram dos meus pensamentos, Lauren se levantou e foi abrir. Minha mãe, minha irmã e Emma.


 Sofia e Sinu vieram até mim, Emma ficou na porta conversando com a Lauren. Me deixei ser abraçada pela minha mãe, e como um corpo sem controle, comecei a chorar outra vez. A dor que sinto é imensurável, mas o carinho dos que amo, me traz um conforto de outro mundo, eu não estou sozinha. As palavras são poucas, acho que ninguém sabe o que dizer em um momento como esse, nem eu sei.


 Minha mãe saiu com a Sofia, segundo ela, eu preciso comer, acho impossível ingerir alguma coisa no momento, mas não contestei, Lauren saiu ao chamado do Dr. Ryan, só ficou Emma na porta, ela observou Lauren se afastar então veio até mim.


— Como você está? - Perguntou parando ao lado da cama.


— Já tive dias melhores. - Respondi sincera. 


 Ela me deu um meio sorriso e enfiou a mão no bolso, tirando de lá uma bolsinha.


— Eu pretendia te dar isso em outra situação, nem sei se é um bom momento, mas… - Tirou o objeto da bolsinha, e eu pude ver um anel, um belo anel. — Como você pode ver, esse anel tem pedras de diamante, sabe o que ele significa? - Neguei com a cabeça. — Amor e união. - Buscou minha mão na cama e colocou o anel no meu dedo. — E é o que você e a Lauren vão precisar para superar esse momento, eu acredito muito na força do amor de vocês, e a união vai curar o que sangra aí dentro, você precisa dela, e ela precisa de você. 


 Senti um nó na minha garganta. 


— Isso é… Lindo. - Pigarreei. — O significado, e o anel. - Segurei a mão dela antes que ela se afastasse. — Obrigada. - Agradeci.


 E eu sei que ela sabe que não foi apenas pelo anel.


— De nada. - Sorriu.


— Eu sempre quis amigos cheios de grana pra me dar diamantes. - Brinquei, ou ao menos tentei, toda palavra que sai, parece se acanhar com a atmosfera obscura, e caem.


 Emma riu e negou com a cabeça. Nesse momento Lauren retornou ao quarto.



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