Victoria começava a sentir um embrulho no estômago, nunca tinha andado de carro em toda a sua vida. Pareciam estar na parte nobre da cidade, ela podia ver grandes casarões por todos os lados. Estava quieta e tinha as mãos no cinto de segurança, com medo do movimento do carro. Red deu uma olhada nela e franziu as sobrancelhas.
- Você nunca esteve dentro de um carro antes? – Perguntou intrigado.
- É claro que já. – Ela disse, nervosa. Red freou bruscamente, ela fechou os olhos, apavorada.
- Já pode abrir os olhos. – Red estava com o rosto inclinado e com um sorriso irônico no rosto, quando ela o viu, sentiu algo estranho dentro de si. Sentiu seu rosto queimar de vergonha, ao se pegar observando o queixo anguloso e as covinhas que apareciam por baixo da barba rala e ruiva. Victoria pigarreou e desviou o olhar. – Não precisa ficar envergonhado... Mas, é meio estranho você nunca ter andado em um automóvel. – Ele havia interpretado erradamente a reação dela. – Parece até que ficou isolado do mundo por muito tempo... Deve ser coisa da minha cabeça. - Ele continuou a dirigir. – Eu só freei para ver esse seu rosto de assustado. – Riu. Victoria ficou com a expressão emburrada, odiava que rissem dela. Red dirigiu em silêncio quando viu-a irritada. Tori sentiu os olhos pesarem. A escuridão da rodovia, o balanço do carro e o som da melodia calma que vinha do rádio, fizeram-na adormercer. Acordou ao sentir alguém balançar seu ombro. - Acorda moleque, chegamos. – Red saiu do carro. Uma Tori sonolenta saiu do carro, cambaleando. Se sentia cansada. Tão cansada que quase não percebeu a casa à sua frente. Era no meio da floresta, as luzes da varanda estavam ligadas e lá estava um labrador cor de chocolate, que latia para os dois. A casa era de madeira rustica, mas bastante moderna e grande, havia apenas um andar e as janelas eram de vidro escuro. O jardim era cercado de flores e pedras e Tori podia jurar que estava ouvindo um riacho ao longe.
- Nossa... – Deixou escapar.
- O que foi? – Ele soltou o cachorro que logo pulou em cima do dono e fez festa. – Ei cara, eu só saí faz algumas horas... – Red riu enquanto conversava com o amigo.
- Qual o nome dele? – Perguntou.
- Parker. – Red se agachou para afagá-lo. Parker foi na direção de Tori e ela deu um passo para trás com medo, como estava sonolenta acabou cambaleando e caindo no chão. Parker pulou em cima dela e lambeu seu rosto todo. Ela gargalhou ao sentir cócegas que a língua do cachorro provocava. Red levantou-se e ajudou-a a sair do chão.
- Obrigado. - Ela afagou a cabeça de Parker. O cachorro caminhou ao lado dos dois e esperou ansiosamente para entrar na casa quando Red tirou as chaves do bolso.
- Eu mantenho ele do lado de fora quando eu não estou. Ele fica ansioso e faz muita bagunça. – Ele tirou a jaqueta e andou para dentro da casa. Victoria fechou a porta e ficou ali parada no meio da sala toda decorada em madeira. Havia uma lareira e uma TV bem fina em cima da mesma. O sofá em formato de “L” era cinza e estava posicionado de frente para a parede. Havia uma mesa de jantar de seis lugares no lado esquerdo da sala, ao lado de uma grande janela de vidro, também de madeira rustica. O tapete era marrom escuro e quando Parker se deitou sobre ele, quase ficou camuflado. – Aqui. – Red havia voltado com uma muda de roupa. – Tome banho, você dormirá no quarto de cima, primeiro à esquerda, há um banheiro nele, o meu quarto é embaixo. Se ouvir qualquer barulho suspeito, grite. Se estiver com fome, a cozinha é no final do corredor. Se sujar algo, você limpa. – Disse.
- Sim, senhor. – Tori disse, passando por ele.
- E Victor... – Red disse, fazendo-a virar-se para ele.
- Sim? – Tori respirou fundo.
- Não roube nada. – Red deu um sorriso irônico. Victoria estreitou os olhos, sentindo vontade de arrancar aquele sorriso insuportavelmente bonito do rosto dele. Tori virou-se e subiu as escadas, entrando no quarto indicado. Trancou a porta e foi para o banheiro. Quando olhou-se no espelho estava horrível. Os cabelos bagunçados e sujos. O rosto estava cheio de manchas pretas, além das olheiras ao redor dos olhos.
- Meu Deus, estou péssima. – Red tinha razão, ela fedia a lama e ovos podres. Estava há quatro dias sem tomar banho. Era um recorde, ela pensou. Trancou o banheiro e tirou as roupas, colocando-as no cesto de roupa suja. Ela esperou a banheira encher com água quente e colocou os sais de banho, que tinham cheiro de hortelã e alecrim. – Como um assassino de aluguel tem sais de banho em seu banheiro? – Ela franziu as sobrancelhas. Entrou na banheira e deixou a água quente deixá-la relaxada. – Isso é muito bom... – Fechou os olhos e mergulhou a cabeça embaixo da água.
Depois de relaxar na água quente, Tori levantou-se e tomou uma ducha de água morna, esfregou-se bem e lavou os cabelos. Nunca havia desperdiçado tanta água em um banho, ela pensou. As freiras do convento ficariam escadalizadas com tamanho desperdício. Ela riu ao pensar que nunca mais voltaria para aquele lugar. Se dependesse dela, voltaria apenas para dizer a Francesca que estava bem e que, adivinha só, era uma assassina de aluguel. Se é que poderia se chamar disso. Não havia matado ninguém e sabia que não teria essa coragem. Mas, se dependesse dela, Red teria a sua ajuda para sempre. Era o mínimo que poderia fazer pelo cara que salvou a sua vida.
Deitou-se na cama de casal, após vestir a camisa de manga comprida e larga, e o short que mal ficava em sua cintura se não fosse amarrado com o cordão. Pelo menos a roupa escondia os seios, que eram pequenos, mas mesmo assim poderia ficar aparente em uma camiseta menos folgada. Sua pele cheirava a hortelã e alecrim e logo adormeceu, ao sentir o contato da pele com os lençois macios. A vontade de dormir acabou prevalecendo sobre a vontade de comer alguma coisa.
Tori acordou com o cheiro de comida. Ela levantou da cama ouvindo o estômago gritar por algum alimento. Destrancou a porta e desceu as escadas de madeira. Foi até o fim do corredor e parou na porta da cozinha. Ali estava Red. Sem camisa, apenas com uma calça de moletom, as costas iluminadas pela janela de vidro que iluminava a cozinha de tijolos e madeira, com um grande balcão de madeira no centro. Red estava cozinhando e ao que parecia tinha um cheiro bom. Entretanto, sua fome pareceu ser menos importante do que observar aquele peitoral nu, bem à sua frente.
- Jesus. – Tori deixou escapar baixinho. Red virou-se para ela e sorriu.
- Bom dia, Victor. Está com fome? – Ele mexeu a frigideira. Ela se aliviou por ele não ter ouvido.
- Bom dia, estou sim. – Ela manteve o tom grave da voz. Foi até ele. – O que é isso? – Apontou para a placa de vidro onde ele mexia a frigideira.
- Bacon e ovos. – Red falava sobre o conteúdo da panela.
- Não... Isso. – Ela tocou na placa de vidro.
- O fogão? – Ele olhou para ela que tinha os olhos brilhantes no equipamento. Ele riu.- Você nunca viu um fogão digital antes? – Tori fez que não com a cabeça, ainda olhando o aparelho. – Nunca viu um fogão digital, nunca andou de carro... Alguém manteve você em cativeiro? – Brincou.
- Quase isso... – Encolheu os ombros. Ele ficou sério de repente.
- Sente-se aí. – Apontou para um dos bancos altos de madeira do balcão. Colocou metade do conteúdo da panela no prato dela, assim que ela sentou, e despejou o restante no prato dele. Em cima do balcão tinha bolo e pão, além disso havia suco de laranja e café. Tori nunca tinha visto tanta comida em um café da manhã para duas pessoas. Ela ficou ali parada, olhando para o prato, se sentindo culpada por não poder dividir aquela refeição com Francesca e sua família pobre.
- Algum problema? – Ele notou a expressão triste no rosto dela. – Foi o que eu falei sobre o cativeiro?. – Perguntou.
- Não é isso... Eu não fui mantido em cativeiro. – Tori disse.
- Ok... – Red começou a comer. Victoria percebeu que ele não estava tão interessado em seu passado ou nela. Ela respirou fundo e fez a sua oração antes de comer. Red parou de mastigar e ficou olhando para ela. – Que porra está fazendo? – Ele suspendeu uma sobrancelha. Tori terminou de orar para olhar para responder.
- Estou agradecendo pela comida e pelo teto que me foi ofertado hoje. Não xingue durante uma oração, isso é rude e desrespeitoso. – Ela começou a comer sob o olhar intrigado de Red. – Sua comida vai esfriar se continuar me olhando assim. – Tori deu uma olhada rápida nele e depois baixou os olhos para o prato.
- Não sabia que um garoto de rua acreditava em Deus. – Ironizou.
- Você só sabe fazer isso? – Largou o garfo.
- Fazer o quê? – Ele continuou comendo.
- Zombar das pessoas? – Os olhos cor-de-mel e quentes dela cruzaram com os olhos azuis e frios dele. Ele soltou um risinho e depois ficou sério.
- Victor, eu não sou seu amigo. Você trabalha para mim e é melhor você aprender a conviver com o meu jeito, porque eu não mudo por ninguém. – Seus olhos faíscaram. Victoria estava prestes a dizer algo, mas ele se antecipou. – Volte a comer, antes que eu enfie essa comida por sua goela a baixo. – Diante da ameaça, Victoria comeu calada, com um silêncio terrível pairando sobre os dois.
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