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História Revolt - Prepare-se para o nosso grito


Escrita por: loonamoon e newfront

Notas do Autor


95%

"Se pudesse ver a Lua se deteriorando, queria que fosse de uma forma tranquila, aos poucos e não do dia para a noite." A nona história sobre o processo do fim que acontece de pouco em pouco. Bem-vindas(os) ao novo ciclo do Loonamoon.

notas do autor: Debut no Loonamoon, é isso mesmo, produção? Meu ponto diz que sim. Foi uma longa jornada enquanto escrevia essa fic, foi um processo doido, mas interessante, então agradeço ao projeto por me possibilitar essa oportunidade. O plot foi um pouco diferente do que estou acostumada, porém, me diverti bastante, por isso espero que gostem e boa leitura!

agradecimentos (por loonamoon): olhar a betagem da @gx9 é perceber o quão atenciosa é analisando a fanfic, seu trabalho é incrível! e @sf9feminist sem comentários, você passa dos limites com suas capas e não posso deixar de dizer o quanto se supera a cada trabalho, lindo demais!!

Capítulo 1 - Prepare-se para o nosso grito


Uma última ajeitada no uniforme, já alinhado, foi feita antes de virar a esquina do colégio em que estudava. Desviou o olhar para a pulseira dourada em seu pulso esquerdo fazendo com que uma breve arfada de ar escapasse pelos lábios, mais um dia se iniciava. Os passos precisos em conjunto aos cabelos balançando a cada movimento concluído demonstrava uma confiança capaz de dar inveja a qualquer um, e Sooyoung sabia, realmente dava. Base comportamental número 2: Vestimentas adequadas são o reflexo do seu compromisso educacional. Sentia os olhares fixos em si enquanto desviava de um aluno ou outro que estava pela calçada, não tinha pressa, no entanto, queria chegar o quanto antes para conferir as respostas da atividade de química com Kahei.

Desejava um acerto de noventa por cento no momento em que o professor concluiu a aula com uma folha de exercícios que deveria ser entregue no dia seguinte, ou seja, hoje. Contudo, as questões estavam mais complexas do que o esperado, fazendo-a passar boa parte da madrugada entre livros e uma quantidade exagerada de cafeína. Assim, as poucas horas de sono eram escondidas por uma quantia de maquiagem que não estava acostumada a usar, mas estava tudo bem. Fazer parte do Good Kids Club era isso.

Portar-se como um cristal lapidado, quase alcançando a perfeição, seja devido às altas notas ou a maneira que andava pelos corredores do colégio. Uma pedra preciosa que deveria ser protegida pela instituição.

E de fato acontecia. Talvez mais do que os outros alunos gostariam, reclamações que escutava entre os murmúrios alheios, mas quem era Sooyoung para se importar com isso. Se fazia parte do clube e recebia tantos privilégios era porque merecia, certo? Claro que sim, essa era a real intenção do Good Kids Club, quando a própria Ha Sooyoung apresentou a ideia de fundá-lo.

Aos quinze anos, em um dos projetos escolares semestrais com o objetivo de auxiliar o colégio na construção de um ambiente mais agradável e encorajador, Sooyoung decidiu ir mais longe comparado aos demais com suas propostas comuns – bebedouro com refrigerante, sala de jogos, horários vagos, etc. Ela montou uma apresentação de como um clube como um propósito incentivador, por parte do colégio, em relação àqueles considerados os melhores alunos seria uma boa maneira de aumentar a média de toda a instituição, pois aqueles que se tornassem membros continuariam a se esforçar para continuar ali, e os que não, também se esforçariam no intuito de entrar no clube.

Ela só não esperava que tal sugestão fosse levada tão a sério.

Agora, aos dezoito anos e no último ano do ensino médio, Sooyoung, orgulhosamente, podia se considerar uma das integrantes mais importantes do Good Kids Club, não que existisse algum tipo de hierarquia no clube, porém ser aquela que possibilitou a criação do mesmo trazia algumas vantagens diante a coordenação, ao ponto de, talvez, poder se comparar a atual presidente do grupo, Kim Hyunjin.

Não era uma tarefa fácil, com certeza, desde a criação do grupo, seus dias se tornaram muito menores. Mais tempo para o estudo, menos para a diversão. Apesar disso, Sooyoung entendia que se tratava de saber escolher quais eram suas prioridades para o momento e as respectivas consequências. Sem esquecer de todas as regras criadas com o decorrer do tempo no intuito de se ter uma melhor postura dos membros do clube, proporcionando um ambiente mais agradável e correto, nas palavras da instituição. Comportar-se era parte da rotina.

Também existiam as incertezas, quase certas, relacionadas a poder ou não considerar o seu grupo social como amigos de verdade. Na verdade, o rótulo ‘conhecidos próximos por interesses’ parecia ser o mais adequado para a relação existente entre os membros. As conversas se voltavam a trabalhos, notas, apontamentos do que podia melhorar e dúvidas de matérias; nunca sobre o filme que saiu recentemente, a dor de cabeça que lhe afetou na última noite ou os problemas familiares que lhe fizeram perder o sono. Superficial.

Todavia, se os fins realmente justificam os meios, estava tudo bem, pois era fácil agir dessa maneira ao ter em mente todas as vantagens que estar ali proporcionava.

O caminho até a sala foi mais rápido do que esperava e, provavelmente, os culpados eram os passos não tão largos, já que precisava manter a postura nos corredores do colégio e a última coisa que queria era uma advertência em vermelho vivo debaixo do seu nome na caderneta do inspetor. Quando se deu conta, a placa simbolizando sua turma já estava em seu campo de visão, um suspiro aliviado escapou de seus lábios, por sorte havia tempo suficiente para corrigir as questões e até tirar umas dúvidas.

Ao passar pela porta deixou que um sorriso moldasse seus lábios, cumprimentando com um rápido aceno todos que direcionavam um olhar para si. Base comportamental número 12: Evidencie as qualidades existentes, cordialidade e educação sempre. A mochila descansando na parte de trás da cadeira, livro didático da primeira aula sobre a mesa, caderno de química abraçado contra o corpo, passos em direção a Kahei sentada em meio ao seu mar de materiais.

— Bom dia. — Sua fala foi a responsável por fazer a Wong desviar a atenção do caderno de exercício. O óculos de armação redonda foi colocado na posição adequada enquanto sorria para a Ha, esperando que continuasse a falar. — Conseguiu terminar as questões do professor Kang?

— Você sabe que não existe a possibilidade de não conseguir terminar. — Sooyoung até riu da tentativa de piada da mais velha, porém as palavras martelavam sua mente ao ponto de lhe provocar dor. Ela estava certa, não existe essa possibilidade. Se ter o seu nome chamado durante as correções e resolver com uma resposta errada era vergonhoso, imagina não ter o que dizer. — Fiquei mais tempo do que gostaria nessa atividade, mas acredito que o resultado foi satisfatório.

— Será que poderíamos comparar as respostas? — Base comportamental número 5: Um grupo é construído com o auxílio de todos, trabalho em conjunto fortalece os laços, a proatividade e boa comunicação. Em outras palavras, se alguém do grupo pede ajuda, por que não ajudar? Não quer ficar mal falado, ou quer? — Juro que vai ser rápido. De forma geral estou confiante, mas tem uma ou outra que tenho minhas dúvidas.

— Claro, vou confessar que estou da mesma forma. — Mais uma vez ajeitou os óculos que escorria pelo delicado nariz, Sooyoung torceu para que nenhum inspetor notasse esse pequeno deslize, ela até que gostava da Wong. — Então vai ser uma ótima oportunidade de conversarmos sobre e trocarmos conhecimento.

Conversas vazias e superficiais faziam parte do dia a dia, sem motivos para entrar na vida pessoal dos colegas, a Ha continuava a puxar assunto sobre conteúdos e questões trabalhadas, embora a vontade de contar sobre as estrelas que passavam a ser mais frequentes no céu durante a noite a inquietasse. — Claro, eu adoraria. — Usando o tapete para esconder a poeira, Sooyoung fingia que nada a incomodava com o pensamento de que o problema era ela, já que nenhum aparentava pensar o mesmo que si.

Os próximos minutos foram recheados com informações sobre as propriedades e as reações dos compostos orgânicos. Momentos como esse que Sooyoung agradecia por estar no grupo, a certeza dentro de si a fazia pensar que uma ajuda como essa, por mais que quase imposta, não seria comum. Pessoas são egoístas demais para ajudar por pura empatia.

O intenso som do sinal simbolizando a chegada dos professores às salas fez com que Sooyoung caminhasse apressadamente em direção a sua mesa, agradecendo Kahei uma última vez com um generoso levantar dos cantos dos lábios. A ideia de relatar ao professor de química acerca da atuação da Wong surgiu, e, dependendo de como o dia se sucederia, realmente o faria. Kahei ficaria a devendo uma. É sempre uma situação confortável ter um favor a ser cumprido por outros.

Passou o olhar rapidamente pela mesa, colocando em ordem todo o material logo após guardar na mochila o caderno não utilizado no momento. As pontas dos dedos alisando os fios de cabelo, devidamente arrumados, apenas para não correr nenhum risco. Cadarço amarrado, saia sem um amasso sequer, blusa e seus enfeites, como a gravata borgonha e a pequena placa com seu nome, impecáveis. Não esperava um elogio pela organização, porém era satisfatório ver o resultado bem a sua frente e, ocasionalmente, a distinção em comparação a outros alunos de sua turma.

A instituição por si só apresentava regras assim como qualquer outra, das mais básicas como o uso diário do uniforme e da etiqueta de identificação àquelas que não fazia tanto sentido, ‘não poder dirigir uma moto nos corredores do colégio’ era uma delas que, por acaso, Sooyoung continuava sem entender mesmo depois de todos esses anos. Contudo, estar no Good Kids Club implicava em seguir rigorosamente a base comportamental, um compilado de regras adicionais aos membros do clube, justamente para, como dito anteriormente, possibilitar um ambiente mais agradável. E esse fato causava uma barreira entre os alunos.

A diferença era clara.

Roupas amassadas, cabelos presos de maneira desleixada, tênis sujos e com os cadarços à solta, pirulito entre os dentes, risadas correndo pela sala embora existisse a presença do professor, despreocupadamente presas em suas próprias bolhas perfeitamente imperfeitas para se importar em tirar as melhores notas da turma ou, ao menos, participar durante as aulas. Seria rebeldia ou apenas uma característica? Sooyoung não sabia dizer, colocar a maioria de seus colegas em caixinhas de estereótipos que preferia deixar para as outras pessoas. Porém, existia um alguém que a Ha poderia conceituar muito bem e sem qualquer trabalho.

A causa principal de toda e qualquer confusão. Jungeun. Se as situações fossem outras, ela poderia ser a rainha de todo o castelo, mas, nas devidas circunstâncias, estava mais para a bala do canhão jogada contra a estrutura, abalando-a, destruindo-a. Uma típica pessoa visivelmente invisível.

Pelos cantos dos olhos, Sooyoung observada a jaqueta jeans em tons desbotados brilhando sobre o uniforme, cabelos loiros enrolados no dedo, o tênis de cano alto batia no chão enquanto deixava que suas amigas seguissem o rumo da conversa que, apesar de não saber do assunto, aparentava não prender sua atenção. Visão fixa no professor de gramática coreana completar o quadro com informações. Vagos movimentos da bochecha, deveria estar mordendo e Sooyoung a observava há um período incerto para ter a noção de que a tempestade se aproximava.

O que seria dessa vez? Mais um comentário ácido para a lista? Uma reclamação sobre a forma que o professor, supostamente, despreza os outros alunos? Sooyoung estava mais que acostumada com as reclamações, estava longe de se importar com elas, entretanto era diferente com Jungeun.

A menina era tratada como uma heroína por aqueles que não fazem parte do grupo, o grito no meio da multidão não ouvida, corria atrás do que acreditava, de certa forma, aclamada por aqueles que se encontram no entorno, era o que diziam. Todos sabem o seu nome, que só é falado quando faz alguma bagunça. Pois, para a coordenação e membros do Good Kids Club era apenas a erva-daninha contaminando o belo gramado. Por isso que Sooyoung a observava, queria estar pronta para o que estivesse por vir. Remediar e prevenir.

— Bom dia, vamos continuar de onde paramos a aula anterior — o professor Jung disse, logo ao terminar suas anotações. — Lembram em qual página estamos? — O olhar firme correu pela sala, esperando a resposta, demorando um pouco mais naqueles com pulseiras douradas.

Não passando despercebido por Jungeun.

— Página 214, professor.

— Obrigada, senhorita Jang. Então, vamos começar com a leitura.

Diferente do esperado, nada aconteceu. Pelo fato de Jungeun sentar um pouco à frente de si, a Ha apresentava uma visão privilegiada que possibilitava assistir os detalhes da loira, mas, naquele momento, esta se portava totalmente ao contrário das anotações mentais feitas diante todo esse período em que convivia com a Kim. A cabeça abaixada, riscando ou desenhando na folha do livro, alheia ao mundo ao seu redor, sem a postura que demonstrava estar prestes a arrumar uma encrenca com a primeira pessoa que passasse por sua frente.

Estranho. Levemente estranho.

Mordeu a ponta do lápis rapidamente antes de voltar a atenção para o professor. Aquela não era hora de se preocupar com Jungeun, na realidade, sequer sabia se um momento como esse existia. Não após ser o alvo da Kim por tantas semanas seguidas até que ela decidisse gastar seu tempo livre importunando outro alguém, voltando ao início em um ciclo sem fim.

Sooyoung julgava ser tudo falta do que fazer. Se ela tivesse deslocado essa ira fora do comum em ações mais produtivas, era certeza que as maiores notas do colégio estariam relacionadas ao seu nome, no entanto, e de certa forma, a Ha ficava feliz por Jungeun não pensar da mesma maneira que si. Seria uma a mais para competir pelo topo do quadro semestral com classificação dos melhores alunos.

A aula passou voando entre anotações feitas em diversas cores para melhorar a memorização e perguntas para sanar as dúvidas que apareceram. Assim que o professor passou pela porta, Sooyoung gastou rápidos segundos encarando orgulhosamente seu caderno, com certeza o trabalho seria recompensado ao ter o certificado de participação do clube. Sabia, independentemente de qual caminho escolhesse, esse pequeno pedaço de papel facilitaria sua vida.

— A aula de química foi cancelada para quem está no clube, uma reunião de urgência deve acontecer. Vou conferir daqui a pouco, mas parece que nós duas e Heejin seremos as responsáveis por comparecer à reunião e passar a informações para os outros da turma. — Sooyoung levantou uma das sobrancelhas, o dia aparentava estar andando em direção oposta ao comum, uma situação como esse era realmente inesperada. — Algo envolvendo a direção, pelo que ouvi. 

— A direção do colégio ou do clube?

— Do clube, o que é bem estranho. — Kahei suspirou. Aproximou-se vagamente da Ha para sussurrar para que apenas ela pudesse ouvir. — Será que Hyunjin abdicou da função?

— Sinceramente, acho improvável. Ela aparentava gostar tanto de ser a presidente, lembra de como ela se esforçou para ganhar a votação? — A Ha ajeitou a postura, recostando no suporte da cadeira. — Por isso não penso que ela abriria mão disso.

— Foi a primeira vez, desde a criação do clube, que vi alguém agir daquela forma.

— Sim, ela conversava com todo mundo sobre suas propostas, o que mudar, o que preservar, estava bem engajada. — Ali, Sooyoung tinha uma certeza, não se tratava de uma boa notícia, o peso residente em seu coração simbolizava isso. Em meio a temporadas em que sua intuição parecia não existir, naquelas em que se manifestava a Ha possuía convicção que poderia abraçar o sentimento.

— Sem falar que nunca ouvi uma reclamação sobre ela. — Balançou a cabeça concordando com a fala da Wong. — Enfim, vamos ter que esperar até o horário para saber o que aconteceu.

— Verdade. E obrigada, Kahei, por me manter informada. — É, ela realmente deveria falar com algum professor sobre a ajuda da Wong. Com isso, uma nova base comportamental invisível aos olhos de muitos se tornava norma: ser gentil com todos somente para usá-los, para garantir o seu lugar no topo.

‘Apenas mais uma aula e saberá do que se trata, fica calma, se acalma’. Repetia essas mesmas palavras como um mantra que, por causa do estado em que se encontrava, não causavam efeitos. Semelhantes a mau pressentimento que se alastra pelo corpo e faz moradia em cada músculo e órgão vital.

A movimentação inconstante das borboletas de seu estômago fazia com que a Ha se sentisse enjoada, o nervosismo era tamanho que incontáveis eram as vezes que passou a mão na saia do uniforme para limpar o suor acumulado em suas mãos. Estranho. Isso lhe dizia que as circunstâncias poderiam ser piores que, simplesmente, Hyunjin ter pedido para se afastar do cargo de presidente do Good Kids Club.

Acompanhada de Kahei, Sooyoung seguiu em direção a parte do colégio destinado ao clube – com uma grande sala de descontração com direito à mesa de tênis de mesa, máquinas de vendas automáticas dos alimentos considerados benéficos na hora de estudar, jogos de tabuleiros, confortáveis poltronas, além de uma biblioteca exclusiva e uma sala onde aconteciam as reuniões com, ao menos, dois membros de cada turma. O ambiente estava mais calmo que o normal, Sooyoung queria colocar a culpa no horário, visto que ainda aconteciam as aulas, então era de se esperar o mínimo de pessoas possíveis ali, porém sua mente se encontrava longe demais para acreditar em desculpas lógicas.

— O que foi? Você está estranha. — Outro ponto para considerar a intuição da Ha, em nenhum outro momento Kahei demonstrou prestar atenção na maneira que se portava para apresentar uma repentina simpatia. Dias ruins existiam para qualquer um, por essa razão não era de se esperar que as pessoas levassem isso em consideração para, ao menos, perguntar o que lhe afligia.

— Não sei, sinto que o que vão nos contar não será bom, por isso estou um pouco inquieta. — Alisou os braços enquanto os usava para se abraçar. — Mas não se preocupe.

E, desse modo, qualquer resquício de empatia por parte da Wong desapareceu. — Tudo bem, vamos entrar, eles já devem começar. — Empurrou a porta, já entreaberta, da sala de reuniões. A maioria dos colegas de clube estavam sentados em suas respectivas cadeiras referentes a turma que faziam parte. O costume era acontecer as reuniões depois do término das aulas, logo o clima nervoso simbolizava o desconhecimento do assunto que seria tratado.

Sentou-se após soltar um suspiro discreto, esperando que a reunião começasse.

— Vejo que todos estão aqui, podemos começar. — Hyunjin se levantou, trazendo toda a atenção para si. — Juro que será rápido, apenas um aviso para não tomar o tempo da aula.

O silêncio tomou conta do local, cada um preso em seus próprios pensamentos ao mesmo tempo em que aguardavam que Hyunjin continuasse a falar.

— Enfim, queria informar que não irei mais ser a presidente do clube. — Sooyoung encarou rapidamente a Wong, embora tivessem comentado sobre, parecia uma situação utópica tendo em conta os acontecimentos do último ano. — Gostaria de agradecer por acreditarem em mim durante esse período em que estive na presidência, mas chegou ao fim.

— Haverá outra votação ou passará a presidência ao vice? — Um garoto que Sooyoung não lembrava bem o nome perguntou.

— A direção do colégio que irá escolher o novo presidente e, pelo que chegou até a mim, já foi escolhido.

A fala de Hyunjin foi o apogeu para a formação de uma confusão silenciosa. Medo de se expressar ou porque não tinham o que dizer ainda? O bater das borboletas, que antes incomodava, agora traz consigo uma vontade de quebrar as amarras. Estava mais que evidente o fato de ninguém questionar o que acontecia, entretanto, passou dos limites. Nem mesmo após a criação do clube a direção interviu na escolha do presidente, então por que agora?

De fato, a intuição indicava que a interferência da instituição na direção do clube não era benéfica; eram eles que apresentavam as reivindicações, fazendo o diálogo entre os membros e o colégio, colocar qualquer pessoa que quisessem era como conduzir o clube da forma que acharem correto. Tirar ou colocar o que bem entender.

— Por quê? Eu realmente não entendo. — Sem ao menos notar, Sooyoung começou a esvaziar a mente. Lidaria com as consequências depois, só precisava liberar as toneladas existentes em seus ombros, embora não soubesse se estavam ali devido a todas as sensações anteriormente ou pela notícia.

— Como assim? — Hyunjin questionou, sendo a voz dos presentes que encaravam a Ha.

— Convenhamos, Hyunjin, você cumpre com excelência o seu papel e todos sabem disso. Sem falar que falta, praticamente, um ano para as eleições acontecerem realmente. Não estou dizendo que a pessoa que será ou já foi escolhida não pode lidar com esse cargo, porém já estamos acostumados com você e todo o seu método de trabalho, não ouvi nenhuma reclamação, as realizações feitas por você foram incríveis. Então, por que essa mudança?

— Foi uma decisão deles, não tem nada a ser feito, além de aceitar.

— Se eles podem mexer com isso, podem mexer com qualquer coisa e tenho medo do que o clube pode virar. — Cruzou os braços ao soltar o ar preso em seus pulmões de uma vez. — Mas entendo que não é culpa sua, Hyunjin, apenas esperava uma justificativa plausível, mas parece que não iremos receber.

Por mais que aparentassem pensar no assunto, Sooyoung não conseguiu enxergar uma ação de outrem que demonstrasse concordar ou discordar consigo. Mais uma vez, ela não sabia dizer que tal feito era por receio de expressar o que pensava em meio a uma situação relacionada a direção. Existiam rumores de expulsões, apenas rumores relacionados a saídas repentinas do clube, porém não podiam se calar em casos como esse.

O ar em seu pulmão parecia cobrir todo o seu órgão, sentiu-se fraca, como se toda a escada que construiu até o topo, a voz que diziam ter, não servisse de nada,  um estranho nas íris alheias que estavam presos em suas bolhas finas demais, e que com qualquer movimento brusco pudessem ser estouradas.

No entanto, estava tudo bem, logo voltaria ao normal e se acostumariam com a presença de um novo presidente, quem quer que ele seja.

...

O dia seguinte se iniciou e, com ele, a rotina. Uniforme alinhado, cabelo arrumado, mochila com todos os cadernos com a matéria completa e exercício em dia nas costas, pulseira dourada circulando o pulso. Se as vinte quatro horas anteriores estavam recheadas de um clima estranho, as primeiras do novo dia pareciam normais. Sem qualquer acontecimento que tirasse da zona conforto e essa sensação possibilitava que Sooyoung respirasse aliviada, existiam muitas questões para se pensar a respeito e não queria que mais delas aparecessem.

Os passos eram calmos até a sala de aula, cabeça ereta enquanto desviava de um ou outro aluno. As estrelas brilhantes no céu aparentavam sorrir para si, seu dia seria ótimo, era o que sentia. Pois, assim que passou pela porta, sentiu o olhar de Kahei sobre si, um olhar diferente do comum; nada de perguntas sobre a matéria, nada de sugestões de livros para estudar a matéria, nada de pedidos para passarem as aulas vagas na biblioteca estudando. Havia... pena?

— Sooyoung, nós precisamos conversar, se possível em um lugar mais reservado. — A testa franzida, o coração errando uma batida, pela primeira vez, sua intuição estava errada.

— Claro, só vou colocar a mochila no meu lugar. — Rapidamente, ela fez o que disse, voltando ao encontro de Kahei em seguida. — Onde quer ir?

— Banheiro do segundo andar, zona sul. — O lugar mais silencioso que Sooyoung conhecia, justamente por se encontrar em uma área que poucas pessoas iam, já que nenhuma das salas daquela região do colégio funcionava, apenas serviam de despejo para matérias de limpeza e carteiras quebradas. — Vamos antes que a aula comece.

Kahei andava a sua frente, indicando o caminho, mesmo que a Ha o conhecesse como a palma de sua mão, mas,  francamente, aos olhos de Sooyoung, parecia que a Wong não queria ser vista andando ao seu lado. Isso nunca aconteceu. Dizer que estava confiante com o que estava por vir era uma completa mentira, contudo, talvez, tivesse começado a sentir prazer em mentir para si mesma.

E, desse jeito, continuavam. Os pensamentos que tanto tentava esconder pareciam ser altos o suficiente para esquecer da barulheira escolar ao seu redor, apenas seguia os passos de Kahei em um constante modo automático, até que esta para abruptamente na frente da porta de tintura velha, adentrando o local escuro em seguida, sem esperar a companhia da Ha.

Diferentemente de todos os outros banheiros do colégio, esse era escuro com poucas frestas de luz entrando de pequenas janelas localizadas na parte superior das paredes com seus pontos de mofo. Algumas gotas de água, ou qualquer outro líquido, escapavam pelo teto, molhando o chão e se acumulando em tons terrosos. Pelos primeiros instantes desde o momento em que ali adentrou, Sooyoung sentiu dificuldade em respirar adequadamente, um cheiro incomum, forte. Como o colégio deixava o local chegar nessa situação? Será que alguém o utilizava para além de ações consideradas ilícitas? Sooyoung ficaria surpresa se algum dos vasos sanitários ou das pias realmente funcionassem.

— Preciso que me entregue a pulseira. — As palavras jorraram como a água jogada por um carro em alta velocidade em um dia chuvoso ao passar por uma poça, acertando, desprevenidamente, Sooyoung.

Não poderia estar acontecendo. — O quê? Estou sendo expulsa?

— Não torne as circunstâncias mais delicadas, apenas chegou esse pedido até mim. É a direção. — A explicação incompleta abriu os olhos de Sooyoung, ela entendia o que ocorria. Essas eram as consequências do dia anterior. — Não tem nada a ser feito. — Novamente essas palavras, e eram essas que a Ha começava a sentir uma imensa repulsa.

Sooyoung passa os dedos por seus longos cabelos escuros em meio a um alto suspiro. Precisava fazer algo, era injusto, as coisas não podiam acabar dessa forma, não depois de todo o suor e lágrimas despejados devido ao clube, não depois de todo o esforço para chegar onde está. Não podia assistir seu castelo ser destruído bem diante de seus olhos e ficar parada.

Sooyoung ri, e é amargo.

Havia diversas perguntas em sua cabeça que desejava fazer em voz alta, porém ela sabia que Kahei não seria capaz de respondê-las, portanto precisava ir atrás de quem poderia fazê-lo. A chama do que poderia chamar de justiça surgiu em seu peito, queimando qualquer receio presente em sua vida durante os últimos anos. Não podia terminar igual o local em que se encontrava, por isso, em um rápido movimento, retirou a pulseira de seu pulso, sem qualquer cuidado, sem se importar com o estado que ficaria, se rasgaria ou amassaria, não mais.

— Sempre tem o que ser feito, Kahei.

...

Pela primeira vez em sua vida escolar, Sooyoung não prestou atenção na aula, o mundo a sua volta parecia não existir, do mesmo jeito que o mundo pareceu ter esquecido que um dia ela existiu. O alisar das almofadas dos dedos por onde um dia esteve a pulseira que tanto se orgulhava possuir, parecia ser mais importante do que qualquer outro movimento.

O castelo que demorou tanto para construir com os altos muros, no final, não serviu para a proteger. Havia entrado em conflito uma decisão superior, os sussurros entre as paredes beges tratavam sobre antigos membros que enfrentaram ou foram contra uma escolha, assim como ela, e acabaram se mesclando à multidão de alunos. Depois de tanto tempo se importando com a forma que se portava, jamais cogitava se encontrar nessa situação. Porém, o sentimento existente dentro de si não era de arrependimento.

Agiu da maneira que julgava ser correta, o que tem de errado nisso?

Expulsá-la por simplesmente pensar diferente, parecia até uma piada, divergências de opiniões sempre existem, não era motivo para tal feito. Ou talvez era. Base comportamental número 7: Corte tudo aquilo que não é benéfico, seja de curto, médio ou longo prazo. Sooyoung, por simplesmente ir contra, passou a ser considerada um mal para todo o clube, precisavam cortá-la pela raiz para que não servisse de inspiração para outros membros.

Deixou que a cabeça caísse sobre as mãos, escondendo o rosto enquanto fechava os olhos, a frustração corria por suas veias tensionando os músculos durante o processo. Era isso.

Se havia um ensinamento que levava para vida era aprender com os erros. Geralmente, aplicava-se para os momentos em que estava estudando e cometia algum erro durante a resolução de um exercício, examinava o que a havia levado a agir dessa forma e seguia em frente, tomando cuidado para não o cometer mais uma vez. Um costume que foi se espalhando para outras partes de sua vida. Em outras palavras, preferia não chorar pelo leite já derramado, por isso, precisava superar.

No entanto, não negaria a estranheza existente. Sem reclamações sobre não estar focada na explicação do professor ou alguma aproximação para perguntar acerca das atividades do dia, como se toda a rotina e preocupações do dia a dia fossem somente fruto da sua imaginação.

Averiguou com cuidado à sua volta. A pulseira brilhando naqueles que focavam firmemente nas palavras do professor, canetas coloridas enfeitando as anotações, mãos levantadas e dúvidas sanadas, entretanto um ato não passou despercebido por Sooyoung. Apenas os membros dos grupos participavam da aula. Os outros alunos pareciam presos em seu próprio mundo: uns anotando uma informação ou outra, outros olhando para o teto alheios ao que ocorria, sem falar daqueles que mexiam no celular ou liam um livro, fora da lista dos títulos que deveriam ser trabalhados em sala, praticamente na visão do professor.

Então, era sobre isso que Jungeun brigava...

“— Senhorita Ha, poderia, por favor, vir até o quadro demonstrar para a turma como que resolveu a próxima questão? — a professora questionou, e, naquele momento, Sooyoung agradeceu por ter certeza que respondeu corretamente à questão referida. Receber uma repreensão logo no primeiro horário não estava em seus planos.

— Claro — respondeu, alinhando o uniforme ao corpo durante a ação de se levantar da cadeira.

Durante o curto percurso em direção ao quadro, revisava mentalmente o processo feito para chegar no resultado esperado, as regras, o cuidado com a vírgula, enquanto procurava se acalmar para que sua letra ficasse o mais bonita possível. Um elogio não causaria nenhum mal. No entanto, uma voz atrás de si a fez parar.

— Por que ela? Por que não eu ou Haseul, por exemplo? — Jungeun. Claro, quem mais seria? Sooyoung levantou uma das sobrancelhas, esperando ou que a Kim continuasse a falar ou que a professora respondesse, visto que a pergunta não fora destinada a si. — Por que só chama aqueles que tem essa pulseira meia boca no pulso? Também fazemos parte da turma.

— Não estou te entendendo, senhorita Kim. É claro que fazem parte da turma.

— Então, por que só fala sobre mim ou qualquer outro aluno quando fazemos alguma confusão? Acha que não somos capazes de responder? Não somos inteligentes o suficiente só porque não fazemos parte desse clube super seleto com os, supostos, melhores alunos que nunca olham além do próprio umbigo?

— Tenha cuidado com a maneira que se refere aos seus colegas, senhorita Kim! — A professora se aproximou da mesa de Jungeun. E, Sooyoung, por mais que tivesse seus próprios receios em relação a Kim, não aprovando a maneira que agia ou dizia, sentia-se em meio a um campo de batalhas pelas faíscas escapando dos olhos de ambas.

— Dizem que uma palavra só dói quando você sabe que ela é verdadeira, então, você se sentiu ofendida com isso, professora? — Os braços cruzados apoiados na mesa, o olhar fixo na mais velha, o sorriso moldando o canto dos lábios. Ela estava provocando, tocando em alguma ferida desconhecida pela Ha, possivelmente para ter um retorno excessivo por parte da professora. Todavia, Sooyoung notava os traços vermelhos enfeitando as bochechas.

— Saia da sala, Jungeun, agora. — Todos presentes sabiam, levar ela para a direção nada resolvia. Kim Jungeun era um caso de rebeldia perdido.”

Ainda que doesse confirmar, mesmo sem exteriorizar, que existia lógica na forma que Jungeun agia, pelo menos nessa lembrança, era inevitável ser feito. Em nenhum momento, desde a expulsão, o seu nome foi chamado para responder uma pergunta ou ler um dos parágrafos, ações que eram praticadas em, praticamente, todos os horários, ou seja, os funcionários da instituição já sabiam de sua expulsão.

Desviou o olhar para a loira que conversava por bilhetes indiscretos com as duas outras amigas que sentavam perto de si. O sorriso carregado em seus lábios era diferente do que estava acostumada, genuíno, divertindo-se com o que quer que esteja escrito no pedaço de papel, distraída o suficiente para não se importar com o fato de ser inviável. Possivelmente, nessas circunstâncias, preferia estar assim, poderia continuar com a conversa sem intromissão.

Uma baixa risada escapou dos lábios observados sendo seguida por rápidos tapas no ombro de uma de suas amigas, estas que tampavam a boca com as mãos para não cair na gargalhada. Então era assim ter uma amizade além do interesse? Ter piadas internas, momentos de descontração quando não deveria, gostos em comum e debates sobre o que não concordavam, desabafos na terça à noite quando deveriam estudar para a prova no dia seguinte.

Fixou em Kahei, os óculos caindo pelo nariz enquanto concluía a grande anotação presente no quadro. Em nenhum segundo notou o olhar dela sobre si, supostamente chegou a vez de se tornar invisível àqueles para quem um dia brilhou como diamante.

“— Sempre tem o que ser feito, Kahei. Quando essas palavras saíram pela boca de Sooyoung, poucas horas atrás, foi totalmente sem pensar, uma resposta chave para demonstrar que não estava afetada com a expulsão e que iria agir, embora sem qualquer intuito por trás, por mais que a vontade existisse.

Sair de expulsa para aquela que conseguiu, de certa forma, solucionar algum dos problemas do colégio seria incrível.

O único problema era que, para isso acontecer, precisava da ajuda de Jungeun, aquela que jamais imaginou trocar mais de duas palavras. Como iria se aproximar de alguém que julgava ser insuportável – ou a tal garota chata que fica arrumando confusão por nada? Imaginava que a Kim pensava o mesmo de si, mas aquela era a oportunidade de ouro para usar a habilidade de forçar uma, quase, amizade com as pessoas.

Os ponteiros do relógio localizado acima do quadro simbolizavam que faltavam poucos minutos para o término da aula, iniciando o intervalo, oportunidade perfeita para conversar com Jungeun. Apenas tinha que encontrar as palavras certas, mas se envolver em um diálogo com a Kim aparentava ser mais difícil do que imaginava. Nada, por enquanto, parecia ser um vínculo para ser o pontapé para o início da relação. Chegaria nela já comentando sobre o assunto ou tentaria uma melhor aproximação para adquirir sua confiança?

Todavia, seus pensamentos foram cortados pelo alto som do sinal. A aula chegou ao seu fim. Apressadamente procurava pela Kim, que já não estava em sua cadeira, olhou em direção a saída e lá estava ela. “Vamos, Sooyoung, aja.”

— Jungeun, será que eu poderia conversar com você? — Andou em passos largos em direção a Kim, não podia deixar que ela passasse pela porta, com certeza não saberia onde encontrá-la pelos enormes corredores do colégio. — Não tomarei muito do seu tempo, eu juro.

Jungeun trocou rápidos olhares com as amigas, pareciam conversar muito nos rápidos minutos seguintes, até que a mais alta entre elas resolveu quebrar o silêncio. — Te esperamos no lugar de sempre, não demore — disse, antes de sair com o braço apoiado no ombro na outra. Ali a Ha percebeu que não se recordava de seus nomes. Elas eram mesmo invisíveis.

— O que quer, Sooyoung? — As mãos encontraram abrigo nos bolsos da jaqueta jeans, olhos fixos em todos os detalhes de Sooyoung, observava-a por completo.

— Você sabe o meu nome?

— Qual é? — Riu, parecendo não acreditar na pergunta anterior. — Quase impossível não saber de tantas vezes que os professores te chamavam. Mas fale logo, o que quer?

— Tem razão. — Passou a mão sobre a nuca, levemente sem jeito, no entanto, rapidamente consertou a postura, tentando se manter firme mesmo com o olhar de Jungeun preso em si. — Eu preciso de sua ajuda, sei que tivemos algum tipo de desavença, não sei bem como classificar isso, porém...

Mais uma risada ecoou pela sala já vazia, deixando Sooyoung confusa sem saber se continuava a falar ou não.

— Fiquei sabendo que você foi expulsa do tal clubezinho, mas não esperava que viesse até mim. — O balançar descrente da cabeça de Jungeun desconcertou a Ha, que naquele momento, crucificava-se pela ação impulsiva, deveria, ao menos, ter esperado um pouco para se acalmar e criar um roteiro do que falar. Ela deveria saber o quão imprevisível era a Kim.  — O que foi? Não me olhe dessa forma como se eu não tivesse falado o óbvio, a fofoca voa, ainda mais quando envolve uma pessoa do tão famoso e querido Good Kids Club. — As últimas palavras recheadas de uma pura ironia, que fazia anos que Sooyoung não ouvia, aparentava divertir a Kim.

Lá estava ela em sua pior versão, pronta para jogar sal nas feridas expostas.

— Sabe o que é mais engraçado? Que agora que perdeu a mão protetora e se encontra totalmente perdida, vem atrás de mim como se eu fosse a salvadora da pátria, mas, antes, me olhava com desprezo sempre que eu abria a boca para “reclamar” sobre o que estava e está acontecendo nesse colégio, os únicos momentos que eu parecia existir. Então, me deixa pensar o que te traz até aqui.

Uma das mãos saiu do bolso para segurar o queixo, em uma típica posição de quem pensava. Contudo, a satisfação em seu rosto era o que Sooyoung precisava para saber que as palavras já estavam na ponta da língua. Quem sabe, para Jungeun, existia algum tipo de prazer na situação? Ter uma ex-membro do Good Kids Club atrás de si, querendo sua ajuda, ótimo ampliador de ego.

— Se sente mal por estar sendo excluída e não participar das aulas? Por ninguém olhar para si? Por não ter mais ninguém ao seu lado? Por não poder se esconder naquela biblioteca? Tudo isso e mais um pouco? Por isso, vem até mim, querendo que montemos um grandioso plano para colocar tudo para baixo? — Embora quisesse, Sooyoung não pôde conter a vontade de desviar das íris escuras que tanto brilhavam, invadindo sua alma e bagunçando o que existia por lá. — Pelo seu olhar, acho que consegui te ler muito bem. Não escutei suas palavras, mas já adianto, não vejo verdade nelas. Por isso, te dou minha resposta, não irei te ajudar.

“Mesmo estando na biblioteca presente na parte destinada ao clube, Sooyoung conseguia ouvir traços de uma desordem, possivelmente, nas redondezas do local. Olhou em volta, notando que os ali presentes compartilhavam a mesma feição que si, uma mistura de confusão com curiosidade. Por isso, fechou o livro que lia, deixando sobre a mesa para marcar lugar, andando em direção ao som em seguida.

A cada passo que dava em direção a sala de descanso, o barulho ficava mais alto. As vozes se misturavam, formando uma irritante harmonia e impossibilitando que a Ha descobrisse o que estava acontecendo. Pelo horário, o vai e vem ali era esperado, no entanto, a pequena roda a sua frente demonstrava que algo estava errado, parecia o típico amontoado de alunos quando uma briga acontecia, mas raras eram às vezes que isso ocorria no colégio, principalmente na área do Good Kids Club.

A curiosidade poderia ser considerada um defeito para muitos, mas Sooyoung preferia a levar como uma fonte vital para o adquirir de conhecimento, se não fosse pela curiosidade de tentar, de saber o que aconteceria ou o porquê de existir, não estariam onde estão. Dessa forma, por que não levar para outro lado da vida? Ter uma certa curiosidade sobre as pessoas ao seu redor facilitaria na hora de a ler, de saber o que gosta ou não, saber seus pontos fracos e feridas. Seria como ter uma vantagem.

Aproximava-se ao desviar de um ou outro colega, a mente borbulhando em hipóteses das razões da bagunça, torcendo para que nenhum funcionário chegasse para colocar ordem no local. Logo ao chegar no ponto central, fixou nos cabelos loiros mesclando com os pingos avermelhados no rosto.

Sooyoung facilmente conseguia saber quando Jungeun estava com raiva. O corpo voltado para frente em posição de ataque, olhos fixos na movimentação próxima a si, canto dos lábios levantados em um sorriso debochado, porém confiante ela podia até perder a briga, discussão ou qualquer que seja, mas a Ha compreendia que, dentro de Jungeun, esta se achava a certa na situação, até porque, ninguém em sã consciência entraria em tantos conflitos sem uma convicção por trás. E era dessa maneira que a Kim se portava no momento.

Sooyoung era curiosa, porém não o suficiente para entrar no olho no furacão, por isso, posicionou-se atrás de um menino um pouco mais alto que si, assim podendo tanto escutar o que estava acontecendo quanto se proteger de qualquer movimento brusco.

— Jungeun, eu já cansei de te pedir, mas irei fazer mais uma vez e espero que seja a última. — Hyunjin passou a mão pelo cabelo, parecia cansada, contudo não ao ponto de desistir do que queria. — Por favor, se retire, você sabe que não pode ficar aqui.

— Por que não, Hyunjin? Só porque é presidente desse clubinho acha que pode mandar em mim?

— Ela não está mandando em você, apenas pedindo o óbvio. — Uma voz feminina ecoou pela multidão.

— O que é óbvio? Que vocês se acham tão superiores que precisam de um lugar próprio para se isolar do resto do colégio? — Jungeun respondeu no mesmo tom, para que independente de quem seja aquele que tivesse falado anteriormente pudesse sentir o peso de suas palavras. — Porque se for, também acho que isso é óbvio.

O ar preso em sua garganta, a mão apertando firmemente a ponta da camisa do uniforme. Como ela poderia afirmar com tanta certeza algo tão equivocado? Todos esses prestígios que recebiam era uma forma de recompensa, nada mais do que isso, se tanto lhe importava, se tanto os queria, deveria se esforçar para entrar no clube, nada além disso.

Em outras circunstâncias, por Jungeun estar sozinha, facilmente ela poderia ser tirada dali, contudo se envolver fisicamente ou forçar uma saída da Kim poderia ter suas consequências para os membros do Good Kids Club. A melhor alternativa era torcer para que as palavras fossem suficientes para que Jungeun saísse por conta própria.

— Sabe que assim como qualquer outro é bem-vinda no clube — Hyunjin apertava os lábios firmemente, supostamente contando mentalmente para manter a postura. Sooyoung não fazia ideia de como a mais nova conseguia se comportar tão perfeitamente. — Caso queira conhecer o local para ter como incentivo para melhorar as notas e sua postura aqui no colégio, posso te acompanhar, esquecendo de tudo o que aconteceu, caso contrário, por favor, se retire. Está atrapalhando quem quer estudar.

— E julga que eu não estudo? — Riu, balançando a cabeça. — Você, por ser a presidente do clube, sabe muito bem que meu nome estava na lista de possíveis membros, mesmo com todo esse “mau comportamento”, não vem com essa. — Umedeceu os lábios, possibilitando que um largo sorriso surgisse enquanto descansava as mãos na larga jaqueta que utilizava. — Quando estiverem do outro lado, vão saber do porquê disso!”

E, observando Jungeun sair da sala com sua postura em uma junção de teimosia e confiança, Sooyoung sabia dos motivos.

...

Alguns dias se passaram desde a expulsão e ainda não contou para seus pais sobre o ocorrido, por mais que soubesse que não brigariam ou ficariam chateados consigo. Esperar para a suposta ajuda de Jungeun era o mais viável, embora não tivesse a mínima ideia do que faziam, caso a loira aceitasse participar. Dias que não foram suficientes para acabar com os pensamentos confusos que faziam moradia na mente de Sooyoung, causando-lhe, às vezes, dor de cabeça.

Sentada no pequeno banco localizado em frente a uma grande janela de seu quarto, Sooyoung mirava o céu em tons escuros que proporcionava que o clima se tornasse ainda mais lamentoso, ainda não se passava das quatro da tarde, lembrava da notícia de que, devido ao encontro de Júpiter e Saturno, já estando em noventa e cinco por cento, logo a Lua se encontraria cada vez mais escura, consequentemente, inabitável. No entanto, deixava essa preocupação para os cientistas, astrônomos ou quem quer que fosse o responsável por estudar o caso. Se em alguns meses ou anos não pudesse viver mais aqui, teria que aproveitar o tempo que lhe resta.

Porém, após focar exclusivamente nos estudos, o mundo que se abria era completamente novo. Agora não tinha mais que suportar a constante procura à perfeição, com as roupas milimetricamente arrumadas, notas altas, escondendo todas as suas imperfeições, sem o peso das falsas amizades que não estavam ao seu lado quando não precisavam, sem a obrigação responder todas as questões de maneira correta ou procurar aparecer durante as aulas para que o professor evidencie a sua inteligência.

Considerando esses pontos, até que ser expulsa do clube apresentava suas vantagens: poderia agir da maneira que lhe convém e agrada, claro que não fugindo muito da linha, já que se tratava do último ano do ensino médio, porém o fato de ter toda a pressão imposta pelo clube tranquilizava a Ha.

Por outro lado, o colégio não poderia continuar desta maneira. O que era para ser apenas um incentivo para que os alunos se esforçassem mais nos estudos, virou um meio de separação, causando desprezo entre os demais e aqueles que dele participavam, com regras rígidas supervisionadas ao máximo. Uma relação que passou para os funcionários da instituição, focando somente nos membros do clube e, quase que, apagando a existência dos outros.

Parecia que quanto mais tempo se passava, mais razão Jungeun possuía. Nomes de alunos fora do clube só eram chamados quando se metiam em confusão, o que não era tão comum, visto que muitos já estavam cansados de esperar por mudanças que nunca vinham. Por essa razão, que anteriormente não sabia dos nomes das amigas da Kim, Cho Haseul e Jung Jinsoul, estas, assim como outros, encontram-se conformadas com a situação, porque independente do que acontece sempre estão errados.

Uma mudança de pensamento muito radical para pouco tempo. Contudo, devido às circunstâncias, difícil seria não pensar desse modo.

Sooyoung não era mais ouvida, parecia que toda a voz que tinha quando fazia parte do clube havia sumido por completo, seja pela atenção dos professores para tirar uma dúvida, os horários de conversa com o diretor, uma alimentação melhor durante o intervalo, simplesmente sumiu, como se ela tivesse se tornado somente uma formiga a mais no formigueiro.

Além disso, não poderia esconder a vontade de se vingar. Acabar com a folia da mesma forma que fizeram com a sua, ainda mais nesse momento por entender completamente o que acontecia entre as paredes do colégio, seria incrível ter essa oportunidade. Todavia, não tinha certeza se conseguiria fazer isso sozinha, ela não era tão confiante e destemida para falar o que pensava e, acima disso, agir, mesmo sem qualquer apoio, como Jungeun.

Falando no pequeno demônio de cabelos loiros, Sooyoung continuava a rebobinar a pequena conversa que tiveram, se poderia chamar aquilo de conversa. Realmente, tendo suas observações sobre a Kim, foi burrice tentar uma aproximação sem preparar o terreno, seja em relação ao que falar ou quebrar um pouco dos julgamentos que ela tinha sobre si. Da mesma maneira que deveria fazer com ela.

Mas não negaria que esses primeiros passos pareciam ainda mais difíceis do que as provas semestrais feitas justamente para abaixar a média dos alunos menos preparados.

Sooyoung queria ter, ao menos, uma parcela do que antes possuía, seria o mais justo. Jungeun já tinha uma experiência em bater contra o sistema, seriam a dupla perfeita, entretanto as barreiras entre as duas dificultavam a construção de qualquer plano.

Se não consegue o que deseja de primeira, tente por caminhos alternativos que ainda te leve para o local almejado. Mas quais caminhos eram esses?

Poderia tentar conquistar as amigas de Jungeun para descobrir mais sobre a loira, uma aproximação progressiva e natural, mas não tinha a sua disposição tanto tempo assim. Escrever uma carta detalhando o que pensava e queria também era uma opção, porém Jungeun não parecia ser do tipo de pessoa que se importava com cartas, poderia jogar no lixo assim que a visse sem dar uma olhada sequer no conteúdo. Pedir para conversar com ela, como da última vez, também era uma boa, mas antes deveria aprender a se manter firme mesmo com as palavras da Kim.

Os primeiros passos realmente são os mais complicados.

Uma arfada de ar escapou dos lábios de Sooyoung, frustrada andou em direção ao espelho, encarando o seu reflexo. A imagem que via parecia menos cansada comparada a dias atrás, sem motivos para ficar até tarde acrescentando informações a matéria dada pelos professores ou responder corretamente todas as questões, as horas de sono se tornaram maiores e havia concluído alguns livros encalhados na estante por tantos meses.

Se, de uma forma ou de outra, lhe foi dada a oportunidade de viver nesse “novo mundo'', deveria saber o que gostaria de aproveitar. Por isso, fechou os olhos, possibilitando que a mente trabalhasse em sua própria utopia.

Ela queria se sentir confortável com seus erros, ter o bater do coração mais forte por esquecer alguma lição de casa, correndo rapidamente para o fazer antes do professor escolher alguém para responder às perguntas. Queria evidenciar que não sabia sobre tudo, que não tem a necessidade de estar sempre certa, pois geralmente não estava. Mostrar ser humana e não uma máquina perfeita. Poder usar algo além das estranhas blusas de frio que sua mãe lhe comprava, somente para se encaixar aos demais. Queria amigos.

A regra implícita, mas quase direta, de conversar apenas com membros do clube ou aqueles que estão próximos de entrar, restringe a se aproximar daqueles que podem trazer algum tipo de benefício, seja ajuda na matéria, prova em conjunto, estatutos e interesse. Isso é amizade? “Você é legal porque você realmente é legal ou por que você precisa de algo?” Kahei virou as costas para si assim que saiu do banheiro, e, embora soubesse que não poderia considerá-la como além de colega próxima por interesse, ainda doeu.

Continuava a prestar atenção nas aulas, porém não de uma forma excessiva, assim, durante o período em que se encontrava mais desatarefada, preferia observar, discretamente a relação de Jungeun com suas amigas. O compartilhamento de fones de ouvido, as conversas pelos bilhetes, os olhares que diziam mais do que qualquer palavra, as risadas abafadas durante o horário de um conteúdo mais cansativo. Leve, natural, bonito.

Talvez tentar uma aproximação quando as três tivessem juntas fosse a melhor alternativa. Expressando-se na presença de Haseul e Jinsoul, por mais que Jungeun continuasse a negar a ajuda, poderia fazer com que elas acabassem conversando o assunto fora da presença da Ha, e, na melhor das hipóteses, concordasse em trabalhar em conjunto com a Ha.

— Sim, é isso. Agora tenho que pensar e praticar o que vou falar, preciso me preparar.

O nervosismo era tamanho que sentia vontade de roer as unhas como maneira de o liberar. Internamente, podia-se ouvir o tic-tac do relógio, longos segundos para o início do intervalo. Mesmo treinando por todo o final de semana o que deveria ser falado em conjunto com as possíveis respostas para as indelicadezas de Jungeun, a Ha ainda não se sentia confiante o suficiente, acreditava que, quando mais precisasse, o roteiro se tornaria páginas em branco.

Teria em torno de vinte minutos para tentar uma conversa amistosa e apresentar para elas a proposta. Poderia segui-las pelos corredores do colégio até o local que passavam esse horário, mas acreditava que seria bem pior. Se colocando no lugar delas, não ficaria nada confortável com alguém te seguindo e ainda invadindo o seu espaço para uma simples conversa, realmente seria estranho. Então, o que deveria ser feito era se aproximar enquanto continuavam na sala de aula, não demoraria muito para ela esvaziar, poderiam conversar sem receio.

Agir no impulso da última vez não deu certo, porém, escutando o sinal tocar, foi impossível não andar até Jungeun.

— Mais uma vez, gostaria de conversar com você — disse Sooyoung, assim que colocou a mão sobre a mesa bagunçada da Kim, olhando para Haseul e Jinsoul em seguida. — Com vocês, se possível.

— Pensei que tinha sido clara o suficiente, Sooyoung. — Jungeun tirou um pirulito do bolso da jaqueta, colocando em seguida na boca após remover o plástico protetor.

— E foi, não posso negar, mas pensou que iria desistir tão fácil? — Levantou uma das sobrancelhas, segurando um sorriso ao ver um certo desconcerto no rosto alheio. — Vocês escutam o que tenho a dizer e podem ir embora, não preciso de uma resposta imediata.

— E tem a ver com o quê? — Jinsoul perguntou, enquanto puxava uma das cadeiras na proximidade, sentando-se em seguida.

— Como vocês devem saber bem, fui expulsa do clube e, de certa forma, queria me vingar. Antes de qualquer coisa, deixe que eu seja mais clara. — Sooyoung ter cuidado para esclarecer os motivos era extremamente importante, não podia deixar que elas pensassem que agia desse jeito apenas por egoísmo. — Não irei mentir dizendo que não tem uma parcela de interesse próprio, claro que tem, gostaria de tirar deles da mesma forma que tiraram de mim. Mas não é só isso...

— Não vai me dizer que quer “acabar com tudo isso porque agora sabe o que passam nesse colégio”? — Haseul se intrometeu, acertando na leitura da proposta de Sooyoung.

— Para ser sincera, é isso. — Era a hora.

Como um anti-herói que age por conta própria, seguindo suas ambições e deslizes, contudo, nesse contexto, não se tratava de ter um caráter duvidoso, apenas dependia de quem observava suas ações. Jungeun poderia ser considerada um símbolo de resistência dentro do colégio pelo jeito que se impõe, porém, existia o seu lado egocêntrico. O sentimento de prazer ao ser usada de exemplo para aquele que concorda com suas ações, satisfação por ser a causa da dor de cabeça para aqueles que não suporta.

Quem não gosta de ser engrandecido, não é mesmo? Ter seu nome espalhado pelos corredores. Ser o pesadelo dos professores e coordenação. Causar receio nos membros do clube. Isso aumentava o seu ego. Estar na linha tênue entre a existência e invisibilidade, poderia ser benéfico quando se sabia jogar o jogo, Jungeun sabia quando usar isso ao seu favor e Sooyoung estava prestes a fazer o mesmo.

— Sempre observei as ações de Jungeun questionando os seus motivos, porque para mim não fazia sentido. Claro, eu possuía o que vocês almejavam por direito, porém na minha perspectiva vocês não mereciam, pois não faziam parte do clube. Agora, não fazendo mais parte, percebo o quão errado está.

As feições sérias e olhos fixos em si, o sinal esperado para continuar com o plano. Atenção adquirida, sua vez de tocar nas feridas ao mesmo tempo em que o ego seria inflado, sem esquecer das possíveis ações para se concluir o almejado.

— Não sei se sabem, mas fui eu quem deu a ideia de criar o clube. Se compararem a ideia inicial com o que se tornou, perceberam o quanto se diferem. Logo iremos sair do colégio, possivelmente não sentiremos grandes mudanças, mas temos que considerar os benefícios a longo prazo. Então, talvez seja um pouco tarde, mas gostaria de dizer que você tem razão em fazer toda essa confusão, Jungeun, seja confrontando os professores, seja tentando entrar na parte reservada ao clube.

— Você fala engraçado, toda conceitual, mas saquei — Jinsoul comentou, rindo levemente.

— Confessar essas coisas é muito difícil, imagino como todo esse tempo no clube fez com que seu orgulho crescesse exageradamente, então, de coração, aprecio suas palavras. — Não estava em seu roteiro essa reação, porém possibilitou que suas maçãs do rosto fossem evidenciadas diante o levantar dos cantos de seus lábios. Parte feliz com o elogio de Haseul, parte satisfeita por estar quebrando mais uma barreira. Um ponto a mais para Ha Sooyoung.

— Penso que trabalhando juntas poderíamos causar mais do que uma simples desordem.

— E o que está passando nessa caixola? — Jinsoul cruzou as pernas, ajeitando a postura como se demonstrasse que estava disposta a ouvir a proposta da Ha.

— Tanto o clube quanto a coordenação foram tomando conta sem nenhuma ação grande que os impedissem. E chegou a um nível que nem mesmo o clube consegue se impor às ações do colégio. Foi por isso que fui expulsa, fui contra a mudança de líder que a direção pediu. — Comprovar que, mesmo no fundo e de forma implícita, possuíam pensamentos parecidos. Ótimo método de conquistar a afeição alheia. — Suas ações são boas, Jungeun, mas você não vai conseguir acabar com o que deseja sozinha. Por isso, estivesse pensando, e se não juntássemos o máximo de pessoas possíveis para pressionar o colégio?

— Com certeza têm mais pessoas que querem mudar essa situação, só que não fazem por acharem que não vai dar em nada, já que não somos ouvidos. — A Cho pontuou, provavelmente questionando a ideia de Sooyoung, mas ela já esperava por isso.

— Mas a partir do momento em que essas pessoas virem que outros estão correndo atrás do seu direito, também sentirão vontade de fazer o mesmo.

— Faz até sentido, efeito bola de neve.

— Tá bom, supimpa, mas como quer juntar esse pessoal? Sair conversando com geral vai dar trabalho e ainda chamará atenção da chefia. — Mais uma pergunta que Sooyoung preparou a resposta anteriormente, alegrando-se pelo rumo da conversa estar seguindo o esperado.

— Podemos espalhar panfletos nos banheiros ou regiões que têm uma maior concentração de pessoas, nunca saberão quem foi e ainda se espalha rapidamente. — Jinsoul balançou a cabeça, ponderando sobre as palavras.

Haseul perguntou: — Aqueles panfletos que usam diferentes tipos de letras recortadas de revistas, certo? — Sooyoung assentiu com a cabeça, sorrindo com a animação das duas. No entanto, Jungeun continuava calada em seu próprio mundo.

— Resolvemos essa questão do panfleto, o que falar, onde colocar, etc. Posso chegar mais cedo e os espalhar onde julgarmos ser os pontos estratégicos, não moro longe daqui. Depois é esperar alguns dias para a notícia se espalhar e ir agindo conforme a reação das pessoas, possivelmente existe a possibilidade dos integrantes do clube ou até mesmo a coordenação, mas, como você falou anteriormente, Haseul, vão supor que não vai dar em nada. Não será problema.

— E o que quer fazer depois disso? Ir chorar para a coordenação que eles acabem com o clube? — Uma gargalhada ecoou pela sala, Sooyoung se segurou para que mais risadas não escapassem, era a sua vez de rir em descrença do que ouviu, deixando as outras três confusas.

— Posso não ter tantos planos, isso eu não nego, porém, algo imaturo assim, nunca passou pela minha mente. E se fosse, pensa que eu pediria sua ajuda? — Pendeu a cabeça para o lado, encarando as íris escuras de Jungeun. — Não viria conversar com vocês por algo assim e, acredito, que saiba disso. — Cruzou os braços, sorrindo. — Espero mais, que use todo o renome que construiu para parar o colégio.

— E começar uma pequena revolta? — O corpo inclinou para frente, aproximando-se da Ha. Olhos brilhando como as estrelas residentes no infinito preto, criança recebendo o melhor presente de aniversário, a notícia tão esperada, Jungeun se encontrava satisfeita com o que escutava.

Um belo desafio, e, ao se deparar com um de tamanha magnitude, a Kim não iria parar até conseguir.

— Bem, se assim quiser chamar!

...

Os intervalos dos dias seguintes foram destinados à criação do plano, então, obrigatoriamente, a Ha teve que se enturmar com as outras três, surpreendendo-se como o clima entre elas se diferenciava daquele que a envolveu enquanto fazia parte do Good Kids Clube.

Ao receber um bilhete com caligrafia fofa de Haseul, dizendo que iriam se encontrar em uma das salas vazias do segundo andar, zona sul, para conversarem mais sobre o assunto, Sooyoung passou o restante da aula criando suposições do quão desconfortável seria, contudo, depois de passar na lanchonete e ir até à sala destinada, a feição de surpresa foi evidente ao encontrar uma mesa, que anteriormente deveria ser utilizada por um professor, e em sua volta quatro cadeiras.

Uma situação simples e, quem sabe, intencional, visto que Sooyoung precisava se sentar, entretanto, se sentia bem com a possibilidade delas quererem verdadeiramente a sua presença ali.

Haseul e Jinsoul diariamente se esforçavam para não deixar um clima estranho, perguntando sempre sobre as opiniões da Ha e algumas situações que aconteciam quando estava no clube, a Ha não sabia se, de fato, era devido ao plano, como diziam ser, ou para sanar as curiosidades que tinham a respeito, mesmo assim, respondeu sem receios. Jungeun, por longos dias, continuava a ficar mais reservada, sua voz normalmente aparecia quando as perguntas eram destinadas a sua pessoa ou não concordava com o que era falado. Mas Sooyoung preferiu não se importar, muito menos forçar uma simpatia por si, talvez Jungeun enxergava como um “trabalho” e nada além disso.

No entanto, a Ha notou que a distância imposta por Jungeun existia por causa da sua própria personalidade; mais reservada, atentando-se às pessoas à sua volta para ter a certeza de que poderia, realmente, se abrir. Cada pessoa apresentava uma maneira diferente de se proteger, sobretudo abaixava os escudos para mostrar a verdadeira personalidade, e essa era a maneira da Kim.

Era interessante lidar com diversos jeitos de enxergar a vida, e a Kim possuía um que a atraía: saber o momento certo de correr, parar, gritar ou se calar, a capacidade de auto-aceitação e auto-consciência – jamais a viu agindo para agradar um outro alguém –, vestindo-se da maneira que se sente confortável, que a faz bem, uma resposta do que existe dentro de si e não daquilo que querem que seja. Sooyoung a via como um exemplo, pois, estava acostumada a aceitar situações que não lhe agradava, por outro lado, Jungeun não tinha nenhum problema de expressar o que sentia ou queria.

Esperava que um dia conseguisse ser como Kim Jungeun.

Com isso, essa tal convivência forçada fez com que, cada vez mais, Jungeun começasse a se abrir. Ações simples, como aparecer mais durante as discussões, comentar despretensiosamente sobre um acontecimento da noite anterior enquanto a Ha estava junto, compartilhar o fone dizendo gostar muito da música tocada, tendo vezes que até perguntou sobre a matéria.

Porém, teve um ato que, ainda, não saia da mente de Sooyoung.

Por acordar completamente atrasada, Sooyoung saiu às pressas de casa, não se preocupando em se arrumar além do pedido pelo colégio, uniforme e tênis, com certeza chegaria desarrumada por ter que correr todo o trajeto, então não faria diferença.

Divertido eram os passos largos, ziguezagues entre as pessoas em seus caminhos próprios enquanto o vento bagunçava o cabelo, a adrenalina fazendo o coração bater mais rápido, embora afastasse os pensamentos de que poderia ter que esperar o término do primeiro horário fora da sala se chegasse depois do professor, gostou da sensação de estar no prazo limite.

Principalmente diante o contentamento que a acertou em cheio quando limpou as gotículas de suor presentes em sua testa ao jogar a mochila na sua mesa. Uma euforia maior comparada ao concluir as metas do dia, a emoção era outra.

— O que é isso? Sooyoung atrasada? — A Ha olhou em direção da voz, vendo Haseul sorrindo para si. — Acordou atrasada, foi? — Logo, Jinsoul e Jungeun repetiram a ação, provavelmente achando graça do estado que ela se encontrava.

— Fiquei até tarde pensando no que poderíamos fazer, e, ainda por cima, esqueci de ajustar o alarme. — Jogou o corpo na cadeira, arrumando rapidamente os fios rebeldes com a ponta dos dedos. — Acordei tarde sendo um poço de cansaço.

— E comeu alguma coisa?

— Não, Jinsoul, não tenho o costume de comer assim que acordo.

— Que bom! Porque euzinha não aguentaria ficar sem comer.

— Não aguenta mesmo, se fosse ela em seu lugar, Sooyoung, chegaria aqui, deitaria no chão e teríamos que ficar passando alguma comida em seu nariz para tentar acordá-la. — Jungeun zombou da amiga que deu de ombros, voltando a atenção para a barra de cereais presente em sua mão, por mais que não fosse exagero. — E conseguiu pensar em algo? — Jungeun completou a fala, olhando para Sooyoung.

— Sim e não — suspirou, correspondendo o olhar. — Sim, consegui, mas nada que passará pela complicadíssima banca de avaliação, vocês no caso.

— E ainda reclama. Você está no lucro, mulher, cheguei em um nível que nem pensar mais eu consigo. — Sooyoung gargalhou do comentário da Jung, porém não pode responder, pois, a professora havia chegado na sala fazendo com que cada uma fosse para o seu lugar.

Lentamente, com o passar dos minutos, o corpo de Sooyoung ia se esvaziando de toda a adrenalina gerada pela corrida, consequentemente, o calor adquirido deu lugar a pequenos tremores na tentativa de se livrar do frio que cercava. Xingando-se mentalmente por não ter se lembrado de pegar a blusa de frio.

Sentia o eriçar dos cabelos em uma rápida resposta de seu corpo para se aquecer, porém, nada o suficiente para se sentir mais confortável. Assim, tentou focar na aula para esquecer do vento gélido que entrava pelas janelas da sala.

No entanto, uma bolinha de papel caiu sobre seu caderno, olhou em volta rapidamente, encontrando uma Jungeun fazendo movimentos estranhos com a mão aparentando que queria que Sooyoung desfizesse a bola. Ao abri-la, um sorriso escapou fixando a caligrafia torta em tinta preto.

“Tá parecendo uma vara de bambu de tanto que treme.”

Rapidamente pegou sua caneta roxa e respondeu antes de jogar, cuidadosamente, a bolinha na cabeça de Jungeun. Ou não tão cuidadosamente assim.

“Esqueci minha blusa em casa, saí com muita pressa, não queria perder o primeiro horário.”

“Não perdeu o horário, mas está quase morrendo de hipotermia.”

“Quanto exagero, apenas estou com frio, nada mais.”

“Quer minha jaqueta? :)”

A proposta repentina acaba com qualquer suspeita do que Jungeun queria com a conversa. Embora sejam palavras escritas, Sooyoung sentia que não eram vazias, existia alguma preocupação inesperada com o seu bem-estar, empatia genuína que a fazia passar o polegar ao longo de todo o pedaço de papel amassado. Jungeun assemelhava-se a uma caixa de surpresa, por mais que tivesse todas as possíveis reações e ações anotadas em sua mente, ela sabia como surpreender.

“Não ficará com frio?”

“São duas. estou com uma blusa de frio fina por baixo, então não irei.”

“Tem certeza?”

“Melhor dividirmos do que você morrer de frio :p”

“Tudo bem, eu aceito. Obs: não sabia que usava essas carinhas, gostou? ;)”

“Achei fofo, não era algo que esperava, mas até que combina com você irei usar mais então :3”

A jaqueta jeans trouxe uma atmosfera relaxante, livrando-a dos rápidos tremores e trazendo o aroma semelhante à flor de laranjeira”.

Sooyoung sempre escutou que duas cabeças pensam melhor do que uma, no entanto, quando se travava das quatro mentes completamente diferentes, o resultado demorava ainda mais para chegar, uma vez que raramente chegavam em um consenso.

Sooyoung dava uma ideia, Jungeun negava, em suas palavras ainda eram certinhas demais. Haseul compartilhava um caderno com palpites, Jinsoul dizia ser muito complexo. Jungeun resolvia apresentar parte dos pensamentos obtidos durante a aula, Haseul concordava em parte, virando uma confusão por nenhuma das duas concordarem nas mudanças feitas. Jinsoul soltava sugestões soltas e sem informação, mas só a sugestão em si era o bastante para as outras negarem.

A solução, depois de muito pensar, foi fragmentar cada proposta dita anteriormente, menos as de Jinsoul, não estavam dispostas a se envolver em um problema ainda maior, formando um roteiro do que deveria ser feito.

Cinco metas divididas em prazos relacionados ao tempo que julgavam ser necessário para o seu comprimento. As primeiras seriam as mais demoradas, primeiro porque teriam que esperar a uma quantidade considerável de pessoas para partir para as duas últimas, segundo que precisavam, cuidadosamente, preparar o terreno para o que estava por vir. Sooyoung queria resultados, Jungeun não era acostumada a agir seguindo um esquema, porém renunciar algumas coisas era o mais considerável para o momento.

Decidir sobre os panfletos foi a parte mais fácil. Mesa suja de recortes de revistas velhas, mãos com resquícios de cola, papel branco se mesclando às cores diversas das letras, três versões diferentes com o mesmo texto foram montadas durante o intervalo. “Se os acontecimentos dentro deste colégio envolvendo o Good Kids Club gera qualquer tipo de revolta, amarre uma fita roxa em seu pulso pelo decorrer da semana.”

Espalhá-los pelo colégio enquanto se escondia como um projeto de espiã para não trazer suspeitas foi divertido. Antes mesmo do primeiro sinal, existia pilhas de cópias dos panfletos originais por todo colégio, escondidos em lugares para que os funcionários não tivessem acesso. Elas sabiam que qualquer aluno teria a chance de encontrar o papel, no entanto, também sabiam que por ser uma simples ação, nenhum membro do clube se importaria com isso.

Estavam mais preocupados em manter seu mundo perfeito.

No primeiro dia após a exposição dos panfletos, Sooyoung não utilizou a fita, um combinado entre elas para que, se ninguém aparecesse usando, parecesse um ato programado por Jungeun, o que não seria nada fora do comum. Entretanto, a feição de admiração ao ver o mar roxo se sobrepondo ao dourado.

Nada além das fitas, não escutou nenhuma conversa sobre o assunto ou perguntas de quem estava por trás do suposto projeto, como se os próprios alunos criassem um acordo de se manterem calados até segundas ordens.

O objetivo era usar o restante da semana como base de quantas pessoas tinham o mesmo pensamento que elas em relação ao grupo, e era evidente a insatisfação com o colégio, estavam prontos para a segunda meta. “Para o colégio somos invisíveis, então mostre que não é verdade, grite da forma que mais os incomoda: participando das aulas.

Para Sooyoung era fácil, tinha o conteúdo em dia, apresentava até um caderno que escrevia as dúvidas enquanto revisava o assunto trabalho em sala para pesquisar em livros didáticos em outro momento. Então, para facilitar a vida de todos, Jungeun copiou algumas e compartilhou para aqueles que apresentavam interesse em participar das aulas ao mesmo tempo que outros faziam por conta própria.

Assistir de camarote a imposição dos colegas de turma enquanto os professores, lentamente, não conseguiam mais impedir que suas vozes ecoassem pelas salas, agradava-a.

O que não imaginava era que essa segunda parte do plano se tornasse além de simplesmente incomodar os professores, notou que boa parte de sua turma aparentavam estar mais interessados nas explicações dos professores, sem o foco no celular ou no pequeno inseto que vagava pelo chão.

A terceira meta seria um pouco mais complicada, porém Sooyoung sabia que também conseguiriam concluí-la sem grandes problemas. “Eles têm acesso a um lugar para descansar, mas por que nós não podemos usar também? Sempre quis ter acesso às máquinas de alimentos e vocês?”

— Já coloquei os panfletos nos mesmos lugares de sempre, mas como isso vai acontecer? Não dá para todo mundo entrar lá de uma vez — Haseul falou, mordendo um pouco do sanduíche natural da Jung, recebendo um olhar raivoso em troca, por essa razão, mordeu novamente.

— Sem coração, mas com razão — respondeu Jinsoul, enquanto encarava as duas marcas de mordidas.

— Querendo ou não, Jungeun se tornou a líder, então ela poderia conversar com uma pessoa de cada turma para que estipulassem que vai em que momento, quem vai depois e assim sucessivamente.

— Acho uma boa ideia, Sooyoung. — Esta que encarou Jungeun desacreditada com o que ouviu. — O quê? A ideia foi realmente boa. — Virou o rosto, quebrando o contato com a Ha.

— Sabe qual o melhor horário para invadirmos a sala de descanso, Sooyoung?

— Possivelmente uns quinze minutos depois do término da aula. Seria o tempo para se iniciar a reunião, caso tenham, e as pessoas se acomodarem na biblioteca que também existe por lá, se não tiverem nada.

— E se pegarmos um pessoal de cada sala, ou só de algumas mesmo. Eles dão um migué no professor, saem um pouco antes do intervalo e se reúnem nesta sala? — As três encararam Jinsoul, chocadas com o que acabou de falar. — Má ideia? — perguntou, terminando com o sanduíche.

— Pelo contrário, ótima ideia.

Assim foi feito, com o primeiro grupo decidido, cabia esperar para que escutasse os efeitos entre os rumores do colégio. Jungeun não acompanhou o grupo no intuito de mostrar que não era apenas ela que apresentava insatisfações, mas os alunos que se ofereceram a ir diziam não sair dali até o momento em que o sinal tocasse sinalizando a hora de voltar para as salas.

Naquele determinado dia, preferiram se juntar na parte de trás da sala em que estudavam, conseguindo conversar com o colega de turma que decidiu se juntar ao grupo antes que a professora do horário chegasse.

Sem interesse na conversa de Haseul e Jinsoul sobre a sequência de um jogo desconhecido, Sooyoung percebeu o quão calada a Kim se encontrava. — Nervosa? — murmurou, somente para Jungeun escutar, não querendo atrapalhar a conversa das outras duas.

— Sei que o melhor era não ter ido, com certeza eles falaram a coordenação e o fato de eu estar no meio poderia prejudicar o plano — Os braços abraçavam as pernas, respondia sem manter contato visual com a Ha. —, mas não consigo não me sentir aflita, não sou alguém que espera que as pessoas ajam no meu lugar.

— Eu entendo e aprecio essa sua característica, mas não quer dizer que você precisa agir sozinha sempre. Saiba que não está deixando de fazer só porque não está lá, ainda mais quando se trata de uma situação em que você não é a única a se sentir tão desapontada e zangada. — Descansou a mão no ombro da Kim, depositando um rápido carinho ali.

— Acho que gosto de estar no centro das atenções. — Ela soltou o ar pesadamente. — No começo foi como uma resposta ao que guardava dentro de mim, uma ação impulsiva que gerou duas opiniões completamente diferentes. Uns me amavam por eu fazer o que não tinham coragem. Outros me odiavam por eu ser a pedra no sapato, assim dizendo. Mas com o passar do tempo...

— Também passou a ser uma questão de alimentar seu ego — interrompeu, recebendo uma confirmação de Jungeun. — Entendo como é.  O clube me fez ter uma rotina e um agir tóxico, porém, no final, estava tudo bem com isso, pois fazer parte do clube me diferenciava, como se eu fosse mais que os demais. Me aproximava de quem achava conveniente, ficava procurando incessantemente pela perfeição, ficava até mais tarde estudando para evidenciar a minha capacidade, aguentava as regras do clube. A pulseira dourada fazia tudo valer a pena.

— Estar longe do centro me faz ter a vontade de correr até lá simplesmente para colocar mais fogo no palheiro, principalmente porque sei que vão falar bem de mim. Não todo mundo, mas entendeu.

— Eu sei, por isso que, quando fui falar com você pela segunda vez, comecei a falar e engrandecer os seus feitos — confessou, rindo da boca aberta em choque. — No final, todos gostamos de ser evidenciados, cada um só faz da maneira que mais lhe agrada.

— Acho que tem razão.

— Eu sei. — Seu olhar direcionou a Kim que já tinha os olhos fixos em si, havia serenidade por trás de seu sorriso tão contagioso que Sooyoung se pegou sorrindo também.

Nenhuma das quatro participou ativamente da terceira etapa, isso porque algumas das pessoas que participaram da “invasão” a parte destinada aos membros do clube foram chamados para conversar com a direção. Por serem muitos, o diretor foi incapaz de punir todos, já que nenhum revelou quem era o líder ou líderes, somente advertiu na intenção de diminuir a presença de não-membros na sala de descanso.

Sem ao menos esperar qualquer panfleto ou comunicado, os alunos continuaram a utilizar a sala em especial no momento do intervalo. Reconheciam, desse modo, que logo poderiam partir para a última meta do plano. “Eles já sabem o que queremos, agimos seguindo nossos direitos, mas por que não deixar ainda mais evidente? Coordenação, se prepare para o nosso grito.

Sexta-feira, o dia escolhido. Dividiram-se para compartilhar o plano para, ao menos, uma pessoa de cada equipe. A direção e o restante da equipe da coordenação ficava no primeiro andar do colégio, um espaço razoável, porém pequeno para a multidão que dizia participar. Por isso, preferiam se resumir no pátio desde o primeiro horário.

Não subir para as salas. Continuar mesmo que a coordenação os repreenda. Cartazes feitos. Clamores treinados para comprovar seus posicionamentos. As palavras de Sooyoung iriam se tornar verdadeiras, iriam parar com o colégio.

No intuito de afastar os pensamentos intrusivos, a Ha preferiu chegar o mais tarde possível, pois sabia que presenciar a aglomeração de pessoas não iria fazer bem. Logo, passou pelo portão faltando poucos minutos para o início da aula, observando como o colégio se encontrava, presumivelmente, vazio, fazendo seu coração bater descompassado.

Todavia, parou de andar assim que passou pela porta que dividia o resto do colégio do pátio central. Pulsos refletiam em roxo, mochilas jogadas no chão, alunos espalhados pelo local esperando o momento para soltar a voz, cartazes prontos para serem levantados. Jungeun e a típica jaqueta correndo em sua direção e se jogando em seus braços.

O movimento inesperado a faz cambalear para trás, usando um dos pés como apoio para não ir ao chão. Flor de laranjeira invadindo seu nariz e desacelerando as batidas. — Você tinha razão, não preciso agir sozinha.

— Por que diz isso? — pergunta, no momento em que se afastou do pseudo-abraço.

— Olha em volta, preciso mesmo responder? — Sooyoung preferiu ficar calada. As estrelas reluziam acima de suas cabeças, o sorriso de canto em canto, o aroma de laranjeira, o calor humano a aquecendo mais que o moletom usado. — Sinceramente, não importa o que acontecer, se o clube irá deixar de existir ou se apenas algumas coisas iriam mudar, sei lá, não importa sinto que já conseguimos.

Olhando para o passado, Sooyoung relembrava de como seu dia a dia mudou completamente. Não apenas isso, como as mudanças que aconteceram internamente. Dar de cara com a invisibilidade foi como se tudo desmoronasse, perdeu a voz, que atualmente percebe que, quase não tinha, perdeu aqueles pequenos privilégios que, anteriormente, dava a vida para ter, porque eles a faziam se sentir importante, parte de algo maior e, talvez, melhor. Porém, depois da expulsão, ela era só mais uma, insignificante, visto não trazer nenhum benefício para o colégio.

Como se o limitador de visão que vestia tivesse caído e pudesse enxergar muito além do mundo perfeito que buscava, notando a diferença e a indiferença. Antes o clube parecia uma ponte, oportunidade, facilidade, contudo, sua verdadeira face estava ligada com a limitação, a uma faca de jardinagem podando os galhos, sua própria natureza.

Em contrapartida, a satisfação de estar mais leve se mesclava com a vontade de vingança. Sentia que precisava transformar o ambiente que estava inserida, um querer dividido em seu interesse próprio, revidando pelo que lhe foi feito, e a tentativa de acabar com a invisibilidade dos não-membros.

Fitando a aglomeração a sua frente, Sooyoung sentia o mesmo que Jungeun. Haviam conseguido, independente da razão de cada um presente, eles se juntaram na busca do bem-estar comum. Não se tratava somente em dar fim ao Good Kids Club, era sobre ter o tratamento que mereciam, sem exclusão, sentir-se parte do meio.

Fitando Jungeun presa em seus pensamentos, enquanto também observava a multidão, lembrou sobre a notícia do provável despovoamento da Lua, a necessidade de aproveitar o tempo que lhe resta foi sanada, pelo menos, no momento. Apesar de não saber como seria o amanhã, estava orgulhosa do que havia feito nas últimas semanas, um enorme progresso em sua vida. Feliz por encontrar pessoas com quem podia confiar, por saber que tinha forças para lutar por aquilo que acreditava, por quebrar as barreiras que um dia impôs em sua volta.

O som do sinal ecoou pela estrutura do colégio, possibilitando que as mãos de Sooyoung começassem a suar, particularmente, quando as íris escuras a miraram tão vivamente. Quente como nunca tinha visto anteriormente. Jungeun parecia em paz, como se fosse o seu momento particular. — Vamos, temos uma pequena revolta para fazer. — A mão macia procurou a da Ha, em um aperto singelo transmitiu a confiança que tanto precisava.

No primeiro momento, deixou que fosse levada pela loira, entretanto, antes de devidamente entrar no aglomerado, Sooyoung a puxou em sua direção, colando os corpos e trancando os olhos um no outro. O movimento fez com que o toque das mãos cessasse, agora as mãos da Kim se apoiavam nos peitos de Sooyoung, respirando apressadamente pelo susto, mas acabando com o sorriso.

— Obrigada — murmurou, antes de juntar brevemente os lábios em um toque singelo. — Vamos! — Não dando tempo de resposta, já tratou de juntar as mãos novamente e puxar a Kim entre os alunos.

Ali, e para ambas, o universo se tornou pequeno.


Notas Finais


A você que chegou até aqui, meus agradecimentos. Além de claro, um enorme "obrigada" a toda a equipe do Loonamoon, vocês são demais. Até a próxima!


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