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História Rainha Vermelha - Moderato


Escrita por: poutyboxian

Notas do Autor


Boa leitura ^.^

Capítulo 3 - Moderato


O ambiente rústico, composto por uma paleta de cores que passava pelos mais variados tons de marrom, tinha se tornado um espaço familiar para Irene.

Três semanas se passaram desde que sua vida virou de ponta cabeça, também fazia três semanas que iniciou seu treinamento. Não sabia exatamente como se sentia, pois, na maior parte do tempo, se ocupava em manter a mente focada em coisas que exigiam sua total atenção. Sua meta era alcançar poder próprio.

Sehun passava grande parte dos dias lhe dando aulas, tanto que se reuniam sempre na sala particular do bruxo (cada bruxo que residia naquela mansão tinha sua própria zona privada). Irene só tinha permissão de entrar em tal sala quando era convidada por Sehun. Irene já possuía dominância dos princípios básicos da magia, algo bem principiante que, em termos mundanos, seria o primário. Todavia, ela queria passar do básico. E quando Sehun veio com a proposta de treiná-la, não pensou duas vezes antes de aceitar. Além dos treinos serem uma ótima oportunidade de aprender mais a respeito de feitiços, se provaram ser uma excelente distração. 

— Sempre canalize a pessoa que deseja encontrar através de algum objeto que pertença a ela — Sehun orientou durante certo ponto da aula sobre feitiço de localização. 

Sehun tinha o costume de perguntar se Irene dormiu bem e se havia tomado café da manhã antes de todos os treinos. Geralmente, a resposta da primeira pergunta era uma meia verdade. Os pesadelos de Irene eram frequentes, mas nada que ela viesse a se lembrar quando acordava. Irene sentia o corpo e a cabeça pesados todas as manhãs e um gosto amargo na boca, que sempre a impedia de tomar café da manhã após despertar. No entanto, ao final de cada treino, Sehun a arrastava até a cozinha e preparava um sanduíche e um suco fresco da preferência da garota. Sehun parecia um irmão que Irene, secretamente, sempre desejou ter. 

Acompanhou o andar elegante do rapaz até uma das poltronas acolchoadas e assim que ele se virou notou que na mão dele tinha uma figura conhecida.

— O urso da Seulgi? — Ergueu uma sobrancelha, mais uma vez estava com a pelúcia que a colega de quarto tinha lhe emprestado para dormir em sua primeira noite de tormenta.

Nesses dias que se passaram, descobriu mais coisas sobre Seulgi. Como, por exemplo: o fato dela ter sido acolhida pelos bruxos quando tinha apenas seis anos. Seulgi lhe confidenciou que a mãe biológica era muito amiga de Baekhyun e o fez prometer que, se algo acontecesse a ela, ele cuidaria de sua filha.

A mãe de Seulgi acabou por ser morta em uma armadilha de caçadores, assim como o pai foi antes mesmo da menina nascer. Cumprindo a promessa feita à mãe da garotinha, Baekhyun assumiu a guarda dela. Em termos legais, e humanos, Baekhyun se trata do tio da menina. 

— Assim que cheguei aqui, Baekhyun me deu o ursinho. — Apontou para o urso que foi a companhia noturna de Irene. — E me perguntou como eu queria chamá-lo e ofereceu as opções de: pelo nome, por algum apelido fofo ou de tio. Acabei chamando ele de "titio Bae". Ele achou adorável e, desde então, sou a sobrinha dele. — Sorriu com doçura. Estava explícito na expressão de Seulgi que a menina tinha muito carinho pelo bruxo mais intimidador dali. — Ele me ensinou basicamente tudo o que sei, inclusive a ler. Baekhyun exerceu a função de pai para mim. Não que os outros não tenham cuidado de mim também. Todos aqui são bem cuidadosos e protetores, você logo irá notar. — Piscou travessa enquanto seu sorriso se ampliava. — Baekhyun é uma pessoa de bom coração. Se dê a chance de conhecê-lo melhor.

Dispersando a onda súbita de devaneios, Irene voltou a se focar em Sehun.

— Tenho a permissão dela — esclareceu. Já tinha notado que Sehun é o tipo de pessoa que não gosta de rodeios em diálogos. Gostava disso. — Esse feitiço é bem simples, mas exige muita concentração e foco. Você precisa deixar sua mente limpa e permitir que seja preenchida pela pessoa que procura. Apenas segure firme o urso para canalizar a energia de Seulgi. — Sehun se afastou alguns passos e se pôs a observar o desempenho da aprendiz, que se ajeitou na posição de lótus, esticou bem a coluna e envolveu a pelúcia entre as mãos.

— Feche os olhos, se concentre e repita Revelare até que consiga visualizar a localização dela. — Fez um breve gesto com a mão, um claro incentivo para Irene começar.

E assim ela fez.

Sentia a textura felpuda e macia na ponta de seus dedos, algo que, instantaneamente, puxou a lembrança de Seulgi em sua mente. Associava a garota com sensações e sabores que a transmitiam doçura. Para iniciantes, era necessário realizar magia com o auxílio de um círculo traçado no chão. No círculo havia parte dos quatro elementos, estes ficavam com a tarefa de ajudar os bruxos a aprenderem a como canalizar a própria magia e, a partir daí, se tornarem bruxos completos.

Irene respirou fundo antes de permitir ser coberta pelas lembranças de Seulgi. Tons de rosa surgiram em sua mente, como se estivesse em frente a uma enorme nuvem rosada. Porém, subitamente, o vislumbre da porta vermelha surgiu, o que a fez arfar e abrir os olhos de supetão. Sentia seu coração bater forte contra o peito e sua pele eriçada. Rapidamente ergueu os olhos e se deparou com o olhar analítico de Sehun, que prevalecia de braços cruzados enquanto encostava o quadril na quina da mesa.

— Tente outra vez — a voz soou baixa, porém autoritária.

Irene assentiu. Tragou uma boa quantidade de ar para os pulmões antes de apertar os lábios e se concentrar novamente na textura da pelúcia. Novamente, se encontrou com a nuvem de tons de rosa. Logo suas narinas foram invadidas pelo cheiro de chocolate, algo característico de Seulgi. A garota adorava tomar chocolate quente antes de se deitar. 

Um súbito estalo ecoou na cabeça de Irene, tal som se assemelhava ao click de alguém que acaba de ligar um interruptor. A nuvem rosada ondulou e, do meio dela, surgiu a imagem de Seulgi rindo enquanto ouvia duas meninas cochicharem para ela algo que parecia ser engraçado. Inconscientemente, Irene sorriu de forma contida, algo que não passou despercebido para Sehun.

Revelare — murmurou Irene. No mesmo instante pode visualizar a cidade de New Orleans, logo viu uma casa modesta e uma placa que dizia “French Quarter”. Tudo passou em flashes ligeiros, mas Irene conseguiu ter uma visão perfeita da localização de Seulgi.

— Saberia me dizer onde Seulgi está? — Sehun questionou, coisa que fez a garota despertar.

— Ela está na casa de algumas amigas, parece está se divertindo — comentou. — A casa fica próxima daqui, em French Quarter, ao lado de uma loja de vinhos.

Sehun puxou um dos cantinhos da boca.

— Nada mal. Mas lembre-se que…

— A prática leva à perfeição — Irene completou antes de assoprar as velas que formavam o círculo. 

— E faz com que imagens indesejadas não surjam em sua mente em meio a feitiços — complementou. Sabia bem ao que Sehun se referia. Ele sabia.

— Me sinto andando em uma corda bamba — murmurou. Não esperava ser ouvida, mas Sehun tinha ouvidos aguçados.

— Procure sempre se equilibrar. Se imagine como a equilibrista de um grande espetáculo onde a atração principal é você. — Piscou calmamente. — Me recordo que, quando era mais nova, gostava de ir ao circo. 

— Ainda gosto. — Levantou o olhar e o lançou um sorriso minguado. Circo a lembrava do pai. — Tentarei me lembrar disso. Obrigada. — Suas palavras foram sinceras. Era grata pelo que Sehun estava fazendo e pela maneira como ele a trata. Sehun não a via como alguém frágil e isso é algo que Irene valorizava muito.

Aceitou a mão estendida do rapaz e não fez cerimônia quando ele falou que era hora da primeira refeição do dia.

 

Sehun não foi tomar café da manhã, mas alegou que já tinha tomado e que havia pendências a serem resolvidas. Sendo assim, Irene seguiu pelo corredor até a ampla cozinha. Quando estava há poucos passos desta, ouviu vozes conhecidas, sons de talheres e o cheiro gostoso de café e de pão sendo esquentado. Não demorou para adentrar a cozinha e se deparar com a figura alta de Chanyeol servindo café para Jongdae, que estava sentado diante do maior com um sorriso satisfeito tomando conta do rosto.

— Bom dia, Irene — Chanyeol foi o primeiro a saudá-la, ele ainda servia Jongdae, mas levantou o olhar para ela e a lançou um sorriso bonito. Em seguida, Jongdae a desejou um bom dia cantarolado, aparentemente estava de bom humor.

Desejou bom dia para ambos antes de ir em direção a eles.

— Aproveite que Chanyeol está de bom humor e tire o máximo de proveito do lado prendado dele e… AI! — Jongdae exclamou ao mesmo tempo que deu um pulo, gotas de café escorriam pelas costas de sua mão.

— Ops. — Chanyeol abaixou o bule com um sorrisinho zombeteiro no rosto.

— Seu miserável! — Jongdae gritou e Chanyeol se limitou a encará-lo com uma expressão entretida.

— É raro vê-lo na cozinha nesse horário — Irene interveio antes que a implicância matinal dos dois se aprofundasse. Costumava ver Chanyeol depois das onze da manhã. Até checou o relógio de parede e este a confirmou que passava um pouco das oito.

— Acordei disposto — retrucou com simplicidade. — Peguei no sono cedo noite passada.

— Não teve uma noite muito proveitosa e mesmo assim está de bom humor?! Isso sim é um milagre — Jongdae comentou após limpar a mão suja de café.

— Na verdade, foi proveitosa. Consertei seu relógio, o que estava fazendo um barulho irritante. De nada. 

— Meu herói! — Jongdae exclamou, feliz com a informação.

— Quer que eu te faça um sanduíche, Irene? — Chanyeol perguntou. 

— Adoraria. — Até porque as torradas e o sanduíche de peito de peru com queijo no prato de Jongdae estavam a fazendo salivar.

— Pode pegar as torradas, se quiser. — A voz de Jongdae a despertou e a fez se tocar estar muito focada no conteúdo do prato dele. Irene sentiu as orelhas esquentarem e, timidamente, pegou duas torradas com geleia.

Apesar de Irene tender a se sentir sem jeito na presença dos dois bruxos, eles sempre procuravam fazê-la se sentir confortável. Costumava tomar café da manhã na companhia de Jongdae, ele sempre acordava cedo. Jongdae já tinha confessado que gostava de ver o sol nascendo e sentir a brisa fresca das primeiras horas da manhã, coisa que a surpreendeu de um jeito bom. Não esperava que Jongdae fosse esse tipo de pessoa. Por sua vez, Chanyeol se mostrou ser um rapaz bem cuidadoso que gosta de ajudar os demais em tudo que pode.

— O que aprendeu hoje? — Jongdae perguntou enquanto Chanyeol estava envolvido demais montando o sanduíche, até assobiava alguma música que os ouvidos de Irene desconheciam.

— Feitiço de localização. Consegui localizar Seulgi — respondeu de forma quase automática.

— Ela foi a festa de pijama, não é? — Jongdae levou uma torrada a boca e deu uma boa mordida, o que resultou em seu lábio superior sujo de geleia. 

Irene assentiu enquanto pegava um guardanapo, logo o ofereceu. Apontou onde estava sujo, Jongdae fez bico antes de pegar o guardanapo e limpar a região.

 — Ela te chamou?

— Sim, mas eu não quis ir. — Entortou o nariz. — Não estou a fim de ter interação humana.

Seulgi foi gentil ao convidá-la, mas não é como se uma casa cheia de meninas animadas e curiosas fosse um lugar que Irene quisesse estar. Se recordava que Seulgi ficou cabisbaixa com sua recusa, mas ela acabou compreendendo a decisão de Irene. 

— Parece que temos mais uma antissocial por aqui, o que significa que agora temos um bom balanceamento nessa casa entre o time social e o anti.

— Não separe a casa em times, Jongdae. — A voz de Baekhyun preencheu o ambiente e assustou Jongdae, que praguejou algo sobre Baekhyun parecer uma assombração com seus passos de fantasma.

Em resposta, Baekhyun deu uma risadinha baixa antes de ir até Jongdae e esmagar as bochechas do bruxo, com ambas as mãos, até Jongdae formar um bico de peixe. Jongdae até tentou golpear  Baekhyun, porém tal tentativa foi mal sucedida, visto que Baekhyun desviou do golpe com a agilidade de um gato.

— Bom dia para você também, indecente. Espero que o que eu esteja vendo embaixo do seu roupão seja um short. — Baekhyun o ignorou.

— Bom dia, Irene. — Um sorriso simples foi direcionado para Irene, que prontamente o respondeu. — E sim, é um short. — Baekhyun piscou em direção a Jongdae antes de se sentar onde Chanyeol, instantes atrás, estava de pé.

Baekhyun se encontrava um tanto desalinhado, seus cabelos negros estavam bagunçados, seu rosto um tanto inchado e o roupão de seda preto bastante amarrotado. Parecia ter acabado de acordar.

— Não beba minha xícara de café…

— Tarde demais, contaminei sua xícara — Baekhyun rebateu após bebericar o conteúdo da xícara de Chanyeol.

— Contaminou? — Irene indagou com uma sobrancelha erguida em uma clara interrogação.

— Piada interna entre eles — Jongdae se apressou em responder e Irene permaneceu na dúvida, mas optou por não procurar saber que piada seria essa.

Baekhyun tinha muitas camadas, contudo, ao ver de Irene, o lado divertido e descontraído se sobressaia sobre as demais quando o clima estava leve. Já o lado sério, centrado e intimidador, se manifestava quando a situação pesava. Tinha se intimidado na primeira vez que o viu, mas conforme os dias se passaram, Baekhyun se mostrou ser bem amigável e, vira e mexe, pedia para ela o fazer companhia enquanto arrumava sua vasta estante de livros.

— O que aconteceu para você acordar essa hora? — A pergunta partiu de Chanyeol, ele olhava Baekhyun por cima do ombro.

— Senti sua falta, gracinha. — Havia um misto de provocação e divertimento no tom de Baekhyun, ele tinha virado o corpo em direção a Chanyeol. — Você não dormiu no quarto.

Pelamor, não comecem — Jongdae choramingou.

— Culpe o Jongdae e o relógio dele — Chanyeol acusou.

— Ahh, agora a culpa é do meu relógio?! 

— É sim — afirmou Chanyeol, se divertia implicando com Jongdae.

— Dormi mal essa noite, me mime com um sanduíche — Baekhyun continuou, coisa que arrancou um arfar descrente de Jongdae.

Irene não negava, observar tal cena era divertido. 

Desconfiava da relação de Baekhyun com Chanyeol. Já tinha notado que eles gostavam de se provocar, que tinham piadinhas internas e que possuíam uma ótima relação e, bem, eles dividiam o quarto. O que, automaticamente, fazia a jovem bruxa se perguntar o quão próximos eles são um do outro. Eles não demonstravam, ao menos não na frente dela, que eram um casal. Não havia troca de carícias, mas tinha troca de olhares afetuosos, não havia beijos, mas tinha muito cuidado um com o outro, não havia muito contato físico, mas tinha bastante proximidade e uma sincronia que chegava a ser assustadora. Já tinha pensado na possibilidade de eles serem um casal discreto, mas também podiam ser apenas grandes amigos com um vínculo muito forte; pensar sobre isso a fazia se sentir culpada por maldar a relação. Afinal, ela também dividia o quarto com Seulgi e isso não significava nada além do que era: apenas duas meninas que se davam bem dividindo o quarto.

— Seu sanduíche está pronto. — A voz de Chanyeol a arrancou de seus devaneios. Irene mirou o necromante e se deparou com ele apontando o sanduíche com o queixo. Não tardou a pegá-lo. O cheiro de queijo derretido e peito de peru fez com que o estômago da garota gritasse até ela o acalmar dando uma boa mordida.

Chanyeol acabou por tomar café da manhã lá pelas nove da manhã, pois se ocupou caprichando no preparo do sanduíche de Baekhyun. Por outro lado, Jongdae tomou tranquilamente seu café antes de se lembrar que tinha que buscar o celular, que estava no conserto. Irene não se demorou na cozinha, depois de comer sanduíche, beber suco de morango de caixinha (oferecido por Baekhyun) e de responder perguntas triviais por parte dos bruxos curiosos, os avisou que precisava tomar um banho. O que não era mentira, não tomou banho antes de treinar e seu corpo estava com o suor seco da noite turbulenta de pesadelos que tivera.

 

O banho relaxou os músculos tensos de Irene e a proporcionou um tanto de leveza corporal. Necessitava disso, até porque é no chuveiro que tem o costume de colocar suas ideias no lugar e a pensar com mais clareza. E é no chuveiro que conseguia desfrutar um pouco da sua própria companhia, ao menos por um tempinho. Não gostava de ficar muito tempo à mercê dos próprios pensamentos. Pensando nisso, desligou o chuveiro e tratou de se secar. Rapidamente, se vestiu e saiu do banheiro com o pensamento voltado à pequena pilha de folhas imprimidas que estavam à sua espera no sótão.

— Dessa vez tenho um convite irrecusável para você. — A voz de Seulgi assustou Irene, tanto que acabou dando um pequeno pulo que fez quem a assistia soltar uma risadinha animada.

— Acho que não terei escapatória dessa vez — Irene falou ao passo que ajeitava a postura. Seulgi tinha os mesmos passos de fantasma do tio.

— Exato. — A amiga sorriu convencida enquanto se direcionava a própria penteadeira. — Soube que Sehun te ensinou o feitiço de localização e que você me localizou. Só espero que não tenha me visto nua.

— Não, eu não… — Irene começou, mas se interrompeu ao ouvir o riso alto da garota acompanhado de um olhar provocativo, que era assustadoramente semelhante ao de Baekhyun.

— Estou brincando! Não me leve tão a sério — Seulgi falou enquanto pegava uma das múltiplas escovas de cabelo que ela deixava dentro de um pote roxo da Hello Kitty. — Fico feliz que tenha conseguido realizar o feitiço sem complicações. — O sorriso da menina foi sincero, chega os olhos miúdos brilharam.

— Foi mais fácil do que imaginei. — E realmente tinha sido. — A festa do pijama foi boa? — Não era uma real curiosidade, viu Seulgi se divertindo com as amigas, mas achava educado perguntar.

— Se eu pensar nos salgadinhos, te digo que foi, mas se eu pensar nas conversas incômodas, te digo que não. — Deu uma penteada na franja antes de colocar a escova de volta ao pote. — Digamos que meu assunto favorito está bem longe de ser qual dos rapazes daqui é o mais gostoso, elas incluíram Baekhyun nisso. — Contorceu o rosto em desagrado. — Baekhyun é praticamente um pai para mim! — Seulgi falava em um tom escandalizado, como se estivesse a falar a coisa mais absurda do mundo. Chegava a ser cômico. — Todos aqui me criaram, então imagina o quão desconfortável foi essa conversa.

— E você falou para elas que esse assunto não te agradava? — Irene questionou, mas não conseguiu disfarçar o tom risonho em sua voz.

— Falei sim. — Seulgi deu um sorriso gaiato. — E elas me expulsaram de lá. — Deu risada. — Meio que acabei contrariando algumas. — Uma expressão beatífica tomou conta do rosto bonito.

— Meio que as contrariou? E como seria esse meio-termo? — A essa altura, Irene já estava curiosa com o que a bruxa dissera às meninas para ser expulsa. Só a ideia da tão doce Seulgi ser expulsa de uma festa de pijamas já fazia um riso coçar em sua garganta.

— Uma delas começou a falar obscenidades sobre eles. — As bochechas de Seulgi se tingiram de vermelho. — Fiquei desconfortável e fui um tanto rude, aí uma delas berrou para eu cair fora dali. Bem, ao menos eu comi bastante. — Sorriu com as bochechas coradas. Irene riu.

— Bem, eles chamam muita atenção. Não me surpreende essa empolgação da parte delas.

— Algum deles chama sua atenção? — Seulgi soltou repentinamente, o que fez Irene arregalar os olhos, surpresa.

— Eles são realmente bonitos, mas não chamam minha atenção da forma que está pensando. — Irene observou os olhos da garota se estreitarem. — Eu gosto de garotas — falou de uma vez. Não estava acostumada a ser tão direta quando se tratava de sua sexualidade, mas sentia que não tinha razão para esconder isso da menina à sua frente. Se Seulgi tivesse algum tipo de preconceito descobriria agora.

Em um primeiro momento, Seulgi exibiu uma expressão surpresa, mas logo foi substituída por um sorrisinho contido.

— Eu também — foi tudo que Seulgi disse, o que fez Irene se sobressaltar. Não esperava ouvir tal confissão de sua colega de quarto, mas nem teve tempo de pensar a respeito. Mal deu por si e já estava sendo arrastada corredor abaixo por uma Seulgi visivelmente empolgada.

— Vamos a nossa aventura de hoje! Você precisa pegar um pouco de sol!

 

 

— Por que me trouxe aqui? — Irene questionou assim que se viu parada em frente a uma loja vazia com paredes de vidro e com uma grande placa escrita "Inauguração em breve"

O tempo estava fresco e o sol esquentava a pele das bruxas de forma gostosa enquanto fazia auréolas no topo das cabeças delas. Após darem uma boa caminhada, Seulgi parou em frente a tal loja e fez com que Irene também freasse seus passos ali.

— Porque você está diante de uma herança de família. — Sorriu antes de se virar totalmente para Irene, que estava com o semblante nublado pela confusão. — Seu pai deixou essa loja em seu nome. Seria um presente de aniversário, mas você sabe… — Seulgi mordeu o lábio inferior ao ver o rosto cabisbaixo da garota. — Sehun sabia disso e me disse e, bem, queria que você visse, então a trouxe aqui — complementou em uma tentativa um tanto desesperada de amenizar suas palavras anteriores.

— Sempre comentei com meu pai meu desejo de ter uma doceria. — Sorriu triste — Não imaginava que ele deixaria esse espaço para mim… — Irene não sabia ao certo o que estava sentindo. Fazia dias que não parava para pensar no pai, porque doía. Doía mais do que se sentia capaz de verbalizar. Saber que o pai realizou um sonho infantil seu fazia um sentimento agridoce tomar conta dela. 

— Você está bem? Quer ir embora? Me desculpe, eu realmente não quis… — Irene levantou o olhar para Seulgi e fez um pequeno gesto com a mão de quem espanta uma ideia.

— Não se desculpe, mas não posso dizer que estou bem. Faz dias que não sei o que é me sentir bem… Só estou vivendo um dia de cada vez e procurando não cair nas armadilhas de meus próprios pensamentos, mas não se sinta culpada. Sou grata por ter me mostrado esse lugar. — Não tinha sentido em tentar enganá-la ou pior, tentar se enganar.

Seulgi pareceu um tanto aliviada, mas havia um vinco de preocupação no meio de suas sobrancelhas que se estendia até os olhos. Irene sentia a urgência da menina em remediar a situação.

— Tem algo que eu possa fazer por você? — A urgência de Seulgi também se fez presente em sua voz.

— Vamos tomar sorvete.

Seulgi não pensou duas vezes antes de concordar com a ideia. 

Tinha uma sorveteria há algumas ruas de onde estavam. Durante a caminhada até lá, Seulgi se pôs a tagarelar sobre as partes boas da festa de pijama. Visava levar a conversa para um caminho mais leve e seguro, coisa que acabou por conseguir.

Uma vez na sorveteria, pediram uma bomba calórica chamada banana split. Ao se encaminharem para os assentos, a música ambiente mudou para uma bastante conhecida pelos ouvidos da dupla.

Quelqu'un m'a dit — falaram em uníssono e automaticamente se encararam e abriram sorrisos cúmplices.

— Como conhece? — Irene foi a primeira a perguntar.

— Quando era mais nova, tinha o costume de ouvir músicas da rádio local até adormecer, essa era uma das músicas que mais tocava. Gosto bastante dela. E você?

— Foi a primeira música que aprendi a tocar no violão — Irene revelou antes de levar uma colher generosa de doce à boca. O misto de sabores explodiu em sua boca e a fez fechar os olhos por alguns segundos. Fazia um bom tempo que não comia tal sobremesa.

— Hm, você sabe tocar violão, bom saber.

— Considerando que faz uns quatro anos que não toco, acho que desaprendi o que sei.

— Chanyeol tem violão. Aposto que ele te emprestaria.

— Então é ele que toca? — Vez ou outra ouvia acordes de violão reverberar pela mansão, mas não sabia exatamente de onde vinha, muito menos quem o tocava.

— Sim, ele adora tocar e Baekhyun adora ouvir.

— Eles são bem próximos.

Claro que são. — Irene não sabia dizer se viu demais, mas podia jurar ter visto um sorrisinho irônico nos lábios de Seulgi antes dela enfiar uma colherada na boca.

Seguiram comendo banana split e com uma nova pauta de conversa, que se resumia no treinamento de Irene. Seulgi, guiada pela curiosidade, perguntou sobre todos os feitiços que Irene aprendeu até o momento, quais a Bae teve mais facilidade de aprender e aqueles que achou mais difíceis. Comentou também sobre alguns que ela achava bacana e sobre outros que a jovem aprendiz ainda aprenderia. Não demorou para o combo de calorias chegar ao fim e para o celular de Seulgi alertá-la de que era hora de alimentar seu familiar, que consistia em um coelho da cor de caramelo. 

Familiares se tratam de espíritos que fazem parte do submundo. Eles se utilizam de formas de animais para caminharem no mundo dos vivos e sempre buscam companhia em meio aos bruxos, visto que estes são os únicos capazes de ouvi-los. Mas, assim como os bichinhos de estimação dos humanos, precisam de alimento. 

— Hora de alimentar Pernalonga — foi tudo que Seulgi disse antes de se levantar e ser seguida por Irene. Pagaram pela sobremesa e trilharam o caminho de volta para casa.

Irene ainda achava o nome do familiar da colega de quarto comicamente irônico, visto que o coelho tinha as perninhas pequenas e era todo miúdo, parecia uma bolinha de pelos com orelhas grandes. Todavia, achava fofa e genuína a relação que observava entre Seulgi e o familiar. Se perguntava se um dia teria algum.

 

 

Uma vez de volta à mansão, Irene viu um rolo de jornal depositado em cima da caixa de correspondências que ficava em frente à residência. Sem pestanejar, pegou o jornal e saciou a curiosidade de Seulgi ao dizer preferir ler jornais a sites de notícias. Felizmente, a menina não a questionou sobre isso. Adorava a companhia de Seulgi, mas ansiava por se enfiar no sótão e passar as próximas horas focada em suas pesquisas e estudos — o que não tardou para acontecer. Acabou dando a desculpa de que ficaria um tempo pegando sol no jardim e, parecendo engolir, Seulgi deu de ombros e foi para o quarto alimentar o familiar. Uma vez sozinha, Irene correu para o sótão.

 

 

A mente de Irene fervilhava. Estava diante de sua mais nova obsessão, que se resumia no estudo de cinco casos de estupro que tinham como padrão o fato das mulheres violadas serem distintas entre si e sem nenhuma ligação. Todas elas foram a festas, bares ou baladas e, após ingerirem bebida batizada, foram encontradas inconscientes em alguma região deserta da cidade. Nenhuma sofreu nenhum tipo de furto dos objetos pessoais que carregavam consigo, mas foram abusadas sexualmente e não se recordam da face de quem as violou. A polícia chegou à conclusão óbvia de que se trata de uma mesma pessoa cometendo o mesmo tipo de crime. Entretanto, até o momento, não havia nenhum suspeito de tal atrocidade, ao menos para a polícia. Irene foi mais a fundo na pesquisa e uma hipótese surgiu em sua cabeça no quinto relato do mesmo crime. Após ler o relato do sexto caso, que estampava a capa do jornal de hoje, não tinha mais dúvidas de que sua teoria tinha 90% de chance de estar correta. 

Havia achado outra semelhança entre esses casos, uma semelhança que passou batida pela polícia. Bem, passou batida pelos olhos de quem de fato está se esforçando para solucionar esse caso. Não podia dizer o mesmo do policial que protegia a própria pele. Nos seis casos tinha um mesmo policial coletando o depoimento das vítimas. Podia ser excesso de séries policiais assistidas ou sua intuição de bruxa falando mais alto, mas algo a dizia que não podia ser coincidência que, toda vez que lia o nome do policial, sentisse a boca se amargar. Seria fácil um policial ocultar as provas contra si mesmo quando nem as suas vítimas se lembravam de sua face.

Rapidamente, pegou uma das notas adesivas coloridas e rabiscou um “PODE SER O POLICIAL QUE COLETA O DEPOIMENTO DAS VÍTIMAS” e o colou na parte interna da porta do armário antigo do sótão, que já possuía múltiplos recortes de jornais e papéis impressos do caso. Ali ficava a sua área de pesquisa. Irene dedicava boas horas de seus dias tentando ver coisas que passavam batidas pela polícia ou, nesse caso, que eram ocultadas.

Quando estava prestes a sublinhar o depoimento da nova vítima, ouviu vozes e passos se aproximando. Logo empurrou todas as coisas que estavam na mesa para dentro da gaveta e a fechou de forma apressada antes de se enfiar dentro do armário que, anteriormente, pregou o papel. 

 

A porta do sótão foi aberta pelas figuras, um tanto bagunçadas, de Chanyeol e Baekhyun. Estes pareciam animados enquanto trocavam sorrisos cúmplices e afetados. Em um piscar, a porta foi fechada por Baekhyun. Não demorou muito para Chanyeol passar um dos dedos pelo passador de cinto da calça jeans de Baekhyun e o puxar até que o corpo menor ficasse perigosamente perto do seu. 

— Agora é a hora que você fala um "Enfim, sós". — No ver de Baekhyun, o timbre rouco de Chanyeol se tornava ainda mais gostoso de ouvir quando ele resolvia falar aos sussurros.

— Desde quando sigo um roteiro, hm? — A sobrancelha arqueada em desafio acompanhada de um sorriso sacana fez com que a atenção de Chanyeol se voltasse totalmente para os lábios rosados e umedecidos que, no momento, pediam para serem cobertos pelos seus. — Há uma graça especial no imprevisível — foi a vez de Baekhyun sussurrar antes de levar o indicador até os lábios cheios de Chanyeol e, com a ponta do dedo, fazer o contorno da carne macia da boca convidativa. Chanyeol fez menção de abrir a boca, o que fez Baekhyun substituir o indicador pela língua habilidosa. Lambeu os lábios dele, de baixo para cima, e finalizou sugando o lábio inferior, o que arrancou um arfar de Chanyeol. — Senti falta disso.

Após dizer isso, encerrou de vez qualquer distância corporal que restava entre eles.

Chanyeol agora estava com o corpo contra a parede e com Baekhyun o pressionando contra ela com o próprio corpo. Tinha sentindo falta de sentir o calor do corpo de Baekhyun o incendiar de dentro para fora.

 — Meu corpo já lhe dá a resposta que você quer.

— Gostaria de ouvir da sua boca o que seu corpo me diz. — Pressionou o quadril contra o de Chanyeol. A voz de Baekhyun pingava malícia.

— E se eu me negar a dizer? — provocou.

— Sofrerá as consequências.

— Talvez eu goste das consequências. — O sorriso ladino de Chanyeol deu o ar da graça enquanto a destra de Baekhyun se enfiou nos cabelos alheios. Puxou a cabeça do necromante para baixo, gesto que permitiu que as bocas se encontrassem de forma mais cômoda. Uma vez que o ósculo se iniciou, as mãos de Baekhyun se deram passe livre para transitarem pelo corpo tão conhecido. Sabia bem os pontos onde o parceiro tinha mais sensibilidade.

Fazia dias que ambos não se davam a liberdade de se saciarem. Estavam necessitados, queriam se afundar um no outro e se deliciarem com beijos afoitos, toques despudorados e terem como trilha sonora o som de zíper se abrindo, de estalidos de beijos quentes e de arfares e gemidos que, juntos, formavam a melodia mais indecente.

Chanyeol sentia os lábios de Baekhyun em seu pescoço enquanto suas próprias mãos trabalhavam em explorar o peitoral desnudo do homem que o tirava a sanidade. Se ocupava em dar leves arranhões no abdômen definido enquanto a boca se ocupava em passar a língua no lóbulo da orelha de Baekhyun. Se embriagava com o gosto da tez do bruxo, que já dava indícios de suor.

Chanyeol sentiu quando Baekhyun se esfregou nele antes de ouvi-lo murmurar uma obscenidade em seu ouvido e o pedir para segui-lo. De início, apenas observou o bruxo se afastar. Baekhyun estampava seu típico sorriso sem-vergonha, que fazia um contraste gostoso com a figura de camisa aberta, cabelo na mais completa desordem e uma calça preta que delineava o quadril, as pernas, as coxas fartas e a intimidade despertada, que já marcava a calça de forma imoral. Baekhyun era o pecado em forma de homem.

Em passadas rápidas de pernas, Chanyeol ultrapassou Baekhyun e chegou ao destino indicado pelo próprio: a velha mesa de sinuca.

— Se deite na mesa — Baekhyun ordenou, Chanyeol prontamente o fez.

Um riso divertido preencheu o ambiente.

— Não precisa obedecer o que digo — Baekhyun escorou o quadril na quina da mesa de sinuca. Tinha acabado de enfiar dois dedos dentro de um rasgo que havia na jeans de Chanyeol, tal rasgo se localizava na coxa esquerda. Se pôs a acarinhar a pele macia e viu que  Chanyeol gostou. Ampliou o sorriso antes de cessar a carícia e impulsionar o corpo para cima da mesa.

— Eu sei, mas quero ver o que pretende fazer — devolveu.

— Pretendo fazer muitas coisas. — Lançou um olhar penetrante e carregado de luxúria na direção de Chanyeol, que sentiu os pelos dos braços e da nuca se eriçarem e um repuxar em seu baixo ventre em pura expectativa.

Uma vez em cima da mesa, Baekhyun engatinhou até estar perto do necromante. Chanyeol mantinha as pernas esticadas e o tronco levantado, se apoiava sobre os cotovelos para se manter em tal posição. Vários botões de sua camisa estavam abertos, o que dava a Baekhyun uma boa visão da pele de seu peitoral.

Sem pestanejar, Baekhyun se sentou em uma das coxas de Chanyeol, se inclinou em direção a ele e tomou os lábios em um beijo calmo. Não tardou para ser correspondido, com muita boa vontade, por Chanyeol. E demorou menos ainda para o ósculo voltar a se intensificar.

 

Enquanto os enamorados estavam envolvidos demais um com o outro, Irene agonizava vendo toda a cena por uma brecha no armário. Precisava sair dali com urgência! Estava bem longe de querer ver ou ouvir uma cena de sexo explícita, mas também não queria dar sinal de sua presença. Estava a morrer de vergonha e, infelizmente, não aprendeu nenhum feitiço que a fizesse ficar invisível.

No fim das contas, estava certa em desconfiar desses dois, mas detestava o fato de descobrir que eles têm um relacionamento enquanto os flagra em meio a preliminares. Maldita hora que resolveu se esconder.

Evitou ao máximo olhar para o que acontecia lá fora, mas de nada podia fazer pelos seus ouvidos, visto que estava segurando a porta do armário para ela não se abrir sozinha.

Espremeu os olhos e ouviu mais do que devia. Teria que sair dali e teria que ser agora. 

Quando estava decidida a tentar sair sem ser notada, ouviu um sibilo que lhe gelou o sangue. Estava com os olhos fechados e, ao sentir algo frio deslizar pela lateral de seu braço, os abriu de supetão e deixou um grito escapar de sua garganta ao se deparar com olhos vermelho sangue que pertenciam a uma cobra, que estava próxima demais de si.

Em meio ao susto e ao instinto de se afastar da cobra, Irene acabou por tropeçar e cair para fora do armário, o que a fez encontrar os olhos surpresos dos bruxos.

Estava ferrada.

 


Notas Finais


Para quem teve curiosidade de saber da música mencionada pelas meninas, aqui está o link dela: https://www.youtube.com/watch?v=ua5nTADGat4


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