História Sarapintado (ShinKami) - Capítulo 19

Denki virou o rosto para trás, vendo Ochaco encostada na batente da porta de entrada, esta mesma que voltou para dentro assim que foi encarada, fazendo Kaminari engolir em seco e continuar a olhar para a frente. Eijirou estava ao seu lado e estavam sendo observados por três outras pessoas, mas que não conhecia e nem ao menos eram de seu reino.

Sua vista depois disso foi para a garota ao lado de um daqueles soldados desconhecidos, toda descabelada, sangue saindo de sua boca e nariz. Ela olhava constantemente para baixo, em silêncio o tempo todo. A observava com pena, infelizmente um sentimento que não tinha como arrancar de seu coração.

Quase pulou de susto quando sentiu uma mão pousar forte sobre seu ombro coberto.

— Você também mandou muito bem, meu querido. — disse um homem desconhecido e o loiro forçou um sorriso. Este mesmo homem se virou agora falando com Kirishima — Ei, mano, qual o nome dele?

— É Denki. — ele falou, sorrindo mínimo

— Denki, você mandou muito bem... Eu já falei isso para você? — ele perguntou sem graça

— Na verdade, já.

— Ah foi mal, mas enfim, mandou bem demais. Você e a garota tá bom?

— Tudo bem, Tetsu — o moreno pronunciou os interrompendo —, deixe-o em paz, ok?

— Ok, ok. Bem, vamos levar logo esta aqui para Ettarats, né, Kendo?

A garota acenou em positivo enquanto ajudava a algemada a montar no seu cavalo.

— Hã, licença. - chamou a atenção deles — Vocês irão fazer o que com ela assim que estiverem lá?

— Ah, não sabemos. — proferiu Tetsu-Tetsu dando de ombros — Provavelmente a torturarão para conseguir informações, e se ela não morrer lá, vai ser presa em perpétua. Além disso, ela pegou o cataclismo com vocês, da mesma forma.

— Entendi.

— Enfim, até outro dia, mano. — estendeu a mão enveludada e Eijirou a apertou com força, mostrando confiança

— Até lá, mano. — disse seguro

Antes que eles partissem, Toru finalmente levantou a cabeça, mostrando um sorriso medonho e totalmente fora do normal, tanto que fez Denki se arrepiar.

— Eu tenho muitos amigos, Denki. — ela disse baixo, antes de Kendo lhe dar um tapa no braço, mandando-a ficar quieta

Então as três pessoas se despediram, Tetsu-Tetsu, Kendo e o garoto loiro que não descobriu o nome, levando junto deles Hagakure, que agora permanecia quieta como lhe mandaram.

No momento em que eles partiram, os dois se viraram e começaram a andar em direção à cabana novamente. Ele o abraçou de lado enquanto caminhavam devagar.

— Ei.

— Hum?

— Eu te conheço tempo o suficiente para saber o que essa cara significa.

— Que cara?

— Essa aí que você está fazendo.

Kaminari suspirou, dando de ombros.

— Acho que só estou apreensivo por Toru.

— Mesmo depois de tudo que ela fez? — ele interrogou indignado

— É, sabe, ela era minha amiga também.

O moreno suspirou, bagunçando os próprios cabelos quando pararam na batente da porta. Conseguiam ver Uraraka preparando alguma coisa no fogão. O maior negou com a cabeça vendo ela fazendo aquilo. Ele próprio tinha falado para ela não se preocupar com aquele tipo de coisa. Ela estava grávida, e mesmo que ainda não estivesse em condições que a deixariam mais debilitada, ainda temia pela saúde dela e do bebê, então tentava deixá-la o mais longe possível das tarefas de casa.

— Ela nos enganou, Denki. — virou-se para ele novamente — Ela nunca foi nossa amiga, ela só fingia.

— Eu sei, mas ainda assim não apaga os momentos em que nos divertimos juntos, entende? Existia uma Toru que era nossa amiga, mesmo que ela tenha sido falsa.

Eijirou suspirou, parecendo desistir de tentar fazê-lo mudar de ideia. Ele só concordou e os dois entraram, mas antes do moreno ir em direção à cozinha para ajudar a mulher, o louro o segurou pelo pulso, chamando sua atenção.

— Ei, é só que... Eu ouvi ela falar alguma coisa sobre ter um monte de amigos. — desviou o olhar — Você acha que deveríamos nos preocupar?

Kirishima franziu o cenho enquanto abaixava a cabeça e assentia.

— Sim, pode se esperar tudo de traidores como ela. Na verdade, não ficaria nada surpreso se tivesse mais três deles no esquadrão. — negou com a cabeça, contudo, logo sorrindo em direção à Denki — Vai ficar tudo bem, vamos passar disso. Não precisa se preocupar com nada, certo? Só preste atenção ao seu redor.

Kaminari assentiu, finalmente deixando ele ir até a cozinha enquanto as palavras dele e de Toru reverberavam sobre seus pensamentos obscuros.

×××

Denki bateu algumas vezes na porta, ainda ouvindo somente o silêncio. Com um prato de comida nas mãos olhou para Ochaco que só encarava a situação e que deu de ombros, deixando Kaminari sozinho para verificar se Eijirou não tinha desmaiado no quarto. Bem, esperava que não. Desde as últimas semanas ele não maneirava a bebida e ficavam assim, sem saber o que fazer.

Já tinha tido uma conversa com Uraraka sobre a situação de Kirishima e o possível ponto que o deixou assim. Ela concordou, dizendo que realmente tinha algo estranho com ele e não pareceu repreender o romance do mesmo com o príncipe. Não chegaram a uma conclusão do que poderiam fazer com ele além de conversar, mas ele sempre desviava quando tentavam fazer ele desabafar ou quando ao menos conseguiam tocar num ponto do herdeiro.

O loiro suspirou então, entrando no quarto que parecia mais uma caverna de tão escuro. Conseguiu visualizar o corpo jogado do moreno na cama e então respirou fundo mais uma vez enquanto deixava a comida de lado sobre a cômoda e andava até o corpo desacordado. Tentou o acordar o chamando e remexendo o ombro dele, contudo, o maior só resmungava algo e voltava a dormir. Dava para ver pelo bafo dele que ele já tinha bebido pelo menos umas três garrafas de algo contendo álcool. Revirou os olhos enquanto agora tentava — e conseguia — com o resto de suas forças o erguer e colocar de pé para irem até o banheiro. Iria lançar uma ducha de água fria na cara dele para ver se aquele ser acordava de vez.

Arfou aliviado quando finalmente pôde colocá-lo no chão do banheiro, se esticando enquanto tentava arranjar mais força para dar um banho nele ou pelo menos o molhar para o acordar. Desceu a manga de sua blusa até o cotovelo, vendo que a coloração já tinha descido até mais embaixo. Azul e amarelo formavam uma raiz que se estendia ramificada e bonita pelo membro. Percebeu no último banho que apareceu uma mancha roxa perto de seu quadril e uma vermelha em seu pescoço. Estava tudo indo rápido demais. Suspirou, desejando que Hitoshi ainda estivesse bem e que voltasse logo.

Voltou ao seu objetivo principal, que era acordar Eijirou. Retirou a blusa e as calças, deixando-o somente com a roupa íntima. Então, pegou um balde e encheu com a água que tinha num tambor maior ali, sorrindo perverso quando jogou o líquido gelado sobre o outro, que praticamente pulou no lugar quando a água fria entrou em contato com o corpo.

— Denki, seu merda!

×××

— Sério, eu não sei qual o seu problema. — Eijirou disse enquanto comia com Denki praticamente gargalhando ao seu lado.

Eles estavam em frente à lareira comendo. Até convidaram Ochaco, mas ela foi dormir, então estavam ambos sozinhos.

— Ei. — falou Kaminari — Você sabe se a Ochaco já deu um nome pro bebê dela?

— Acho que não. — ele deu de ombros — Você sabe que ela acredita que não iremos sobreviver, então ela provavelmente não deu porque ela não tem esperança de dar a luz.

— Isso é triste.

— Realmente.

Ficaram em silêncio por um tempo, olhando o fogo. Vendo aquilo, não sabia o porquê, contudo, se lembrava de Hitoshi. Talvez por ele sempre estar com aquela pose séria e com os olhos fervendo seja por amor, raiva ou determinação. Sempre foi um livro com muitas páginas as quais o loiro gostava de ler com muito carinho. Também lembrava de quando ele ficava vermelho por uma cantada ruim sua ou até mesmo só quando retribuía o olhar intenso dele sobre si. Ele era perfeito. Tão belo quanto as chamas.

— Ei, Denki.

— Sim?

— Você já se apaixonou por alguém?

Quase engasgou sozinho e Kirishima riu desse fato. Era a hora. Olhou para ele, esperando que continuasse, porém, aparentemente queria uma resposta sua. Desviou o olhar, respondendo simples.

— Sim.

— É, eu sei.

Por pouco não engasgou, de novo.

— Você acha que eu não via você e o Hitoshi sorridentes andando juntos para lá e para cá pelo castelo?

Acabou rindo pela forma que ele falou, todavia, negou com a acbeça.

— Mais alguém sabe?

— Acho que não, eles não prestam tanta atenção nesses detalhes. Além de que, é meio difícil imaginar o comediante e paquerador Kaminari Denki apaixonado de verdade por alguém.

— Nossa, vocês acham que eu sou o quê?

— Sei lá, um encalhado?

Bateu no braço dele rindo enquanto se preparava para tentar arrancar uma casquinha daquela humilhação.

— Então. — pigarreou — Você já se apaixonou por alguém?

Ele respirou fundo, assentindo.

— Sim... O Katsu-

— O Katsuki, é eu sei.

Ele o olhou estranho e por um belo momento, Denki pensou que era melhor ter calado a boca. Todavia, do mesmo jeito, o maior não pareceu muito afetado.

— Ficou meio na cara também? — assentiu e ele suspirou — Será que mais alguém sabe?

— A Ochaco. Eu contei pra ela.

— Sei.

Silêncio.

— Ei — chamou a atenção de novo —, sabe, você não quer falar nada? Desabafar talvez?

Ele deu de ombros olhando para baixo enquanto ficavam mudos de novo.

— Acho que você é igual a mim. — deu atenção a ele novamente quando começou a pronunciar algo — Na verdade, mais parecido com meu eu antigo. Alguém esperançoso que quer que a pessoa que ama fique à salvo. Acho que Hitoshi também é assim, se quer saber.

Sorriu com as palavras dele.

— Como Katsuki era? — indagou — Sabe, sempre quis conhecer o príncipe mas nunca tive a oportunidade.

— Ele te odiaria. — disse com convicção e Kaminari riu — Mas se gostasse de você do mesmo jeito fingiria que o odiaria.

— A família Bakugou é realmente tão problemática assim?

— Com toda certeza. Mas eles te recebem bem depois de um tempo, tanto que demorou para que eu pudesse conseguir algo com Katsuki. Ele não parecia gostar de mim, mas cedeu em algum momento. Eu era o mais engraçado e altivo, então era eu quem sempre fazia ele rir e se divertir. Parecia sinceramente que ele nunca tinha algum momento de lazer antes, só pensava em estudar para herdar o trono da melhor maneira possível. Isso só mostrava o quanto ele era incrível porque... porque ele queria que o povo dele fosse feliz, ele realmente se esforçava. E por mais que sua personalidade não fosse das melhores nem a mais fácil de lidar, ele ainda era fantástico, de todas as formas.

Sorriu quando viu pequenas lágrimas no canto dos seus olhos vermelhos, no entanto, estes logo fecharam com força enquanto ele colocava a mão sobre a perna, parecendo com dor. Se aproximou dele, engolindo em seco quando sentiu um lampejo de dor no braço também. Riu internamente pensando na sincronia da agonia de ambos.

— Você tá legal? — perguntou e ele assentiu, não parecendo estar mais com nenhuma algia enquanto virava o rosto para olhá-lo

Porém, franziu o cenho quando ele pôs uma mão sobre seu rosto do nada. Sentiu o clima se fechar e não conseguiu respirar quando ele colocou os lábios sobre os seus. Sentiu um arrepio correr sua espinha quando ele tocou a sua boca com a língua, provavelmente pedindo algum tipo de permissão. As mãos que tremiam foram guiadas até o rosto dele, entretanto, não como o mesmo queria, somente para o afastar lentamente, dizendo não em silêncio para seu pedido.

Quando o distanciou, ele não parecia decepcionado ou algo do tipo. Na verdade, não conseguiu ler muito daquela expressão indiferente.

— O que você... — não conseguiu terminar

— Denki.

Engoliu em seco.

— S-sim?

— Vamos ser francos e pensar. — falou ele — Você acha que Hitoshi sobreviverá nessa missão? Acha que ele voltará depois de, o quê? Mais um mês? Eu disse que você era igual o meu eu do passado, que sonhava e esperava para que o amante estivesse à salvo no final. — ele deu de ombros enfim — Isso não aconteceu de verdade, aconteceu?

Ficou em silêncio, o encarando incrédulo e sem saber o que dizer para ele. Depois de algum tempo ele soltou seu rosto, pondo a própria mão sobre o rosto, parecendo arrependido.

— Desculpe, Denki. Não... Não era isso que eu queria dizer, eu-

— Tudo bem, Eijirou. — pronunciou baixo, ainda sem saber o que pensar — De verdade.

Ele assentiu, o observando levantar com o prato de comida na mão.

— Não vai ficar mais um pouco? — ele arriscou perguntar

— Não, vou só lavar a louça e ir dormir.

— Entendi. — e voltou a olhar a lareira

O que diabos aconteceu?, se perguntava Denki enquanto ia em direção à cozinha.