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História Salvação - Sobre se quebrar em dois e doar a metade


Escrita por: girassoldegaveta

Notas do Autor



Capítulo 20 - Sobre se quebrar em dois e doar a metade


Fanfic / Fanfiction Salvação - Sobre se quebrar em dois e doar a metade

Taehyung despejou sobre a bandeja biscoitos recém-saídos do forno.

O aroma de chocolate libertou seu sorriso retangular, que logo foi acompanhado pelo doce repuxar de lábios de Seokjin. Sentiu-o bater os quadris e apontar para a sala de estar, onde Jeongguk e Namjoon brincavam com Gaeul.

O calor se apossou de seu peito.

Completavam pouco mais de um ano de casados e ele não poderia se sentir mais feliz, quase como se estivesse em paz com o universo que construiu.

Jeongguk era o melhor amigo, esposo e pai que poderia desejar.

Teriam passado por apuros nos primeiros dois meses de paternidade se não fosse pela ajuda de Haenim, Chohee e Eunseo. Não imaginavam que amamentar e trocar fraldas fosse algo tão trabalhoso.

Não se esqueceria do primeiro susto que o moreno tomara ao observar a fralda suja de Gaeul. Ele mal soubera movimentar os próprios dedos sobre a pele pálida do bebê, enquanto se livrava do conteúdo fedorento e limpava a filha.

Jeongguk prometera jamais trocar fraldas como aquela, mas sempre cedia quando Taehyung, no meio da madrugada — e movido pelos berros da criança — pedia-o para acabar com a falta de sono de Gaeul.

Fazia-o apenas pelo amor que sentia pelo Kim e por sua pequena Iron Girl e, no final das contas, acabou se aperfeiçoando na arte de trocar fraldas sujas.

Não se irritavam quando Gaeul desembestava a pedir por atenção em momentos inapropriados. Jeongguk se sentia louco sempre que capturava o choro esganiçado, bem quando se obrigava a controlar o pênis ereto e correr para findar o choro da filha.

Após as primeiras semanas, desistira de olhar para trás quando era sua vez de cuidar da criança. Era frustrante ter, como último vislumbre, a imagem de Taehyung seminu e ofegante entre os lençóis — próximo de derreter em meio aos chupões arroxeados e lábios maltratados — sem sequer poder tocá-lo e tratá-lo como bem queria.

Seus corpos sempre foram uma bagunça de telas manchadas e ondas violentas quando se uniam pelo prazer mútuo.

O Kim nunca achou fácil ter de se libertar do corpo do marido quando Gaeul o chamava indiretamente. Ela já interrompeu estímulos orais. O ápice anterior ao ato carnal.

Para ele, era deveras frustrante deixar o companheiro se aliviar sozinho enquanto caminhava para o quarto de Gaeul.

A inocente criança até mesmo já quebrou seus beijos ingênuos e carinhosos.

Quase subiram pelas paredes após um mês e meio sem sexo. Tiveram sorte de os pais e amigos ajudarem a ambos na visita posterior àquelas semanas sem qualquer contato.

Na primeira noite de visitas, transaram por toda uma madrugada.

No presente, possuíam mais controle sobre a filha. Gaeul não chorava com tamanha frequência quanto antes e já se via livre para comer alimentos mais sólidos, além de tomar leite formulado sem a presença de lactose. Comprovaram que cuidar de um bebê com intolerância à substância era trabalhoso, contudo era o tipo de trabalho que lhes dava prazer. Nada valia mais do que levar um sorriso satisfeito aos lábios de Gaeul, livrando-a da escassez de cólicas ocasionadas pela alergia.

Ela era um bebê saudável e deveras adorável.

 — O que vocês estão tentando fazer? — Taehyung deixou a bandeja com biscoitos sobre a bancada, interrompendo as tentativas falhas de Hoseok e Namjoon, que tentavam alimentar Gaeul.

Sentada sobre a cadeira de alimentação, o bebê se recusava a comer uma papinha de amora. Gaeul empurrava a tigela de ursinho para longe.

 — Ela é impossível. — Namjoon, com o cabelo tingido de loiro outra vez, resolveu se sentar ao lado de Seokjin, apoiando as investidas de Hoseok.

Seu esforço para alimentá-la era admirável. — Aish, qual o problema dela, Gukkie? — O Jung perguntou.

 — É a primeira vez que estamos dando papinha de amora para ela. Ela está desconfiada, talvez não esteja acostumada com a cor. — Jeongguk se agachou em frente à cadeirinha, brincando com as mãozinhas do bebê. — O que foi, princesinha? Não está gostando da nova papinha? Tente, amor. — Murmurou, conforme levava a colher rumo aos lábios pequenos.

Gaeul recusou outra vez.

 — Vamos, Iron Girl. É gostoso, veja. — Para passar confiança ao bebê, Jeongguk provou o alimento, forçando uma expressão de satisfação — mesmo que a papinha não fosse ruim, não estava em seus planos ter de mostrar suas artimanhas em frente aos amigos.

Tirariam uma com sua cara pelo resto da vida.

Tentou ignorar os risos zombeteiros de Jimin e as piadas sussurradas de Seokjin, retornando a sua missão impossível de fazer a filha comer a maldita papinha.

 — Ela ainda se recusa. — Taehyung bufou com derrota. — Ela aceitou a papinha de brócolis e maçã tão bem... Qual o problema, amor? Amora é uma fruta tão gostosa. — Taehyung também se agachou em frente à cadeira, apoiando uma das mãos sobre o ombro alheio.

Ambos se olharam pensativos. Antes mesmo de iniciarem o namoro, eles desenvolveram a atitude de, ao mesmo tempo, formularem os mesmos pensamentos.

Foi daquela forma que uma lâmpada se acendeu na cabeça do casal. 

 — Talvez se... — O Jeon mordeu os lábios, contendo o ímpeto de sorrir diabolicamente para a criança.

 — Bem, não temos escolha. — O Kim murmurou, alcançando um dos biscoitos da bandeja e o posicionando em frente ao rosto da filha.

Os amigos observavam o casal com curiosidade, logo segurando o riso quando notaram o que ambos fariam.

Tão astutos.

 — Eu não acredito. — Jimin rapidamente clicou na câmera do celular para filmar os gestos atrapalhados dos dois pais.

 — Pronto? — Taehyung olhou para o marido, que consentiu em silêncio. Ele aproximou o biscoito da boca de Gaeul, vendo a filha abri-la automaticamente.

Jeongguk foi rápido ao depositar a colher dentro da pequena boca, rindo quando o bebê fez careta e tentou alcançar o biscoito que foi afastado dele.

— Não, não, não. — Com o auxílio da colher, Taehyung fez com que Gaeul engolisse os restos da papinha que deslizaram por seu queixo. — Você precisa comer tudinho, querida. Não podemos sujar seu babador do Homem de Ferro a toa, não é mesmo?

 — Jeongguk ainda vai transformar a Gaeul em um mini Homem de Ferro, escute o que eu digo. — Namjoon murmurou aos amigos, que compartilhavam da mesma opinião.

 — Conseguimos! — Taehyung e Jeongguk fizeram um de seus vários apertos de mão, logo dando a mamadeira com água natural e filtrada para o bebê.

 — Eu acho que ela gostou. — Jimin finalizou a gravação, empurrando Hoseok para o lado. — Você e Namjoon já podem alimentá-la agora.

 — É melhor que só o Hobi alimente ela. — O loiro coçou a nuca com timidez. — Desastrado como sou, eu vou acabar derrubando papinha em nós dois.

Ainda que não demonstrasse, Jeongguk achava adorável o modo desajeitado de Namjoon. Apostava todas as fichas que Jin também concordava com sua linha de pensamento.

Namjoon era atrapalhado, contudo o grande esforço que empregava sobre tudo que realizava contribuía para que seus projetos e tentativas saíssem perfeitos, ou quase.

 — Não se preocupe, hyung. Você não vai derrubar papinha na Gaeul. Apenas vá com calma, sem pressa. — O moreno puxou o melhor amigo pelo pulso, colocando a colher em sua mão e, pacientemente, guiando-o em direção ao bebê.

O loiro soltou algumas caretas e resmungos esganiçados, enquanto parecia sofrer uma crise existencial — o que se tornou um show de comédia para os amigos. Em conclusão, ele suspirou satisfeito ao que Gaeul comia a papinha e segurava seu polegar. Ela parecia pedir mais.

Não deixaria seu contentamento explícito. Seu coração se enchia de calor ao observar os grandes olhos negrumes da garotinha.

Um grande sorriso soltou de sua boca. Seus olhos puxados se tornando linhas delicadas.

 — Viu? — Jeongguk deu um tapinha em seu ombro. — Ela gostou de ganhar comidinha do tio Joonie.

 — E também vai gostar de ganhar comidinha do tio Hobi, agora passe essa colher pra cá. — Hoseok exigiu, ignorando o riso frouxo dos amigos e se concentrando em tomar a colher das mãos de Namjoon.

 

 

*.

 

 

 — Por que os seus pais não vieram com Namjoon e Jin hyung? — Taehyung perguntou ao marido.

Ambos estavam na cama. Jeongguk sentado sobre seu colo conforme espalhava uma loção de barbear em seu rosto.

Os amigos estavam na casa de Haenim, tomando chá e comendo bolo enquanto eles e a tia mimavam a pequena Gaeul. O tempo que o casal tirou para ficar a sós desencadeou beijos quentes e questões pendentes.

Jeongguk deu de ombros, arrastando o barbeador sobre a pele de Taehyung.

— O velho Jeondae está bastante ocupado com a empresa. A última coisa que mamãe me disse foi que ele estava averiguando a proposta de alguma empresa estrangeira. Eu sinceramente não sei o que ele vai fazer. — Jeongguk disse. Seus olhos atentos a lâmina que deslizava pelo queixo de Taehyung. — Ele não pode simplesmente viajar para outro país e deixar minha mãe sozinha de novo. Da última vez, ela quase arrancou os cabelos e eu precisei acalmá-la enquanto cuidava de Gaeul. Eu não sei o que faria se vocês dois não estivessem comigo.

Taehyung sorriu, dedilhando as coxas do marido, que eram levadas por sua velha camiseta. Gostava quando Jeongguk usava suas roupas. Observar a composição de pele nua e face concentrada despertava em Taehyung a vontade de compor novamente.

Já fazia algum tempo que ele não escrevia letras e poemas em seu caderno repleto de figurinhas de heróis. Como o marido, Taehyung também possuía hobbies costumeiros.

Gostava de escrever em silêncio, em recantos onde pudesse ouvir os sussurros do próprio coração, que ele imaginava ter muito a dizer. Fosse como fosse, tiraria um tempo para escrever outra vez. Ademais, aquilo faria bem ao seu cérebro.

Já moldava as palavras que passaria para a folha amarelada quando o latido próximo à porta rompeu suas ideias. O filhote de Husky Siberiano marrom tentou subir na cama de casal, gracejando o ouvido dos donos com seu ganido fino.

 — Taegguk, o que faz aqui? — Jeongguk suspendeu a barbeação, dando colo ao filhote.

Como já tinham uma garota, decidiram complementar a família adotando Taegguk poucas semanas depois que Gaeul chegara. Só não imaginavam que cuidar de um cãozinho, ao mesmo tempo que cuidavam de um bebê, fosse ser ainda mais trabalhoso.

Metade da culpa pela antiga abstinência sexual dos maridos estava no fato de Taeguk arranhar a porta do quarto no meio da noite, latindo e ganindo para que os donos o deixassem entrar. Eles não tinham outra escolha senão acatar o pedido manhoso, observando a bolinha de pelo se infiltrar no meio dos lençóis e adormecer próximo aos travesseiros. Não podiam correr o risco de acordar a filha — e muito menos deixar o filhote morder seus sapatos e arruinar os móveis da sala de estar.

Taehyung terminou de se barbear por conta própria, lavando o rosto na pia do banheiro e retornando ao quarto. Perdeu-se na nostalgia de observar o Jeon brincando com Taegguk. Encostou-se ao batente da porta, suspirando com paixão.

Sentia-se realizado, purificado.

Sua vida estava perfeita da forma que estava. Tinha uma família amorosa, amigos geniais e um homem incrível que chamava de seu.

Imaginou como seria sua vida se não tivesse conhecido Jeongguk.

Talvez ele se apaixonasse por algum colega de profissão ou turista da região, construindo uma história de amor confortável. Taehyung cogitou que aquela relação não teria a mesma louca paixão que o moreno demonstrava ao tomá-lo para si e sussurrar declarações ao pé de seu ouvido.

Os chás e cafés não teriam o mesmo gosto se não fossem feitos por Jeongguk.

Sua pele não teria o mesmo brilho sem os carimbos do rapaz.

Sua vida não teria nenhuma gota da magia que sentia apenas de olhar para a aliança em seu anelar. Atribuía aquilo ao fato de que se casou com Jeon Jeongguk e o tornou seu amigo e amante para todas as horas.

O Sr. Kim.

Mordeu os lábios, roubando o filhote dos braços de Jeongguk. Inclinou-se sobre a cama para beijá-lo, sugando o oxigênio do marido e amolecendo seus braços quando apoiou um dos joelhos no meio de suas pernas.

O beijo com gosto de biscoitos e papinha de amor se transformou em um gesto molhado com saliva de cachorro.

 — Taegguk! — Ambos riram do filhote pestinha, logo se atentando ao som do telefone no andar debaixo. 

 — Eu atendo. — Jeongguk se ofereceu, deixando um último beijo na boca de Taehyung e um afago nos pelos macios do filhote.

O Kim se jogou na cama, brincando com as patinhas de Taegguk, que parecia cheio de energia.

 

 

Jeongguk manteve o semblante contente enquanto atendia a ligação, sorrindo mais amplamente ao ouvir a voz doce de Jeondae.

 — Oi, pai!

Contudo a felicidade se perdeu em algum estado crítico de sua mente. Ela murchou como um balão furado ao processar o pigarro entristecido do homem, que pediu coisas que Jeongguk não queria fazer.

Por que bons sentimentos eram substituídos por tempestades tristes?

 — Pai...

 — Por favor, meu filho. Tente entender. Eu preciso de você.

Por que agora?, era a única coisa que passava pela cabeça de Jeongguk ao que ele desligava a ligação sem ao menos dizer até logo.

Por um momento, sentiu raiva do pedido envergonhado do pai, porém ele tinha o dever de colocar seus pensamentos no lugar. Deveria encaixar cada peça antes que perdesse a sanidade e quebrasse tudo ao seu redor.

Viu quando Jimin e Namjoon entraram pela porta.

Eles disseram que estavam ali para recolher algumas filmes clássicos da estante de Taehyung. Levariam-nos para assistirem na casa de Haenim, que não possuía tantos bon clássicos quanto Taehyung. Todavia, eles se calaram rapidamente quando olharam para a inexpressividade no rosto de Jeongguk.

 — Ei, Gukkie... Aconteceu alguma coisa? — Jimin foi o primeiro a questionar. Seus olhos se desviando para além do moreno e topando com Taehyung, que correu pelo corredor atrás de Taegguk. .

 — Vocês podem ficar com Taegguk? — Jeongguk pegou o filhote no colo, coçando atrás de sua orelha felpuda antes de entregá-lo nos braços de Namjoon, observando-o com olhos suplicantes.

Namjoon pescou a aura densa, concordando silenciosamente. Ele rapidamente recolheu os filmes que Jimin desejava, antes de pedir licença e puxá-lo para fora da casa. Mais tarde, ele perguntaria ao melhor amigo o que estava acontecendo. Jeongguk parecia ansiar por uma conversa íntima com Taehyung.

Não perderia tempo tentando adivinhar o que acontecia, pois imaginava que a conversa que Jeongguk teria com Taehyung seria longa. Deixaria que o melhor amigo corresse em direção ao seu conforto quando se sentisse disposto. Sempre estaria de braços abertos para seu dongsaeng preferido.

 — Vamos deixá-los sozinhos. — Namjoon murmurou para Jimin, enquanto atravessavam o deck da casa vizinha. — Eu tenho certeza que mais tarde eles vão nos contar o que está acontecendo.

O ruivo maneou fracamente. Havia notado a face surpresa de Taehyung ao ver o companheiro pedir que os deixassem sozinhos por um tempo. O Kim deveria estar tão confuso quanto eles.

 

 

Taehyung fitava os próprios pés enquanto ele e o marido permaneciam no mesmo lugar. Sua respiração contrastava com a de Jeongguk, que se aproximou com insegurança.

Jeongguk manteve os olhos sobre o rosto de Taehyung.

— Amor... — Taehyung chamou, umedecendo os lábios secos. — O que acont—

Qualquer tentativa de persuasão foi interrompida pelos lábios de Jeongguk, que envolveram os seus, mantendo profundidade no ósculo intenso, porém lento.

Sua cabeça passou por mil e um carrosséis, mantendo-se distante de algum ponto de controle que não fosse a boca faminta e o corpo rijo se encostando desesperadamente ao seu.

De súbito, Jeongguk colocou o marido no colo, arrancando dele um gemido surpreso. Levou-o para o andar de cima, chutando a porta do quarto. Não teve a preocupação de trancá-la, deixando Taehyung sobre os lençóis e se posicionando sobre seu corpo.

 — Não vai... — Taehyung inspirou profundamente. — Não vai me contar porque está agindo assim?

 — Meu pai quer que eu viaje para Londres e seja o embaixador da filial que ele transferiu para a Inglaterra. — Jeongguk não delongou o assunto.

Prometeram um ao outro que jamais mentiriam ou esconderiam qualquer assunto de relevância. Jeongguk cumpria o tratado com afinco, tal como o Kim fazia.

Taehyung observou os olhos negros do parceiro, engolindo em seco ao ver a tristeza que se apossou de seus gestos. O marido parecia fragilizado.

 — Quanto tempo? — Ele arriscou perguntar. Foi brindado com um sorriso forçado e um leve afago no rosto.

Jeongguk se inclinou para mais perto, roçando os lábios com leveza e apreciando o sabor doce que estava ali. Deslizando sua língua pelo lábio inferior de Taehyung, antes de beijá-lo e suspirar. — Um ano... Talvez um ano meio.

Taehyung suspirou com pesar, virando o rosto e olhando para algum ponto de interesse fora da janela. Seu coração disparou e seus olhos se tornaram constelações tristes.

 — Amor, diga alguma coisa, qualquer coisa. — Jeongguk respirou contra seu pescoço, deslizando as lufadas de ar por suas bochechas subitamente enrubescidas.

Jeongguk sabia que Taehyung não sentia vergonha. Taehyung se segurava para não transbordar.

Viu aflição nos olhos cor de avelã, fechando os próprios ao que os dedos longos deslizaram por suas costelas e apalparam a pele de seus ombros. Deixou que o marido invertesse as posições, acomodando-o em seu colo de tal modo que Taehyung se deitou completamente em seu tronco, enquanto mantinha os joelhos apoiados ao lado de sua cintura.

 — Eu não vou te dizer que estou tranquilo com a notícia, porque tranquilidade é a última coisa que estou sentindo agora, Kim Jeon Jeongguk. — Taehyung deslaçou um bico emburrado, que foi mordido pelo Jeon. — Mas você sabe o que eu penso em relação a isso, não sabe? Você precisa ajudar o seu pai, querido. Eu sei que ele não confia em ninguém além de você para ocupar esse cargo enquanto Jeonghyun está se formando.

Jeongguk suspirou com amor.

Taehyung sempre foi disposto de paciência. Coisa que o parceiro suou para aprimorar em sua própria vida. Jeongguk sempre foi alguém impaciente demais. Ávido demais.

Eles ainda tinham muito o que aprender um com o outro.

Jeongguk bufou, bagunçando os fios acastanhados do parceiro. — Aquele maldito ainda tem mais um ano para completar o doutorado de administração. Ele é quem deveria estar ocupando esse lugar na empresa.

 — Ei, está tudo bem. — Taehyung beijou sua boca, descansando o queixo em seu peito à medida que fazia círculos ali. — Está tudo bem. Você não deveria sentir raiva, pelo contrário. Você deveria se sentir amado. O pai Jeon confia em você. Não se preocupe comigo e com Gaeul, nós vamos nos virar bem sozinhos.

 — Mas... Eu pensei que...

 — Que nós iríamos com você? — Taehyung perguntou. — Gukkie, eu não posso abandonar os meus alunos por tanto tempo outra vez. O último substituto foi acusado de agredir meus bebês. Os pais não confiam em qualquer outro professor, e já perdemos muitos alunos enquanto eu estive ausente. Fora que a escola precisa de minha ajuda mais do que nunca. Eu corro o risco de perder o emprego se continuar pedindo licença atrás de licença, amor.

 — Merda, Tae. — O moreno descansou o braço sobre os olhos, mordendo a boca enquanto sentia algumas lágrimas deslizando por suas bochechas. — Como eu vou sobreviver sozinho sem as minhas pessoas preferidas do meu lado? Nem mesmo o papai vai estar lá. Eu quero acompanhar o crescimento da minha filha e do meu filhote. Eu quero ver minha filha andar...

 — Ei, ei. — Taehyung o puxou para cima, dobrando as pernas entre as suas. Ele enviou aconchego quando tocou em suas mãos, massageando seus nós. — Sempre estaremos em seu coração, não é assim que funciona? — Ele observou o marido concordar em silêncio. — Você poderá não estar aqui, mas nós sempre te sentiremos ao nosso lado. Nesse momento, nossos pais e amigos vão estar mais presentes do que nunca. Eles ajudarão Gaeul e filmarão todas as proezas que a nossa filha fizer. Eu prometo te enviar todos os vídeos, assim como prometo que nos veremos regularmente por chamadas de vídeo. Gaeul não vai deixar de manter contato com você, nem ela e nem Taegguk.

Jeongguk ouvia aquelas promessas com um sorriso pequeno. Seus olhos avermelhados denunciavam o choro engarrafado, mas estaria tudo bem se tivesse a visão segura de sua família.

Não seria simples viajar para o outro lado do mundo e coordenar contratados sem a presença de sua família, mas se apegava, agarrava-se com todas as forças às certezas que Taehyung deixava sobre suas mãos.

Era bom saber que o Kim não ficaria sozinho, mesmo que ele próprio fosse se definhar a cada dia sem a presença de Taehyung.

Trezentos e sessenta e cinco dias eram demais.

Já sentia seu coração doer enquanto puxava Taehyung para um abraço apertado, que se prolongou entre os beijos e mordidas carinhosas, suspiros e gemidos que, a todo custo, Taehyung tentava engolir com extrema falha. Jeongguk reivindicava por sons extremamente altos de sua boca, como uma última lembrança antes de partir.

Eu vou sentir falta disso.

Foi o que Jeongguk disse enquanto sugava a pele acobreada de Taehyung para dentro de sua boca e lambuzava os mamilos com saliva. Suas mãos impunham força e nostalgia ao abrir as pernas do marido, não lhe deixando intervalo para recuperar o fôlego antes de fazê-lo sentir sua boca entre as pernas.

Taehyung arqueou a coluna, tapando os lábios para que os sons vergonhosos que fazia fossem interrompidos, embora soubesse que aqueles mesmos sons eram deveras prazerosos aos ouvidos do marido.

Jeongguk o engolia com vontade, marcando suas coxas com dentes pontiagudos e lábios untuosos.

Taehyung obedeceu quando o marido pediu que ele se virasse de costas e empinar o traseiro. Segurou-se na cabeceira da cama, mordendo o travesseiro e afundando os olhos ali ao passo que o moreno penetrava a língua em seu orifício e o lubrificava com saliva.

Era sensível ali, e imaginava que qualquer outro indivíduo também seria se fosse chupado por Jeon Jeongguk. Acreditava que as maçãs de seu rosto haviam enrubescido mais de cento e cinquenta tons de vermelho acima do comum.

Tudo era autoria da face afundada em seu traseiro e dos orbes intensos de Jeongguk. Taehyung os observou ao inclinar sua cabeça para o lado e prender uma das mãos nos fios negros do parceiro.

Após aquilo, tudo se converteu ao prazer de penetrações lentas e gemidos esganiçados.

Jeongguk puxou o marido em seu colo, abraçando-o pela cintura e o amparando no dever de cavalgar e rebolar vagarosamente sobre seu pênis.

 — Você me paga... — Taehyung gemeu contra sua boca, sentindo queimaduras onde ele o tocava. Imaginava que o Jeon pudesse ouvir as loucas batidas de seu coração, conforme rebolava com mais afinco e jogava a cabeça para trás, oferecendo acesso à sua pele já arroxeada.

Jeongguk sorriu contra a pele orvalhada, apalpando as nádegas cheias e jogando Taehyung no colchão, investindo com força até que o ruído da cama batendo contra a parede fosse substituído pelo silêncio.

Taehyung olhou para o gozo que escorria entre suas pernas. Havia se passado muito tempo desde que ambos deixaram de usar preservativo, uma vez que faziam checagens regulares e após alcançaram o máximo de intimidade dentro do casamento.

Ele empurrou Jeongguk para o lado, deslizando sua língua pelas linhas suaves do abdômen do marido e abocanhando o pênis já endurecido, até que a ponta de seu nariz raspasse contra a virilha marcada com algumas veias esverdeadas. Não permitiu que Jeongguk tomasse controle, prendendo seus pulsos ao lado do corpo e deixando uma mordida abaixo da pele de seus testículos.

Ouviu-o se engasgar com prazer.

Jeongguk amava a sensação de ser controlado pelas mãos grandes do parceiro.

 — Fique quietinho, meu bem. — Murmurou rouco, retornando à felação torturante e molhada de saliva, o que ocasionava em altos estalos.

Inutilmente, Jeongguk tentava domar a respiração pesada, reunindo as sensações dos gestos libidinosos. Fechava os olhos e dava importância aos sons diversos e as cócegas que seu suor fazia ao escorrer por sua jugular e clavículas. Ao prazer que Taehyung lhe propiciava.

Sentiria falta de saborear aquele amor; de acordar todas as manhãs e vê-lo ressonar ao seu lado; de olhar para a face angelical e perceber que tudo estava em seu devido lugar.

Perderia um pouco da mente, uma porcentagem do controle e organização que Taehyung um dia lhe ensinou, todavia gostava de pensar que estaria fazendo um favor a uma das pessoas que mais amava.

Jeondae se sentia orgulhoso, e Taehyung se sentia também.

Estaria apenas acrescentando pontos positivos em seu amadurecimento periódico. Orgulhava-se de quem se tornou. 

Um homem feito de falhas e suficientemente merecedor do amor do homem mais incrível do mundo. Kim Taehyung sempre seria o melhor entre todos, mesmo que Jeongguk botasse esforço no pensamento de que o merecia quando outrora acreditara não merecer.

Sentiu vitalidade quando tocou na boca vermelha, enroscando os dedos entre os fios acetinados do Kim. Seu corpo explodiu de satisfação no instante que o parceiro se colocou para dentro de si.

Forte, rápido e extremamente profundo.

Seus gemidos saíam esganiçados pela pressão dos dedos afundados dentro de sua boca. Taehyung fez questão de afundá-los um pouco mais enquanto rebolava entre suas pernas, empregando aperto as coxas que tanto gostava de beijar em madrugadas quentes.

Sentiu quando as mãos serelepes arranharam a sinuosidade de suas costas e se cravaram em seu traseiro, puxando-o para perto.

Taehyung amava ver Jeongguk implorar. Amave ver a pele manchada com vários tons de vermelho e os cabelos bagunçados em uma desordem que era bela aos seus olhos.

Porque Jeongguk era a criatura mais bela que teve o prazer de conhecer.

Era a criatura mais bela e mais selvagem também. Reprimiu um sorriso presunçoso quando ele revirou os olhos e gritou com toda a força dos pulmões para fazer o mesmo movimento novamente.

Aroma forte de suor e algo mais erótico se concentrou naquele quarto. Peles se esfregando, mãos e dedos se contorcendo, declarações sussurradas e gemidos deliciosos.

Ambos se apreciavam.

 — Eu... te amo... Jeonggukie.

 — Eu também... te amo, Tae.

A cama quebrou enquanto tudo se repetia.

 

 

*.

 

 

Após dois dias, Jeongguk se despediu da família e amigos que ainda estavam em Jeju. Deixou suas malas próximas ao deck de Haenim, virando-se para Taehyung e Gaeul.

Manteria em mente a última imagem do marido.

Cabelos bagunçados, cara amassada, minha camiseta preferida do Homem de Ferro que mal cobre meus chupões. Perfeito.

 — Você vai pensar no papai, não vai, Iron Girl? — Ele pegou o bebê no colo, enchendo-o de beijinhos que foram correspondidos por mãozinhas se agitando e tocando seus lábios e bochechas. Mordeu os dedos miúdos com leveza, sorrindo para a filha que lhe mostrou a bela faixa de gengiva saudável que ele adorava.

Sentiu-se tocado pelo abraço aconchegante de Namjoon e Seokjin. O loiro, ao contrário do namorado, não se demorou no ato, deixando um afago em suas madeixas e apoiando o próprio peso no batente da porta.

 — É melhor que mande notícias, garoto. — Jin beijou sua testa, esfregando o indicador sobre a pele selada. — Pelo seu próprio bem.

O moreno revirou os olhos. — Tudo bem, papai. Eu prometo telefonar todos os dias. — Ele se afastou, observando o sorriso murcho de Hoseok.

O homem o abraçou com força e melancolia.

— Ei, seu sorriso é bem mais do que isso. — Jeongguk sussurrou, deixando algumas cócegas na barriga do amigo mais velho.

 — Eu só não gosto de pensar que vocês dois vão se separar por um tempo. Eu mal sou capaz de ficar um dia sem a presença de Jimin, quem dirá você ficar longe de Taehyung por um ano. Só não enlouqueça em Londres, tudo bem? Não estamos a fim de buscá-lo em um hospício. — O Jung deu alguns tapinhas em suas costas, dando espaço para que ele parasse em frente a Jimin.

O ruivo se demorou olhando para o céu nublado antes de suspirar e voltar suas vistas a Jeongguk. Ele sorriu de canto, desafiando o dongsaeng a dizer o que queria ouvir — e o que Jeongguk bem sabia que deveria dizer.

Tão impertinente.

 — Tudo bem, tampinha. — Jeongguk fingiu chutar o Park, antes de envolvê-lo dentro de um abraço apertado. Ele acariciou os fios ruivos de Jimin, deixando um beijo ali.

Aquilo surpreendeu Jimin, tanto quanto surpreendeu o restante dos amigos. Mesmo Hoseok se postava chocado com aquele gesto.

 — O que foi? — Jeongguk perguntou enquanto se desfazia do contato. Sentiu quando as mãos pequenas de Jimin afagaram suas bochechas com carinho e um pouco de receio. — Pode não parecer, mas eu te amo. Você é um bom amigo.

Jimin se sentiu aquecido. O Jeon não fazia ideia de quanto tempo ele esperou para ouvir aquilo de sua boca. Ele sempre gostou de Jeongguk. Sempre o achou deveras adorável.

Irritava-se facilmente quando Jeongguk decidia tratá-lo com irrelevância. Era desapontador ter conseguido arrancar uma confissão de amizade em meio a uma despedida, mas o feito era melhor do que nada.

Por fim, sorriu da forma mais brilhante que conseguiu — o quê, aos olhos de Jeongguk, foi um gesto cativante.

Ele gostava quando Jimin sorria repleto de dentes branquinhos e fofas meias-luas no lugar de duas órbitas escuras.

 — Eu vou sentir saudades. — O Park confessou, deixando alguns beliscões na cintura do moreno. — Todos nós vamos sentir.

O Jeon sentiu vontade de chorar novamente. — Eu também vou sentir saudades. — Correu para os braços do esposo, abrigando-se no abraço aconchegante e lhe roubando um beijo intenso e demorado. Almejava que Taehyung sentisse seu gosto para sempre.

O Kim não queria largá-lo, nunca mais. Suas mãos escorreram pelo corpo do marido, guardando aquelas curvas no espaço secreto em sua mente e apertando os olhos quando o sentiu se afastar.

 — Eu vou desistir da viagem se continuar te beijando. — Jeongguk sussurrou contra seu pescoço, rindo baixinho e o puxando para mais um beijo com sabor de até logo.

 — Vá rápido. — Taehyung o empurrou sem impelir força real, observando-o pegar Taegguk no colo e esfregar seus pelos.

 — Até parece que está louco para se ver livre de mim, apressando as coisas assim.

 — Eu só não quero fazê-lo desistir da viagem.

A revelação sincera atraiu Jeongguk. Ele engoliu o bolo de saliva, soltando Taegguk e deixando um último beijo na cabeça de Gaeul.

Todos fingiram não ter visto a lágrima que escapou de um de seus olhos quando o bebê acariciou seu rosto.

 — Bem... — Jeongguk deu um suspiro trêmulo, pigarreando e olhando para trás, onde Haenim aguardava dentro do carro. — Isso é um te vejo em breve. — O couro de despedida obrigou o homem a apertar a alça das malas com força.

Deu um último olhar a Taehyung antes de se virar e caminhar para perto do automóvel, onde jogou as malas no porta-malas.

Apressou-se para entrar no banco de carona. Não podia olhar para todas aquelas pessoas que acenavam no deck. Não gostava de pensar que estava se despedindo de seu mundo real para adentrar outra dimensão que de nada condizia com sua ânsia de felicidade, mas aquilo era preciso.

É preciso, sua mente sussurrou, conforme ele tomava coragem de olhar para a face de cada um e lhes mandar um aceno tímido. Seu corpo se prendeu a uma caverna de inverno quando ele viu Taehyung segurar a mão de Gaeul, incitando-a a acenar enquanto dizia “dê tchau ao papai”.

Prendeu um soluço, fungando asperamente. Ele colocou o cinto de segurança quando ouviu a pergunta de Haenim.

 — Tem certeza, querido?

Somente concordou. — Dê a partida antes que eu pule para fora desse carro, tia.

Taehyung se recordou de alguns romances clichês, onde o personagem que partia implorava para que o carro parasse, deixando assim um último beijo quente nos lábios de quem amava e que esperaria sua volta para sempre.

Aquilo não aconteceu, e tudo o que Jeongguk deixou como último vislumbre foi seu rastro na grama seca.

 

 

*.

 

 

Os primeiros dias longe de Jeongguk foram quase insuportáveis para Taehyung. Mesmo que os amigos estivessem ao seu lado, ele sentia uma parte de si sem preenchimento. Estava oco.

O Jeon levou uma parte de seu coração para Londres. Imaginava como o homem estava se saindo na função temporária. Sem dúvidas, ele é um ótimo administrador.

 — O papai Jeon é incrível, não é, querida? — Sussurrou para a filha, enquanto dava a ela uma mamadeira com iogurte sem lactose.

Gaeul não deu ouvidos ao pai. De qualquer forma, ela ainda não entendia o que todos ao seu redor diziam. Concentrava-se apenas no líquido denso que mamava.

Sem notar, confortou Taehyung ao prender as mãozinhas nos dedos adultos e esfregá-los como se estivesse os acariciando.

O pai sorriu, deixando a mamadeira vazia sobre a mesa de centro e colocando a filha em frente ao corpo, em uma posição vertical, deixando a cabecinha próxima de seu ombro.

Fazer Gaeul arrotar era algo cansativo. Demorava em torno de vinte minutos ou mais até ouvi-la reproduzir o ruído que tanto aguardava, como naquele momento.

Após Gaeul arrotar, Taehyung a colocou deitada de barriga para cima dentro do berço reserva com rodinhas que deixava na sala. O presente dado por Jeonghyun era adorável. O berço tinha inúmeras almofadas rosa pastel com lacinhos e bolinhas, e um dossel transparente, que estava fixo acima do berço e caía em forma de cascata.

O pai aguardou que a garotinha dormisse para pegar seu antigo caderno de anotações e se sentar no sofá. Abrigou Taegguk em seu colo que, como Gaeul, não demorou mais do que cinco minutos para pegar no sono.

Ele folheou as páginas amareladas, parando para observar antigos poemas e composições que fizera no início de sua adolescência.

O último poema foi feito há muito tempo. Bem antes de conhecer Jeongguk.

Sua caneta deslizou rapidamente pelo papel. Mesmo quando errava algumas palavras, não se importou em riscá-las e reescrevê-las acima ou ao lado do borrão. O senso de nostalgia estava em personalizar seu mundo particular com erros impensados, que logo seriam mascarados por curativos.

Os rabiscos eram as palavras que não soavam corretas, e o curativo sempre seria as palavras dez vezes mais bonitas do que as anteriores.

 

Assim como aquelas folhas mortas que caíram e estão voando

O meu amor está desabando sem força

O seu coração está apenas se afastando

Eu não consigo te alcançar, não mais

Eu não consigo mais suportar

(...)

 

Franziu o cenho ao ler as palavras que escreveu. Contra os lábios, ele pressionou a caneta de luxo que herdou da bisavó.

Até mesmo Taegguk despertou de súbito, farejando as folhas amarelas e fitando o dono com seus graciosos olhos azul violeta.

 — Melancólico demais? — Taehyung questionou, entretanto o filhote rompeu os olhares e voltou a se deitar sobre suas pernas. — Eu estou enlouquecendo. — Riu com pesar, deixando o caderno e a caneta de lado e se deitando sobre a espuma do sofá.

Insistia em pensar em Jeongguk, conforme acariciava a bolinha de pelo dorminhoca.

 

 

*.

 

 

Jeongguk se sentia dez anos mais velho a cada dia que passava longe da família e amigos.

Não gostava de administrador funcionários, tampouco de usar ternos apertados e as malditas gravatas que se equiparavam a cordas de enforcamento. A única vez que se sentiu à vontade dentro de um terno foi no dia em que se casara com Taehyung.

Taehyung.

Apenas degustar aquela pronúncia fazia o homem chorar. Esperava que Namjoon e Jin estivessem o tratando mais do que bem. Até seu retorno, confiava que o loiro se tornaria mestre em dar papinha na boca de Gaeul.

Pegou-se sorrindo no escritório, enquanto observava o retrato de sua família perfeita sobre a grande mesa de madeira. O peso da aliança ainda era prazeroso de sentir.

Deveria se ocupar com o trabalho ou acabaria surtando e pegando o primeiro avião de volta para a Coréia do Sul. Trezentos e sessenta e cinco dias.

Ele prometeu tantas coisas a Taehyung.

Prometeu que não se irritaria por banalidades, que se alimentaria corretamente e que não beberia. Estava tudo bem, contanto que mantivesse a cabeça ocupada com inúmeros relatórios que precisava preencher e com os clientes e funcionários que deveriam passar por suas mãos.

Seu pai deveria fazer o maior e mais gostoso bolo de chocolate do planeta quando retornasse. Aquela seria a forma como Jeondae lhe pagaria.

Quando não se perdia fitando as próprias assinaturas exaustivas, deixava mais de cinco minutos passarem enquanto observava o calendário ao lado do porta-retratos. Riscá-lo todos os dias era o quê, pateticamente, transmitia-lhe ânimo — embora a sensação se perdesse depressa ao analisar os inúmeros traços vermelhos que ainda deveria fazer.

Mal havia começado.

Por um momento, ele chorou em silêncio.

Acordar sem o calor de Taehyung era uma sensação estranha. Acostumou-se com os braços ao redor de sua cintura ou com uma das pernas jogada sobre a linha de seu quadril. Sentir a respiração morna contra sua nuca, bochecha, testa e pescoço era o mais delicioso bom dia que recebia.

Já sentia saudades dos choros escandalosos de Gaeul e da língua áspera de Taegguk lambendo seu rosto.

 — Eu vou enlouquecer. — Murmurou com derrota, dando alguns tapinhas no rosto ao notar que estava se tornando um homem fraco.

Prometeu a Taehyung que não seria um homem fraco.

Cumpriria.

 

 

Para Jeongguk, as noites e madrugadas frescas se tornaram a melhor parte de sua vida inglesa. Era em meio ao breu que matava a saudade de seus bebês preciosos.

Comunicava-se com o marido por chamadas de vídeo — como fez na época que precisara cuidar da empresa do pai.

Na última madrugada do terceiro mês, a garoa fraca trepidava contra os vidros da grande janela do quarto de Jeongguk.

 — Oi, meu amor. — Taehyung cumprimentou com um sorriso doce, segurando Gaeul no colo e se pondo a balançar um dos bracinhos da filha. — Diga olá para o papai Jeon, querida.

Sem dúvidas, aquela era visão que fazia Jeongguk rejuvenescer todas as noites. Ele tocou na tela do notebook, fingindo dedilhar as bochechas de sua garotinha. Se fechasse os olhos, poderia sentir a pele fofinha do bebê e os lábios macios do companheiro.

 — Olá, meus amores. — Sorriu amplamente, acenando para Taegguk, que latia ao lado de Taehyung e fazia Gaeul rir.

A gostosa risada que incitou Jeongguk a rir da mesma forma.

— Também é bom ver você, Taegguk. Você está sendo o melhor cão de guarda da nossa princesinha, não está, garotão?

O latido manhoso lhe arrancou um sorriso complacente.

— Eu aposto que sim.

 — As coisas estão exaustivas sem você aqui, Gukkie. — Taehyung confessou com pesar.

Jeongguk observou os orbes avelãs se apagarem como uma vela soprada.

Compartilhava da mesma saudade; da mesma dor. Não fazia ideia se Gaeul, com tão pouca idade, já sentia sua ausência.

Esperava que não.

Ver sua família era o que lhe dava forças, mas era também o que continuamente desmoronava sua mente. A substância de seu cérebro liberava amor, tanto quanto liberava saudade.

Era vendo cenas como aquela que Jeongguk almejava largar tudo e correr de volta para o cantinho onde nunca deveria ter saído.

 — Céus, eu te amo tanto, Taehyung. Eu estou morrendo de saudades.

 — Nós também estamos, mas não se preocupe tanto conosco. Estamos nos virando bem.

 — Namjoon e Jin estão cuidando de vocês?

Taehyung revirou os olhos com aborrecimento. A extrema preocupação do Jeon não deixava de ser adorável, porém.

É claro que eles estão, amor. Assim como Jimin e Hobi hyung. Eles me visitam quase o tempo todo, sempre que podem, mas eu não gosto de pensar que posso estar atrapalhando o trabalho deles. Eles também trabalham, amor. Também devem cumprir responsabilidades além de viajarem para Jeju o tempo todo.

Jeongguk conhecia aquele tom.

Era o tipo de tom que exprimia desconforto.

Quantas vezes teria que dizer ao marido o quanto todos o amavam e se importavam com seu bem-estar?

 — Ei, TaeTae. Eu sei o que está pensando e peço que pare com isso, por favor. Nossos amigos te amam e te visitam porque se preocupam com você e querem te garantir o melhor. Então pare de pensar que é um fardo, porque você jamais será visto como um. Não é reconfortante saber que você tem uma filha e um cachorro para cuidar sozinho.

 — Não fale assim, Gukkie. Está desconsiderando a tia Haenim? Ela me ajuda quando eu surto e começo a chorar como um bebê.

Jeongguk franziu o cenho, ajeitando-se na poltrona conforme umedecia os lábios. — Você está tendo crises de choro, meu amor?

Taehyung olhou para um ponto aleatório nos sapatinhos vermelhos de Gaeul. O mal que sempre caminharia ao seu lado era o tamanho de sua língua.

Não queria que o moreno se preocupasse com sua saúde emocional. Temia que o rapaz largasse tudo e corresse para o calor de seu abraço se ele apenas assumisse não estar suportando sua ausência. — Às vezes, sim... Mas eu não quero que você pense nisso. Está se preocupando demais comigo quando deveria cuidar da própria saúde. Me diga, Gukkie, você está se alimentando direito?

 — Não mude de assunto, Taehyung. Que crises de choro são essas e por que ninguém abriu a boca para me falar sobre elas?

 — São choros, só isso, Jeongguk. Eu me esqueço que você não está dormindo ao meu lado, que não está no meu pé me pedindo para tomar banho com você. Eu me esqueço que você não está aqui para ver a Gaeul crescendo,  mas é normal, não é? Ou vai dizer que não chora pensando em nós dois?

A confissão atingiu Jeongguk. 

Óbvias eram as lágrimas que sempre escapavam quando ele estava no banho sozinho ou se preparando para dormir sozinho. Quando estava tomando café da manhã sozinho ou caminhando pelo parque sozinho.

Sozinho.

A solidão era algo deveras incômodo.

Não poderia simplesmente falar com Taehyung sobre seu dia enquanto ambos se deitassem debaixo dos lençóis. Arriscaria atrapalhar o sono do marido e da filha se ligasse para casa em uma manhã qualquer, portanto preferia desperdiçar as próprias noites de sono. Sabia o quanto Taehyung se sentia desconfortável ao fazer aquelas chamadas de vídeo.

Taehyung aconselhava o marido a dormir. Dizia que Jeongguk deveria renovar as forças com uma boa noite de sono, mas o moreno não  fazia nada daquilo, uma vez que preferia se manter acordado para falar com ele.

Aqueles eram os únicos momentos que tinham juntos, quando não enviavam mensagens instantâneas que seriam visualizadas horas depois, ou quando realizavam ligações que duravam pouco menos de cinco minutos.

Para o moreno, era agradável ouvir a voz rouca depois de uma tarde exaustiva. Queria poder ouvi-la ao pé de seu ouvido. Ora com manha, ora repleta de segundas e terceiras intenções que serviriam para endurecê-lo rapidamente.

Kim Taehyung era o único vício que fazia Jeongguk entrar em abstinência. Necessitava voltar, mas deveria cumprir sua agenda. Estava em Londres por Jeondae afinal. Por amar o pai incondicionalmente, tomaria conta daquela maldita filial.

E, por todo aquele turbilhão de más sensações, chorava como uma criança com medo do escuro no final de todas as tardes inglesas.

— É claro que eu choro como você, Tae. Eu só... sinto sua falta, sinto falta do meu lar. Eu quero muito voltar.

 — E você vai, assim que terminar tudo o que tem para fazer aí.

E Taehyung sempre seria aquele que colocaria sua cabeça no lugar. Tão prestativo.

 — Eu te amo. Amo vocês.

 — Nós também te amamos, não é, querida? — Taehyung ergueu o bebê, balançando-o delicadamente enquanto murmurava próximo ao pescoço de Gaeul. — “Eu também te amo, papai”.

 

 

*.

 

 

Taehyung riscou mais um número em seu calendário.

Mais três meses sem você, Jeongguk.

Com o tempo, ele aprendeu a suportar a ausência do marido. Aquele era um pensamento pretensioso.

Não suportava de verdade, porém aprendia a lidar todos os dias com a sensação de abrir os olhos e não ver Jeongguk ao seu lado na cama. Desejava protegê-lo em seus braços e lhe dar um pouco mais de seu pequeno mundo.

Sua bolha de saudade estourou no instante que ouviu Jimin chamá-lo da sala de estar.

 — Tae, venha rápido! Você precisa ver isso!

O rapaz largou a massa de pão que fazia na cozinha, tropeçando nos próprios pés enquanto corria para perto do tumulto de vozes desesperadas.

 — Mas o que diabos está acontecendo aqui? — Ele perguntou, interrompendo os passos diante da filha e dos amigos.

De mãos dadas com Seokjin e Jimin, Gaeul caminhava cambaleante rumo a Namjoon e Hoseok, que faziam caretas e coreografias infantis.

 — Venha, princesinha. — Namjoon se ajoelhou, chamando a garotinha com as mãos. — Venha para o tio Joonie. Ele te encher de beijinhos.

 — O titio Hobi também quer beijinhos. — Hoseok se ajoelhou ao lado do amigo, ostentando o vasto sorriso de dentes perfeitos que fez Jimin amolecer por um momento.

O sorriso mais lindo do mundo, o Park pensou, observando a doce face do namorado.

Observar o entrosamento entre os homens e a garotinha emocionou Taehyung. 

Haenim filmava o momento, focando a lente nos pezinhos da sobrinha-neta.

Ainda entorpecido pelo triunfo, Taehyung pediu espaço entre os amigos, chamando a filha pelo apelido que Jeongguk deu. — Venha, pequena Iron Girl. Venha para o papai. Não ligue para seus tios babões.

Gaeul pareceu liberar ainda mais disposição, buscando caminhar mais rapidamente em direção ao pai.

No momento certo, Jin e Jimin soltaram suas mãos, observando-a apoiá-las no chão e curvar o corpinho para frente.

Quando o pai fez menção em pegá-la no colo, a garotinha alinhou a postura sem tirar o sorriso gengival do rosto, dando passos molengas e contorcendo os dedinhos no tapete felpudo.

Cada passo fazia o coração de todos baterem mais depressa, como uma repercussão que apenas seguia os comandos daquele gesto inocente. Suas respirações pesadas foram substituídas por comemoração quando Gaeul caminhou mais um pouco antes de cair nos braços de Taehyung.

Ele a girou no colo, enchendo-a de beijinhos e mordidinhas enquanto todos lhe lançavam elogios e disputavam espaço para segurá-la também. 

 — Eu estou feliz por presenciar esse momento. — Jimin fungou, mascarando o rosto no peito do namorado.

 — Não chore, Minnie. Eu vou acabar chorando também. — Seokjin saiu a procura de um lenço, retornando com os olhos avermelhados e se apaziguando com os beijos doces de Namjoon.

Taehyung sorriu o formoso retângulo na direção de Haenim, enxugando as lágrimas miúdas e pedindo que o bebê acenasse para a gravação. — Sua Iron Girl agora pode salvar o mundo, Gukkie. — Ele fez o sinal de V com os dedos, enquanto Jimin se colocou ao seu lado e segurou uma das mãos de Gaeul, fazendo-a imitar os gestos do pai.

Todos acenaram para a câmera, mandando boas vibrações para Jeongguk e dizendo o quão orgulhosos estavam do bebê.

 — Tome cuidado, garotão, ou a roubaremos pra nós. — Namjoon jogou uma piscadela, segurando a garotinha no colo e correndo para longe. Ao contrário do esperado, ninguém se intimidou com o gesto.

Os amigos riram e entraram na brincadeira de perseguir o loiro e Gaeul pela casa.

Ao longo dos meses que Namjoon passou cuidando da sobrinha de coração, ele adquiriu o senso de cuidado com tudo que passava por suas mãos. Zelando pelo conforto do bebê em seus braços, aprendeu a ser mais diligente e controlar o nervosismo que o fazia temer sempre que tocava em Gaeul.

Não quebrava mais seus óculos ou os de Seokjin — e nem a geladeira da própria casa.

Haenim enviou o vídeo para toda a família e as respostas vieram mais do que rapidamente.

Jaehyung e Eunseo mal foram capazes de acreditar, enquanto Chohee e Jeondae desejaram viajar para Jeju na mesma hora, apenas para ver Gaeul tentar andar rumo a eles.

Contudo a mensagem mais aguardada veio logo depois. O celular de Taehyung não parou de apitar um único segundo. Antes que Taehyung pudesse responder a série de mensagens desesperadas, Jeongguk ligou.

 — Taehyung, a nossa filha andou! Céus, a nossa filha andou mesmo, porra!

O Kim gargalhou, observando Gaeul passear por vários colos antes de ser deixada com Haenim. — Alguém que diz ‘céus’ e ‘porra’ na mesma frase deve ser, no mínimo, alucinado. — Provocou, recebendo uma respiração pesada como resposta.

 — Não brinque comigo, amor! Olhe para ela... Eu...

A felicidade foi substituída por uma densa melancolia. Jeongguk chorava do outro lado da linha, fungava com quase desespero. Taehyung imaginou que seus pulmões e olhos estivessem doendo.

Sentiu vontade de chorar também. — Ei, querido. Não chore.

 — O que você espera que eu faça, amor? Eu queria estar aí para ver minha filha andando. Eu queria que ela estivesse andando em minha direção também, mas tudo o que posso fazer no momento é admirá-la de longe. Céus, você faz ideia do quanto isso é frustrante?

 — Eu estaria vendo Gaeul caminhar e se jogar nos seus braços se você estivesse aqui. Acredite, Gukkie, isso é tão frustrante para mim quanto é para você.

Todos se calaram diante do silêncio perturbador. Era comum que cenas como aquela se repetissem.

Taehyung e Jeongguk passaram a discutir por ligações e chamadas de vídeo. O casal sempre cutucava a mesma ferida. Jogava os mesmos argumentos de discussões passadas.

Jeongguk não compreendia as circunstâncias do marido, assim como Taehyung não compreendia as suas.

Jeongguk sentia saudades de casa e descontava suas frustrações em comentários ácidos, que levavam a brigas inconvenientes. Taehyung sentia saudades do marido e não compreendia seu ponto. A impressão que tinha era a de que o Jeon pensava que apenas ele sofria pelas milhas e milhas de distância que os separavam.

Taehyung também sofria; também contava os dias e passava as estações esperando pelo retorno do parceiro, e tudo que o marido fazia era murmurar o quão exaustiva sua vida se tornou e desembestar a dizer coisas que acabariam ferindo os dois.

Ambos deveriam permanecer estáveis.

O Kim suspirou pesadamente, amassando o tecido da calça moletom com os dedos para, quem sabe, pudesse expelir um pouco do tumulto que acendia bombas-relógio dentro de si. — Amor, você ainda está aí?

Jeongguk continuou quieto.

Pensou que ele tivesse abandonado a ligação, mas se tranquilizou quando a respiração calma denunciou a presença do ser mal humorado do outro lado da linha.

 — Eu acho que estou envelhecendo muito rápido. — Jeongguk murmurou, passando as mãos pelos fios negrumes. Talvez eu envie mais um boneco do Homem de Ferro para a coleção da nossa princesinha.

Taehyung riu, brincando com algumas mechas castanhas de seu cabelo. — Eu não acredito, Jeongguk.

 — O que foi? Ela realmente gosta do Homem de Ferro, nada mais justo.

 — Tudo bem, você pode comprar quantos bonecos quiser para ela.

 — Eu imagino o que as futuras amiguinhas dela dirão ao vê-la carregando um boneco por aí quando deveria brincar de boneca como todas as outras.

 — Bem, nós diremos que ela tem todo o direito de escolher os brinquedos que quiser. Gostar de super-heróis e ter uma coleção de bonecos não a tornará menos menina do que qualquer outro amiguinha que ela fizer por aí. É óbvio que algumas famílias vão dizer que isso é a “influência promíscua de dois pais”, mas nós estaremos aqui para intervir, não é?

Jeongguk sorriu. — É claro que estaremos. Juntos.

 

 

*.

 

 

Os meses se arrastavam com ainda mais vagareza.

Onze meses.

Onze meses até que Jeongguk dissesse que teria de ficar mais alguns meses em Londres, finalizando programações e solucionando uma lista de contratempos.

Aquela foi a primeira briga sem uma resposta definitiva.

Taehyung explodiu sem ao menos notar. Jeongguk prometeu que voltaria depois de exatos trezentos e sessenta e cinco dias, mas o acordo foi desfeito.

Pela primeira vez, o moreno viu Taehyung chorar desesperadamente como nunca fez antes. Observou-o puxar os cabelos e encolher as pernas, murmurar palavras desconexas enquanto abaixava os olhos com súbita vergonha de se mostrar tão quebradiço.

 — Você me prometeu que voltaria, Gukkie... Gaeul já completou um ano e Taegguk está tão grande que eu mal dou conta...

Jeongguk tentou secar o próprio pranto. — Por favor, TaeTae. Tende entender o meu lado...

 — Eu entendo, é claro que eu entendo, mas eu não queroa entender.

 — Você está sendo egoísta, Taehyung.

A afirmação áspera obrigou o Kim a rir cinicamente, enquanto deslizava o tecido da camiseta de mangas longas pelos olhos. — Eu estou sendo egoísta há onze malditos meses, Jeongguk. Por te querer ao meu lado e por desejar que a nossa família estivesse completa outra vez. Qual é, Jeon? Não sente mais tanta falta quanto antes?

 — Por favor, Taehyung, não diga besteiras. É claro que eu sinto sua falta!

Aos olhos de Taehyung, Jeongguk parecia esfriar junto à relação que mantinham a distância. As ligações e chamadas de vídeo se tornaram menos frequentes. O envio de presentes era quase inexistente junto às cartas românticas que o casal insistia em mandar um para o outro.

Taehyung aguardava a resposta da última carta há exatos dois meses.

 — Você se tornou um homem frio, Jeongguk. Sinto que está cada vez mais distante de mim, de tudo o que nós somos. Jeonggukie... — Chamou-o, comprimindo um pé contra o outro sobre a poltrona fofa. — O que nós nos tornamos? Você não é mais o mesmo.

Jeongguk assumiu que, de fato, vivia nevascas incontroláveis dentro de si. O trabalho pesado o engolia, incitando-o a se focar apenas nas montanhas de papel acumulado e se esquecer da família e amigos que o aguardavam do outro lado do mundo. Todavia, o marido demonstrava individualidade ao acusá-lo de não se importar mais com o relacionamento de ambos.

Jeongguk estava se esforçando mais do que podia para finalizar sua estada em Londres e voltar com uma antecedência que sequer passava pela cabeça do marido.

Taehyung não percebeu aquilo, mas não carregava toda a culpa.

Jeongguk guardou seus sentimentos dentro de uma cápsula de gelo, sem ao menos notar.

 — Até mesmo as suas cartas perderam o amor, Jeongguk.

Ele olhou para o rosto entristecido do parceiro, negando avidamente. — Não, não, meu amor. Você não está entendendo, eu estou fazendo isso por nós. Eu juro!

 — Então volte logo, por favor, Gukkie. Eu te amo e queria que você estivesse aqui para o primeiro aniversário de Gaeul.

A chuva inglesa estava mais impiedosa naquela madrugada. Taehyung enxergou os raios da tempestade pela janela do quarto de Jeongguk. Eles se aproximavam, levando o alto som de relâmpagos para dentro daquela chamada.

O moreno também notou os ruídos, fitando a janela por tempo suficiente até que voltasse a encarar o marido. Seu peito se enchia de sentimentos ruins.

Gritaria com todas as forças que o amor que nutria por Taehyung ainda era o mesmo. Seu amor não mudou. Jamais mudaria.

Amava aquele homem com sua vida. Amava Gaeul e Taegguk também.

Entretanto, antes que pudesse respondê-lo, antes que fosse capaz de sanar o eminente desespero que tomou a face chorosa pela falta de respostas, a chamada caiu adjunta as luzes do apartamento.

A luminária de emergência se acendeu rapidamente, embora já fosse tarde.

Sob a parca luz do objeto, Jeongguk chorou abraçado ao próprio corpo, reprisando a face depreciativa do esposo até que não lhe restasse nada. Ele suspirou com falta de ar, procurando pelo celular que estava guardado em sua maleta.

Ótima hora para a bateria acabar, pensou com raiva ao ver o aparelho morto, jogando o celular contra a parede e ouvindo quando o aparelho se fragmentou em pedaços.

Seu mundo desmoronava, conforme pensava em Taehyung. Correria para o marido imediatamente se tivesse permissão, mas ele precisava ter paciência.

Sozinho não suportaria a carga de responsabilidades se o Kim não confiasse em suas palavras. Ele confiava?

Temia pela resposta.

 

 

*.

 

 

Taehyung não sabia mais o que pensar ou fazer.

Jeongguk não dava notícias há mais de três dias. Ele não atendia suas ligações, não respondia suas mensagens e não dava as caras no Skype para conversarem como sempre faziam.

Desesperado por respostas, ele procurou Jeondae, ouvindo o homem dizer que não deveria se preocupar. O sogro afirmou que o filho não se esqueceu de seu amor.

Ele está programando algo grande, querido. Não se preocupe”.

Foram aquelas as palavras que se cansou de ouvir pelas últimas quarenta e oito horas, após vinte e quatro horas sem a presença simbólico do marido. Estava enlouquecendo, mas decidiu seguir o pedido do sogro e dedicar sua atenção a Gaeul, que já era capaz de ingerir uma quantidade significativa de iogurte comum sem sofrer efeitos colaterais.

Mais um triunfo que Jeongguk não viu.

O marido estaria bravo com algo que ele disse na última conversa? Fez mal ao enaltecer toda a dor que sentia em sua ausência?

Taehyung se questionava sobre suas atitudes anteriores, odiando-se pela certeza de tê-lo afetado dizendo coisas que há muito tempo estavam presas em sua garganta. Talvez tivesse feito o marido surtar de vez.

Sentia-se tolo, e o sentimento de culpa permaneceu íntegro por mais longas duas semanas sem notícias.

Os amigos impediram Taehyung de pegar o primeiro voo para Londres a procura de Jeongguk. Como os sogros, pai e madrasta, eles lhe disseram que tudo estava sob controle e que ele deveria se dedicar apenas à filha que criava. Prometeram estar ali para ajudar, mas o Kim não precisava de ajuda.

Ele precisava de Jeongguk, antes que perdesse todos os fios acastanhados da cabeça.

Naquela tarde em especial, sentou-se sobre os degraus do deck, jogando um graveto mediano para Taegguk, que se postou a correr pela grama em torno do pessegueiro. Jimin e Hoseok se ofereceram para brincar com o animal quando viram o caderno de poesias em suas mãos.

 

Ali, as folhas de outono parecem estar em jogo

Parece que elas estão olhando para nós

Se as nossas mãos se tocarem, mesmo que inesperadamente

Serão apenas migalhas

Eu só olhei, junto aos ventos de outono

A fala e as expressões faciais que ficaram mais frias de repente

Eu só vejo o nosso relacionamento murchando

(...)

 

Outra vez, Taehyung analisou as palavras no papel, contudo, daquela vez, ele não sentiu incômodo ao lê-las. Sentiu-se familiarizado, como se tudo o que estava sentindo fosse despejado sobre a superfície amarelada.

Cada linha melancólica era o que de fato vivenciava.

Seus olhos avelãs fitaram o céu pouco azulado. O outono se aproximava novamente, no entanto, ele não lhe soava tão formoso como sempre foi.

Pensar naquela época lhe causou calafrios tempestuosos. O que aconteceu com sua história de amor?

 

Como o céu de outono, não tem nada entre nós

Uma diferença ambígua, é diferente de antes

A noite está muito mais quieta hoje

Uma única folha de outono está presa ao galho

(...)

 

Uma lágrima solitária escapou de seu olho, aproximando-se do fim ao tocar no caderno de poesias sobre seu corpo inerte. A primavera que vivia, de repente, tornou-se fria como uma noite de inverno.

Sequer era capaz de controlar o tremelique em seus dedos que escreviam ainda mais rapidamente sobre as folhas do caderno. Escrever sempre foi aquilo que motivava Taehyung a ser um homem comedido, porém todo o equilíbrio parecia se esvair por entre seus dedos ao pingar a caneta preta contra o papel.

A calma estava longe da lista de adjetivos que daria as sensações sentidas com tamanha precisão. Doía como o inferno, e sequer sabia distinguir qual área do corpo era mais afetada pela sensação de perda. Sentia-se entorpecido.

 

Como se todas as folhas de outono tivessem caído

Como se tudo que parecia eterno estivesse se afastando

Você é a minha quinta estação

Porque mesmo que eu tente te ver, eu não consigo

Veja, para mim, você ainda é verde

(...)

 

Seus olhos embaçados enxergaram a distorção de uma mão estendida. Taehyung observou o sorriso singelo de Seokjin.

Silenciosamente, ele o convidava para brincar com Taegguk também.

Taehyung não sabia o que seria de si sem a doce presença de seus amigos.

 

 

Noites mal dormidas se tornaram frequentes para o Kim. Após aquelas duas semanas, Jeongguk continuou sem dar a ele qualquer notícia, nem sequer um sinal de que estava respirando.

Implorou com toda a paciência que lhe restava para que Jeondae o deixasse ir para Londres, mas o homem se recusava a ceder ao pedido. Até mesmo Jaehyung lhe disse que estava se preocupando a toa.

Naquela noite, Taehyung acordou chamando pelo moreno quando uma tempestade rasgou o céu. Perdido, ele passou a mão pelos cabelos, ouvindo o choro de Gaeul no berço ao lado da cama.

Seus passos molengas seguiram até o bebê e suas mãos trêmulas a seguraram com conforto. — Não chore, minha querida. — Murmurou embargado, mal controlando as próprias lágrimas que despencaram sem seu consentimento.

Pensar em Jeongguk não era mais uma tela colorida. Seu coração se tornava preto e branco sempre que se recordava do marido. Ele estaria saudável? Comendo e dormindo bem? Fazendo um bom trabalho?

Jeongguk sumiu do mapa. Desapareceu como cinzas.

Não estava ali para colocá-lo na cama e pedir para que descansasse enquanto cuidaria do choro de Gaeul. Ele era sempre tão atencioso.

 — O que aconteceu, Tae? Gaeul não para de chorar. — Jimin adentrou seu quarto ao lado de Hoseok, Jin e Namjoon, encontrando o olhar perdido do rapaz. — Ei, por que você está chorando?

 — Está doendo, Jimin. — Taehyung confessou com dificuldade, deixando que Seokjin pegasse a filha e a levasse para o andar debaixo, ao lado do namorado.

 — Nós cuidaremos dela, não se preocupe. — Namjoon secou uma de suas lágrimas antes de sair e fechar a porta, deixando sozinhos ao lado dos dois melhores amigos.

 — O que está acontecendo com ele? — Sentou-se na beira da cama, abraçando os joelhos conforme fitava o casal.

Jimin e Hoseok se entreolharam com pesar. Pareciam esconder algo do Kim.

Taehyung notou, e sentiu o ódio se misturar com a ilusão de ser enganado e deixado de lado. — Por que me parece que eu sou o único que não sabe de nada aqui? O que todos vocês estão me escondendo? Isso não é engraçado! — Naquele momento, ele já se remexia impaciente, como se seu corpo estivesse sofrendo mínimas convulsões.

Não era sua intenção espernear com os amigos, mas se sentia no limite. Sua mente se apagava, à medida que era impedido de questionar e saber a verdade. Todos mentiam e lhe escondiam algo, aquilo lhe era mais do que óbvio.

Mas por quê?

Era como se estivesse vivendo uma utopia. Como se fosse impedido de ver o verdadeiro mundo do lado de fora. Não gostava quando terceiros lhe impediam de viver os fatos e lidar com cada um deles.

 — Por quê? — A pergunta saiu sussurrada, enquanto seus amigos o deitavam sobre a cama e o abraçaram com carinho.

Jimin fazia Taehyung chorar contra seu pescoço, conforme Hoseok acariciava os cabelos do melhor amigo, apertando-o com cuidado.

 — Amanhã de manhã, as suas lágrimas te farão sorrir.

Aquela foi a última coisa que ouviu de Hoseok antes de pegar no sono, embalado pelo par de braços aconchegantes e pelo fraco aroma de uma das sete camisetas coloridas que Jeongguk lhe dera de presente há mais de um ano, quando ele ainda existia em seu mundo.

“Eu posso te dar todas as cores do arco-íris. Basta me pedir”.

Foi aquilo que Jeongguk dissera na época que viajaram para New York, contudo, aquela frase não tinha mais qualquer essência. Agora, as sete cores do arco-íris não passavam de borrões acinzentados.

 

 

Taehyung acordou com sussurros ao pé do ouvido. Os cutucões leves só serviram para fazê-lo se remexer entre os lençóis.

 — Vamos, Tae. Acorde.

A voz de Jimin incitou Taehyung a abrir os olhos devagar, provando da ardência vinda dos raios de Sol por detrás da fresta da cortina. Sentiu seu corpo pesar, assim como os olhos que ele esfregou instintivamente.

Dormiu bem na noite anterior, como não dormira há meses. Talvez fosse a presença dos amigos que o deixou tão seguro. Não sabia ao certo o que pensar, à vista disso sorriu para o casal parado em sua frente.

Seu sorriso, porém, foi substituído por espanto ao ver os cabelos de Jimin tingidos de preto enquanto os de Hoseok brilhavam com um tom de castanho claro. — O... quê...

 — Hoje nós vamos te levar para um lugar muito especial. — O amigo de mechas negras enfiou as mãos nos bolsos das calças brancas.

Sem palavras, o Kim olhou para Jimin. Seu silêncio constrangedor apenas cresceu ao ver Namjoon e Seokjin parados próximos ao batente.

Os cabelos loiros de Namjoon foram substituídos para um claro tom de azul, e as madeixas castanhas de Jin sustentavam um loiro platinado que o deixava com a aparência de um verdadeiro príncipe.

Todos ali usavam calças e camisetas brancas, pulseiras de couro e colares de cristal. Os casais emanavam uma aura deveras pacífica e angelical, divergente de seus reboliços internos. Ele se sentia até mesmo atingido pelas boas vibrações dos amigos.

Reconhecia que as nuvens cinzas dentro de si batalhavam contra a claridade fumegante dos amigos.

Após algum tempo, elas foram domadas pelos feixes de luz daqueles belos homens.

Sentiu-se bem e apto a agir como um ser humano feliz.

 — Eu vou pintar o seu cabelo. — Jin se aproximou de Taehyung, que ainda estava sentado sobre a cama.

Ele vedou os olhos quando Seokjin tocou em sua franja, inclinando-se para perto da mão que escorreu por sua bochecha.

 — E eu vou te ajudar a se vestir. — Jimin deixou uma caixa de presente sobre a poltrona de sua penteadeira, sorrindo para o melhor amigo.

Embora Taehyung alegasse que poderia tomar banho sozinho, ele permitiu que os dois amigos preparassem a banheira com perfumados sais de banho e o banhassem por longos minutos. Também deixou que Jin cobrisse seus fios castanhos com uma tintura vermelha, ainda que tivesse resistido excessivamente.

Seokjin disse que a cor combinava com ele. Não discordava, uma vez que nunca ousaria discordar das opiniões daquele hyung.

Jimin recuperou a caixa de presente que outrora estava sobre a poltrona, entregando-a nas mãos do melhor amigo.

Repleto de curiosidade, ele desfez o laço branco, tirando a tampa da embalagem branca e olhando para um par de jeans brancas e uma camiseta branca sem estampas.

Tudo era abundantemente branco.

 — Para que isso serve? — Perguntou, assim que botou os olhos sobre as correntes douradas que faziam par com a pequena coroa de rosas brancas.

 — São correntes de cabelo, TaeTae. Vamos colocar no seu cabelo assim que terminarmos sua maquiagem. — Jimin sorriu com paixão.

Ele desconfiou de tudo aquilo. Desconfiou da discreta camada de sombra dourada em seus olhos, do vermelho opaco que tomava seus cabeços, da coroa artificial ao redor de sua cabeça, das correntes douradas que escorregavam sobre sua testa e orelhas. Taehyung se sentiu desconfiado.

Tomou algum tempo observando seu exótico reflexo no espelho e pensando nos amigos que o aguardavam do lado de fora da porta. O que tudo isso significa?

Sua consciência parecia presa a alguma espécie de fantasia de contos de fada. Perguntava-se para onde o levariam após descer os degraus daquele deck. Perguntava-se onde estava Taegguk e Gaeul.

Eles ficariam para trás com alguém? Deixaria-os sem seu conforto, como Jeongguk fez?

Jeongguk.

Aquele nome fez um grotesco bolo se formar em sua garganta. Somente os céus sabiam o quanto necessitava do dono de tal nome que deslizava feito calda de chocolate de sua boca. Necessitava dos olhos escuros, do corpo pálido e dos sentimentos que Jeongguk lhe oferecia todos os dias.

Taehyung sentia falta de ser amado. Jeongguk deixara de amá-lo?

Jamais perderia a fé naquele amor que, para si, sempre foi real. Agarrava-se a esperança de voltar a sentir o marido contra si; de voltar a acordar ao seu lado e lhe beijar as bochechas enquanto se agarrava às costas nuas.

O Jeon sempre lhe dizia o quão gostoso era senti-lo agarrado às suas costas.

Seus orbes avelãs voltaram a fitar o fantasiado Kim Taehyung preso no espelho. A cópia que soava feliz e completo, mas que não passava de mera farsa.

A maquiagem bonita e as roupas de anjo só serviam para encobrir seu estado fragilizado e para deslizar seus cacos para debaixo do tapete.

O que todos eles queriam ao vê-lo daquela forma? Ao obrigá-lo a encarar alguém que deixou de existir após meses equivocados?

Não era engraçado entristecer alguém com o próprio reflexo mentiroso.

Uma mentira.

O Taehyung bem vestido e bem disposto não passava de uma mentira.

Deu alguns tapinhas na própria face, alcançando seu caderno e a conservada caneta da avó falecida. Passou os olhos mais uma vez pelas palavras escritas, dando fim as últimas linhas que precisavam ser despejadas para fora de seu peito desconsolado.

 

Eu não consigo te alcançar

Eu não consigo desistir de você

Como as folhas secas caídas

Esse amor está se despedaçando.

— BTS

 

Ah, sim.

Aquele era o primeiro dia de outono.

O primeiro outono sem Jeongguk.

Ele calçou as sandálias com pressa ao ouvir a buzina do carro de Haenim, descendo as escadas e trancando a porta de casa.

Observou um segundo automóvel mais atrás. Namjoon o conduziria ao lado de Jin e Taegguk, que se postava com uma adorável coleira de rosas laranja ao redor do pescoço.

Taehyung se aproximou do carro de Haenim, sorrindo para Hoseok que se sentou no banco de carona. Jimin puxou o melhor amigo para os bancos traseiros, e olhar do Kim se perdeu em Gaeul, que estava protegida a cadeirinha cor-de-rosa.

Ela trajava um lindo vestido branco de bailarina e sapatinhos de pérola. Na cabeça, a tiara de lacinho controlava sua perfeita franjinha preta. Ela também usava a pulseira de ouro que continha o próprio nome e um desenho do rosto do Homem de Ferro, que há muito tempo ele mandara personalizar.

Gaeul estava linda. Estava deveras linda.

 — Você é a coisa mais linda do mundo. — Murmurou entorpecido, brincando com as mãozinhas gordinhas do bebê até notar os olhares furtivos em seu rumo. — O que foi?

 — Você está lindo. — Hoseok disse, sorrindo amplamente. — Se eu não amasse o Jimin, te roubaria para mim.

 — Não me considere um obstáculo, amigo. — O agora moreno respondeu sarcasticamente. — Eu posso deixá-lo sozinho se é isso o que quer.

 — Yah, eu só estava brincando, amor!

 — Vá se foder, Jung!

 — Ei! — Taehyung estapeou o casal. — Como vocês ousam dizer palavrão na frente da minha filha? Ela está aprendendo a falar, então não coloquem palavras feias na boca dela!

Os amigos taparam a boca rapidamente, desculpando-se com Taehyung.

O Kim se voltou para Haenim, que sorriu e desejou um bom dia. Como todos os amigos, ela trajava vestes brancas. Um vestido cigana com rendas e uma coroa de flores semelhante a sua. O batom cor de cereja brilhava sobre seus lábios finos.

Sua imagem tirou o fôlego de Taehyung.

 — Você está linda, tia.

 — Não tanto quanto você, meu querido. Está pronto?

 — Para onde vamos?

 — Você logo vai descobrir, Tae. — Jimin se aproximou, vendando seus olhos com delicadeza, de modo que o lenço branco não comprimisse seus olhos e desfizesse a maquiagem recém-feita. — Eu sei que você odeia surpresas, mas você vai adorar essa, eu te prometo.

Ele engoliu em seco, permanecendo calado enquanto sentia o carro seguir para qualquer direção que desconhecia. O vento fresco entrava pela janela aberta, tombando contra seu cabelo vermelho. A mão do melhor amigo realizando espirais sobre a sua.

Aquilo serviu para acalmá-lo de temores desconhecidos. Não prestou atenção na conversa animada enquanto pensava em tudo que, supostamente, aconteceria quando descesse daquele carro.

O silêncio que se instalou no carro apavorou Taehyung, mesmo que Hoseok lhe garantisse que tudo ficaria bem.

 — Vocês não vão me amarrar e jogar o meu corpo no mar ou algo assim, não é? — Ele perguntou após botar os pés para fora do automóvel e largar suas sandálias. Sentindo a areia morna se infiltrar entre os dedos dos pés.

Ouviu o riso de Namjoon a sua direita. — É claro que não, Tae. Por que diabos faríamos algo assim?

Calou-se, procurando controlar as batidas loucas de seu coração. Seu estômago se revirava e suas mãos suavam, conforme ele se aproximava de algo que não era capaz de ver. Por um instante, ouviu vozes que subitamente se calaram, fazendo com que seus nervos saltassem contra a pele.

Não gostava daquela sensação. Não se sentia familiarizado.

Mordeu os lábios, controlando o desejo de apertar as mãos pequenas de Jimin que ainda o guiava areia adentro. A vontade de carregar Gaeul se apossou de si. Perdeu-se das risadinhas gostosas da garotinha após caminhar um pouco mais. O barulho manso do mar foi tudo o que ele ouviu.

 — Onde está Gaeul? Eu quero segurá-la.

Jimin sorriu pequeno.

Outono. Aquele foi, sem dúvidas, o nome mais apropriado que Taehyung poderia ter dado ao bebê.

— Então vá atrás do seu outono.

O Kim não soube interpretar o trocadilho que o melhor amigo fez com o nome de sua filha, mas se sentiu na liberdade de desfazer a venda quando o aperto em torno de seus ombros se dissipou.

Um rápido arrepio subiu por sua coluna ao observar o caminho feito de flores na areia, contudo o legítimo impacto só veio à tona ao ver Jeongguk, seu Jeongguk, parado no final do caminho de flores, erguendo Gaeul para o alto antes de olhá-lo com amor.

Seu peito se apertou, e ele precisou soltar um arfar pesado, antes que as lágrimas grossas fluíssem como orvalho.

Então ele  correu em direção ao marido, que deixou a filha sobre os cuidados de Seokjin. Jeongguk se desfez de todas as amarras ao estender os braços em direção ao marido e mergulhá-lo em seu abraço.

Taehyung desejou sentir aquele conforto por mais de um ano.

As exclamações e risadas foram ignoradas por Taehyung. Ele apertou as mãos sobre os ombros ainda mais largos do que se recordava, afundando o nariz entre os fios cor de chocolate do marido.

— Jeongguk... — Sussurrou, observando o belo rosto de perto.

Jeongguk secou suas lágrimas, puxando-o pela cintura e dedilhando seu queixo. — Sou eu, amor. O seu garoto.

Oh, o Kim sentiu falta da voz alguns tons mais grossa do que há um ano. Ele precisou fechar os olhos e apreciar os sussurros carinhosos contra seus lábios.

 — Por favor, me diga que não é mais um maldito sonho, Gukkie... Por favor.

O Jeon encaixou suas mãos em torno do marido, vendo o quão bem elas se enroscavam ali e arriscando cogitar quanto tempo mais aguentaria sem sua presença brilhante. Não fazia ideia de como suportou mais de duas semanas sem olhar para aquele rosto. Sentira-se perdendo a vida que lhe pertencia.

Taehyung lhe perguntava se não era um sonho montado, mas não compreendia que ele próprio era o único sonho de Jeongguk. O sonho que prometeu realizar assim que se apaixonou pelo doce sorriso retangular.

Jeongguk deixou que uma lágrima escorresse por sua bochecha enquanto erguia o queixo do ruivo, logo o pegando no colo e o beijando como há muito tempo não fazia.

As bocas se adocicaram, impondo força uma contra a outra. Taehyung arrastou suas mãos sobre o peito de Jeongguk, que vestia roupas semelhantes às suas. Outrora ele desejou toques gentis e repletos de amor como aquele, cogitando que tivesse perdido aquela sensação para sempre.

Custava para Jeongguk acreditar no quanto o Kim se tornou ainda mais bonito e no quanto seus sentimentos se inflavam a cada resvalar de bocas e batidas de coração.

O contato foi desfeito apenas para que Taehyung observasse todos os parentes vestidos de branco. Jaehyung, Eunseo e seu meio-irmão, Baekhyun, sorriam em sua direção. Chohee e Jeondae brincavam com Gaeul.

Seus olhos congelaram no jovem desconhecido, que estava parado ao lado do altar, onde havia um arco de flores de casamento. Os ramos verdes se interligavam entre o arco cor de bronze, hospedando as inúmeras rosas brancas amontoadas acima de suas cabeças.

Jeongguk notou seu olhar curioso sobre o rapaz vestido com jeans negras dobradas um pouco acima dos tornozelos e uma regata branca. Seus cabelos acinzentados contrastavam com sua pele pálida grifada com poucas tatuagens.

— Amor, esse é o meu antigo amigo de colégio, Min Yoongi. Yoongi hyung, esse é o meu marido, Kim Taehyung.

 — É um prazer conhecê-lo, Taehyung-ah. — O homem mais baixo lhe deu um carinhoso aperto de mãos, posicionando-se no meio do altar e os convidando para se aproximarem. — Acho que já podemos dar início ao casamento.

Casamento?, Taehyung se perguntou.

Seus olhos se voltaram para Jeongguk, vendo uma resplandecência fascinante nas órbitas escuras. — Casamento, Jeongguk?

 — Yoongi hyung se formou em Filosofia e Teologia e seguiu estudos em um seminário. Ele é um padre, Taehyung. Eu armei tudo isto. Deixei de te dar notícias porque se eu queria voltar antes do previsto, eu deveria cumprir os mais de três meses restantes de trabalho dentro de duas semanas. — O homem de fios acastanhados afagou a bochecha do marido. — Eu fiz o impossível para voltar. Quando te vi desanimado e melancólico naquela madrugada de tempestade, eu percebi que deveria voltar o mais depressa possível. Me perdoe se eu te preocupei, por favor, me perdoe. Eu nunca seria capaz de te abandonar. Eu te amo mais do que tudo, Tae. — Ele beijou suas mãos enquanto se reverenciava.

Taehyung sentiu pesar.

A confissão do marido serviu para acalmar sua frustração não menos deplorável. Jeongguk o deixara sozinho apenas para voltar mais cedo do que o planejado.

Ainda não havia se acostumado a todas as loucuras impensadas que ele fazia por si como se fosse um simples chá da tarde.

Jeongguk magoou seu coração por evaporar, contudo não fez o marido esperar menos do que um ato insano, onde deixara horas de descanso e conforto de lado para lhe fazer uma surpresa estrondosa.

Aquilo sempre fez parte de sua essência. Pensar no conforto de Taehyung e no que ele desejava, antes de pensar em si mesmo.

Tão complicado.

Taehyung deu um soco fraco em seu peito, afundando o rosto em seu pescoço e sussurrando xingamentos modestos.

 — Eu ainda te odeio por ter me feito se preocupar tanto com a sua vida, Jeongguk.

 — Eu sei, amor. — Ele beijou a ponta de seu nariz, afagando a linha de suas costas. — Mas eu te amo de qualquer jeito e quero me casar com você, de novo.

O Kim sorriu. — Você é inacreditável, criança.

 — O que eu disse há quase dois anos, hyung? Não me chame de criança, eu não sou uma criança. Uma criança não prepararia um casamento surpresa.

 — E nem me obrigaria a realizar essa cerimônia. — Yoongi disse com diversão, atraindo a atenção dos convidados. — O que eu, um padre excomungado, poderia fazer por vocês dois? Isso será apenas uma união simbólica. Padres ainda não possuem o arbítrio de casar pessoas do mesmo sexo, infelizmente.

Silenciosamente, Jimin ergueu uma das mãos. — Você foi excomungado por desejar casar pessoas do mesmo sexo?

O homem de cabelos cinza deu de ombros. — Talvez, mas eu acho que o fato de ter me assumido gay é que foi a cereja do bolo. Eu sempre fui a favor de relacionamentos homoafetivos, e achei que podia fazer alguma diferença quando botasse os pés naquela paróquia, mas me enganei. Não foi bem uma deposição de cargo. — Ele fez aspas os dedos. — Eu escolhi cair fora e fazer o que sempre senti vontade de fazer, como compor rap underground, pintar o cabelo e fazer tatuagens. Foram três sonhos realizados, embora os meus pais não queiram me ver nem pintado de ouro hoje, mas eu não ligo. Eu sei que eles desejam secretamente que eu seja feliz.

Todos permaneceram calados, enquanto os mais jovens o olhavam com admiração.

O pseudo padre pigarreou, oferecendo a mão ao casal. — Que comece a cerimônia.

Taehyung não acreditou que se casaria pela segunda vez.

Era cômica a forma como Jeongguk surgiu de repente e pôs sua manhã de cabeça para baixo. Poderia provocá-lo e dizer que não estava de acordo com aquilo, mas não se daria ao trabalho enquanto estivesse sentindo o fervor da mão alheia contra a sua. A colônia cítrica que tanto desejou sentir outra vez. O tremular de cada movimento que apontava o delicioso nervosismo e que mandava calafrios para a boca de seu estômago.

Sua conclusão era o início daquela história. De sua própria história.

Era ao lado de Jeongguk que ele sorriria para sempre, semelhante ao presente, onde observava o marido colocar uma aliança de ouro em seu dedo mindinho. A jóia era ainda mais fina do que aquela que ambos possuíam no anelar.

Esqueceu-se de falar o quão bonito ele estava com o cabelo tingido de marrom, e se esqueceu de perguntar como ele reconhecia a finura exata de seu dedo mindinho ao que ele abrigava a peça de ouro com perfeição.

Claro.

Quase se esqueceu do delirante fascínio que o marido possuía por suas mãos. O Jeon, de fato, sempre acertaria a medida de seus anéis.

E sempre lhe falaria confissões bonitas como aquela, onde ele roubava cada pormenor pertencente ao rosto de Taehyung, enquanto este se concentrava em deslizar o objeto em seu pálido dedo mindinho.

Jeongguk sempre puxaria o marido para perto e tomaria seus lábios em um beijo que o deixaria de pernas bambas e sem qualquer fôlego restante.

Porque Jeon Jeongguk era uma maré constante, que permaneceria próximo de seus pés, escaldando-o com carinho e com o amor que nunca lhe faltaria. Ele era bom em mimá-lo com amor infinito.

Aquele amor infinito era tão presente quanto às folhas de outono que se prendiam aos seus cabelos desordenados pelo vento costeiro.

Inquieto, Taehyung se sentou na cadeira da primeira fileira repleta de adornos, observando seus amigos e Yoongi se posicionarem acima de um piso tubular, pouco a frente de outro grande arco de flores. — O que vocês estão fazendo? — Perguntou afoitamente.

 — Treinamos para fazer isso durante meses, Taehyung. — Namjoon suspirou pesado. Embora estivesse exausto, sorria com satisfação enquanto se posicionava em cima do palco. — Compomos uma música para você. Na verdade, Jeongguk e Seokjin compuseram o vocal e Yoongi, Hoseok e eu nos viramos com o rap e com a produção da canção. Hobi e Jimin ficaram com a parte que eu mais adoro, a coreografia.

Taehyung mal foi capaz de rir do comentário irônico de Namjoon quando a melodia deu início.

Jimin se posicionou mais à frente, de costas para os convidados. Parecia tão mais confiante e charmoso daquela maneira. Confiança que demorara anos para desenvolver, por receio de não demonstrar ser bom o suficiente.

 

Quero acordar, eu odeio esse sonho

Estou preso dentro de mim, estou morrendo

Não quero ser solitário

Só quero ser seu

(...)

 

Taehyung fechou os olhos.

A voz de Jimin era doce e deveras melodiosa. Deixou-lhe vontade de tomar café e comer bolinhos de laranja. Seu belo sorriso fez Taehyung sorrir também, contudo ele se obrigou a prender a respiração quando Jeongguk invadiu seu campo de visão.

O vento ameno bateu contra os fios castanhos, varrendo a musculatura de suas costas e sua face madura.

 

Por que é tão escuro onde você não está?

É perigoso como se eu estivesse naufragando

Me salve porque eu não consigo me segurar

(...)

 

Todavia, ele continuava sendo seu garotinho.

Seu coração bateu mais rápido com a mensagem refletida na voz harmoniosa. Subia-lhe arrepios pela espinha, secando seus lábios e enchendo seus olhos.

O sorriso de canto daquele homem lhe soprou uma mensagem oculta. Não tinha forças para rejeitar aqueles braços fortes. Sequer cogitaria a possibilidade de fugir do homem de sua vida.

O rapaz era um ser inacreditável. Não lhe soava real conforme dançava de forma tão independente. Jeongguk era capaz de aprender qualquer coisa com facilidade, certamente.

 

Ouça os sons do meu coração

Está chamando por você por vontade própria

Porque dentro desta escuridão

Você está brilhando intensamente

(...)

 

Seokjin era o hyung mais lindo que ele já viu. Não estava a par de sua voz angelical, ou do brilho luminoso em seus olhos quando cantava. Jin foi um dos melhores amigos que deixou entrar por sua porta.

Futuramente, chamaria-o para mais conversas no deck e pediria mais conselhos magníficos do rapaz. Sua sabedoria carinhosa o salvara de tantas controvérsias. Como um verdadeiro irmão mais velho.

 

Por favor, estenda essa mão, me salve, me salve

Eu preciso do seu amor antes que eu caia, caia

(...)

 

Aquela música lhe trouxe bons sentimentos, ainda que ela fosse adocicada com uma pitada suportável de melancolia.

 

Me salve, me salve

(...)

 

Aquela era a frase primordial que reproduzia tudo. Desde o início.

 

Hoje a lua brilha no vazio das minhas memórias

Este lunático que me engoliu

Por favor, me salve hoje à noite

Dentro dessa loucura em que você vai me salvar hoje à noite

(...)

 

Yoongi demonstrava satisfação enquanto exibia suas rimas bem elaboradas, e só naquele instante Taehyung veio a notar o quanto seus cabelos cinza e suas tatuagens lhe davam um aspecto cativante. A voz rouca atraiu a atenção de Gaeul, que balançava os braços enquanto permanecia no colo de Taehyung.

 — Você gosta de rap, meu amor? — Murmurou contra o ouvido da filha, observando a entrada estrondosa de Hoseok.

 

Eu sabia que você era a salvação

A única mão amiga que pode acabar com todas as minhas dores

O melhor de mim, você é a única coisa que tenho

Por favor, aumente sua voz e a deixe tocando para que eu possa rir

(...)

 

O rapaz possuía o sorriso mais vistoso da galáxia, que não se desfez em nenhum momento durante a melodia. Parecia uma poção de magia libertada no espaço. Seu corpo era leve como pluma, enquanto seus movimentos manifestavam uma facilidade celestial que de longe parecia real.

Hoseok e Jimin eram os melhores dançarinos que conhecia.

E Jeongguk era a mescla de todos os astros em um único corpo.

 

Obrigado por ter me deixado ser eu

Por ter me ajudado a voar

Por ter me dado asas, por ter me endireitado

Por ter me acordado desse sufocamento

Por me acordar de um sonho, que era tudo que eu estava vivendo

Pensando em você o Sol sai

Então joguei fora minhas tristezas

Obrigado por criar o "nós"

(...)

 

Taehyung admitiu a presença de lágrimas grossas ao ouvir os fragmentos feitos por Namjoon. Aqueles vocábulos eram uma curta declaração à Seokjin, mas o hyung os compôs também pensando em seu relacionamento com Jeongguk.

Namjoon mostrava agradável esforço dançando e manifestando uma voz tão bela. O suor que brotava de suas têmporas denunciava o quão aplicado estava sendo com cada passo efetuado. Mesmo que não fosse o melhor dançarino do planeta, seus gestos na dança fizeram Taehyung sorrir como se estivesse admirando o próprio deus da filosofia.

No final das contas, Namjoon sempre soaria como um pedacinho de seus amores paternos. Era deveras bonito aos seus olhos, como nenhum homem de mente colorida e jeito discreto jamais seria.

 

Por favor, estenda essa mão, me salve, me salve

Eu preciso do seu amor antes que eu caia caia

— BTS

 

Todos aplaudiram de pé, observando Taehyung correr para perto e abraçá-los com apego. Até mesmo Yoongi foi abraçado carinhosamente, acolhendo o gesto delicado e lhe devolvendo as palavras de aconchego. Um resquício de sua castidade sempre estaria ali. Embora soasse como uma confortável nevasca no campo, Yoongi sempre daria todo seu amor àqueles que mais necessitavam.

Taehyung puxou o marido pela gola da camisa, prendendo-o em seu beijo intenso e abundante de gratidão.

Jeongguk deitou Gaeul contra seu peito, tomando liberdade para puxar o outro para mais perto e deixar uma mordida calorosa em seus lábios.

 — Gostou? — Ele perguntou.

 — Eu amei! Vocês estavam, wow! — O Kim chacoalhou as mãos. — Eu não acredito que vocês aprontaram tudo isso. Onde arranjaram tempo?

 — Não foi difícil conciliar os preparativos do casamento com nossas semanas de visita. — Jin deixou um beijo em sua testa. — Estamos felizes que tenha gostado.

 — É um pouco tarde para dizer ‘surpresa’ agora, não é? — Jimin disse com timidez, encolhendo os ombros.

O ruivo observou as tímidas lágrimas nos olhos de Jimin, resolvendo transmitir sua total felicidade o abraçando com força. — Você é o melhor amigo do mundo, todos vocês. — Seus olhos percorrem cada rosto bonito, deixando um agradecimento silencioso a cada sorriso direcionado a ele.

Eram tudo para si.

Ele fitou seu sorriso predileto, mordendo os lábios para a cena de Jeongguk brincando com sua filha como sempre fazia. Observou-o jogar uma bolinha de borracha para Taegguk. O grande filhote correu para longe, movimentando-se ao redor dos convidados e os cativando com seus latidos precoces e patinhas peludas. Não sabiam se cachorros eram permitidos ali, mas se encarregaram de não deixá-lo fazer necessidades na areia de temperatura amena.

 — Papai!

Todos se direcionaram a vozinha jovial que ressoou próximo a Jeongguk.

 — O quê?! — Taehyung se aproximou da filha, tocando na mão miúda enquanto o marido permanecia boquiaberto. — Querida... O que você disse?

Gaeul olhou para o semblante pálido de Taehyung, mostrando suas gengivas rosadas. Ambos os pais sentiram uma vibração distante, como se tivessem ganhado uma estrela do espaço sideral.

O Jeon pingou uma lágrima, engolindo em seco ao que seu peito se apertava para o súbito silêncio da garotinha.

Sua menina falou papai, olhando em seus olhos. Tocando seus dedos ossudos.

A melhor sensação do mundo.

Ouviu os ruídos valentes do bebê, que se voltou para Taehyung e balançou os bracinhos em sua direção. — Pa...pai!

 — Oh, meu deus! — O ruivo tomou o bebê dos braços de Jeongguk, esfregando o nariz nas mechinhas pretas de Gaeul. Murmurava palavras incompreensíveis, fungando e sorrindo contra as mãozinhas gordinhas.

Os avós se aproximaram com pressa, batalhando por espaço ao lado dos filhos.

 — Diga ‘vovô’, querida. — Os homens diziam, ao mesmo tempo que as mulheres cochichavam ‘diga vovó’.

Gaeul pareceu gostar de toda a atenção desmedida, engasgando-se um pouco antes de rir como uma estrela sapeca.

Jeongguk riu com a criança, correndo com a filha em direção ao mar, contudo ele foi impedido por Jin, que disse não ser uma boa ideia levá-la para a água. A decepção em seus olhos durou tempo suficiente até que puxasse Taehyung em direção às ondas suaves.

Taehyung sentiu suas correntes e coroa caírem longe de seu alcance. A água embebendo seus membros e o levando de encontro ao rapaz. Ofegou contra os lábios vermelhos de Jeongguk, notando seu pranto discreto, que virava água do mar.

Seus dedos longos o empurraram para longe dos olhos negrumes, podendo observar o vidro, outrora embaçado, dando forma ao brilho de sereias mágicas

Jeongguk sempre sustentaria um lado emotivo perante o marido. Sustentaria mil sentimentos em um e os oferecia para Taehyung. Era daquela forma desde o princípio — onde não esperavam escrever seus destinos juntos, em uma única linha.

Taehyung esperava do fundo do coração que os amigos e parentes, parados próximos a areia, não tivessem visto as mãos intrusas o erguerem pelas coxas com desejo.

O rosto do Jeon descansou sobre seu peito. Taehyung deslizou as mãos pelos ombros de Jeongguk, deitando sua cabeça sobre a dele.  

Coroas de flores de todas as formas e tamanhos foram jogadas ao redor de ambos, exalando perfumes distintos e os oferecendo a certeza de que não deveriam estar em nenhum outro lugar, com qualquer outra pessoa. E não estariam.

Não estariam separados pelas estações novamente.

Aquele seria o melhor primeiro dia de outono de todos os tempos. Tinham convicção, uma vez que estavam um ao lado do outro novamente.

Gostavam da sensação de provar de amores simples. De viver o infinito cravado em cada uma das alianças que pesavam com o dobro de força em seus dedos.

Eram felizes.

 — Eu te amo, Taehyung. — Jeongguk sussurrou de olhos fechados, resvalando os lábios sobre a pele do queixo alheio e puxando as pernas enroladas em torno de si com ainda mais firmeza. Apenas desejava a certeza de que ele não escaparia para longe de seu alcance outra vez.

 — Eu também te amo, Jeongguk. — Taehyung fechou as mãos entre seus fios castanhos, suspirando a fragrância que, por tantas vezes, evidenciava sua presença em madrugadas escuras, onde saía do quarto para beber água e retornava ofegante, seguido pelos fantasmas dos beijos de verão. — Para sempre.

 — Isso me soa ótimo. Ainda temos muitas estações para viver, meu amor.

Jeongguk sempre amaria Taehyung, e Taehyung sempre seria sua salvação.

Até que somente restassem secas folhas de outono.


Notas Finais


Se eu não me engano, foi para a leitora SammySantos que eu disse, há um tempo atrás, que o Yoongi ainda daria as caras em Salvação. Bem, aí está!
Para quem não sabe, as primeiras letras são de Dead Leaves.

Então a hora chegou, né? Já estava no tempo de eu dizer adeus a Salvação. Hoje faz exato um ano que eu postei o primeiro capítulo dessa história e, poxa, vocês me receberam tão bem, foram tão carinhosos e atenciosos comigo. Eu quero dizer que me senti extremamente bem sempre que recebia mensagens de apoio e carinho aqui no Spirit, na ask, no twitter, enfim. Eu não imaginava que minhas palavras podiam salvar alguém. Sempre que alguém me relatava seu dia triste e dizia que minha história a alegrava e ajudavam-na a ter um dia melhor, eu vibrava de felicidade e respirava de alívio. É tão, mas tão bom receber esse tipo de mensagem. Eu agradeço por cada leitor que fez de Salvação uma fanfic bem vista, por cada comentário que me arrancou sorrisos bobos e por cada favorito que ultrapassou a faixa de mil coraçõezinhos. Mil e poucas pessoas que eu desejo que sintam o meu abraço e os meus beijinhos de conforto. Agradeço por tudo que me proporcionaram até o fim. Agradeço também aos leitores fantasminhas e aos leitores que comentaram por pouco tempo. Todos permanecerão no meu coração — mesmo que eu não saiba nem metade de seus nomes. O meu coração sempre terá espaço para essas mil e poucas pessoas que me deram o ar da graça. Para aqueles que leram mas não favoritaram também. Eu imagino que existam, e me sinto grata apenas por terem lido Salvação.
Todos vocês são leitores fantásticos. Me perdoem se eu não fui bem o exemplo de autora presente que vocês idealizaram, mas quero que saibam que eu sempre estarei aqui dando o meu máximo por vocês. Obrigada por cada carinho de manhã, tarde, noite e madrugada. Da mesma forma que a fanfic foi uma 'salvadora' de pessoinhas tristes, vocês, leitores, são os meus salvadores.

Obrigada por tudo, hm? Eu estarei postando novos trabalhos. Me observem para recebê-los e, se quiserem, leiam Par perfeito, a minha nova long taekook que estou postando agora: https://spiritfanfics.com/fanfics/historia/fanfiction-bangtan-boys-bts-par-perfeito-5935346

Todas as minhas one shots estão armazenadas no meu computador, e eu estou sem ele no momento, então postarei uma 2shot chamada CORPO CELESTE quanto recebê-lo de volta. Eu ainda estou escrevendo o plot, mas já peço que fiquem de olho se encontrarem uma fic na tag com esse nome, hm?

Beijinhos de luz e abraços de ursinho para cada um de vocês, minhas amorinhas! Foi um prazer viver com vocês durante estes 365 dias de Salvação! >< Espero poder ver, pelo menos, uma parte de vocês em outros trabalhos.Tirarei um dia para responder todos os comentários pendentes, okay? ;)

Obrigada por fazerem parte de Salvação. ❤


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