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História Scarlet Tear - Caso 399


Escrita por: jehny_freecss

Notas do Autor


Essa fic vai ter um processo lento, afinal, acompanha uma investigação e um pouco da vida policial, nada mais natural do que um pouco de frustração pela espera... Mas cada cena, cada detalhe tem um propósito, nenhuma cena é desperdiçada. Por mais que tenha esse processo mais lerdo, peço para que mesmo assim deem uma chance, acredito que vale a pena.

PS:O primeiro encontro ChanHun começou a ser escrito, acho que será interessante...

BOA LEITURA.

Capítulo 3 - Caso 399


Fanfic / Fanfiction Scarlet Tear - Caso 399

***

 

26 de Janeiro de 1986

 

 

 

­­— Sinceramente, Dr. Kim, eu não esperava reencontrá-lo tão cedo e, muito menos, imaginei que fosse em uma cena como esta. — Confessou Park Chanyeol, à suspirar exaurido.

Tinha os robustos ombros caídos, olheiras salientes em baixo dos olhos e um impertinente sono. Desde o instante em que recebeu a ligação de Jongdae, obrigou-se à ir até o hospital central para compreender o ocorrido, já eram cerca das sete da manhã e até então nada parecia estar encaminhando-se para uma solução. Dúvidas e mais dúvidas surgiam de segundo à segundo. Chanyeol confiava em seu potencial, mas sabia que não poderia resolver todas as coisas de maneira solitária.

— Pois sinto em dizer que faço das suas falácias as minhas, Inspetor Park.

E de cauto Chanyeol percebeu que o homem estava tão estafado quanto si próprio.

— Depois que o senhor sai do necrotério, mais ninguém vem para cá? — Perscrutou.

— Somente o zelador e, às vezes, a Dra. Lee, mas ela não estava no hospital ontem. Eu sou o responsável principal deste setor.

— Certo. E... Por quanto tempo mais ou menos a sala ficou fechada?

Kim Jongdae pôs a mão no queixo, pensativo, e em seguida replicou:

— Acho que de uma hora ou uma hora e meia. Eu terminei de avaliar um cadáver de um velho homem, morte natural, e com isso meu serviço do dia havia acabado. Saí daqui e fui para meu escritório no terceiro andar, arrumar algumas papeladas. Depois, quando enfim peguei minhas coisas para ir embora, notei que havia esquecido meu casaco no necrotério. E quando cheguei, tive a tal surpresa... — Sua postura esmoreceu. — A primeira coisa que fiz foi ligar para você, Sr. Park.

Chanyeol somente assentiu e, uma vez mais, caminhou até a maca em que, no dia anterior, o corpo de quem julgava sem moderações ser Oh Sehun estava. Tudo parecia estar nos conformes, como se fosse mais um dia normal de trabalho, no entanto, isso se excluísse o fato de que o defunto havia sumido completamente e também suas roupas e pertences. E as indagações que martelavam os pensamentos de Chanyeol de forma incessante eram: Por que? Por que roubariam um corpo? Existia um propósito para isso? E que tipo de propósito perturbador faria alguém desaparecer com o corpo de um homem morto? E como fizeram isso sem serem vistos?

O inspetor continha muitas esperanças positivas nas pessoas, independente das crueldades que testemunhava devido o seu trabalho, em contraste, conforme o tempo passava deliberado, uma incerta empatia para com os misantropos aumentava no seu âmago. Por mais contestável que isso soasse.

Próximo o bastante da maca metálica, foi então que notou um detalhe mínimo que, talvez, não estivesse ali no dia anterior. Na parte lateral, bem na beirada, o metal apresentava pequenas depressões. Ao chegar com o rosto um pouco mais perto, teve uma melhor ideia do que poderia ter causado aquilo, entretanto, apenas deixou-lhe com mais questionamentos. Era semelhante demais com a marca de dedos. Como se alguém tivesse apertado com força o suficiente para tal.

— Mas como alguém poderia ter tanta força para afundar os dedos no metal dessa maneira? — Cochichou para si mesmo, cruzando os braços. 

— Sr. Park. — Kim Jongdae chamou-lhe a atenção.

— Sim? 

— O chefe de segurança do hospital está aqui, como pediu.

Chanyeol, empertigado, de jeito lento virou-se em direção até o homem, este, parado ao lado do Dr. Kim, em um uniforme cinza e grosso de inverno, feições marcantes e um tanto gastas.

— Sou Yoon Chulmoo. — Estendeu-lhe o braço direito, que brevemente fora apertado em saudação. — Soube há alguns minutos do que ocorreu aqui, visto que meu horário de trabalho começou agora pouco, e que precisavam de minha ajuda, obviamente. — Declarou. 

— Sou o Inspetor Park Chanyeol, do décimo quinto Departamento de Polícia de Seoul. Estou encarregado do caso. — Informou com certo orgulho. — Gostaria de pedir-lhe algumas coisas, Sr. Yoon, seriam importantes para saber o que houve.

— Claro, com todo o prazer. Mas antes... — Ele pigarreou, apertando o olhar com tom desconfiado. — Desculpe-me se parecer ousadia, mas é que o senhor me aparenta ser tão jovem, poderia me mostrar seu distintivo?

— Sim, eu posso. — Park respondeu.

Suspirou, nem um pouco surpreso pela desconfiança do Sr. Yoon — que em sua concepção, até era boa, revelava que ele tinha argúcia —, afinal, esse tipo de coisa para consigo já encaixava-se no termo de ser normal, pois sua jovialidade somada a um cargo considerado um tanto importante nas escalações policiais, sempre causavam certas suspeitas para quem não o conhecia. 

De dentro de um dos bolsos internos do sobretudo, Chanyeol puxou seu distintivo, tendo cuidado para não revelar a arma no cós de sua calça, e logo, mostrou o aclamado pedaço de lata para o homem, que depois de verificar com afinco, assentiu convencido e deixou com que Park o guardasse novamente, bem mais disposto a tentar ajudar.  

— Bem, então, o que quer de mim, Inspetor?

Park crispou os lábios.

— Eu poderia ver as filmagens das câmeras de segurança do necrotério e dos corredores próximos? Entre as dez da noite e às duas da madrugada. Acho que no meio desses horários foi que alguém estranho pode ter entrado e feito o que fez. 

Explicou incisivo, e em seguida, vislumbrou a troca de olhares nada discreta entre o chefe de segurança e o médico legista, com feições claras de que havia algum fato impossibilitante para aquele pedido. 

— O que houve para estarem com estas caras? — Perguntou, brusco.

— Bem, — Começou Sr. Yoon. — não temos câmeras de segurança no necrotério e nem nos corredores próximos. 

— O que? Por quê?

— Esse tipo de sistema de segurança eletrônico é novo no mercado nacional, ainda mais com a novidade do dispositivo de carga acoplada, ou seja, é caro, e... — Chanyeol notou ele limpar as mãos no tecido do uniforme, como se estivesse constrangido. — O hospital já gasta despesas em demasia com medicamentos e equipamentos de fisioterapia e de exames, para se preocupar devidamente com esse tipo de coisa, Inspetor. Além de que, nunca haviam roubado um corpo do nosso necrotério antes. O ato em si é incomum nessa região, por isso jamais tivemos preocupação com qualquer tipo de crime nesse setor do prédio. Porque era uma possibilidade quase inexistente.

Chanyeol suspirou, e cruzou os braços rente o largo peito uma vez mais, numa postura destemida proposital, elevando sua altura já notavelmente alta, pois havia percebido um tênue receio da parte do Sr. Yoon, e fazer isso talvez pudesse lhe favorecer. 

Kim Jongdae observava a tudo de maneira atenta.

— Uma possibilidade quase inexistente que aconteceu, diga-se de passagem. — Alfinetou. — No entanto, tudo bem, eu compreendo. Confesso que até a Polícia de Seoul tem seus momentos de priorização financeira. Mas Sr. Yoon, como chefe de segurança, me fale, todas as entradas e saídas do hospital tem devida monitorização? Todas possuem o sistema de câmeras de segurança?

— Sim, Inspetor Park. Já que são áreas de grande movimento. Especialmente no Centro de Trauma.

— Ótimo! — Exclamou, dando uma olhadela no relógio de pulso. — Então, o senhor me faria um grande favor?

— Se for algo de meu alcance, sim.

— Quero que reúna em fitas VHS todas as gravações das câmeras de saída e entrada do hospital, no período das dez da noite até mais ou menos às duas da madrugada, como mencionei antes. Já que foi entre esses horários que o corpo desapareceu. Talvez de alguns corredores próximos dessas saídas, também seria de enorme prestígio. Faria isso para mim?

— S-Sim. — Tossiu. — Mas sinto em dizer que reunir todas as gravações poderá demorar alguns dias. Muito mais por organizar em horários tão específicos. Creio que não conseguirei entregar-lhe as fitas tão cedo, Inspetor. 

— Sem problemas, Sr. Yoon. — Disse Chanyeol, pegando, num ato semelhante para com o Dr. Kim no dia anterior, seu cartão do escritório pessoal. — Aí está o meu número particular. — Entregou-lhe. — Quando terminar, disque para mim e, se caso eu não atender, pode deixar um recado na secretária eletrônica. O quanto antes voltarei. 

— Certo. Obrigado. — Assentiu o homem, logo despedindo-se para voltar aos seus afazeres.

Park Chanyeol novamente olhou seu relógio de pulso, e depois sua atenção norteou-se para Jongdae.

— Daqui uns quinze minutos uma viatura do décimo quinto departamento virá até aqui, Dr. Kim. Os homens farão o relatório oficial do desaparecimento do corpo e interrogar alguns dos funcionários que trabalhavam no setor durante o ocorrido. Espero que não se incomode de ter de repetir tudo o que me falou outra vez. — Comentou.

Kim apenas franziu o cenho.

— Não, não me incomodo. Mas... — Hesitou, confuso. — Você irá sair, Sr. Park? Pensei que fosse o encarregado do caso.

— E sou. — Sorriu breve e confiante. — Entretanto, para isso, preciso visitar um local antes. — Explanou, e ergueu a mão direita, em clara despedida. — Até mais, Dr. Kim. Tenho a sensação de que ainda nos veremos muitas vezes.  

— Não é o único, Inspetor Park. Não é o único. 

E em seguida, Chanyeol saiu, ajeitando o longo sobretudo, com frio. 

Talvez nevasse durante a tarde.  

 

 

 

 

***

 

 

 

 

O céu estava excessivamente nublado, de forma que nem mesmo um ínfimo raio de sol conseguisse trespassar as nuvens carregadas, assim, deixando aquele dia um tanto quanto penumbroso aos olhos perspicazes de Chanyeol.   

Ele estava no parque público em que o corpo de Oh Sehun foi encontrado, no bairro de Dongjak-gu. Bem à sua frente, a árvore que ele foi visto. Com sua sinceridade, Park tinha de assumir, aparentemente não havia nada no lugar que pudesse insinuar algum tipo de violência ou ato criminoso. Era tudo muito familiar e agradável para os visitantes apesar do gélido clima, e mesmo se tivesse algo, a neve que logo cairia durante essa tarde, se encarregaria de sumir com qualquer coisa. Isso o deixou frustrado. Também havia ido até a casa de Lee Naejoon, a moça que chamou a polícia após achar o corpo, porém, dela nada de novo foi ouvido além do que já sabia antes. Ela frisou o fato de ter visto um homem estranho de antemão à tudo, e Chanyeol de verdade considerava este detalhe algo importante, no entanto, sem um retrato falado ou uma descrição suficiente — que tinha de ser muito mais do que somente "Eu não consegui ver direito, estava muito escuro, mas dava para perceber uma singularidade bizarra no perfil" —, ele não poderia fazer nada. E isso era o que potencializava sua frustração.  

— Paciência, Chanyeol. Paciência. — Disse para si mesmo, respirando. 

De dentro do sobretudo, pegou o diário velho do pai, apoiando-se em uma perna, começou a vasculhá-lo uma vez mais, indo diretamente a pontos específicos que chamaram-lhe a atenção. 

"Dezoito pessoas interrogadas"

"Vistos pela última vez na mansão abandonada Kim"

"Hospital Psiquiátrico Sol Nascente, Sr. Jung"

E dentre todos, o que mais lhe parecia incongruente, escrito numa indagação genuína.

"Lágrima Escarlate?"

Suspirou, e então guardou o diário novamente. Uma brisa congelante lhe afagando a face.

— Certo. Vamos recapitular! — Murmurejou para si mesmo, num hábito repetido de quando ficava transtornado com um caso. Lhe ajudava a pensar. — Dois garotos desapareceram em 1975. Vistos pela última vez na casa abandonada e dezoito pessoas foram interrogadas. Aliás, preciso ler esses arquivos imediatamente! — Levou a mão ao queixo. — Mas o que um hospital psiquiátrico teria à ver com isso, hein, papai? E o que é Lágrima Escarlate? — Coçou a têmpora. — Certo, onze anos depois uma mulher encontra um corpo no parque, sendo este corpo o de Oh Sehun, um dos garotos desaparecidos, aparentemente morte súbita. Não deu tempo de fazer a autópsia, pois durante a madrugada do dia 25 para o 26 de janeiro o corpo desaparece... De novo...

Cruzando os braços, Park Chanyeol mirou desanimado a rodovia do outro lado do parque. Uma mulher andava de mãos dadas com o filho na calçada. 

— Dois garotos desapareceram... — Pensou Park. — Dois. Oh Sehun e... Do Kyungsoo. 

 

 

 

 

 

***

 

 

 

 

 

 

27 de Janeiro de 1986

 

 

 

Não que desgostasse do banco de dados, era muitíssimo do eficiente, rápido e bem prático nas cognições, no entanto, por ser um recurso relativamente novo, continha uma certa falta de informações antigas que listas telefônicas em geral conseguiam cumprir melhor no papel.

 Chanyeol gostava de listas telefônicas. O fazia se lembrar da infância e, consequentemente o fazia se lembrar do pai. Ele era um homem peculiar, o tal. Não era de falar muito, obtinha um trejeito escrutinado admirável e sempre que se punha a dizer algo, tinha a atenção de qualquer pessoa em si com devoção. Era impressionante. Yoora dizia que Chanyeol havia puxado essas características do pai, e por isso a vocação para trabalhar com investigações  nunca foi uma opção, e sim predestinação.

Park relembrava-se de vê-lo pela fresta da porta do escritório da antiga casa onde cresceu, muitas das vezes com aquela lista telefônica amarela em cima da escrivaninha, vasculhando as páginas à procura do endereço de alguém. A sobrancelha arqueada, os lábios franzidos e a postura inigualável de tão ereta. Assemelhava-se com um tipo de ritual, todo o processo da busca. Você tem o nome da pessoa, procura ele naquele livro enorme e bem... Tem muitas pessoas com o mesmo nome, então você tem de anotar todos os endereços e ir atrás de todas aquelas pessoas caso não tenha o mínimo de informação sobre aquela que de fato você quer saber. Trabalhoso demais. Frustrante demais. Com o banco de dados era muito mais fácil. Só necessitava digitar o nome e logo estava ali, o endereço, a foto e toda uma base de descrições dos indivíduos. Você só precisa encontrar o certo, ou o mais suspeito, o qual se enquadra na investigação. Simples e prático. Não significava que você iria resolver o caso de imediato, entretanto, agilizava muita coisa que o antigo método não o fazia.  Todavia, esse novo sistema não agradava em completo os gostos de Chanyeol, para ele é como se faltasse algo. Emoção, talvez. A precisão de ter de se entregar as informações cada vez mais, cada mínimo detalhe tinha de ser agarrado firmemente, o envolvimento da relação entre investigador com os investigados. Em quesito, eram muitas vertentes que em verdade mais atrapalhavam do que ajudavam, não obstante, vale ressaltar que Chanyeol sempre conteve essa tal preferência nada aditiva nos métodos mais rústicos, e que para ele somente funcionavam por causa da sua inopinada habilidade para com o trabalho. 

Contudo, como anteriormente mencionado, por ser um sistema relativamente novo, o banco de dados se ausentava de informações antigas demais, coisa que listas telefônicas cumpriam melhor no papel por serem algo de fato da sua própria época.  E Park deslumbrou-se deste fato de maneira totalmente despropositada.

Desde que havia pego o velho diário do seu pai, Chanyeol ficou com muitíssimas indagações, uma das principais, por mais estranho que soasse, era sobre o que poderia significar aquela tal "Lágrima Escarlate". Pois ao mesmo tempo que parecia ser algo sem sentido jogado ao vento, também tinha certa curiosidade do motivo de estar ali, lhe rodeando. 

Para Chanyeol, ser um inspetor assemelhava-se muito como se estivesse no olho de um furacão. Você está literalmente no meio de tudo, sem ser atingido de forma direta, e as informações ficam-lhe rondando, rondando e rondando. No entanto, está tudo uma bagunça, sem conseguir compreender nada. Circulando desordenadamente. As pistas são agitadas na sua face, mas não tem como entendê-las assim tão fácil se logo existe a possibilidade de escaparem junto com o vento outra vez. Porém a sua missão é captar algo, qualquer coisa por mais ínfima que seja, para que possa sair do olho e entrar lá dentro. Sentir na pele a tragédia que coisas simples podem causar e encontrar algo que lhe dê o pontapé da charada. E então, quando enfim você acha uma informação em que pode confiar, aquela que entrega a ponta do fio para ir puxando e desfazendo cada nó até chegar a outra ponta, é o momento onde você enfim está na sincronia do furacão, que gira e gira junto dele. Não contra ele. Logo no seu ritmo vai acompanhando-o e finalmente chega uma vez mais dentro do olho. Mas a diferença é que desta vez você compreendeu todas as pistas até a sua solução, e pode dizer "Caso encerrado"

Todavia, são poucas as vezes que alguém contém a sagacidade necessária para sair e voltar do olho do furacão de maneira correta. A sala no segundo andar do Décimo Quinto Departamento da Polícia de Seoul cheia de casos arquivados explicitava mais do que bem essa circunstância. 

E Park estava exatamente nela quando teve o tal deslumbre. 

Foi somente uma suposição. 

E se...

E se tivesse alguma informação sobre Lágrima Escarlate no banco de dados?

Uma rua? Um monumento? Quem sabe até mesmo uma pessoa?

Não fazia mal algum testar uma suposição, na verdade, uma boa parte do trabalho de Chanyeol poderia ser caracterizado por suposições e teorias. 

Por isso que naquela manhã, após tomar seu rotineiro café preto, checar a secretária eletrônica e pôr o inseparável sobretudo negro dado pelo distrito, a primeira coisa que fez quando chegou na Delegacia foi dignar seus passos para a escadaria que levava ao segundo andar até a sala de arquivos, aonde encontrava-se o prestigiado Macintosh de última geração. 

Era um cômodo grande, com muitas estantes metálicas repletas de pastas confiscadas que formavam pequenos corredores, além de conter aquele cheiro de papel velho e guardado com uma pitada de miscelânea de tintas usadas. Não havia janelas, apenas tubos de circulação no teto, assim oferecendo uma breve sensação baforada e quente, que de certo modo para Park até era bem vinda pelo inverno escrupuloso o qual enfrentou afora. 

 O computador estava ao fundo, em cima de uma escrivaninha encostada numa das paredes beges com pintura descascando. Chanyeol sentou na cadeira giratória, observou a tela já ligada, todas as luzinhas piscando. Sr. Lee era quem cuidava do aparelho, por grande parte de sua função no departamento ser armazenar as informações dos relatórios e cuidar para que o sistema não desse tilt

Havia exatamente três computadores em toda a delegacia, um deles ficava com o delegado no seu escritório, este na sala de arquivos, e o outro encontrava-se sem funcionamento na sala dos achados-e-perdidos. O ideal seria que todos os empregados dali tivessem computadores, contudo, para o governo sairia caro demais gastar fortunas com vários aparelhos sendo que todos poderiam usar somente um, por isso, o trabalho manual em geral ficava mais recorrido do que o digitalizado. 

Empertigado, Chanyeol abriu o sistema, e logo digitou despretensioso, apenas testando, aquelas duas palavras.

"Lágrima Escarlate"

E esperou, esperou, alguns barulhos estranhos depois e então...

 Nada.

Nem uma informação sobre aquilo. 

Suspirou. Ombros decaindo num óbvio sinal de frustração.

— Bem, o que vale é a tentativa. — Rezingou, em um ato de auto convencimento um tanto falho.

E numa brincadeira de criança, impulsionou as pernas para a esquerda e girou a cadeira, rodando lentamente. O mundo numa perspectiva pueril, deixou escapar um sorriso desavisado.

Foi então que viu. 

A enorme lombada azul cobalto envelhecida com o tempo, naquela prateleira cheia de livros sobre a geografia do país. 

Parou de rodar. 

Park confiava em seu potencial, entretanto, o que deixava oculto nesta afirmação, era o fato de que seu potencial, em verdade, deixava-se ser guiado puramente na sua intuição. E obtinha sorte o bastante para ela sempre lhe levar à boas pistas, por causa disso, não deixava de segui-la ou de confiar em si mesmo quando tinha estes deslumbres. 

Como o que teve quando percebeu a lista telefônica na estante. 

Sequer pensou, brusco, levantou-se da cadeira e foi até ela. Agarrou o livro pesado, provavelmente com mais de quinhentas páginas, capa dura e leve odor de mofo. "LISTA TELEFÔNICA DE SEOUL 1961-1962", dizia o título. Logo, voltou a escrivaninha, colocando a lista ao lado do grande teclado. 

Olhou o relógio de pulso, marcava 8:45 da manhã, às dez horas deveria ir até a sala do delegado Kwan, para entregar o relatório do dia anterior. Pigarreou. Resoluto, mas ironicamente hesitante, começou a folhear o livro minucioso. Era muito parecido com procurar uma palavra específica num dicionário, sendo a diferença a quantidade exacerbada de informações, assim tendo a precisão de muita paciência. 

Park enquanto lia linha por linha, sentiu uma nostalgia apoderar-se dos pensamentos — de quando moleque, escondido atrás da porta, vigiando o pai matutando no escritório —, o qual se sentiu deveras desconfortável pelo fato de essa ser a segunda vez em um período tão curto de tempo, e ainda interligada aos mesmos eventos assombrosos de casos não encerrados, desaparecimentos, mortes e mais surgimentos de dúvidas.

E foi às 9:37 da manhã que o coração de Chanyeol bateu mais rápido. A coluna dolorida por ficar tempo em demasia arqueada sobre o livro, respiração inconstante. 

Tudo isso por uma única linha. — Falou, sarcástico.

"Lágrima Escarlate: Discoteca ........................ Rua Jivalnang; 666"

— Mas se é uma discoteca, por que não apareceu no sistema? — Perquiriu-se Park. — Deveria ter aparecido.

Discotecas eram lugares populares, era estranho não ter mais detalhes. 

"Talvez tenha falido", refletiu.

Nada fazia sentido nesse caso, um verdadeiro desafio.

Chanyeol achava-se bom em desafios. Gostava deles desde que por gente se entendia.

 Mas para conseguir resolver esse, tão interligado ao passado mesmo acontecendo no presente, tinha de fazer uma coisa um tanto imponderada...

Precisava reabrir o Caso 399.

 

 

 

 

 

 

***

 

 

 

 

 

 

Delegado Kwan era um homem autêntico e severo. Seus mais de quarenta anos trabalhando na polícia de Seoul poderiam facilmente ser vistos através de suas rugas marcadas na fronte. Inabalável se caracterizaria bem na sua postura profissional. E Chanyeol não se preocuparia de admitir que continha sim um temor em correlação ao velho homem. Isso por uma agravação de Kwan ter sido parceiro de seu pai em muitos casos do passado, antes de subir de cargo e Noomdae morrer. Ou seja, uma superestimada expectativa de todos no departamento caíam sobre os ombros de Chanyeol como barras de ferro maciças. 

Antes de bater na porta, Park aprumou os largos ombros e certificou-se de que os fios cinzas de seu cabelo estavam todos devidamente arrumados. 

— Entre. — A voz grossa soou abafada.

Chanyeol não teve restrições de entrar no escritório, carregando uma pasta preta em mãos e logo fechando a porta atrás de si. 

Havia duas janelas na sala, uma em que através se podia ver o próprio departamento com funcionários num trabalho árduo, e outra com visão para os prédios da capital. O delegado estava sentado na cadeira de frente para a mesa com diversas papeladas e o Macintosh ligado. Park vislumbrou quando o homem inclinou o olhar para o relógio pregado na parede, marcava exatamente 10:00 horas da manhã. 

— Sua pontualidade incisiva é algo que sempre me deixou estupefato, senhor Park. — Comentou Kwan. 

Chanyeol deu um passo à frente, tomando o elogio com peito estufado.

— Vim trazer o relatório do homem encontrado morto que estranhamente desapareceu durante a madrugada, como exigiu, senhor.

— Obviamente. — Suspirou Kwan, erguendo o braço esquerdo. — Me dê ele e já pode se retirar. 

O inspetor custosamente negou com a cabeça, o que fez o velho homem arquear a sobrancelha desgostoso.

— Sr. Park?

— Antes de qualquer coisa, delegado, quero pedir-lhe um favor. 

— Um favor?

— Sim.

— Qual? 

Chanyeol hesitou por um instante, cuidando com as palavras que diria e em como poderia explicar a situação sem parecer estar delirando. Havia muitas coincidências nos fatos e isso também era um ocasional problema.

— O senhor deve lembrar-se do Caso 399, dos garotos desaparecidos de Imprimington. Foi o penúltimo caso que meu pai foi encarregado de resolver e que, infelizmente, não conseguiu. E também uma fase pontual de sua vida por certas loucuras de sua mente terem início. 

— Sim, lembro-me. Terrível tragédia, aliás! Seu pai era alguém destemido e sensato, se alguém algum dia me contasse que ele enlouquecesse... — Inspirou profundamente. — Bem, eu jamais acreditaria se não tivesse visto com meus próprios olhos. Mas... Porque está relembrando tais coisas, Sr. Park? 

O inspetor engoliu em seco.

— A questão, Sr. Kwan, é que existe uma probabilidade significante de o caso que estou cuidando agora estar diretamente ligado com o caso 399.

— Como assim? 

— O homem morto... — Suspirou cansado. — Ele é Oh Sehun, um dos garotos desaparecidos. 

Kwan riu, os dentes desgastados pelo charuto revelando-se, incrédulo.

— E o que lhe fez pensar numa barbaridade dessas, inspetor Park? — Indagou cômico. 

— Acontece que, — Chanyeol aproximou-se um pouco mais. — este homem que morreu, tinha uma identificação. — Colocou a pasta preta em cima da mesa, abrindo-a até uma parte específica e logo mostrando-a para o delegado. — Um cartão estudantil, com todas as principais informações de Oh Sehun.  

O riso enfadonho que Kwan tinha nos lábios se reverteu em uma expressão séria e cansada. 

Havia um ditado popular e muito conhecido pelos trabalhadores do mundo policial que dizia: "Uma vez, é acaso. Duas vezes, coincidência. Três vezes, padrão". Não obstante, delegado Kwan jamais acreditou em coincidências, para ele, tudo tinha um motivo para acontecer, por mais bizarro, tendencioso ou espetacular que aparentasse ser. E um filho continuar com o legado do pai justamente com o caso que tal não conseguiu encerrar, lhe parecia conveniente demais. 

— E o favor que você gostaria de me pedir seria...

— Eu quero reabrir o Caso 399. 

Os ombros de ambos os homens tencionaram deliberados devido a apreensão sombria que espalhou-se no ambiente. 

— Não. — Kwan sentenciou. — Definitivamente não, Sr. Park. Agora saia da minha sala! 

— Sr. Kwan, acho que você não está entendendo o grau da situação. — Chanyeol apelou.

— Mas é claro que entendo! — Exaltou-se, levantando da cadeira e apoiando as mãos calejadas na mesa. — E digo que acho isto um absurdo. Acha que sou idiota, inspetor Park? Não sei como conseguiu este cartão estudantil, no entanto, suas atitudes óbvias é o que me deixam irritado. Compreendo que seu pai foi um investigar extremamente benemérito, e o caso 399 foi uma mancha no seu impecável histórico, todavia, vir com ladainhas para cima de mim para tentar resolver uma coisa que há anos já foi datada como perdida, apenas para limpar seu sobrenome... — Suspirou compenetrado, fechando a pasta negra. — Não irei admitir isso, Park Chanyeol.

Chanyeol estava boquiaberto, sem acreditar no rumo que as acusações alheias tomaram sobre si. Sentiu-se injustiçado.

— Acaba de me ofender impropriamente, Sr. Kwan. — Disse com tom áspero. — Julga mesmo que eu seja esse tipo de pessoa? Que viria com informações imaginárias ou fundadas por mentiras apenas para seguir com algo que nem mesmo gosto de lembrar? O que aconteceu com meu pai, e a ligação que tal coisa tem com essa história ou não, é algo que profundamente machucou minha família e a mim. E que por vontade própria não gostaria de ressuscitar se não tivesse-me caído no colo como uma granada.

— Entretanto, como quer que eu engula tais conveniências, inspetor Park? — Indagou o delegado, um pouco mais ameno apesar de ainda ofensivo. — Que justamente você, o filho de Noomdae, dentre tantos investigadores de Seoul, foi quem se encarregou e encontrou uma pista tão valiosa sobre isso, depois de tantos anos do caso ter sido arquivado? E então, o corpo que poderia comprovar como verdadeira a pista encontrada, simplesmente desaparece. Esse tipo de coincidência, não é algo que eu acredite de modo fácil, senhor Park. 

Chanyeol fechou os olhos, expirando com exaustão, com sua sinceridade, nem mesmo ele se creditaria de confiar nas suas próprias palavras se estivesse no lugar do delegado, porém eram os fatos apresentados nas suas inconstâncias tortas, a verdade da circunstância por mais impossível que soasse. Por isso, quando voltou a acarar o velho homem, logo disse com destreza o que pensava:

— Acaso, coincidência ou conveniência, delegado Kwan, não me importo no que acha que tudo isso se define. Mas a questão é que é o que está acontecendo. Aliás, quem encontrou a pista foi o Dr. Kim Jongdae, não eu. — Confidenciou, altivo. — Confesso que me é desgostoso pensar sobre todas as complicações que tudo isso irá me gerar. E que já estão me gerando, na verdade. Entretanto, também acredito que isso é uma oportunidade de enfim ter respostas, algo real para se basear. As pessoas merecem ter um fim digno, de acordo com as suas atitudes na sociedade, independente do tempo que isso leve. Um menino inocente desapareceu, e até hoje não houve um final para essa sentença. — Sua expressão esmoreceu, um arrepio na coluna, como um rouxinol sem ninho. — Meu pai teve de acabar do jeito que acabou e tudo por estar procurando por respostas, e isso, puramente para ajudar as pessoas. Para ajudar esse garoto! Mesmo que tenha sido algo terrível, ao menos, eu sei o que houve com ele, com o meu pai. Mas a família de Oh Sehun até hoje não sabe. Mais de onze anos esperando por respostas e tudo que fizemos foi desistir do caso. Arquivando-o e abandonando-o. Isso é desprezível, Sr. Kwan. — Revelou, colérico. — Estamos aqui para ajudar, nos submetemos a um código de honra e tudo o que deixamos para trás são mães e filhos desesperados e sem respostas! E agora que finalmente eu posso fazer alguma coisa, algo sólido e verdadeiro em correlação a este caso, o senhor quer me negar? 

O delegado pigarreou.

— Você sabe que não é bem assim, Chanyeol.

— Então o que é? Temos algo aqui! — Apontou para a pasta. — Por menor que seja, ou mais conveniente que pareça, é alguma coisa que pode levar tudo isso em algum fim digno e acalentar o coração de uma família... Um ponto final. Tudo o que estou pedindo para o senhor é um ponto final. Para esta família, para mim e... E também para o meu pai. E isso só poderá acontecer se deixar que eu reabra o caso 399. 

Silêncio.

 Um silêncio escrupuloso.

 Kwan não desviou seu olhar sério de Chanyeol por nenhum dos minutos que se passaram naquela sala silente. Park sabia que havia se entregado as emoções pavorosas, contudo, o que disse não deixava de ser verdade, a sua verdade ao menos, o que de coração acreditava. Afinal, era esse o principal motivo dele ter se entregado ao mundo investigativo, ajudar as pessoas a terem seus finais dignos. A lhes dar a justiça tão merecida. O alto inspetor tinha uma convicção genuína de que poderia mesmo encontrar a resolução que por anos ninguém encontrou. Não imaginava tanto o porquê, mas algo dentro de si ansiava por isso, por essa oportunidade para com essa situação em específico. 

O delegado continuava a lhe observar com franqueza, dessas que bem contemplam o que a pessoa pensa, e dava para ver que ele não havia estimado das coisas que foram-lhe ditas. No entanto, também continha uma certa empatia nas íris castanhas e ofuscadas. O som dos ponteiros rodando no relógio começaram a soar, foi angustiante, e Chanyeol sentia-se suar um pouco com o nervosismo da próxima sentença que o delegado há qualquer momento iria explanar. 

— Por alguma vez já refletiu sobre todas as consequências que eu deixar você fazer isso podem desencadear, Sr. Park? — Perguntou Kwan, a voz grossa e rígida. — Vale a pena continuar com isso mesmo que custe em acabar com as esperanças de uma família e arrebentar o fio tênue de compaixão no relacionamento entre você e sua mãe? 

Chanyeol engoliu em seco. Seus lábios grossos tremeram. É claro que Kwan estava ciente do conturbado vínculo entre ele e sua mãe deste que seu pai morreu, mais do que um delegado, ele era um amigo antigo da família. E a mulher jamais foi sutil de seu ódio para com o trabalho do filho. Ela tinha medo. Medo de que Chanyeol encontrasse o mesmo caminho que o marido. Que se deixasse vencer por uma loucura aterradora envolvendo sangue e seres imaginários. Sua preocupação não era supérflua, no entanto. 

— É o que mais venho pensando nas últimas horas, Sr. Kwan. — Foi o que Chanyeol respondeu. — Mas sinto que é necessário. 

— E você não tem temor de que por um acaso mirabolante, possa acabar como Noomdae?

— Eu não sou o meu pai, delegado! 

O homem então, apenas assentiu, condescendente.

— Certo. Está bem. — Inspirou e sentou-se na cadeira, os punhos cerrados. — Tudo bem. 

O inspetor arregalou os olhos.

— O senhor... Isso quer dizer que...

— Sim. O caso 399 está oficialmente reaberto. — Declarou. 

— Obrig-

— Com uma condição. — Interrompeu Kwan, erguendo o indicador, carrancudo. 

— C-Condição?

— Sim.

— Qual?

— Um parceiro. Você só poderá continuar com isso se tiver um parceiro. 

— O que? Mas eu não preciso de um parceiro, ter um só iria me atrapalhar. O senhor sabe que trabalho sozinho, Sr. Kwan. 

O velho homem arqueou as sobrancelhas. 

— É a minha condição, Park Chanyeol. Aceite-a ou vá embora. 

Chanyeol fechou os olhos por um milésimo de segundo. Ele sabia o que o delegado estava fazendo. Era uma promessa. A promessa que o homem fez a sua mãe num empenho de acalmá-la. Ele estava tentando protegê-lo. 

— Tudo bem. — Murmurou. — Eu aceito.

— Ótimo.

— E já tem ideia de quem será meu parceiro nisso? — Perquiriu descontente. 

Kwan cruzou os braços rente o peito, imponente. 

— É um detetive transferido de Pequim. — Contou. — Faz poucas semanas que se mudou e ainda está reconhecendo nosso modo de gerir os casos no décimo quinto departamento... Seu nome é Zhang Yixing. 


Notas Finais


O que acharam? Por favor, digam-me...

Como já perceberam, se realmente alguém chegou até aqui, próximo capítulo terá a chegada de um personagem muito importante...


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