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História Salvatore - O Som da Praia


Escrita por: staargirl

Capítulo 3 - O Som da Praia


Fanfic / Fanfiction Salvatore - O Som da Praia

- Nós vamos andar até lá? - questionei.

 

- Claro que não - a garota virou e me fitou de novo, olhos em mim e depois em meu tronco, em direção à roupa que eu usava. O que tanto ela olhava? O que estou vestindo de errado? Por que estou incomodado com isso, o possível fato dela estar me criticando mentalmente? 

 

Fitei Lars, o visual hollywoodiano de sempre, calça jeans, muitas pulseiras, a porra de um rolex de 30 mil no pulso, botas e jaqueta de couro em pleno calor italiano. Eu estava igualmente de calça jeans e botas, mas ao contrário de Lars não sou louco e não coloquei jaqueta de couro alguma afinal eu nem trouxe uma na mala, apenas trouxe roupas de verão e de praia, por isso combinei a calça jeans com a primeira blusa leve que encontrei, uma camisa branca que lembrava uma camisa social, mas na verdade era uma dessas camisas leves de praia e com os botões de cima levemente abertos, expondo o começo do peito, uma camisa fresca para o calor e dobrei as mangas, nem ao menos coloquei um relógio, só querendo parecer o mais simples e menos chamativo possível. 

 

- O vilarejo é vazio, estamos indo para Lombardia é lá que a movimentação acontece.

 

- Nós vamos andar até a Lombardia? - Lars questionou reclamando e sorri internamente me sentindo vingado por ele ter escolhido usar uma jaqueta de couro no interior da Itália que faz 40 graus até a noite.

 

- Claro que não! Vamos de bicicleta! Tcharam! - ela parou de andar assim que chegou no canto da estrada, perto de algumas árvores onde várias bicicletas estavam amarradas  - São as bicicletas da família, usamos para ir ao centro ou fazer compras, é o nosso meio de transporte principal - ela abaixou e tirou um punhado de chaves de trás de uma moita - Precisamos chegar antes das 7 da manhã, é o horário que o meu irmão vai até o mercado  - a garota subiu na bicicleta e insinuou com o olhar que eu e Lars deveríamos subir nas outras duas com o cadeado aberto.

 

- É sério? - Lars riu de deboche.

 

- Não estamos nos Estados Unidos, riquinho americano, sobe logo - Isabella revirou os olhos, rebatendo Lars e gargalhei baixo, contente com aquilo.

 

- Sobe logo, Ulrich - sorri e subi na bicicleta, com o humor renovado e vendo Lars fazer o mesmo e xingar alto, tentando pedalar com a jaqueta de couro e o visual montado.

 

- Finalmente! - Bella sorriu e me fitou, fazendo-me sorrir ainda mais até por fim começarmos a pedalar na noite escura, a seguindo pelos caminhos, sentindo o vento batendo e levando o calor embora e após quinze minutos de pura escuridão e caminho de terra, finalmente vimos as luzes da cidade, a típica atmosfera italiana noturna  - Chegamos - Isabella parou de frente para uma livraria. Fitei a careta de Lars ao notar que estávamos na frente de uma loja de livros e apenas seguimos o que Isabella estava fazendo, trancamos as bicicletas no poste e seguimos os passos da garota para dentro do lugar.

 

- Eu juro por Deus que se a tal festa for leitura de poesia eu me mato - Lars sussurrou.

 

- Eu não sou surda, Lars - Isabella falou enquanto passávamos por dentro da livraria - Tudo acontece nos fundos, nunca ouviu esse ditado? - continuamos caminhando até o fim do estabelecimento quando Isabella bateu três vezes de forma combinada numa porta discreta nas últimas prateleiras. A mesma foi aberta minimamente e trouxe um som abafado de música alta - É a Bella, abre aí, eu trouxe uns amigos. São americanos - disse tudo em italiano enquanto Lars traduzia pra mim. 

 

A porta foi fechada de novo, me deixando confuso, até escutar o barulho de trincos sendo puxados.

 

- Eles dão as melhores festas, é uma loucura! 

 

E por fim a porta foi aberta, uma mão rápida nos mandou entrar e logo o choque do som alto, da escuridão, o abafado de muitas pessoas dançando, as luzes de danceteria piscando entre meus olhos e a porta sendo fechada. Tudo que eu não queira. Sem paz. Muitas pessoas. 

 

O cara que abriu a porta virou para nos fitar e nos guiar escada abaixo - Quem são seus amig...PUTA MERDA, BELLA, VOCÊ TROUXE O METALLICA PRA MINHA FESTA? - o cara gritou em um sotaque misturando inglês e italiano mas o suficiente para que eu entendesse, logo entrei em pânico...tudo que eu não queria...ser reconhecido. Minha cara fechou na hora, o ar faltou, desespero, pânico social e vontade de sair correndo daqui, claro que Lars estava radiante de felicidade. Fitei Isabella, parecia perdida e confusa, como se não soubesse o que o amigo falava - VOCÊ TROUXE O JAMES TAMBÉM?

 

- Que? Metallica? Quem é James? - foi a única coisa que a garota perguntou enquanto andávamos para o miolo da festa.

 

Diminuí o passo ao descer as escadas, querendo ficar longe de tudo aquilo, parei no meio do caminho até parar de escutar a voz de Lars e do tal amigo de Isabella, até que por fim fiquei sozinho e respirei fundo, desesperado com o fato de ser reconhecido, quebrando tudo que eu tinha planejado para esses 45 dias longe da fama.

 

Olhei para frente e descobri que estava sozinho e após cinco minutos experimentando uma quase crise de pânico social e fama, desci as escadas, sabendo que o melhor seria ir embora mas me toquei que nem ao menos sabia o endereço da casa do Manciorinni, estava num papel escrito dentro da minha mala. E o fato de não saber pedir um táxi em italiano. Nem falar italiano. Parabéns, Kirk! Você é um idiota. 

 

Recuei e respirei fundo, desci as escadas planejando ficar bêbado e longe de todos e torci para que Lars tenha sido o suficiente para todos e pude notar onde ele estava pois era o local com a maior concentração de pessoas, gritos e flashes de câmeras analógicas. Decidi ir para a direção contrária e abaixei a cabeça, passando por entre todas aquelas pessoas, tentando não ser reconhecido, fracassei, senti meu braço sendo tocado algumas vezes, ignorei, escutei meu nome algumas vezes, ignorei e passei reto, o coração na boca, pois vim parar exatamente no lugar que eu menos queria estar, um lugar em que sou reconhecido, uma festa, aglomeração.

 

Fui até uma mesa de bebidas e a decepção ficou ainda maior, a única bebida que tinha ali era ponche alcoólico nojento e shots de gelatina, isso com certeza é uma festa de faculdade.

 

Xinguei baixo e desisti de ficar bêbado.

 

Encontrei o único lugar para sentar, um sofá de canto perto da mesa de bebidas e sentei longe dos adolescentes se pegando. Escorei no sofá, abri outro botão da camisa, suando de calor e desespero e esse foi meu plano, ficar ali sentado e longe de tudo. 

 

Olhei ao redor, meus olhos com um alvo específico e percebi que Isabella não estava perto de Lars. 

 

Varri os olhos pelo lugar, fitando várias pessoas e então ela...se destacando no meio de todos, pulando e dançando com seu vestido branco de seda, os cabelos voando, os olhos fechados, a mão com um copo de bebida vermelho e dançando, girando, rodando, movendo os quadris, parecendo um anjo, um grande destaque de originalidade no meio de centenas de pessoas, balançando a cabeça e os braços, dançando, hipnotizantemente dançando ao som de algum pop agitado italiano desconhecido.

 

E esse foi o foco da minha visão durante uma, duas, três, quatro músicas até ela parar de dançar e se afastar para conversar com uma amiga. Os lábios rosados ainda com gloss grudados no copo de bebida, o sorriso, rindo de algo que a amiga falava. 

 

- Ei, cara, Kirk Hammett, né, porra eu sou um grande fã da sua banda, olha aqui - me assustei com o flash da câmera e dez pessoas em cima de mim. Sorri sem jeito, desesperado, em pânico, cercado, levantei perdido, não querendo ser rude, mas sem paciência alguma para aquilo, paranoico, me sentindo em uma das festas de Los Angeles que eu tanto quis fugir nesses dois meses sabáticos, e saí correndo, dando passos para fora daquele lugar, sem ar, claustrofóbico, por fim saí, bati a porta de novo e respirei fundo de alívio quando cheguei até a livraria vazia sem som e sem pessoas.

 

Não vou ficar lá dentro, nem que eu fique até cinco da manhã aqui fora esperando os dois saírem, mas não entro de novo.

 

Saí da livraria e sentei no lado de fora, num batente alto no meio da calçada e as costas encostadas no vidro da fachada da livraria. Frustrado por não conseguir voltar para a pousada sozinho.

 

Após quase uma hora respirando ar fresco, algo machucou minhas costas e notei que eu estava sentado na frente da porta de vidro da livraria e alguém tentava sair. Apenas saí da frente e virei a cabeça para o lado tentando não ser reconhecido.

 

- Você não tá curtindo, né? 

 

A voz aveludada, meus olhos no chão captaram o vestido branco. Isabella. 

 

Levantei a cabeça imediatamente, surpreso, não esperando encontrá-la ali. Ela tinha um copo de bebida nas mãos e caminhou em minha direção, subiu no muro onde eu estava sentado e sentou-se de frente para mim, o perfume dela em minhas narinas, o rosto corado pelo álcool que ela bebia. Ela sorriu, olhos compreensivos e calmos.

 

- Não muito - respondi, a fitando - Não tenho mais 20 anos - sorri sem jeito - Não tenho mais energia para essas festas. Sem ofensas.

 

Ela gargalhou - Tudo bem. Eu tenho 22. E você tem o que...30? Não parece ser velho.

 

- Tenho 32...mas há dez anos atrás eu com certeza aguentaria essa festa.

 

Saber a idade dela gelou meu estômago. 10 anos mais nova.

 

Lembrei de quando eu tinha 22. 

 

Ela sorriu e levou os dedos até meu joelho, fazendo-me tremer, as unhas em cima da minha calça jeans, aquele toque, o toque feminino que há tempos eu não sentia, respirei fundo - Olha, me desculpa, eu não sabia que vocês eram famosos...eu tô em choque pra falar a verdade - outro riso - A galera lá dentro mora no centro, eles têm televisão e programas de fofoca, são bem informados. Você já deve ter percebido que eu não tenho nada disso em casa, né. Nem televisão. O lugar é paradisíaco, mas longe do mundo real, meus pais são bem chatos e antiquados. 

 

- Tudo bem, relaxa. O Lars tá adorando.

 

- É, ele tá curtindo mesmo - sorriu, deu um gole na bebida, tirou a mão do meu joelho - O que vocês tocam? São tipo uma dupla de música?

 

- Na verdade, nós somos uma banda inteira, quatro pessoas. Metal. Metallica. Nunca ouviu falar? - perguntei surpreso e ela balançou a cabeça negativamente.

 

- Metal? Ah, eu não escuto isso - outro riso - Não se ofenda. 

 

- Isso é bom, conhecer alguém que não leu alguma mentira sobre mim em uma revista. 

 

- E o que escrevem sobre você nas revistas?

 

- Ah, muitas coisas, nem consigo selecionar as piores.

 

- Sexo, drogas e rock n roll...e...ah, gro...gru...desculpa eu não sei falar essa palavra na sua língua.

 

- Groupies. É bem por aí.

 

- E você não é nada disso?

 

- Perde a graça com o tempo. Na verdade acho que nunca fui esse cara, casei novo e sempre fui o tímido da turma.

 

- Você é casado? - questionou em um grito e forte sotaque italiano e desceu o olhar para minha mão, provavelmente procurando um anel. Sua reação me surpreendeu.

 

- Não mais. Recém divorciado.

 

- Sinto muito.

 

- Não sinta. O casamento não estava dando certo, a separação foi a melhor decisão.

 

- Onde não há amor, não se deve permanecer.

 

- Certamente não havia mais amor ali.

 

-  E por isso veio para o fim do mundo? Se esconder da fama em Pandino? - olhos nos meus, ela mantinha o contato visual com tamanha facilidade que sentia minhas bochechas corarem, os pelos do rosto arrepiando. Me senti um idiota. 

 

- Exatamente - sorri, surpreso em como a garota já captou tudo que estava acontecendo.

 

Levantou - E para me redimir, sei do que você vai gostar, vem comigo - caminhou até as bicicletas - Voltamos daqui a pouco para buscar seu amigo, não se preocupa.

 

Levantei, perdido com a reação dela, porém curioso e estranhamente animado, fui até a bicicleta ao lado da dela e subi, Isabella começou a pedalar pelas ruas italianas vazias na madrugada, a segui, pedalando no mesmo ritmo, e então ela virou o rosto na minha direção, pedalando devagar, o vestido de seda voando, as pernas descobertas em movimentação, os cabelos longos voando pelo vento suave da noite e ela sorriu, abriu um sorriso branco de gengiva rosada em minha direção, retribuí sem jeito, senti o coração bater rápido e bombear um sangue quente para meu corpo, tentei culpar a adrenalina de estar pedalando, mas no fundo sei bem o que causou isso dentro de mim, o sorriso da garota.

 

Ela pedalou pelas ruas, eu atrás dela, dividindo meu olhar entre fitar a paisagem paradisíaca da Lombardia e ela. Notei quando Isabella diminuiu o ritmo da bicicleta assim que entrou em um beco estreito, continuei a seguindo, sorrindo de mim mesmo, pedalando às duas da manhã na Italia e seguindo uma garota desconhecida em um lugar desconhecido. 

 

Enquanto pedalava, senti uma brisa muito forte vindo em minha direção e o cheiro de mar também, e foi aí que descobri, assim que pedalei para fora da rua estreita e passar por uma ponte  que ela havia me trago para o lugar mais lindo do mundo, uma gruta no meio de uma praia vazia. Ela virou para trás e sorriu, sorri de volta enquanto continuávamos pedalando, agora pelo calçadão de frente para a praia, a brisa do mar, o cheiro da praia, o barulho das ondas.

 

Isabella parou e desceu da bicicleta, escorando a mesma num poste. Fiz o mesmo, repetindo cada um dos atos dela. A segui com o olhar, vi a garota tirar a sandália e pisar na areia, ela virou, sorrindo em minha direção, desviei o olhar engolindo em seco quando percebi que não queria desviar o olhar, que queria olhar mais pra ela, cada centímetro do rosto dela, das pernas conforme ela andava descalça pela areia, os braços descobertos pelo vestido de alcinha, as costas nuas conforme ela andava de costas - Vem - ela virou de novo, sorrindo, a voz suave como um canto de sereia prestes a afogar um marujo, desci, tirei os sapatos e senti a areia gelada e fina entre meus dedos, uma sensação de calmaria conforme andava, seguindo a garota de uma beleza surreal, tão linda que nem parecia verdade, tão linda que deveria ser um crime nascer com um rosto desses, como um sonho, como uma sereia - Um lugar sossegado para o turista em busca de paz - ela sorriu - Melhor que a festa? 

 

- Incrível - continuei caminhando e percebi quando Isabella parou e sentou na areia, sentei ao lado dela, nem perto, nem longe - Mas estou me sentindo mal por ter tirado você da sua festa. 

 

- Relaxa, eu vou em festas como aquelas toda semana - sorriu e virou em minha direção, olho no olho, desviei, fitei a água cristalina, engolindo em seco quando a garota se moveu na faixa de areia e sentou mais perto de mim, quase colado, à medida que me fez sentir o cheiro do perfume dela vindo com o vento e os cabelos voando em mim  - E então, está gostando da Lombardia? - ela perguntou e em seguida gargalhou. Fiquei curioso com o motivo do sorriso.

 

- Por que sorriu?

 

- Porque percebi que já te perguntei isso também, então só estou tentando puxar assunto. 

 

Sorri também, ver ela sorrir me dava vontade de sorrir também como se algo nela puxasse minhas bochechas e me obrigasse a mostrar os dentes - Eu tô gostando muito, a pousada da sua família é o paraíso para quem busca paz.

 

Ela sorriu e em seguida fez uma careta, fiquei curioso - Nossa eu tô me sentindo péssima por ter trago você em uma festa, se eu soubesse que estava a procura de paz eu…ou que você era um cara importante...me desculpa. 

 

Sorri com o “cara importante”, abaixei o olhar, desviando dela e fitei as ondas quebrando pela maré baixa na areia - Não precisa se desculpar, eu vim porque quis, ou melhor, porque Lars me obrigou - falei e ela sorriu, me senti aliviado, não queria que a garota se sentisse culpada  - E estou gostando muito da noite - fitei a praia ao redor, notei Isabella olhando em minha direção, engoli em seco - Eu não quero atrapalhar sua noite, se quiser voltar para a festa, só me coloca dentro de um táxi e diz o endereço da sua casa porque eu não consigo me comunicar na Italia - sorri a fazendo gargalhar alto, notando como ela jogava a cabeça para trás ao sorrir e como era impossível ficar mais de um minuto sem olhar para ela, como um imã me puxando para o rosto dela. A garota é de uma beleza surreal, deve causar esse efeito em todos e pra melhorar estou nervoso porque não convivo com uma mulher há muito tempo, problemas do divórcio e de um casamento infeliz e fiel só de uma parte. A garota é linda, olhei pra ela de novo, desviei, porra, linda. Fitei de novo, ela ainda me fitava e sorria, as longas pernas bronzeadas esticadas na areia, um vestido curto de seda, cabelos voando e o cheiro de xampu vindo em minha direção, lábios carnudos com um sinal em cima e um sorriso grande e branco que deve parar ruas. Porra, ela é linda, provavelmente a mulher mais linda que já vi na vida, até mesmo do que italianas em filmes. Será que a solidão e o divórcio estão me deixando tão sensível assim? Tirei esses pensamentos da cabeça na hora, vim atrás de paz, solidão e não confusão.  

 

- Quero ficar aqui. Gosto dessa praia.

 

Sorri, sentindo os pés na areia, fechei os olhos, a brisa do mar, respirei fundo naquela imensidão tão calma, tão longe da correria de Los Angeles.

 

- Kirk - abri os olhos quando escutei meu nome em um sotaque italiano sair da boca de Isabella, abri os olhos na hora, como um gatilho para meu cérebro ansioso para tudo que vem dela, em uma fração rápida de segundos, a fitei, indicando que estou prestando atenção e ela abriu os lábios volumosos e fechou duas vezes, olhou para frente, olhou para mim de novo, parecia perdida ou receosa, em seguida ela falou - Como é a América?

 

Me surpreendi com aquela pergunta, pensei e sorri - Eu acho que não sou a melhor pessoa pra falar disso agora, ando fugindo da correria de Los Angeles e talvez eu quebre suas expectativas sobre a terra dos sonhos. Me pergunte isso daqui um mês, talvez eu esteja com saudade de casa. 

 

- Vou perguntar, pode ter certeza - ela sorriu baixo e olhou para o mar, notei a expressão no rosto dela - Como é sua vida lá? - perguntou de novo e eu quis responder só para não mais ver os olhos dela naquela tonalidade de dúvida - Não quero ser invasiva, só fiquei curiosa depois que meu amigo te reconheceu na festa. Eu não quero saber sobre a fama, quero saber sobre você, quem é você quando não é famoso.

 

Me surpreendi mais uma vez com a profundidade daquela pergunta, mas europeus costumam ser assim, me acostumei com o jeito de ser de Lars, e a garota que mal conhecia me perguntando algo que eu não sabia responder há tempos, desde que parei de sentir, a fama, a bebida, o casamento em ruínas e o fundo do poço. A verdade é que estou tão acostumado a só fugir de jornalistas e encher a cara durante a turnê que não lembrava a última vez que havia conversado de verdade com alguém, alguém do mundo real - Huh, no momento sou um cara amargurado lidando com um divórcio, mas eu já fui mais alegre. É muito difícil saber quem eu sou fora da fama porque nos últimos anos, principalmente de uns 4 anos pra cá quando tudo estourou, é só isso que tento fazer, fugir da fama, tentar não ser o cara famoso que nunca está em casa e se perdeu porque nunca tem tempo pra ser ele mesmo - não soube como todas aquelas palavras sinceras saíram de mim com tamanha facilidade para uma estranha. É muito difícil me abrir com alguém.

 

- Então está aqui para se encontrar?

 

- Paz de espírito na verdade.

 

- Mais como uma fuga?

 

- Isso - sorri - Mas chega desse assunto, não quero que pense que sou um cara chato. 

 

Merda. Na hora que falei “não quero que pense” já deixou óbvio que eu me preocupo com o que ela pensa. Merda, Hammett. Cale a boca. 

 

- Não é chato  - sorriu - É legal saber a vida de outras pessoas, quando se mora em um lugar pequeno como Pandino, todos sabem sobre todos, você é novidade no pedaço - ela sorriu e sorri de volta, sem conseguir desviar - Você está triste, Kirk?

 

E mais uma das perguntas nuas e cruas que eu não esperava receber - Não estou triste, estou um pouco aliviado pra falar a verdade, apenas um pouco desnorteado. É como você disse, onde não há amor, não se deve permanecer - repeti a frase que ela me disse uma hora atrás.

 

- Isso serve pra tudo - ela sorriu, mas foi um sorriso baixo, um sorriso escondendo algo e isso me deixou intrigado.

 

- Como por exemplo? - criei coragem e assim como ela, perguntei o que queria perguntar, de forma disfarçada, claro, não tenho tanta coragem quanto a garota de falar na lata. 

 

- Eu nunca saí de Pandino, não conheço o mundo real. Odeio aqui. 

 

- Ah - mais uma vez surpreso com a fala dela e mais uma vez perdido, sem saber o que falar ou fazer, focando no olhar dela - Entendi.

 

- Se o divórcio te aliviou, por que você está desnorteado? Não deveria estar contente e aproveitando a vida?

 

Outra pergunta crua, sorri, respondi, adorando como a garota não tem medo de perguntar o que quer saber, astuta - Eu casei muito novo, um casamento de 7 anos que foi metade à distância e sem confiança, o amor acabou no segundo ano, depois só fomos arrastando por comodidade, eu tentei me divorciar, não estava feliz, ela também não, mas ela não quis. No final das contas, descobri que fui traído - olhei pra baixo - E quando percebi que não me importava com a traição porque não mais a amava, soube que não deveria permanecer mais naquele casamento. Mas eu fiquei com raiva, confesso, saber que foi traído é péssimo, acaba com o emocional.

 

- Está sendo hipócrita na sua fala?

 

- Como assim?

 

- Quer dizer, você é famoso na américa, os homens na américa costumam ser libertinosos como diz meu pai - sorriu baixo - Você famoso tem muitas mulheres ao redor todos os dias, você nunca pulou a cerca quando estava casado?

 

Sorri com a forma com a qual ela falou - Nunca fui infiel. Eu acredito em algo, quando alguém pensar em trair outra pessoa é porque não tem mais sentimentos por ela, então pra que permanecer? Onde não há amor, não se deve permanecer.

 

- Seria bom se todos os homens pensassem assim - a garota sorriu, percebi que eu não parava de olhar pra ela há minutos, o rosto dela...tão convidativo, tão bonito, impossível não olhar, tudo nela tão bonito, desviei.

 

- Por que você não vai embora de Pandino? - minha vez de fazer perguntas - Você é jovem, tem o mundo todo nas mãos.

 

- Queria que fosse fácil assim - outro sorriso de Bella, esse sem mostrar os dentes, fitei o perfil dela de nariz empinado enquanto olhava para o mar da mesma cor do olhos - Tenho pais conservadores, venho de uma família tradicional no interior da Italia que nem me deixam assistir televisão, estou presa aqui, quero fazer faculdade, ter minha vida, mas meu pai diz que lugar de mulher é na cozinha e não estudando, só queria ter a chance de fugir de tudo isso, escapar para a América, fazer faculdade - senti meu estômago revirar ao ouvir tudo aquilo, os problemas da jovem garota, me senti sufocado só de pensar em estar no lugar dela e ao mesmo tempo um misto de ódio e nojo dos pais dela me atingiram, a prendendo, o olhar sonhador enquanto falava a palavra “américa” com um sorriso nos lábios e forte sotaque italiano - É por isso que eu escapo toda noite, pra viver, pra conhecer pessoas, festas e sair daquela pousada longe da realidade. Eu quero estudar o mundo, quero viver no mundo, não conheço o mundo, eu to presa aqui desde que nasci, não conheço filmes americanos, nem livros, nem músicas americanas porque meu pai vive dizendo que todos são libertinosos e vão nos desvirtuar. Meu pai chama você e seu amigo de hóspedes impuros. Por isso não conheço sua música - ela virou os olhos em minha direção - Você podia me mostrar um dia. 

 

Abri a boca para falar, mas não saiu nada, gaguejei e eu não gaguejava há uns dez anos no mínimo, ainda em choque com tudo que ouvi, com a vida, com os sonhos, com o olhar dela, com todas aquelas informações em tão pouco tempo me fazendo sair da minha bolha egoísta de só pensar em meus problemas o dia todo e agora sinto pena da garota em minha frente presa e querendo ter o mundo nas mãos, a garota sonhadora que merece ter o mundo nas mãos. Percebi nesse momento como sou ingrato com a vida que tenho, como reclamo tanto quando tenho tudo nas mãos, me senti mal. Mas algo me fazia sentir bem, a verdade na garota, como ela era crua e não tem medo de falar, e faz tempo que não conheço alguém real, sincero e tenho uma conversa tão franca quanto a que tive agora. 

 

A garota abriu os lábios para falar algo, foquei mais uma vez no rosto dela, incapaz de desviar o olhar dos olhos dela, o perfume em meu nariz, notei que ela não falou logo e desviou o olhar, notei o perfil dela de nariz empinado fitando o mar - Meu Deus, seu amigo! - Bella levantou em um pulo da areia e só então, notei que já estava amanhecendo, o horizonte claro, a maré aumentando - Precisamos voltar antes dos meus pais acordarem - ela correu pela areia, apressada, os pés afundando conforme ela segurava o vestido nas mãos, chegou na bicicleta, montou, pedalou rápido, fiz o mesmo, tentando acompanhar ela.

 

Me surpreendi pois nem percebi o tempo passando. Balancei a cabeça negativamente quando percebi que minha noção de tempo foi tão afetada pelo rosto belo de Isabella. Menos de 15 minutos depois chegamos de frente a livraria e do lado de fora, Lars só o resto, morto de bêbado e escorado na calçada - Vamos - Isabella falou apressada, provavelmente com medo de ser pega pelos pais. Senti medo. Não queria que Isabella se encrencasse. 

 

Pedalamos rápido, Lars atrás, reclamando, com sono, bêbado, sorri, parei de sorrir ao notar a expressão de Isabella, correndo, aflita, pedalando rápido, o sol cada vez mais alto, atrasada. Ela olhou pra trás algumas vezes, e eu quis me iludir achando que ela estava olhando pra mim, pois eu retribuí, olhando pra ela de volta, mas no fundo sei que ela só estava olhando pra ver se eu e Lars estávamos muito atrás, nervosa pra chegar escondida em casa e não ser pega. Eu não estava no seu campo de visão como um objeto de interesse, como ela estava no meu, pois a carne é fraca e não me orgulho disso e eu estava olhando pra ela pedalando, sem conseguir desviar dos cabelos indo pra lá e pra cá deixando as costas nuas a mostra, o vestido de alcinha, as coxas e pernas conforme pedalava.

 

Eu estava perdido naquele caminho de mato, até que notei quando ela parou a bicicleta e a jogou de qualquer jeito entre os arbustos, estava vermelha e levemente suada pela velocidade que pedalamos. Chegamos. A garota apontou para que fizéssemos o mesmo e nem esperou, ela saiu correndo, desesperada para não ser pega pelos pais. Eu e Lars a seguimos, andando um pouco atrás, puxei Lars sonolento e caindo de bêbado, passamos pelo mesmo caminho escondido da ida, Isabella bem mais na frente eu nem mais a enxergava. Passamos pela casa vazia, o relógio marcando 6:45 da manhã, arrastei Lars pela escada e cheguei ao corredor dos quartos, empurrei Lars pra dentro do quarto dele e caminhei até o meu, na ponta dos pés, respirei aliviado ao ver que todos estavam dormindo e Bella não foi pega.

 

Sorri assim que percebi que pensei nela como “Bella”, oras, também já a dei um apelido. Cuidado, Hammett, você veio atrás de paz.

 

- Desculpa a correria - ouvi a voz aveludada e sussurrada como um soco na boca do meu estômago, nervoso, Bella parada atrás de mim, descalça, segurando o sapato nas mãos para não fazer barulho e escorada na porta do meu quarto, há uns trinta centímetros de mim - Ainda tenho quinze minutos até todos acordarem - sorriu - Só queria agradecer pela noite e companhia, Kirk. 

 

Abri a boca num gaguejo, sem saber o que responder, certamente querendo agradecer também, surpreso com as palavras dela, a forma como o meu nome sai dos lábios volumosos dela, num sotaque Italiano, num sussurro. Me apoiei na parede ao lado, tentando manter minhas pernas retas e não tremendo - Eu que agr…- comecei a falar e parei na hora, assustado, e ela também ao julgar pelos olhos arregalados da garota, no momento que ouvi um ranger de portas, alguém acordando. Notei o desespero dela, a garota agiu rápido, em questão de segundos, entrou na primeira porta que achou e me puxou junto, senti os dedos dela no meu braço, nos escondendo, notei que estávamos no meu quarto, ela bateu a porta rapidamente, nos grudando.

 

Respirei fundo, nervoso, não pelo nervoso como ela pois alguém de sua família acordou e a pegaria no flagra depois da fuga para uma festa, mas nervoso porque a garota estava grudada em mim, nos escondeu com tamanha rapidez que se empurrou em minha direção no momento que fechou a porta do quarto, barriga com barriga, pernas com pernas, peito com peito, podia sentir a rapidez com a qual o coração dela batia, o cheiro dela, o macio da pele pois meu pulso roçava levemente perto do braço dela, Bella subiu os olhos e levou o indicador até meus lábios, encostando o dedo em minha boca, pude sentir o contato de pele da mão dela na pele da minha boca, o hálito quente fazendo cócegas no meu rosto conforme ela respirava rápido.

 

O barulho no corredor cessou, ela se afastou - Desculpa por isso, acho que meu irmão acordou - ela sorriu sem jeito, o rosto avermelhado, olhou pra baixo - Ele deve estar no banheiro, vou aproveitar pra entrar correndo no meu quarto e fingir que estou dormindo - sorriu, tocou em meu ombro, deixando-me tremendo na base, ela chegou até a porta do meu quarto, segurou o trinco, virou em minha direção e sussurrou - Te vejo em duas horas no café da manhã - sorriu e saiu, andando devagar pelo chão e sumindo da minha vista, fechei a porta do quarto.

 

“Te vejo no café da manhã” ecoando em minha mente como uma maldita música grudenta. O cheiro dela, a proximidade, como estava colada em mim há dois minutos atrás. 

 

Caí na cama e respirei fundo.



 



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