O dormitório está cheio. Bem, não havia mais nenhuma dúvida sobre isso, dentre um grupo de oito meninas, como o lugar poderia não estar cheio? Porém, isso não é o que mais incomoda Binnie.
O que a incomoda é que sempre que todas elas estão de volta ao dormitório, coisas acontecem. E não apenas coisas quaisquer, mas coisas que ninguém possui a coragem de comentar no dia seguinte. Coisas como festas, garrafas, e beijos.
Isso realmente, realmente incomoda Binnie. Como tudo muda no dia seguinte. Um silêncio que permanece gravado no ambiente, sempre que Yooa e Mimi combinam de armar os famosos “esquentas”, que envolvem soju e risadas e verdade ou consequência.
Tudo parece ir bem, ir ótimo, até. Então, a garrafa cai de Seunghee para Jiho, e Seunghee sempre faz a mesma pergunta, mesmo já sabendo a resposta.
“Verdade ou consequência?”
Consequência.
“Consequência.” Jiho sempre escolhe consequência.
E Seunghee sempre pede a mesma coisa.
“Hmm… eu te desafio a dar um beijo em qualquer uma dessa roda.”
E Jiho sempre desiste de fazer qualquer coisa, levando todas a brigarem com ela, porque ela não sabe jogar. E Jiho sempre fica com raiva, levantando-se rapidamente e correndo para o seu quarto.
“Vocês são sempre tão irresponsáveis.” Hyojung afirma, se levantando também, mas Binnie a impede.
“Deixa. Eu vou falar com ela.”
Isso também sempre acontece. Ela entra em seu quarto, aguentando seu voto de silêncio pelo tempo em que ela o faz.
“Jiho.”
“Me deixa em paz.”
“Me escuta, Jiho! A culpa não foi delas e você sabe disso.”
“A culpa foi minha? Por favor Yoobin, fala sério. Elas sempre me culpam não importa o que eu faça. Sempre sou eu a que não sabe controlar os sentimentos.” Seu tom possui raiva e culpa, mas também há um ressentimento que apenas Yoobin sente, não importa quantas pessoas possam estar ouvindo do lado de fora da porta. Apenas ela, porque para quem mais seria?
Yoobin não diz nada. Ela apenas chega mais perto, sentando na borda da cama bem ao lado de Jiho, suas coxas se tocando. A garota cujo signo pode ou não definir sua personalidade se recusa a olhar para ela. Então, Yoobin usa sua mão para virar o queixo de Jiho, o olhar dela hesitante ao cruzar com o seu. Seus dedos deslizam pela bochecha macia da garota, e Yoobin sente sua respiração fraquejar já que elas estão a centímetros de distância.
Seus lábios possuem o gosto do álcool misturado a pêssegos (é o sabor favorito de soju de Jiho) e Yoobin deseja que eles não fossem tão atraentes quando colados aos seus, porque o último pensamento que passa por sua cabeça agora é parar de beijá-la.
As mãos dela estão puxando seus cabelos, mas Yoobin não se importa. Suas unhas estão arranhando os ombros dela, e Jiho não se importa. Mas há algo chamado fôlego, e assim que elas se afastam para recuperá-lo, a expressão dela muda de desejo para medo.
É tão rápido que Binnie fica atordoada. Num segundo, Jiho deixa de estar em sua frente, os lábios vermelhos, para se trancar no banheiro, o baque da porta sendo o causador da volta de Binnie aos seus sentidos.
Ela se levanta e corre até a porta, encostando o ouvido para tentar escutar qualquer coisa vindo do outro lado. O choro é baixo, mas inconfundível, e o coração de Binnie se aperta. Sua mão se forma em um punho, mas ela não chega a bater, sentindo que a situação só piorará se o fizer.
Suas costas deslizam na madeira da porta e ela abaixa a cabeça. Odeia que não consegue descobrir o que se passa na cabeça de Jiho, odeia amá-la tanto sem conseguir dizer que a ama. E odeia repetir a mesma rotina, sem mudança.
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Binnie não acredita que está fazendo aquilo, mas está. É um fato que ninguém nega: determinar traços de sua personalidade por uma data de aniversário é reconfortante. Ela clica algumas vezes, inserindo o aniversário de Jiho, e aperta “Enter”, esperando clarificar ao menos um pouco de suas dúvidas.
O site confirma que sim, Kim Jiho é ariana. Os tratos destacados como bons pelo site são a coragem, determinação, confiança e honestidade. Os tratos ruins, impaciência, agressividade, mau-temperamento e impulsividade. É, tudo soa como Jiho.
Binnie não sabe se isso é bom ou ruim.
“O que tá fazendo?” Mimi aparece do nada, assustando-a.
“Jesus, Mihyun, vai com calma!”
“Hahaha, desculpa. O que é isso aí? Astrologia?”
“É, estou fazendo um programa chamado Desvendando Jiho.”
“Iiiiiih, esse aí já vi que vai ser difícil. Ah, você já viu seu ascendente? O meu é o signo da Yooa, queria saber o que isso significa.”
Binnie riu baixo. Pelo menos duas pessoas possuíam sentimentos claros uma pela outra.
“Como é que eu vou saber… Nunca fui uma louca dos signos.” Deu de ombros, e a loira concordou.
“Certo, isso seria a Jine. Por que não pergunta pra ela?”
“Não, acho que essa é uma pesquisa que eu deveria fazer sozinha.” Binnie suspirou, e Mimi assentiu, batendo em seu ombro de maneira a confortá-la.
“O que quer que esteja acontecendo entre vocês duas, é melhor resolver logo. Principalmente quando se trata da Jiho.”
E a loira foi embora, deixando Binnie sozinha com suas incertezas. Ela continuou a pesquisar, um pouco menos extensivamente já que Jiho havia voltado de seu horário de trabalho e atualmente estava na cama ao lado, brincando com seu iPad.
Por que ela parecia tão longe, mesmo estando bem ao seu lado? Será que ela não possuía ao menos um pouco de consideração com o seu coração ao agir como se não se lembrasse de nada que havia acontecido entre as duas durante todo esse tempo?
Era difícil não ficar encarando-a quando ela agia assim. Totalmente desapegada de qualquer coisa, o único foco dela sendo um aparelho.
“Binnie, para de me olhar assim.”
Jiho sempre dizia isso, quando notava. Normalmente, Binnie não responderia nada, apenas desviando o olhar, sentindo o pescoço esquentar e limpando a garganta para tentar se distrair. Mas esse não foi o caso.
“Não quero.” Foi isso que ela disse ao invés, continuando a olhá-la como se nunca houvesse sido pega.
Jiho apenas suspirou, tentando ignorar o jeito com que Binnie a encarava. Ela não sabia se aquilo era uma punição por seu comportamento, ou se Yoobin apenas estava mudando de uma hora pra outra por algum motivo exterior. Tudo que sabia era que sentia-se fraca sob seus olhos, e não havia jeito de parar aquilo.
Levantou-se da cama apenas para sentar-se ao lado de Binnie, espiando o que ela fazia no computador. Segurou a vontade de rir ao notar a expressão surpresa da garota com sua ação, e levantou as sobrancelhas para ela ao ver o site que estava visitando.
“Astrologia? Você tá andando muito com a Jine unnie.”
Binnie rolou os olhos, dando de ombros, mas continuou quieta e observadora.
“Isso... por acaso é o meu signo?”
Foi uma pergunta retórica, porque Jiho já sabia bem o que ela estava fazendo. Não fazia ideia de como se sentir quanto a aquilo. Por que Yoobin estaria pesquisando sobre o seu signo?
“Binnie. Tem alguma coisa para me dizer?” Jiho questiona, tentando arrancar uma resposta dela.
Binnie olha para baixo, como se naquele momento não conseguisse corresponder seu olhar. Ela sente uma pequena dor, como se as borboletas que antes flutuavam em seu estômago, houvessem todas morrido.
“Eu só quero que você se decida. Se quer continuar isso ou não, vai ter que me dar uma resposta.”
Dói ainda mais ter que dizer aquilo, porque ela sabe que Jiho não está exatamente preparada, e Yoobin não tem ideia de quando ela vai estar. Mas se as palavras não saíssem agora, talvez não saíssem nunca mais.
Ela fecha o notebook e sai do quarto, deixando Jiho com uma cara de incerteza e leve incredulidade.
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Binnie não sabe se está morta ou se quer morrer quando finalmente chega de seu horário no dormitório. Sua vontade é de apenas se jogar na cama e acordar só em 2017.
O lugar está quase vazio, já que a maioria das garotas está ocupada em seus próprios horários, mas Binnie sabe que Jiho está em casa porque pode ouvi-la murmurando melodias dentro do quarto que dividem.
“Jiho? Cheguei.” Anuncia ao entrar no quarto, e fica um pouco surpresa quando ela levanta de sua cama, sorrindo. Parece estar de bom humor hoje.
“Binnie. A Arin não ia vir com você?” Jiho pergunta, confusa, e ela assente.
“Sim, mas ela teve que ficar lá de última hora por causa de uns problemas. Daqui a pouco chega, tenho certeza.”
“Ah, entendi.”
Jiho se aproxima dela lentamente e a abraça. Binnie sorri nervoso, mas corresponde o abraço mesmo assim porque não é todo dia que a garota age carinhosamente.
Elas dançam, ainda abraçadas, pelo quarto. Yoobin consegue sentir a respiração de Jiho em sua orelha, e fica ainda mais arrepiada quando ouve sua voz, baixa e com um toque sensual.
“Você sabe que eu queria muito te dar uma resposta agora,”
Ela se afasta para olhar em seus olhos, e Binnie sente seu coração acelerar. As ditas borboletas mortas voltam à vida, voando em círculos dentro de seu estômago.
Por que Jiho está conseguindo deixá-la tão nervosa? Como? Mas essas perguntas não importam muito quando ela a beija, lenta e calmamente, levando os seus sentidos à loucura. Agora tudo que passa em sua cabeça é que não quer nunca soltá-la, mesmo que esse pensamento seja um pouco egoísta.
Suas mãos seguram os quadris dela, deixando que sua boca guie o beijo da maneira que deseja, porque acredite, ela deseja a mesma coisa, talvez mais.
Não recusa os dedos em sua gola, desfazendo botões com tamanha maestria que Binnie se pergunta onde ela aprendeu isso. Ou talvez seja apenas o desejo controlando-a, apenas talvez. Mas é um que ela não descarta.
Os lábios dela descem para o seu pescoço, e Binnie joga a cabeça para trás, facilitando o trabalho de Jiho. Só espera que ela tenha senso o suficiente para não deixar marcas. Sua cabeça está vazia e o corpo, arrepiado.
Torna a beijá-la, nem mesmo percebendo quando seu corpo está deitado na cama e Jiho se encontra acima dela, prendendo-a entre suas pernas, deslizando a fina flanela por seus braços.
Ela volta a colocar a boca em seu lóbulo, sussurrando. “Mas talvez eu faça isso mais tarde.” E gargalha baixinho antes de sair de cima de Binnie, andando para fora do quarto sem nem ao menos explicar-se.
E Yoobin fica lá deitada, o peito subindo e descendo e a camisa aberta e amassada quase fora de seu corpo, tentando entender o que havia acabado de acontecer.
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Jiho não fazia ideia de como se sentir toda vez que Binnie se encontrava ao menos minimamente perto dela, porque não importava a distância, seus próprios olhos sempre davam um jeito de encontrar os dela.
Aquele turbilhão de sentimentos dentro de si eram uma confusão que ela não estava acostumada a ter que lidar, e geralmente nesses casos, ela entrava em pânico, ou fazia alguma idiotice. Talvez até os dois. Mas não conseguia negar que os olhos de Yoobin a hipnotizavam, como se lessem ela perfeitamente.
Jiho não queria ser lida. Construíra barreiras ao redor de si mesma justamente para não se machucar, coisa que ela sabia que poderia facilmente acontecer caso se descuidasse. Não ligava se era parte de si, uma característica de seu signo. Não ligava de ser o Belzebu do grupo, contanto que ninguém pudesse abrir uma brecha em seu coração.
Mas ela pôde. Binnie pôde abrir uma brecha, e ela conseguiu. Jiho nunca desejava admitir isso em voz alta, nem mesmo para si, mas ela conseguiu. A fez sentir coisas que não entendia. Arrepios, coração acelerando, um nervosismo na boca de seu estômago que secava seus lábios, e as mãos tremiam apenas levemente, mas paravam quando ela as entrelaçava, como se lançasse mão de seu poder sobre Jiho para confortá-la, para estar lá para ela.
Parecia que ela sabia. Tinha conhecimento da natureza difícil de Jiho, mas ao invés de lutar contra ela, de pressioná-la, ela apenas entendia. E cada movimento seu, parecia se encaixar nos dela, com o propósito de unificar-se. Binnie entrelaçava-se nela também, assim como suas mãos.
Um encaixe nunca foi tão perfeito.
Mas Jiho ainda tinha medo. O que aquela brecha poderia vir a significar no futuro? O que aconteceria se ela finalmente abrisse seu coração para a garota? Será que poderia se arriscar, correr esse risco? Estava disposta a isso?
Tantas perguntas sem resposta, que faziam sua cabeça latejar, de medo e nervosismo. A tempestade que caía do lado de fora se correspondia com os seus pensamentos.
O barulho do chuveiro se encerrando tirou-a do transe, e minutos depois quando Binnie saiu do chuveiro, os cabelos ainda levemente molhados, ela ainda não possuía uma resposta. Mas bastou um olhar enquanto ela secava os fios com uma toalha para saber que não havia como fugir daquele sentimento.
Aquele fato acabara de acometer Jiho como um cervo virando a cabeça bem a tempo de ver o carro que lhe mataria e a luz branca que o cegou. Era inevitável conviver com aquela sensação de nervosismo misturado com afeto, ou aceitá-la plenamente e permitir-se afogar nela.
Então quando Binnie perguntou se ela estava bem, porque parecia pálida como se houvesse experienciado uma tragédia, Jiho não respondeu. Não, ao invés disso, ela a puxou pela gola (secretamente gostava muito de fazer aquilo, e isso era um fato com que Binnie aprenderia a conviver) e a beijou, não se importando com quem pudesse aparecer para presenciar a cena.
Se afastou apenas quando necessário, no caso, quando o ar era necessário, e sorriu ao ver a expressão confusa de Yoobin.
“Eu já decidi o que quero para a gente.” Falou, apenas, e Binnie riu, mas os olhos brilhavam como nunca haviam, uma felicidade que apenas Jiho conseguia enxergar completamente. E só ela precisava, é claro.
“O que foi que te fez mudar de opinião?” Yoobin perguntou, curiosa, mas ainda sorrindo, observando o modo com que ela pegava sua mão, desenhando círculos aleatórios em sua pele com a ponta dos dedos.
“E isso importa?” Ela riu baixo, soltando sua mão e laçando-a pela nuca, dedos massageando mechas ainda molhadas. Encostou sua cabeça na dela e mordeu um lábio, subitamente nervosa. “Eu gosto de você, ponto.”
“Isso é um grande feito.” Binnie estatou numa voz com um traço sarcástico, e Jiho ergueu as sobrancelhas, dessa vez sendo a pessoa confusa. “Pra uma ariana.”
Ela escolheu não responder nada, ao invés disso puxando Binnie pelos cabelos para que pudesse voltar a ver seus olhos.
“Cala a boca.” Sorriu de canto antes de puxá-la novamente para um beijo, ora no começo rápido, depois lento.
Era como se o tempo houvesse parado, talvez desacelerado, porque ela não sentia mais nada além de borboletas, voando loucamente em seu estômago. E as mãos de Binnie não decidiam um lugar só para se estar, assim como as suas não conseguiam parar de puxar o cabelo alheio, e as estrelas em seus olhos eram ainda mais bonitas quando elas estavam tão perto assim.
E peças e mais peças caíam ao chão, seu coração não conseguia decidir um ritmo enquanto Binnie descia pelo seu corpo, deixando beijos quentes que enevoavam sua cabeça e faziam-a deixar curtos gemidos escaparem para o ambiente do quarto.
Um fogo, talvez uma fogueira, começou a morar dentro de seu coração, e pela primeira vez em um longo tempo, Jiho não se importava nem um pouco. Pelo contrário, ela faria de tudo para deixá-la viva, mesmo que o seu gênio forte pudesse algum dia dificultar as coisas. Jiho faria de tudo para manter Binnie ao seu lado, não importava o esforço. E Binnie se esforçaria para entender aquela ariana que havia passado de gostar a amar em um curto espaço de tempo.
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