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História Reação em cadeia (DG - Draco e Ginny) - St. Mungus


Escrita por: BellaBMalfoy

Notas do Autor


Oi, lindezas! Estou numa felicidade só porque a fanfic ultrapassou as 1000 visualizações! Isso significa muito pra mim e, em retribuição, está aí o capítulo 23 de presente pra vocês!
Boa leitura!
Bjos da Bella

Capítulo 23 - St. Mungus


Lucius estava no chão, sem conseguir respirar direito. Por Slytherin, ele havia se esquecido como a dor era insuportável! Cada osso do seu corpo parecia em chamas. Mas um único pensamento superou a dor. Por hora, Draco estava salvo...

Draco abriu os olhos assustado. Olhou em volta, esperando ver a sala pouco iluminada e desconhecida onde acabara de ver seu pai ser torturado. Mas viu apenas paredes brancas. Onde estou? O que significa isso? Ele se lembrou do diálogo entre o pai e Voldemort... E da tortura do pai. Por Salazar, fora tão real! Draco podia ter certeza de que acontecera realmente. Por mais absurdo que parecesse. Mas não... O mesmo pai que o levara para Voldemort torturá-lo, agora estava se deixando torturar e se arriscando daquela maneira por ele...? Não, certamente não! Era um mero sonho, um sonho sem sentido, definitivamente.

Mas... Fora tão real...

Ele resolveu se concentrar em pensamentos práticos. Analisando rapidamente sua situação, deduziu que estava em St. Mungus. Afinal, podia ter sonhado agora, mas a tortura que recebera, num lugar dolorosamente conhecido (a masmorra de sua casa), essa ele tinha certeza que fora real. Mas há quanto tempo estava ali? Quantos dias teriam se passado desde que fora torturado por Voldemort? Aliás, pensou sobressaltado, tomara que tenham se passado somente dias mesmo. 

Tentou se lembrar de alguma coisa do sonho que acabara de ter para obter alguma pista... Mas, como acontece normalmente com os sonhos, as lembranças começavam a desparecer aos poucos, só restando uma ideia geral. Além disso, achava que era melhor esquecer mesmo. Por mais real que parecesse, muito provavelmente era só um sonho, e ele detestaria fazer papel de imbecil o suficiente para torná-lo referência de realidade.

Certo, realidade. A realidade era que estava em St. Mungus e acordava agora pela primeira vez desde que fora torturado. Mas não sabia por quanto tempo permanecera inconsciente, nem quando poderia ir embora, nem onde estavam suas coisas, nem o que...

Seus pensamentos foram subitamente interrompidos pela entrada de uma mulher jovem que ele supôs, pelas roupas, ser uma medibruxa.

Ela se aproximou e se sentou perto dele devagar, como que para não assustá-lo. Provavelmente esse era o procedimento padrão para vítimas de incidentes graves como o dele.

- Boa tarde, Sr. Malfoy. Como se sente? - ela perguntou numa voz baixa e tranquilizadora.

- Eu... - ele limpou a garganta, percebendo o quão rouca sua voz em desuso soara – Estou morrendo de sede.

Foi o que ele conseguiu falar, embora tivesse mil perguntas na cabeça. Assim que abrira a boca, percebera o quanto sua garganta estava seca e ele estava sedento.

- É claro que sim. - respondeu a medibruxa, com um sorriso tão tranquilizador quanto a voz – Você está magicamente hidratado, é claro, mas sua mente sabe que não bebe água há muito tempo, e a mente muitas vezes consegue ser mais poderosa que qualquer magia. Eu vou te dar um copo d’água em breve, mas antes pode me responder algumas perguntas?

- Eu esperava que você me respondesse.

- Sim, imagino que sim. Mas há um procedimento aqui que preciso seguir. Você sabe onde está?

- Ahn… St. Mungus, imagino?

Ela assentiu, satisfeita.

- Pode me dizer o seu nome completo?

Ah, pronto.

- Draco Lucius Malfoy. - dizer o nome do pai trouxe o sonho novamente à sua mente, o que irritou Draco.

- Quantos anos você tem?

- Dezesseis. - respondeu, a impaciência crescente.

- Sabe em que ano estamos?

- 1997, agora será que você poderia…

- Quantos dedos estou mostrando?

Draco a essa altura já estava se segurando para não gritar com a medibruxa. O fato dela não ter contestado o 1997 já era um bom sinal, pelo menos ele não era um daqueles casos de coma por décadas, mas havia tanto que ele ainda queria saber!

- Sr. Malfoy? Quantos dedos?

- Quatro. - respondeu ele, quase entre dentes.

- Ok. Qual o feitiço utilizado para desarm…

- Mas que droga, expelliarmus!!

E a varinha saiu voando do bolso da medibruxa na direção de Draco, que a pegou por puro reflexo, assustado.

Um silêncio ensurdecedor se seguiu, com a mulher lançando um olhar indecifrável para Draco.

- Eu… me desculpe… eu às vezes… - ele disse, estendendo a varinha de volta para ela.

Mas, quando ela falou, foi no mesmo tom tranquilizador, enquanto embolsava a varinha:

- Não tem problema. Há quanto tempo você faz mágica sem varinha?

Então era algo comum? Draco não sabia se ficava alarmado ou aliviado.

- Ahn… não muito.

- É impressionante. Na sua idade… mas devo alertar que, uma vez que você sabe que faz isso, não devia sair gritando os nomes de feitiços desse jeito.

Draco não achou necessário dizer que não sabia que fazia isso. Poderia fazer a medibruxa achar que ele estava pior do que realmente estava.

- É, eu sei… Foi só… Você sabe, eu acabei de acordar. Ainda estou me situando. Normalmente eu tomo muito cuidado com isso.

- Claro, eu entendo. Acho que já está na hora de você beber o seu copo d´água.

A medibruxa conjurou um copo de água e o passou para Draco, que começou a bebê-lo como se não houvesse amanhã.

- Devagar, Sr. Malfoy! - ela censurou – Você vai ter um enjoo horrível se continuar nesse ritmo.

É claro que você sabia disso, Draco Malfoy, e está se comportando como um idiota. Ele passou a beber o conteúdo do copo em pequenos goles, e a medibruxa aproveitou para continuar falando:

- Me desculpe, Draco, estou aqui te fazendo milhares de perguntas e até agora não me apresentei. Eu sou a doutora Jessica Scofield. Acho que está tudo bem se eu te chamar de Draco?

Ele assentiu, ainda bebendo água devagar.

- Certo. Agora que o protocolo do hospital já foi cumprido, acho que está na hora de tirar as suas dúvidas. Não sei exatamente do que você se lembra, pois é muito comum as lembranças desaparecerem e os fatos se confundirem quando alguém fica inconsciente...

- Há quanto tempo estou inconsciente? - ele interrompeu, ansioso.

- Calma. Não faz nem uma semana, não precisa ficar afobado. - ela respondeu, tranquilizando-o novamente. Mas sua expressão ficou mais séria quando continuou a falar – Você chegou aqui muito ferido, Draco. Tem alguma ideia do que aconteceu com você?

Ele hesitou. Sabia, sim, exatamente o que tinha acontecido. Mas o quanto essa medibruxa sabia?

- Eu... Não sei se me lembro de tudo.

E então foi ela quem hesitou:

- Você sofreu os efeitos de uma maldição... muito poderosa.

Ah, então isso ela sabia.

- Sim, eu sei. Disso eu me lembro bastante bem. - ele disse, em voz baixa.

- Draco, eu não sei por quanto tempo você teve que suportar isso, mas estou realmente feliz e surpresa em vê-lo bem e conversando. Você chegou aqui num estado lamentável, gravemente ferido, sangrando e delirando. Imagino que só não estava pior por causa da poção que o professor Dumbledore te deu antes de trazê-lo.

Dumbledore! Agora Draco estava tendo mais flashes da noite na masmorra de sua casa. Voldemort o torturava, os pais gritavam (os pais? Ou só a mãe? O pai era parte do delírio?), e de repente alguém veio e o salvou. Ele sentiu suas faces esquentarem ao se lembrar que na hora achou que fosse Deus.

- Agora – continuava a medibruxa -, pode me dizer o que mais está sentindo? Vertigens? Tontura? Alguma dor?

- Só... com fome, eu acho. - Draco estava grato à Dra. Scofield pela preocupação e tudo o mais, mas começou a desejar que ela parasse de se comportar como se ele fosse ter um ataque a qualquer momento.

Ela parecia genuinamente espantada.

- Eu gostaria que todos os meus pacientes de Cruciatus se recuperassem assim... - disse, pasma. - Mas tudo bem, eu vou pedir pra vir o seu almoço. – ela consultou o relógio e sorriu – Ou seria jantar? De qualquer forma, há algo mais que eu possa fazer para você se sentir confortável?

Havia sim, mas Draco imaginou que não fosse algo que a Dra. Scofield poderia de fato providenciar. Ainda assim...

- Eu gostaria de saber... Alguém... Não sei, talvez minha mãe, esteve aqui, ou perguntou por mim?

Na verdade não era só sobre a mãe que ele queria perguntar, mas não achou seguro dizer mais que isso. A medibruxa sorriu novamente, parecendo achar graça em alguma coisa que Draco não entendeu:

- Sua mãe quase não saiu daqui, Draco. Mas justo agora ela foi comprar algo pra comer, se não me engano.

Draco começava a se irritar novamente. Se era disso que ela estava rindo, ele não achava graça nenhuma. Mas a Dra. Scofield não tinha acabado:

- Mas se estiver se sentindo realmente bem, você tem outra visita. Uma jovem que veio hoje, pela primeira vez, parecendo muito aflita em saber notícias suas, e veja só! Você escolheu justamente esse momento pra acordar!

O coração dele disparou. Não tinha como ser outra pessoa.

- Eu... Estou bem para receber visitas sim, obrigado. - disse, tentando não parecer muito ridiculamente ansioso.

- Está certo. Vou pedir pra ela entrar, então. E mandar trazer sua refeição também. Qualquer coisa que você sentir, por favor use aquele botãozinho ali para me chamar. Ele está com um feitiço Proteus adaptado e faz soar um aviso diretamente no meu relógio. Ah, já ia me esquecendo! Com alguns dias de atraso, mas… Feliz Natal! - ela disse, sorrindo.

Mas Draco estava se lixando para o Natal. A única coisa que sentia no momento era uma ansiedade quase infantil e só queria que a medibruxa saísse logo para que ele pudesse ver...

E tão logo a Dra. Scofield deixou o quarto ela entrou, contendo nos olhos um misto de aflição e avidez idêntica à dele. Ele ficou tão feliz por vê-la que por um momento esqueceu a fome, esqueceu por que estava ali, o que tinha acontecido com ele e as possíveis consequências... Apenas sorriu e abriu os braços para recebê-la.

Foi o suficiente para toda a tensão abandonar rapidamente o rosto de Ginny.

- Draco! Eu não acredito, você está acordado! - ela exclamou, radiante, enquanto corria para os braços abertos dele.

Ele riu também:

- Eu não poderia desperdiçar sua visita de tão longe, poderia? - disse, as palavras meio abafadas por estar com o rosto praticamente enterrado no cabelo dela.

Por um tempo, eles não fizeram outra coisa senão rirem, se beijarem e se abraçarem, a saudade e o alívio mútuos e evidentes.

Para Draco, era como se o mundo finalmente estivesse voltando ao normal. Ginevra era realidade, a realidade da qual ele se sentia desconectado desde que acordara de um sonho estranho para se ver em um ambiente estranho com lembranças cada vez mais dolorosas. Ela fazia desaparecer o desconforto, os anseios, os medos, as preocupações... Não interessava que fosse passageiro, que os problemas fossem voltar. Ela estava ali, nos braços dele, e isso era tudo o que importava.

Para Ginny, era algo mais do que isso. Ela vira a cena que acontecera menos de uma semana antes. Vira o quão ferido Draco tinha ficado, e Dumbledore a alertara de que era imprevisível o momento em que ele acordaria, que poderia demorar muito tempo, e a prevenira também que, mesmo quando acordasse, ele poderia estar diferente, poderia não se lembrar de uma série de coisas.

Ele não quis dar maiores explicações sobre isso, então Ginny ficou imaginando o pior cenário possível, é claro. Chegou a temer que ele talvez não se lembrasse dela, ou do que sentia por ela e de tudo que viveram juntos até ali. Mas aquele Draco era exatamente o mesmo que ela se lembrava! Com exceção de um pequeno aumento na palidez habitual, ele não estava diferente em nada. Ela fora abraçá-lo um pouco contida, imaginando que talvez ele estivesse fraco, mas ele a envolvera nos braços com tanta força que Ginny percebeu imediatamente que não precisava se conter. A própria frase que ele dissera, “não poderia desperdiçar sua visita de tão longe”, mostrava que ele estava perfeitamente consciente de onde estava, assim como de onde ela deveria estar, e que tivera que percorrer uma certa distância para vê-lo.

Ela ficou olhando para ele, num certo êxtase, sem dizer nada, por tempo suficiente para ele erguer as sobrancelhas do modo torto usual e perguntar:

- Eu por acaso fiquei mais bonito nesses dias no hospital?

Mas Ginny estava maravilhada demais com o que estava vendo para entrar no jogo de humor sarcástico habitual do namorado:

- É só que... Você está bem! Digo, realmente bem! Eu não consigo acreditar no quão bem você parece!

Ela repetiu tantas vezes isso que incomodou Draco:

- Eu gostaria de saber por que todo mundo fica reagindo assim ao me ver.

- Todo mundo? - Ginny perguntou intrigada – Quantas visitas você já recebeu?

Uma enfermeira entrou com a refeição de Draco antes que ele pudesse responder. Foi aí que ele tornou a se lembrar do quanto estava faminto.

- Oi, Draco! Feliz Natal pra você! A Dra. Scofield acabou de nos contar que você acordou! Nem imagina o quanto ficamos felizes em saber!

Draco não respondeu, um pouco surpreso com a efusividade da enfermeira e vagamente curioso para saber quem eram “nós”. Quantas pessoas naquele hospital sabiam do caso dele? Ela continuou falando, enquanto dispunha a bandeja de uma forma confortável para Draco comer.

- Eu sei que a comida aqui não é do nível de Hogwarts, mas tomara que você goste, querido. Jessica nos disse que você estava faminto e eu vim o mais rápido que pude.

Draco se perguntou vagamente se a mulher sabia com quem estava falando, e, caso soubesse, se sugeriria que a comida de Hogwarts era a melhor referência que ele tinha. Mas se em outras épocas isso o irritaria, agora ele não sentia nada além de alívio por ela tratá-lo apenas como um aluno como outro qualquer, e não como o filho rico de um Comensal da Morte fugitivo. Aliás, agora que pensara nisso, a Dra. Scofield, que sabia perfeitamente quem ele era, não manifestara qualquer reação a esse respeito. Ele não poderia se sentir mais grato.

- O cheiro é bom. Tenho certeza que está ótimo. - foi o que ele conseguiu responder.

Ela sorriu como se tivesse recebido o maior elogio do mundo e saiu, deixando Draco e Ginny sozinhos de novo.

- Então, – ele continuou a conversa, com a maior dignidade que conseguiu reunir falando entre uma garfada e outra – quanto a visitas, eu estava falando mesmo da medibruxa, a Dra. Scofield. Como você deve ter percebido pela fala dessa senhora simpática que trouxe a minha refeição, eu acabei de acordar.

- Pois é, e essa Dra. Scofield não comentou nada! Eu nem sabia que você estava acordado, na verdade. Agora eu entendi a carinha marota que ela fez quando disse que eu podia entrar.

- Você foi apenas a segunda pessoa que eu vi depois dela, e ela também ficava me olhando com essa cara de quem viu um fantasma.

- Draco.... - Ginny hesitou, incerta do que dizer – Você se lembra do que aconteceu com você?

- Ela também perguntou isso. Sim, eu lembro.

- De tudo?

- Não é uma lembrança exatamente feliz, e exatamente por isso bem difícil de esquecer.

- Eu estou falando isso porque... porque eu vi.

Ele olhou para ela sem entender.

- Você viu... o quê?

- Tudo. Com clareza de detalhes. Desde que Voldemort começou a usar a maldição contra você, até o momento em que Dumbledore chegou para te salvar.

- Como assim?

- O feitiço que nós fizemos, Draco. É assim que ele funciona.

Draco de fato tinha se esquecido do feitiço, mas, ainda assim, alguma coisa não combinava:

- Mas eu achei… ele deveria avisar a um de nós se o outro estivesse em perigo! E proporcionar uma maneira de tomar alguma providência, claro, senão não adiantaria nada. Mostrar o que está acontecendo, mostrar onde… Estou me lembrando aqui, aquele episódio do colar amaldiçoado… você viu, não viu?

- Vi. Mas não com essa clareza toda. Eu vi uns flashes na minha cabeça. Você estava no seu Salão Comunal, ia abrir um pacote, e eu sabia que você não devia abrir, que alguma coisa horrível aconteceria se você abrisse. Eu fiquei desesperada, tentei correr pra lá pra te avisar, e de repente a sensação de perigo passou. Eu não vi como. Eu não vi que foi o Dobby que chegou. Só… passou. Foi aí que eu comecei a escutar toda a confusão no corredor, cheguei lá e vi a Katie no chão, e todo mundo acusando você.

- Então. Isso coincide com o que eu li sobre o feitiço. Mas ver o que aconteceu comigo com clareza de detalhes já está em outro patamar.

- É. E não foi só isso. Eu não só vi. Eu também senti. - ela estremeceu.

- O quê?? - agora ele estava horrorizado – Não! Você não pode estar querendo me dizer que sentiu a dor...

- Não! Não chegou a esse ponto. Eu estava dormindo, e então acordei de repente com uma dor terrível no peito, e a cena começou a aparecer na minha cabeça... Eu sabia que estava na minha cama, mas eu não estava sonhando. Eu vi Voldemort com a varinha apontada pra você, vi você gritar… Foi horrível. Parecia que não ia acabar nunca, eu pensei que ele fosse matar você. E aí eu meio que... enlouqueci. Não conseguia parar de gritar. Acho que acordei a Grifinória inteira. - ela acrescentou, com um riso sem graça.

- Nossa, eu não sabia. - murmurou ele. - Não tinha ideia que poderia funcionar assim.

- E então, quando eu já nem sabia mais quem eu era, o que era realidade ou coisa da minha cabeça, Dumbledore chegou. Acho que foi a Hermione quem foi buscá-lo, pois eu me lembro de ter falado com ela. E ele disse para eu olhar pra ele, e assim ele poderia saber aonde você estava... E eu olhei, e ele fez um feitiço que não tenho ideia de qual foi, mas com certeza funcionou, porque ele saiu praticamente voando do meu quarto. E algum tempo depois tudo acabou. A dor passou, a visão se apagou, e eu soube... que você estava bem.

Draco ficou em silêncio por alguns instantes, refletindo sobre as palavras de Ginevra. A primeira coisa que sentiu foi incômodo. A forma como ela relatou ter visto o que aconteceu com ele fazia-o se lembrar da sensação que teve com o sonho do qual acabara de acordar. Claro, havia uma diferença clara: ela estava consciente de estar acordada na própria cama, enquanto ele tinha a sensação de estar na sala com o pai e Voldemort, e de repente estava na cama do hospital. Mas de resto, a clareza da cena, a sensação de ela estar realmente acontecendo...

Não. Ele não queria pensar nisso agora. Seu cérebro deu uma guinada e foi se concentrar em outro tópico: ele até então não tinha tido tempo para se perguntar como raios Dumbledore conseguira saber o que estava acontecendo e onde ele estava para chegar lá e salvá-lo. Mas essa era uma dúvida que certamente surgiria se Ginevra não tivesse dado a resposta antes: ela possibilitara que ele fosse salvo. Se ela não tivesse visto a cena toda, será que Dumbledore teria ideia de que havia algo acontecendo? Talvez no dia seguinte, se notasse o sumiço de Draco, mas certamente não na mesma hora. E ainda que Voldemort não o matasse naquela noite, quanto tempo levaria até ele ser encontrado, se é que seria?

E era engraçado o quão confortável Draco se sentia sabendo disso. Ele nunca gostara de depender de ninguém pra nada, e a ideia de dever seu resgate, talvez até sua vida, a outra pessoa, o horrorizaria em qualquer outra situação... se não fosse Ginevra. Porque com ela tudo parecia extremamente natural. Ela proporcionara tantas mudanças positivas na vida dele que se tornara uma parte fundamental dela, já gerando uma dívida para ele simplesmente por estar ali. Só o que havia acontecido agora era que essa dívida tinha aumentado um pouquinho mais.

- Bom, agora é minha vez de perguntar: eu fiquei mais bonita pelo tempo que a gente passou sem se ver? - Ginny perguntou, com um sorrisinho no rosto.

Só então Draco se tocou que devia estar olhando para ela com cara de bobo enquanto refletia. E novamente não se incomodou.

- É só que... Então quem me salvou foi você.

Ela ficou estranhamente tímida ao ouvir isso:

- Draco... Eu não teria condições de fazer nada se não fosse Dumbledore. Eu só sabia gritar e chorar. Não conseguia pensar. Me sinto uma idiota por isso agora. Não sei o que aconteceu comigo, mas eu não conseguia respirar direito, nem falar, nem andar. Eu me arrastava no chão, eu queria te ajudar, mas não conseguia...

- Quer parar com essa síndrome de Potter? - ele interrompeu, um pouco irritado – Você não tinha ideia de que isso poderia acontecer. É acordada no meio da noite com uma visão de pesadelo recheada com dores no peito, acabou de me dizer que não conseguia andar, falar, respirar, e queria ter feito o quê?

E antes que ela pudesse continuar com a ladainha de automartírio, ele emendou com uma pergunta:

- O que eu não entendi é como Dumbledore sabia o que fazer. Quero dizer, você entendeu que estava tendo aquela visão por causa do feitiço, mas e ele, como entendeu tão rápido, se você não conseguia nem falar pra explicar a ele o que estava acontecendo?

- Draco, nós é que somos ingênuos por acharmos que conseguimos esconder alguma coisa do Dumbledore. Ele já sabia do feitiço há muito tempo. Disse que deixa vestígios.

- Mas eu limpei...

- Não é desse tipo de vestígio que ele estava falando. Vestígio de magia, que não pode ser escondido mesmo que todas as evidências físicas sejam recolhidas.

Draco ergueu as sobrancelhas:

- Eu sei que agora foi útil e tudo o mais, mas se ele já sabia antes, como não disse nada nem censurou a gente?

- Ele não pareceu achar que era um problema. - disse Ginny, dando de ombros.

Draco ficou em silêncio outra vez. Era hora de admitir que estava gostando cada vez mais de Dumbledore.

- Problemas estou tendo eu pra fazer algumas pessoas entenderem que o que aconteceu não é da conta delas. – disse ela, mudando subitamente de assunto, irritação tomando conta de sua voz.

- Deixe eu adivinhar. Potter?

- E meu irmão. E as meninas do meu dormitório. Que droga, se ao menos eu tivesse conseguido não gritar…

- Ah, começou.

- Não, porque se você for pensar bem, é uma coisa bizarra mesmo, né? Imagina uma garota berrando tão alto no meio da madrugada que acordou meia casa. Você não ia ficar curioso?

- Não. Ia ficar irritado se ela tivesse me acordado.

Ginny meramente estreitou os olhos para ele e fez uma careta.

- Bem, - continuou ela, mais séria – mas nem todo mundo que veio me procurar se enquadra nesse perfil de curiosos inconvenientes.

- Blaise? - adivinhou ele novamente, também sério.

- É. Aparentemente ele tentou apertar a Hermione mas ela não disse muita coisa pra ele, até porque ela não sabe muita coisa. Inclusive estou até estranhando ela não ser uma dessas pessoas que veio me perguntar… mas enfim, isso não importa agora. Ele estava bem aflito.

- O que você disse pra ele?

- Quase tudo, exceto a parte de eu ter visto o que aconteceu por meio da corrente.

- Mas não é essa a parte que mais está te dando dor de cabeça? Como você justificou pra ele o fato de saber o que tinha acontecido comigo?

- A Hermione não ter dito praticamente nada pra ele me ajudou muito nisso. Se ela tivesse dito que eu acordei gritando, por exemplo, seria mais difícil. Mas como ela só contou que eu sabia o que tinha acontecido, eu disse que a gente tinha combinado de se encontrar no meio da noite e você não apareceu. E que tem um meio que a gente utiliza pra se comunicar, que eu tentei acionar, e você não respondeu. Como eu fiz parecer que eram essas coisas secretas de namorados, ele não perguntou que meio era esse nem nada. Então, quando eu não conseguia contato com você de jeito nenhum, eu senti que tinha alguma coisa errada, e fui direto procurar o professor Dumbledore. Sobre como ele conseguiu saber onde você estava e te salvar, bem, eu pude fingir que também não sabia. Mas que achava que ele tinha tido ajuda do professor Snape.

Draco ergueu uma sobrancelha, surpreso.

- Colocando um crédito na conta do velho Snape, Ginevra? Por essa eu não esperava.

- Ele fez por merecer. - disse Ginny, com um sorrisinho de quem sabia que Draco não entenderia o que ela queria dizer.

- Bom. - disse ele, sem saber o que mais responder – E você conseguiu deixar o Blaise tranquilo? Ele às vezes leva tão a sério essa história de ser o meu único amigo que fica meio protetor demais...

- Acho que “tranquilo” é pedir muito pra alguém que acabou de saber que o melhor amigo está hospitalizado depois de ter sido torturado pelo Voldemort. Mas acho que eu consegui convencê-lo de que a situação estava sob controle, pelo menos. Eu até perguntei se ele queria vir hoje, mas ele pareceu achar que iria atrapalhar alguma coisa.

Os dois ficaram em silêncio por alguns instantes, para depois falarem ao mesmo tempo:

- Não que eu não possa dar notícias suas a ele...

- É, eu posso encontrá-lo em Hogwarts…

Eles riram, mas Draco logo ficou sério novamente. Havia elementos na história que ele não tinha compreendido totalmente.

- Eu só não entendi como foi que meu pai conseguiu entrar lá. Dumbledore não devia ter tomado medidas para…

- Ele é um animago, Draco.

- O quê?? - fez ele, genuinamente espantado. - Como assim?? Desde quando?

- Isso nós não sabemos. Dumbledore deduziu e o professor Snape confirmou… mas só depois que tudo já tinha acontecido. Uma coruja. Fácil de voar por Hogwarts sem despertar suspeitas.

- Eu nunca teria imaginado... - disse Draco, ainda surpreso – Quando eu estava no Salão Comunal, achei mesmo que tinha ouvido um som qualquer, mas não dei muita importância. Agora sei que deviam ser asas de coruja… De qualquer forma, mesmo quando ele apareceu na minha frente e disse olá, eu não fiz nada. Não tentei me proteger, não imaginei o que ele ia fazer.

- Ele fez isso mesmo ou é modo de falar? Disse olá?

- Disse exatamente isso. “Olá, filho”. E eu fiquei olhando pra ele sem dizer nada, sem entender como ele tinha chegado ali, e quando ele ergueu a varinha, já era tarde demais. Acordei já na masmorra da minha casa. Que eu não tinha dúvidas que meu pai ofereceria a mansão como quartel-general pro Voldemort quando fosse necessário, aliás. É uma casa bem... preparada, sabe?

- Eu não entendo… - interrompeu Ginny, com uma expressão que mesclava arrependimento e aflição - Por que eu não acordei?

- Como assim?

- A corrente deve ter tentado me avisar do perigo desde o momento que seu pai apareceu em Hogwarts. Por que eu não acordei?

Draco, mais uma vez, se impacientou:

- Pare de procurar uma forma de levar a culpa pelo que aconteceu comigo, Ginevra. Você possibilitou ao Dumbledore ir me salvar, então…

- Eu podia ter evitado o que aconteceu! Sabe-se lá quanto tempo você passou desacordado naquela masmorra, e esse tempo todo eu estava dormindo e eu podia ter…

- Exatamente, você estava dormindo! Como você podia ter feito alguma coisa dormindo?

- Eu devia ter acordado!! - explodiu ela - Esse feitiço supostamente era pra gente poder fazer alguma coisa, e não ficar dormindo enquanto o outro é sequestrado pelo próprio pai!

- Esse feitiço, pra começo de conversa, era pra eu te proteger, e não o contrário. E eu não li nada sobre o que acontece quando a pessoa está dormindo. - e quando ela fez menção de interrompê-lo mais uma vez, ele levantou a mão para impedi-la, cansado - Ginevra, isso não vai levar a lugar nenhum. Já acabou, já aconteceu. Eu estou aqui agora. E eu estou bem.

Ginny mordeu o lábio para não dizer mais nada. Não estava absolutamente convencida. Percebendo a hesitação dela, Draco aproveitou para continuar falando e ver se conseguia desviar a atenção da namorada da culpa sem sentido que ela resolvera atribuir a si mesma:

- Mas enfim, eu estava muito irritado quando acordei, muito mesmo. Por não ter me preparado, por não ter nem pensado em tentar me defender do meu pai. Por imaginar…. - ele hesitou. Havia coisas que preferia não dividir nem com Ginevra. Mudou o rumo da frase: - Imagino que nem ele deve ter achado que seria tão fácil me levar pra lá. E ele começou a me provocar, eu provoquei de volta e ficamos nesse joguinho até que Voldemort apareceu. E começou a provocar também, eu queria me controlar, mas espatifava os candelabros sem querer na minha raiva, e aí mais eles debochavam... Aí acho que talvez eu tenha passado dos limites. - disse ele, com um olhar que dizia a Ginny que ela não ia gostar do que viria em seguida.

- Você. Espatifava. Candelabros. - disse ela, empacando nessa parte.

- É.

- Aqueles, tipo, de ferro.

- É, Ginevra!

Ela ficou olhando pra ele, aparentemente sem saber o que responder.

- Não é como se eu quisesse fazer isso, ok? Simplesmente acontecia!

Ginny respirou fundo, fechou os olhos e abriu de novo para tomar coragem de perguntar:

- Certo. Sobre talvez ter passado dos limites. O que você fez?

- Eu estava furioso e queria fazer os dois pararem de debochar da minha cara... Aí disse pro Voldemort que ele não passava de um tirano como muitos trouxas de que eu já tinha ouvido falar, e que ele ia cair como todos eles. - completou Draco, esperando o impacto das palavras.

- Você o quê?? Draco, você... Eu não acredito! - Ginny disse, tentando parecer furiosa e repreendê-lo, mas não conseguindo conter o assomo de orgulho e prazer que teve ao ouvir o que Draco tinha dito para Voldemort.

- É, eu sei que foi estúpido. Eu não sou Potter nem nada pra sair confrontando gente mais forte do que eu estando em desvantagem, mas na hora eu simplesmente não consegui me controlar. E foi aí que começou... E eu me arrependi imediatamente do que eu tinha dito. Eu nunca, nunca tinha passado por nada nem parecido com isso antes. Eu achei que fosse morrer. Eu queria morrer, na verdade. - ele completou, num tom de voz cada vez mais baixo.

- Draco... Eu não sei quanto tempo exatamente isso durou. Mas pra mim pareceu uma eternidade. E eu sei o efeito que a Cruciatus causa nas pessoas. Já ouvi falar que dependendo da força que é colocada, do ódio e da perícia do executor com a maldição, em cerca de minutos pode acontecer... Enfim, de elas realmente enlouquecerem, sabe... - ela engoliu em seco - Tem uma ala aqui no St. Mungus para danos causados por magia, e ela está cheia de vítimas do passado de Voldemort e seus Comensais. Eu fiquei com tanto medo... Porque meu pai já contou histórias horríveis sobre o que aconteceu com pessoas torturadas pelo próprio Voldemort... Mesmo Dumbledore dizendo que a sua mente tinha resistido muito bem, eu estava com medo do que eu ia encontrar quando te visse aqui.

Draco se lembrou que na fatídica noite ele também tivera sérias dúvidas de como ainda estava vivo, lúcido e consciente. Sabia que no início resistira por orgulho, querendo provar ao pai que ele estava errado... Mas veio a sua mente com repentina clareza que, num momento crucial entre a sanidade e a loucura, outra coisa tinha sido responsável por uma leva adicional de força que ele, em circunstâncias diferentes, não teria.

- Você sabe... Essa parte pode ter sido um pouquinho culpa sua também. - ele disse, com um meio sorriso, já prevendo que Ginny não fosse entender o significado das palavras.

- Culpa minha... o quê? - disse ela, confusa.

- De eu ter aguentado tanto. Teve uma hora em que tudo ficou tão insuportável que eu estava decidido a fazer o que ele estava me pedindo, o que quer que fosse. Foi quando eu encontrei a corrente no meu pescoço... E aí apareceu uma força que não existia, que não estava lá antes. E não estou falando uma coisa poética e piegas, estou falando literalmente. Parecia que eu tinha tomado uma poção revigorante. Foi... inacreditável.

Ginny não sabia dizer o que era maior: a surpresa de ouvir Draco dizendo algo assim ou a felicidade que fazia subir um rubor pelo pescoço e face dela ao perceber-se de alguma forma responsável pela resistência extraordinária que ele tinha demonstrado na noite em que foi torturado. E ele ainda não tinha terminado:

- Isso significa que você acabou me salvando duas vezes naquela noite. Então eu só... Obrigado, amor.

Ao ouvir isso, ela sentiu uma queimação subindo por seu rosto (já familiar devido ao seu estado emocional nos últimos dias), ameaçando transformar-se em borbotões de lágrimas. Não queria se preocupar em saber por que exatamente Draco havia decidido chamá-la dessa forma pela primeira vez. Podia ser só efeito da convalescença, talvez ele ainda não estivesse pensando direito, afinal tinha acabado de acordar. Mas ela tinha certeza que o amava há tanto tempo que naquele momento só quis pensar que era recíproco, que ele também a amava e nada estava errado no mundo.

Jogou-se nos braços dele novamente e o beijou com uma avidez certamente inapropriada para um leito de hospital. E ele, longe de se importar, retribuiu com a mesma paixão.

Teriam ficado dessa forma indefinidamente se não tivessem sido subitamente interrompidos por alguém limpando discretamente a garganta.

Os dois se separaram e coraram violentamente ao dar de cara com Dumbledore olhando para eles. Mas o diretor não aparentava estar bravo ou mesmo constrangido pela cena que acabara de presenciar. Pelo contrário, parecia estar se divertindo.

- Eu detesto interromper uma cena tão bonita, mas...

- Desculpe, professor Dumbledore. - disseram os dois, baixinho, sem conseguir encarar o diretor.

- Vocês não precisam pedir desculpa. Precisariam se estivessem duelando ou algo do tipo, mas estavam apenas demonstrando o que sentem um pelo outro, e parece ser bastante bom. - ele disse, com sua tradicional piscadela bondosa. - Mas sua mãe está vindo, Draco, e eu imagino que talvez você prefira estar sozinho quando ela chegar.

- Claro! - foi Ginny quem falou, ainda constrangida e querendo gerar qualquer assunto que fugisse da cena que o diretor acabara de ver – Claro que sim, diretor. Nós podemos ir embora agora.

Ela se virou para Draco e, sem coragem de voltar a tocá-lo com Dumbledore por perto, deu um pequeno aceno e disse da forma mais carinhosa que conseguiu:

- Até Hogwarts.

- Até breve. - ele respondeu, com o sorriso torto que ela amava. Ela sorriu de volta e saiu do quarto, sem esperar que Dumbledore a seguisse.

- Até breve, então, Draco.- despediu-se também o diretor.

- Professor, muito obrigado pelo que o senhor fez. Eu nem sei onde ou como estaria agora se o senhor não tivesse aparecido lá.

Dumbledore sorriu ainda mais, menos pelas palavras em si do que pela gratidão calorosa e verdadeira que vira no rosto do aluno:

- Aceito seus agradecimentos, Draco. Mas sabe, eu não fui o único que salvou você.

- Eu sei. - disse Draco, tocando a corrente em seu pescoço.

- Tampouco somente eu e Ginny. Foram três partes de uma bela parceria que permitiram que você estivesse tão bem agora.

Draco olhou para o diretor, previsivelmente confuso. Mas Dumbledore, como fazia com alguma frequência, não explicou o que queria dizer. Apenas sorriu mais uma vez para Draco e saiu do quarto para alcançar Ginny.

Mas o garoto sequer teve muito tempo para tentar decifrar mais esse enigma de Dumbledore, porque a enfermeira falante que trouxera a refeição dele voltou para recolher a bandeja, tagarelando sobre como era bom ele ter comido tudo, que iria se recuperar bem mais rápido desse jeito e provavelmente estaria de volta a Hogwarts muito antes do esperado.

Mal a mulher havia saído, Narcissa entrou no quarto.

A expressão no rosto dela poderia ser indecifrável para qualquer um que não a conhecesse bem. Mas para Draco o desespero nos olhos da mãe era tão claro que ele teve vontade de levantar e consolá-la.

Ela andou a passos rápidos até a cama de Draco e, a princípio, não fez nada a não ser apertar a mão dele com uma das mãos e passar a outra pelo rosto do filho, como que se certificando de que ele estava mesmo ali e nada estava fora do lugar.

- Não se preocupe, mãe. - ele quebrou o silêncio, tentando tranquilizá-la – Eu vou ficar bem.

Narcissa deu um risinho que poderia ser confundido com um choro.

- Esse deveria ser o meu papel, não? Eu é que deveria consolar você, dizer que passou, que vai ficar tudo bem. Mas meu filho... meu filho...

Lágrimas pareciam poder saltar a qualquer momento dos olhos brilhantes de Narcissa, enquanto ela continuava a acariciar o rosto do filho.

- Eu sei, mãe. - ele respondeu simplesmente, sério.

Sabia por que era impossível para a mãe tentar consolá-lo agora. Draco tinha certeza que o que ela tinha sido obrigada a presenciar na masmorra seria uma cena traumatizante para qualquer um, mas não tinha palavras para tentar descrever como ela devia ter se sentido ao ver o próprio filho ser o protagonista daquelas imagens horríveis.

- Eu sinto tanto, Draco, tanto... se eu soubesse, se eu pudesse...

- Mãe, por favor. Nem comece esse discurso de culpa.

- Mas é culpa minha! - ela respondeu, exaltada. - Você não entende, você não sabe...

- O que eu não sei? - perguntou Draco, agora intrigado.

- Foi minha culpa ele ter se interessado por você. Eu não devia ter dito nada.

Draco estava alarmado. De repente, sabia do que a mãe estava falando. Mas ele estava tão certo de que ela não tinha nada a ver com isso!

- O que... o que você disse a ele? - perguntou, ainda contido. Ele tinha certeza que a mãe iria se esquivar da pergunta, ou, pelo menos, editar ao responder, mas se surpreendeu com a urgência na resposta dela:

- Ouça, Draco. Há algumas semanas, eu conversei com Dumbledore a seu respeito. E ele me disse uma série de coisas que, na hora, eu achei tão absurdas que fui imperdoavelmente descuidada quando o Lord das Trevas me questionou a respeito.

Draco já tinha uma série de perguntas na cabeça somente de ouvir essas duas frases, mas achou melhor não interromper, visto que o relato da mãe parecia estar só começando.

- Ele me falou que você parecia estar desenvolvendo habilidades especiais. Me deu exemplos de coisas que aconteceram na escola, em que a sua participação comprovava essa suspeita. E ainda me perguntou se eu tinha feito algum feitiço nesse sentido. E eu... eu não dei a atenção devida, e na verdade fiquei irritada porque a maioria das coisas que ele disse não me pareceu tão sobrenatural assim. Nada que não pudesse significar uma evolução natural sua, e achei que ele estava te subestimando ao pensar que eram obra de algum feitiço. Exceto por um estranho episódio envolvendo um raio no campo de quadribol. - ela olhou para Draco desconfiada ao dizer isso, mas escolheu não questionar o filho imediatamente. - E então, quando o Lord das Trevas me perguntou sobre a minha conversa com Dumbledore, eu contei para ele a maior parte. Mas eu nunca, nunca poderia imaginar que o resultado final seria.....

E ela se calou novamente, as lembranças da noite na masmorra claramente aflorando de forma dolorosa.

- Mãe... - disse Draco, incerto – Você talvez não saiba como a coisa toda começou, mas, na verdade, se alguém tem alguma culpa do que aconteceu, além do Vol... além dele, é o meu pai. Foi ele quem me tirou de Hogwarts e me levou até o Lord das Trevas. - completou, não conseguindo disfarçar a raiva na voz.

Mas se ele esperava a mesma raiva por parte de Narcissa, ou, pelo menos, alguma surpresa com essa revelação, se decepcionou. O que viu no rosto da mãe foi um cansaço muito grande.

- Draco... de uns tempos pra cá você está sempre pronto pra pensar o pior do seu pai em qualquer circunstância. Nunca te ocorre que talvez a culpa não seja dele, não é?

Draco se irritou ainda mais:

- E você sempre pronta pra defendê-lo. Eu posso ter caído nessa quando era criança, mãe, mas não mais. E também não me interessa se ele só estava cumprindo ordens, eu já estou cansado de...

- Mas nem é disso que eu estou falando! - interrompeu Narcissa – Você não sabe o que aconteceu antes do seu pai te levar de Hogwarts, Draco, mas eu sei. O Lord das Trevas não queria sequer tentar conversar com você. Quando ouviu meu relato, e percebeu que Dumbledore parecia estar preocupado e protegendo você, simplesmente decidiu que você era uma ameaça e pronto. Foi seu pai quem o convenceu de que valia a pena tentar trazer você para o lado dele em vez de matá-lo imediatamente.

E então Draco se lembrou do sonho do qual havia despertado poucos minutos antes, e que a visita de Ginevra tinha momentaneamente varrido da cabeça dele. As lembranças eram vagas, mas tinha algo a ver com uma conversa entre Lucius e Voldemort... da qual ele não lembrava exatamente o teor, mas terminava com o pai se deixando torturar pelo mestre para protegê-lo. Tampouco o motivo disso estava claro, mas o momento da tortura de Lucius... esse sim voltara em imagens vívidas para a mente de Draco.

- Mãe... - ele hesitou, não querendo correr o risco de cair em algum tipo de armadilha – Quando eu estava... bem, naquela noite, houve um momento em que eu tive a impressão de que não era só você que estava gritando. Achei que tinha escutado a voz do meu pai...

- Mas é claro que escutou, filho. O que você acha que ele sentiu quando viu aquela cena horrível? Quando viu como terminou o plano que ele estava tão confiante que daria certo?

Ao ouvir isso, Draco perdeu a paciência. Agora a mãe tentaria convencê-lo de que tudo era um grande mal entendido, uma ideia de Lucius que não saíra conforme o planejado. Mal entendido?? Por todas as bruxas e bruxos das trevas, ele fora torturado! Podia ter morrido naquela masmorra, e agora ela diria que tudo podia ser resolvido com uma xícara de chá?

- Ah mãe, por favor! Eu sei que você quer manter a família unida e tudo o mais, mas tem coisa que não dá, simplesmente não dá!

- Draco…

- Não, mãe, me escuta! Você não estava lá, tá bom? No início, você não estava lá!! Você não viu a cara dele me ironizando, você não viu ele me provocando e dizendo que eu sou mimado, e mais!, - e ele precisou altear a voz para continuar porque Narcissa queria interrompê-lo – colocando a culpa em você, dizendo que puxei o lado errado da família! Você só chegou na hora que talvez ele estivesse meio arrependido porque o Lord dele exagerou, mas no início ele estava se divertindo e fazendo hora com a minha cara sim!

Narcissa pareceu estranhamente triste ao ouvir o relato de Draco.

- Sabe, essa parte do lado errado da família, talvez ele nem estivesse falando de mim… mas enfim, isso não vem ao caso. Você tem razão, Draco, eu não estava lá. Mas eu conheço seu pai há 25 anos. Isso quer dizer que eu sei uma coisinha ou outra a mais que você. E eu não sou nenhuma adolescente apaixonada nem dona de casa estúpida que defende o marido a qualquer custo. Sei muito bem quando ele erra, e normalmente sou a primeira a dizer isso pra ele. Antes dele ser preso, quando estava te pressionando pra se juntar aos Comensais, eu estava sempre brigando com ele, dizendo que essa era a pior forma de lidar com você, dizendo que ele deveria gastar mais tempo te mostrando as vantagens e menos te deixando com antipatia. Infelizmente, foi necessária uma temporada de quase um ano em Azkaban pra ele entender isso. Mas ele entendeu, meu filho. Você não conhece Azkaban, e espero que nunca precise conhecer. Mas esse lugar muda uma pessoa. Para o bem ou para o mal. Seu pai mudou. Tudo o que ele teve lá foi tempo, e felizmente usou esse tempo para refletir sobre os erros dele e pensar no que poderia fazer de diferente agora. Então eu não estou falando bobagem quando digo que ele tinha um plano.

Narcissa era uma das poucas pessoas que conseguia produzir esse efeito em Draco: mesmo quando achava que determinada questão estava resolvida em sua cabeça, ela conseguia fazer suscitarem dúvidas nele. De fato (e era a segunda vez que sua mente fazia o favor de lembrá-lo disso) ele nunca tinha parado pra pensar no tempo que seu pai tinha passado em Azkaban. Não tinha sequer se preocupado. Tentando afastar o pequeno incômodo que começava a brotar nele com esse pensamento insistente (seria culpa?), refletiu um pouco. Sabia dos horrores de Azkaban e as consequências que acarretavam a quem ficava preso lá. Mas sempre fora completamente descrente da capacidade recuperativa do sistema prisional. Seria possível que alguém de fato saísse melhor do que entrou?

Além disso, havia um segundo fator que ele não conseguia deixar de considerar: será que Ginevra não havia acordado porque, até o momento em que ele provocara a ira de Voldemort, a corrente simplesmente não tinha feito nenhuma manifestação? Será que, nos momentos em que esteve somente com seu pai, ele jamais estivera em perigo?

- Supondo que isso seja verdade… que plano seria esse? - ele perguntou, mantendo a expressão cuidadosamente neutra.

Quando Narcissa voltou a falar, foi novamente no tom baixo e urgente que utilizou no início da conversa:

- Draco, você é inteligente e perceptivo, sempre foi. Você certamente percebeu a natureza estranha desses incidentes envolvendo você, e que conversei com Dumbledore. Tem algo sombrio acontecendo em Hogwarts, algo que tem você no centro. E o Lord está de olho.

Draco percebeu que ela media as palavras, e que havia medo em seu olhar. Não era difícil adivinhar o motivo. Provavelmente havia o risco (ou seria certeza?) dela ter que prestar contas dessa conversa para Voldemort mais tarde, portanto ela precisava ser extremamente cuidadosa com o que iria dizer. Isso fazia Draco ferver de ódio. Como diabos ele poderia se tornar um dos comensais desse homem? Nem conversar com o próprio filho com liberdade sua mãe podia por causa dele.

- Draco, você está prestando atenção? - repreendeu-o Narcissa. - Isso é importante.

- Desculpe, mãe. O Lord está de olho. O que mais?

Ela estreitou os olhos para ele (numa expressão extremamente parecida com a que ele mesmo fazia frequentemente) em censura.

- O plano do seu pai era deixar que o Lord das Trevas te convencesse sem a interferência dele. Obviamente não da forma como aconteceu. - ela novamente estremeceu com as lembranças – Ninguém poderia prever que você diria aquelas coisas pra ele e que ele reagiria daquela forma desproporcional. Mas a ideia do seu pai era levar você e sair do caminho para que o Lord te convencesse. Não estou dizendo que foi um bom plano, e que não foi um pouco ingênuo da parte dele, conhecendo a natureza do Lord das Trevas, não imaginar que poderia acabar assim. Mas a única coisa que ele pretendia era fazer o oposto do que tinha feito até então. Entenda, meu filho… seu pai mudou. - ela repetiu – Mas ele sabe que gastaria tempo demais pra te convencer disso. E nós não temos tempo. Você ouviu, Draco? Nós não temos tempo.

Ela disse essa última frase com uma urgência tão grande que assustou Draco. Ele abriu a boca pra dizer alguma coisa, mas antes que pudesse falar, um homem desconhecido, de pele azeitonada e cabelos lisos muito escuros, entrou no quarto com um vaso de flores e algo que parecia um cartão de Natal.

- Com licença. Posso entrar? - perguntou ele, sorrindo.

Draco não tinha a menor ideia de quem era o homem, mas a mudança brusca na expressão da mãe ao vê-lo o fez ter uma antipatia imediata por ele, e responder num impulso:

- Não, não pode. Eu nem sei quem você é. - a voz saiu gélida.

- Draco! - repreendeu-o a mãe, com um sorriso que não era dela – Onde está sua educação?

- Não, Narcissa, ele está certo! Imagine, o menino acaba de acordar, está se recuperando de um trauma horrível, recebendo a primeira visita da mãe, que de repente é interrompida por um completo desconhecido!

Draco detestava cada vez mais o homem. Tudo nele parecia passar uma mensagem clara e desagradável. Sabia que ele tinha acabado de acordar, sabia que era a primeira visita da mãe, e ainda tinha a forma como ele falara em “trauma horrível”. Era como se estivesse escrito na testa dele o que Narcissa tinha dito há pouco: o Lord está de olho.

- Me desculpe, Draco. - disse o desconhecido desagradável, depositando as flores tão desagradáveis quanto ele na mesinha ao lado da cama de Draco – Meu nome é Alexander Makulis.

Makulis… Draco conhecia aquele nome. Era de uma importante família de bruxos puro-sangue da Grécia, riquíssimos, que apoiavam a causa de Voldemort, inclusive financeiramente, porém nenhum deles jamais havia sido Comensal da Morte. Eram muito espertos para isso.

- Você está com uma aparência excelente. - continuou Makulis – Quem olhasse pra você sem saber do que aconteceu jamais poderia imaginar.

- Mas aconteceu, não é mesmo? - respondeu Draco, nem um pouco disposto a ser simpático com o homem.

Alexander Makulis, por sua vez, não parecia incomodado pelo tom grosseiro do garoto. Continuou sorrindo, quase condescendente, e meramente olhou para Narcissa.

- Bem.. nós estamos… você sabe, precisamos fazer uma mudança temporária… - ela disse, num tom descontraído que soava horrivelmente artificial – Enfim, Alexander me deu uma carona… isto é, eu preciso ir agora, meu filho.

Não, ele não sabia! Que história era essa de mudança temporária? Chegou a abrir a boca para perguntar, quando raciocinou… era óbvio. Dumbledore descobrira a casa deles como sendo quartel-general de Voldemort. Claro que a mansão havia sido tomada pelo Ministério.

Draco viu Alexander Makulis pegando sua mãe pelo braço e ficou com tanta raiva que queria partir o homem ao meio. O desgraçado! Quem ele achava que era pra acuá-la desse jeito? Escolado pelos acontecimentos na masmorra, porém, se controlou. Sabia que qualquer explosão sua ali só prejudicaria Narcissa.

- Feliz Natal, Draco. Continue melhorando. - disse Makulis. - Você vai precisar ficar forte para voltar à escola.

Draco tinha certeza de que havia mais por trás daquelas palavras, mas não se arriscaria a dizer mais nada. Tinha medo que qualquer palavra sua fizesse brotar chamas da cabeça do homem.

Narcissa, por sua vez, tirou do olhar aquela expressão artificial por um momento ao se despedir dele antes de sair:

- Até breve, meu filho. Seu pai queria estar aqui. Ele sente muito, muito mesmo. E eu também. Mas agora sei que você vai ficar bem.

E saiu, deixando para trás um Draco, confuso, desolado e irritado.

Quando Narcissa e Makulis já estavam longe o suficiente para não terem mais visão do quarto dele, Draco, ainda tomado de uma raiva insana pela atitude do homem, teve uma ideia louca e repentina. Concentrou-se no rosto do homem e no ódio que sentia dele, e disse em voz baixa:

- Cor impetum.

Quando Makulis e Narcissa estavam chegando ao elevador, ele estacou de repente, levando a mão ao peito.

- Makulis… o que foi? - perguntou Narcissa, um pouco friamente. Assim como Draco, estava profundamente irritada com a forma como ele havia agido.

Mas ele não parecia ser capaz de responder. Arregalando os olhos, apertou o braço dela com força com a mão esquerda, num pedido de ajuda desesperado e silencioso, a mão direita ainda no peito. Caiu de joelhos no chão, e Narcissa, assustada, percebeu que iria cair também. Makulis tinha 1,92m. Desvencilhou-se dele com toda a força que conseguiu reunir, e o viu cair deitado de bruços, em agonia, sem conseguir falar. Seu primeiro impulso, assim como seria o de qualquer pessoa minimamente decente, foi pedir ajuda. Olhou para os lados freneticamente, pronta para parar o primeiro enfermeiro ou medibruxo que encontrasse… mas em seguida se lembrou do que ele havia feito. E limitou-se a agachar-se ao lado dele, olhando-o diretamente nos olhos – que ainda imploravam por socorro – com um sorriso condescendente idêntico ao que minutos antes estava no rosto dele.

O socorro, por estarem em um hospital, não demorou a chegar. Assim que o primeiro enfermeiro notou a cena, ela mudou completamente a expressão, parecendo convincentemente desesperada:

- Não sei o que aconteceu! Ele simplesmente colocou a mão no peito e caiu!

E foi com uma expressão de fria satisfação que ela viu Makulis ser levado às pressas numa maca, vítima do que parecia ser um súbito ataque cardíaco.

A mesma expressão permaneceu fixa no rosto de Draco enquanto ele escutava a movimentação de medibruxos e enfermeiros que se seguiu, em passos rápidos, códigos de emergência sendo gritados e ordens sendo disparadas freneticamente pelos corredores.


Notas Finais


Eita que o menino ficou bravo agora. E então? Quais serão as consequências desse ato impulsivo do Draco?
Nos vemos no próximo! E obrigada novamente a quem está lendo e, principalmente, comentando. Vocês são demais. <3
Bjos da Bella


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