História Queenshills - Capitulo XXVIII

Ao sair do quarto de Iur, avistou Adam. Coni foi até ele, e ele sorriu quando olhou para ela:

_ Grande Deusa!

_ Como você está rapaz? Ela desarmou o olhar e sorriu com carinho.

_ Eu estou bem. Iur está me ensinando uma luta bem diferente, e semana que vem eu fui convocado para um ritual. Também estou me preparando para minha primeira viagem. Teremos que ir até Mirta daqui a pouco comprar algumas sementes e algumas armas.

_ Você parece forte e animado! Disse Coni

_ Sim, estou.

_ Fico feliz Adam. Até logo

_ Até logo, acenou o jovem. Adam gostava de Coni, ela olhava para ele com carinho e parecia se importar com seus assuntos. Varias vezes viu ela orientando Iur sobre o que seria melhor para ele. Sentia que a mulher tinha uma espécie de preocupação com ele.

Iur suspirou e foi tomar banho. Pensou em Maira, ele queria ter estado com ela. Coni estava se tornando alguém diferente, ele não gostava de ser tratado como uma coisa por ela. Já havia tolerado muito tudo isso, queria mudar tudo. Afinal, ele também tinha a parte dele, Anne era filha de ambos e a segurança do espaço sempre dependera dele. Ficou pensando em como seria se ele pudesse ir embora dali, com Maira e Anne. Levaria também o jovem Adam, ele cuidou do menino desde pequeno, sentia um carinho muito especial por ele. 

 Coni estava ficando confusa demais, seria necessário afastamentos constantes. Estava ainda mais nervosa do que o comum. Logo Maira daria a noticia a Iur, ela sabia que a mulher contaria. Mesmo que ela exigisse segredo a Maira sobre isso, dessa vez, sabia que a regra seria quebrada. Seria algo entre os dois, um casal que se ama sempre diz a verdade um ao outro, poucas coisas são mais fortes do que a cumplicidade. Ela tinha que colocar a cabeça no lugar. Não podia deixar que uma sucessão de pensamentos da era antiga carregados de emoções desencontradas a levassem para o buraco, e junto com ela, tudo o que as mulheres conquistaram. A paz, a amizade que tinham hoje era tudo. Graças ao afastamento dos homens, as mulheres se empoderaram. Hoje não havia mais competições, intrigas, ciúmes e inveja entre as mulheres. Os homens apenas serviam ao propósito da força e procriação, nada mais. A vida gerava em torno das geradoras da vida, isso era um grande avanço. Antes as mulheres cometiam crimes contra elas mesmas, brigavam e competiam por homens. Agora, as mulheres sabiam que eles não ajudavam-nas em tanta coisa assim. Unidas, conseguiam ir mais longe e tinham a liberdade de serem elas mesmas.

Começou a relembrar e viu que tudo começou quando sentiu ciúmes de Maira e Iur. Viu que mesmo ela carregando um titulo de Grande Deusa e diretora do espaço de Queenshills, não era suficiente para ser amada. Iur amava outra mulher, uma mulher normal sem nenhum dom especial dentre tantos que as outras mulheres dali tinham. Mas ao mesmo tempo, era uma mulher tão perfeita que seria impossível encontrar algo que a denegrisse. Ela pensou em tirar Maira do caminho. Ela pensou isso de novo.

A verdade é que Iur era apaixonado por ela. Mesmo que a tirasse do caminho, ela continuaria viva no coração dele.

Depois, conheceu Arthur. Isso piorou a situação. Agora ela sentia vontade de estar com um homem, que não se importa em estar com ela. Iur também não quer estar com ela, cumpre uma obrigação.

Ela gostaria de estar com Arthur, mas seria uma sombra na vida dele.

Enfim, era difícil para ela admitir que o amor com um homem não seria possível, mesmo porque foi o que ela sempre defendeu.

Ela sempre defendeu o afastamento dos homens, e porque queria tanto ser amada por um deles? Qual o efeito do amor de um homem sobre uma mulher?

Ela precisava saber porque durante tantos anos as mulheres quiseram tanto isso.

Procuraria Grenda, a mais velha do espaço. Ela deveria ter relatos sobre isso.

Grenda recebeu Coni com muito carinho. Como uma anciã, Grenda era uma mulher serena, com olhar doce e experiente. Seus olhos eram azuis vivos, e os cabelos ainda eram levemente cinza e compridos, muito bem tratados. Ninguém ficava com os cabelos brancos cedo em Queenshills. Grenda ofereceu raízes para Coni, mas ela não tinha vontade, recusou.

Nessa idade é importante comer coisas da Terra, cheias de Sol. Dão muita energia. Planto aqui mesmo no jardim, veja que lindas. Mostrou as raízes orgulhosa.

As duas foram sentar-se ali mesmo no jardim de Grenda. Era um dos jardins mais lindos de todo o espaço. Josy adorava visitar o jardim dela desde pequena, visto que Josy era uma apaixonada por jardinagem e aprendera muitas técnicas com Grenda. O sol estava ameno, e o céu nublado. As arvores altas balançavam com aquele barulho de folhas tocando o ar e Grenda falava sobre uma flor, mas Coni não estava de fato ouvindo. Quando sentaram embaixo das arvores, Grenda olhou com atenção e apenas disse:

_Coni, eu tenho alguns relatos sobre o que quer saber, mas tenho também um diário, escrito por uma pessoa da minha família que viveu há mais de trezentos anos atrás. Quando a Terra foi destruída, um de nossos ancestrais sobreviveu e guardou essa relíquia. Se quiser posso te emprestar para que leia.

Coni disse que adoraria.

Grenda começou a dizer que as mulheres no passado, eram as mesmas de hoje. O que acontecia é que elas eram criadas por pais e mães, existiam famílias estruturadas. E os pais, geralmente mandavam nas mães. E as filhas cresciam com essa referencia. Homens mandam em mulheres. As mulheres por sua vez, concordavam com isso. Uma vida ao lado de um homem, muitas vezes era mais confortável do que uma vida sozinha. Porque as mulheres não eram amigas umas das outras. As mulheres foram afastadas dos estudos e dos negócios. Também foram afastadas de decisões políticas. Só depois de muito tempo começaram a fazer parte desses assuntos, e as coisas começaram aos poucos a mudar. Quando elas perceberam que podiam viver sozinhas, através do trabalho, muitas pararam de se envolver com homens. Priorizavam as carreiras e ficavam infelizes eternas. Começaram a ter doenças e atitudes masculinas, agressivas e muitas começaram a se apaixonar por outras mulheres. Tudo isso foi muito comum durante uma época confusa que a Terra existiu. Depois, a infelicidade continuou presente. As mulheres conquistaram seu lugar, mas não admitiam mais muitas coisas. Os homens começaram a ter um desinteresse por uma raça tão parecida com a deles.

O desequilíbrio atingiu um auge, e isso foi próximo ao ano de 2150. Muitas pessoas não tinham mais filhos, famílias não existiam mais. A Terra ficou reduzida em população, porque mais morriam do que nasciam. Houve um afastamento das pessoas, causados por pestes e alta tecnologia. Era possível falar com outras pessoas através de aparelhos e tecnologias holográficas. As pessoas já não eram felizes em nenhum momento. Foi quando houve uma tentativa de retomada em prol dos homens e das mulheres, mas muitas perceberam que agora, os homens já não eram também os mesmos. Haviam se acostumado com as mulheres no poder. Já não se interessavam mais em batalhar por nada, muito menos precisavam conquistar algo. Tinham perdido aquela vontade de poder e luta. O mundo tinha um sexo forte: o feminino. Os homens apenas eram mimados e na vida adulta, podiam viver tranqüilos sem a cobrança de ter uma família e algumas mulheres pagavam por eles. Eles tinham uma vida cômoda e confortável. Quem batalhava nessa época pelo poder eram as mulheres. As coisas se inverteram, as mulheres cuidavam dos homens e os sustentavam. Ainda assim, continuava havendo brigas quando duas mulheres se interessavam pelo mesmo homem. Com uma população reduzida, isso ocorria com bastante freqüência.

Depois, os homens foram se enfraquecendo. Não tinham mais nenhuma agressividade e então começaram as rebeliões de locais onde alguns ainda tentavam se impor. Foram mortos, envenenados por mulheres. E depois, quando as mulheres perceberam em como tudo estava caminhando, elas resolveram então unir-se. Parar de brigar, parar de competir, parar com tanta agressividade e parar com tanta vaidade, afinal, já nem tinham tempo para vaidade. E o inicio da sociedade como estamos hoje começou, até que você já sabe como estamos. Veio a grande destruição e estamos assim hoje Coni. Porque está me perguntando tudo isso? Começou a duvidar se isso é o melhor para nós?

_Acho que hoje vivemos muito bem, não vejo nada errado. Os homens estão bem, e nós também. Podemos conversar, somos amigas, nos defendemos e eles estão satisfeitos também. Mantém suas funções, vejo tudo perfeito. Acho que chegamos a tão sonhada perfeição. Estou com 120 anos, e durante toda minha vida foi assim. Minha bisneta vive comigo, quando isso ocorria naqueles tempos? Concluiu Grenda

_Será Grenda? Será que estou arruinando a vida de pessoas que se amam com esse legado? Ultimamente eu tenho sentido duvidas. Será que não gostaríamos de viver juntos? Eu mesma senti uma paixão, gostaria de viver isso, mas fiz um juramento. Tenho que cuidar desse espaço, dessas regras, manter essas conquistas.

_Leia o diário Coni, você vai encontrar a resposta nele. Eu mesma já li sete vezes. A vida dessa minha ancestral era muito rica em experiências, e ela retrata muitíssimo bem o que sente uma mulher apaixonada, você vai gostar da leitura, vai tirar todas suas duvidas. Mesmo que isso tenha acontecido há 300 anos, tenho certeza que as mulheres não mudaram em relação a paixão. Essas questões estão apenas em você. Eu acho que estamos muito bem assim, sem nos apaixonarmos. Disse Grenda._Vou pegar o diário, só um instante. E saiu caminhando devagar em direção a casa.

Coni lembrou de Maira e Iur. Sabia que isso não era verdade. Pensou nela mesma, e sabia que com certeza isso não era verdade. Também tinha Carly, estava apaixonada e com um filho no ventre. As mulheres se apaixonavam sim.

Ao invés disso, sorriu levemente e esperou Grenda buscar o diário.

Ela voltou minutos depois, com um livro embrulhado em um pano preto. A escrita era muito antiga, parecia digitada. As folhas estavam bem amareladas, mas era possível ler com clareza.

Coni agradeceu Grenda e saiu com o livro embaixo do braço. Estava ansiosa para começar a ler.