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História Segunda Chance - Capítulo X


Escrita por: rose_apothecary

Notas do Autor


Olá! Voltei, tirei meu feriado para escrever de uma vez esse capítulo para vocês. Alias já vou avisando que dessa vez qualquer erro é culpa da obra que está acontecendo no meu prédio que não parou de martelar nem por um segundo do dia de hoje.
Dessa vez eu nem tenho muito o que dizer além dos agradecimentos de sempre porque eu tenho os melhores leitores do mundo. Esse capítulo é um antítese espiritual do anterior de certa forma. A visão veio um pouco diferente mais introspectiva porque o momento pede. Estou torcendo muito pra vocês gostarem dele...
Por fim, só pra deixar registrado que tem uma passagem em itálico e entre aspas no meio do capítulo com um trecho de Os Lusíadas, tá ai os créditos pra não dizerem que eu não coloquei.

Capítulo 10 - Capítulo X


Pedro se viu andando pelos corredores a passos decididos, como se sua outra vida estivesse prestes a tomar uma decisão importante ou realizar algo de grande relevância. A única coisa que parecia denunciar seu nervosismo eram suas respirações, o ir e vir dos pulmões era veloz como se o homem tivesse praticado alguma atividade física. Foi então que ele parou justamente para retomar o fôlego e encarou a porta por alguns instantes.

Ele tentou se localizar no espaço e no tempo pelo pouco que havia visto até ali. Era dia e a temperatura estava quente, a decoração a sua volta era sóbria e definitivamente modesta para alguém tão abastado quanto ele. Além disso Pedro se sentia fisicamente apto, nada do peso do anos que as visões do fim da vida daquele homem proporcionaram. Portanto ficou claro que o que ele estava prestes a presenciar era algum evento da vida adulta do aristocrata. No melhor dos cenários veria suas meninas e a dama de azul, no pior deles alguma questão de Estado o importunava. Contudo, naquele momento até a dança das cadeiras que era a Câmara dos Deputados do Rio de Janeiro poderia servir de entretenimento ao astrônomo.

Quando o homem finalmente controlou pensamentos hesitantes e decidiu abrir a porta, Pedro se deu conta de onde estava. Ele não tinha muito o costume de receber a mesma visão mais de uma vez, mas aqui estava ele mais uma vez vivenciando o dia em que ele contou a Teresa que amava outra mulher. Pedro deveria ter percebido os sinais antes, a roupa do dia anterior desleixadamente arrumada, o perfume francês impregnado na pele tão forte que poderia gerar dor de cabeça em qualquer um, a hesitação em abrir a porta como se o aristocrata soubesse o que o aguardava do outro lado.

E como se o seu dia não pudesse piorar Pedro estava prestes a vivenciar mais uma vez o momento que ele quebrava o coração de sua dama de azul. Ele não sabia se suportaria olhar para o rosto de Teresa enquanto ela lutava para manter a postura numa tentativa vã de não demonstrar que estava desmoronando. Talvez fosse essa a intenção da visão, afinal, prepará-lo para o que estava por vir no futuro. Se é que algo poderia lhe preparar para se tornar a causa do desapontamento da mulher que ele amava.

Era inútil tentar intervir, tentar mudar o que aconteceu, Pedro era um mero espectador. Durante a adolescência tomado por um espírito mais rebelde o astrônomo tentou incansavelmente tomar as rédeas da situação tentando desesperadamente alterar aquele passado torturante. Mas tudo que ele conseguiu foi aumentar ainda mais a sensação de impotência. 

E esse sentimento o atingia de duas formas. Pedro experimentava não apenas as sensações físicas que o aristocrata como também reagia a elas como se assistisse um filme de péssimo gosto em que o protagonista parecia se esforçar para tomar as piores decisões possíveis. Por conta disso ele era capaz de sentir o quanto aquele homem se sentia sufocado e preso. Mesmo sendo um dos homens mais poderosos daquela nação ele não possuía poder nenhum para decidir seu próprio futuro, quanto mais seu destino era moldado pelas necessidades do país, maior era a vontade de se rebelar, de fugir dos protocolos, se permitir algumas liberdades. Como se não bastasse essas sensações de aprisionamento havia prisão real em que ele se encontrava sendo obrigado a se ver fazendo coisas que jamais faria normalmente. Ter aquelas visões era como ser aprisionado mais uma vez naquele sótão gritando por ajuda e tendo como únicas ouvintes as paredes que ecoavam seus pedidos implorando para sair.

Assim que a porta se abriu ele pode ver Teresa próxima à janela observando os jardins. O rosto dela se iluminou ao vê-lo na expectativa do que ele estava prestes a dizer. Como ela já soubesse que tinha algo importante a dizer e pudera nos últimos tempos o aristocrata só a procurava para discutir assuntos de extrema importância relacionados ao Estado. 

Pedro se viu respirando fundo, mais uma vez se preparando para o que viria a seguir. Depois dessa fatídica conversa seriam mais de oito anos de silêncio, de fingimento para os outros e para ele mesmo. Para o mundo ele pagaria de marido exemplar e para si mesmo ele diria que Teresa havia se conformado que aceitava ceder espaço que era dela de direito para outra. Na cabeça daquele homem fazia todo o sentido do mundo que após ouvir da boca do próprio marido que ele amava outra, sua esposa iria simplesmente conceder a ele a oportunidade de viver a aventura que ele tanto sonhava. A aventura era um eufemismo, para o que ele havia feito. Antes fosse uma aventura, porque não só ela teria durado pouco como seria insignificante…

Em sua cega busca por liberdade Pedro humilhou Teresa por anos e foi incapaz de perceber que ela havia lhe dado o maior presente de todos. O sofrimento silencioso dela fez com que ele fingisse para si mesmo que estava tudo bem, eles estavam bem seguindo sendo os parceiros que sempre foram. Mas era justamente o oposto, o que deveria ser uma via de mão dupla possuía apenas um sentido que partia de Teresa na direção dele. Ela havia lhe dado um lar, uma família e por fim o havia deixado livre para se aventurar, mas com a certeza de que havia um local para retornar e o ele havia dado em troca? Tristeza e desgosto. 

O lar que ela transformou em um local só deles, onde eles poderiam viver longe da pompa que se esperava de figuras como eles e que o aristocrata tanto detestava, passou a ser quase que totalmente administrado pela amante a mando dele. A família que ela lhe deu para que eles não estivessem sozinhos, ele a tirou dela, afastando as meninas da mãe para que elas recebessem a educação que outrora ele abominava por o ter transformando em quem ele era.

— Pedro!

Ouviu uma voz chamar, ele encarou a dama de azul a sua frente. Ela seguia com sua postura impecável na espera que ele dissesse algo. A voz que o chamava seguia ecoando pelo cômodo e só ele parecia escutar. O que aconteceu em seguida foi tão rápido que Pedro mal pode reagir, ele foi simplesmente puxado da visão.

Após exalar o ar de seus pulmões com força, o astrônomo abriu os olhos e percebeu que ele estava no chão da mata envolto por folhas molhadas pelo sereno da manhã. De certa forma ele estava grato por ter interrompido tão abruptamente aquela visão, parte dele realmente acreditava que estava revendo aquela memória em particular para se preparar para o que estava por vir, entretanto havia outra parte que estava absolutamente aterrorizada e exausta de toda aquela história. Ao fundo ele podia ouvir os gritos de Teresa ficarem cada vez mais próximos assim como os sons das suas passadas apressadas. Antes mesmo que ele encontrasse forças para se levantar a arqueóloga o tomou nos braços. 

— Pedro que susto você me deu caído no chão — ela o abraçou com força e ele deu graças a Deus que o mar de cabelos negros o empedia de ver o despero em seu rosto. Ele não suportaria ver ela tomada por um sentimento tão negativo, ainda mais por sua culpa. Tentou responder que estava tudo bem, porém seu corpo parecia estar se recuperando de uma maratona olímpica e se encontrava sem forças para nada.  — O que você está fazendo aqui? Esquece...foi outra visão, não foi? Você está bem?

— Sim — conseguiu dizer. Por alguns instantes os dois ficaram em silêncio e Teresa passou os dedos pelos cabelos de Pedro lentamente para acalmá-lo, mas no final das contas foi a respiração e os batimentos cardíacos dela que ajudaram Pedro a se tranquilizar. Ele também usou esse tempo para pensar e se preparar, o susto por ser praticamente puxado para fora daquela visão poderia passar, mas o que estava atormentando sua mente dificilmente o deixaria em paz. —  Eu preciso te fazer uma pergunta.

Embora Pedro soubesse que o assunto da conversa não seria fácil e que ele estava sem energias, o astrônomo decidiu prosseguir. Não dava mais para continuar assombrado por uma passado que nunca fora dele, ainda mais um tão sufocante como aquele. Como ele poderia seguir fingindo que estava tudo bem, que essas visões não existiam e o afetavam?

— Por que você nunca quis saber?

— Saber do que, Pedro? — ela perguntou sem entender. O astrônomo então aproveitou o momento para relutantemente se desvencilhar dos braços de Teresa para que os dois pudessem se encarar. — Do que você está falando?

— Do seu passado, por que você não tem interesse em saber o que aconteceu entre nós? Como você consegue não se importar?

— Porque não me interessa — ela desviou o olhar e cruzou os braços definitivamente mostrando que não se sentia à vontade em fazer sobre o assunto. Contudo Pedro precisava continuar até onde pudesse e ela estivesse disposta, ele só precisava encontrar as palavras certas.

— Como não? Eles são as respostas para tudo que passamos e não sabemos explicar, essas certezas, sensações...é a origem de todos os nossos fantasmas.

— E você acha que eu não sei? — ela se levantou e começou a andar de um lado para o outro, parecia estar considerando algo. — Eu te disse uma vez que falar com você era como olhar num espelho não era?Tudo que você sabe eu sei...Eu consigo ver em seus olhos que você compreende de onde vem toda essa culpa porque suas visões te mostram isso. E basta isso para minha curiosidade morrer — Teresa então parou de frente pra ele. — Você não acha que eu especulo o que aconteceu? É claro que eu faço, o que de tão grave pode ter acontecido entre nós para te deixar tão mexido desse jeito? Uma traição?Um assassinato? Um desencontro que nos separou? — Pedro prendeu a respiração logo na primeira suposição e pela encarada que a arqueóloga lhe deu ele logo percebeu que havia feito justamente o que Teresa dizia, ele entregado toda a verdade apenas como uma reação.— Viu só? Você fez de novo, você acha que eu não percebo as vezes em que você olha pra mim com tristeza? É como se você olhasse na minha direção, mas como se estivesse olhando pra outra pessoa...não sei como se houvesse alguém atrás de mim...Ou então o completo espanto que tomou conta de seu rosto quando viu a filha do amigo de seu pai...Juro que se eu pensar um pouco mais nisso tudo eu junto às peças desse quebra cabeça e honestamente não gosto da figura que está sendo formada principalmente com essa nova variável adicionada a equação.

 — Teresa não é o que você… — ele não terminou de completar a frase, porque de certa forma era exatamente o que ela pensava. Teresa era uma mulher esperta e inteligente, se ela já tinha suspeitas antes do que poderia ter acontecido certamente não restariam dúvidas hoje com a chegada de Luísa. 

— Eu já disse que eu não estou pensando em nada, eu não quero…

Pedro então finalmente parou para absorver tudo que ela havia dito. Até então ele havia apenas se concentrado em dizer o que vinha a mente, com medo de não de perder a coragem e mais uma vez se calar e não tocar mais no assunto. Contudo ao perceber que ele não era o único agitado e tenso ali o astrônomo percebeu ele não estava sozinho.Por mais perturbador que fosse toda aquela história nao se trava mais do sofrimento dele, mas dos dois a partir daquela festa de noivado em que eles decidiram que dali em dia antes caminhariam juntos naquela tortuosa travessia que o destino havia traçado para os dois.

E ela estava inquieta daquele jeito por sua causa. Com acordo ou sem acordo Pedro já se odiava por deixar Teresa daquela maneira. Primeiro ele a havia deixado preocupada com seu sumiço e logo em seguida sem dar tempo para que ela se recuperasse ele a bombardeou com questionamentos que a incomodavam. Não era assim que uma mulher tão extraordinária como Teresa merecia ser tratada, não era assim que tratava uma amiga e nem muito mesmo uma pessoa que ele amava. 

— O que você quer, Teresa? — questionou por fim, era isso que ele deveria fazer para deixar com que ela apontasse o caminho. Mais uma vez ele estava perdido em toda aquela história, não sabia como agir em relação às visões, a culpa…estava totalmente perdido e a única coisa que parecia ser certa era ela. Ele queria Teresa bem, o resto eram só detalhes. Pedro estava exausto e mesmo assim levantou, a envolveu nos braços como ela havia feito antes e passou a mão suavemente pelo rosto até parar no queixo. O contraste entre sua mão suja de terra e a pele macia da arqueóloga quase parar o gesto, era quase um sacrilégio macular um pouco que fosse aquela textura quase divina…Foco! Ele estava ali para saber que caminho seguir, aquele toque era apenas um pretexto para que Teresa olhasse nos olhos dele e visse que ele dizia a verdade. —  Se você quer que eu nunca mais toque nesse assunto? Eu faço, me diga que eu o farei.

— Eu quero ser feliz — ela disse simplesmente. — E eu sei dizer pelos seu olhos que saber o que aconteceu só vai me trazer tristeza…Minhas visões são apenas flashs, não tão concretas quanto as suas, mas eu passei minha vida toda atormentada por elas, eu fui para outro país por conta delas e nada disso matou essas sensações fantasma no meu peito. Eu não quero nada disso! Eu não quero despertar de um sonho e tentar entender o porquê anos atrás, em uma outra vida um crucifixo foi tão importante para mim e nunca saia do meu peito…Essas memórias não são minhas nem muito menos essa ideia fixa na minha cabeça de que eu não posso ser amada…e já que eu estou amaldiçoada pelo resto dos meus dias a receber essas visões eu espero nunca saber do que elas se tratam, acho que se eu souber a razão disso tudo elas vão se tornar minhas, eu vou dar razão a elas — Teresa fez uma pausa percebendo o quanto tinha falado, tudo de uma vez como se assim como ele estivesse segurando aquelas palavras por muito tempo. Então seus olhos ainda marejados se fixaram nele e foi a vez dela de passar os delicados dedos pela face de Pedro. A angústia que transbordava de sua fase de espaço para a tristeza e o astrônomo percebeu imediatamente que ela sentia isso por ele. — A verdade não vai pôr fim a esse tormento, você melhor do que ninguém sabe disso…E Pedro, eu não quero culpar você, principalmente agora que eu consigo perceber e sentir que essa ideia de rejeição não é minha. Por isso eu te peço para que enterramos essa história. Eu entendo que é um fardo gigantesco e se você achar que não consegue eu vou entender, mas se você puder fazer isso por mim…

— Sim — Pedro a interrompeu.

Não havia motivos para deliberações nem era necessário perder tempo com elas, porque a resposta seria sempre a mesma. Mesmo com todas as variáveis contra ele, e eram muitas, o resultado final compensa tudo naquele caso o fim justificaria qualquer meio utilizado para chegar nele, pois havia resultado de todos os sacrifícios ali seria o mais puro de todos: a felicidade de Teresa. Desejar e lutar por esse fim era quase tão involuntário quanto respirar, era a vontade de cada célula de seu corpo. Era inconcebível para ele que alguém pensasse de outra forma, bastava olhar para ela, bastava trocar duas palavras e qualquer um seria capaz de concluir que aquela mulher estava destinada à grandeza, que merece ser feliz. E se havia algo que poderia concluir de toda aquela bagunça de vidas passadas era isso, o destino de Teresa era ser feliz, era por isso que eles estavam ali de novo mais uma vez, para que ela conquistasse o que lhe era de direito dela e de sua dama de azul.

Não, ele não poderia pensar mais daquela maneira. Se ele estava disposto e havia acabado de prometer que iria fazer o que a arqueóloga havia pedido, Pedro precisava se comprometer sequer não pensar mais em toda aquela história. Seria o fim das comparações, das lembranças repentinas de um passado que não era dele e nunca tinha sido. Seria um trabalho árduo esquecer aquela que havia sido sua companheira por cinquenta anos em uma outra vida e ainda o havia acompanhado por mais trinta, sem por um momento fazer com que ele se sentisse sozinho. Contudo havia chegado o momento de deixar sua dama de azul ir embora…aquela santa mesmo na morte havia cumprido sua promessa e era a chegada a hora deixá-la descansar, de sair de sua proteção e se jogar no desconhecido que seria viver sem a certeza de possuir um porto seguro. E havia causa melhor para aquilo do que o amor? 

Era por isso que ele estava disposto a carregar sozinho o peso da verdade e das ações de um homem que machucou tanto a esposa que suas almas acabaram manchadas por essa culpa transcenderam até mesmo o tempo. Por Teresa ele pretenderia que aquela história não existia, enterraria bem no fundo do peito a verdade e agiria normalmente para que a mulher que ele amava pudesse continuar alheia a tudo que havia acontecido. Se o desconhecimento fosse capaz de fazê-la feliz então era isso que ele iria fazer. 

— Se é isso que você quer, a partir de hoje não se fala mais nisso — ele disse com firmeza, prometendo para ela e para si mesmo. — O passado vai ficar onde deveria estar, enterrado a sete palmos do chão.

— Obrigada! — ela disse jogando os braços em volta do pescoço dele dando a mais bonita gargalhada que ele já havia ouvido. Teresa se jogou completamente sobre ele fazendo com que Pedro sustentasse todo o seu peso a tirando do chão, ela parecia tão mais leve de certa forma Pedro se sentia assim também. Era quase como se ele se sentisse em paz com a possibilidade de nunca mais se ver atormentado por um passado que não era dele.  — Obrigada! Obrigada! — ela repetiu enquanto beijava cada uma de suas bochechas. —  Por mais que eu adoraria fingir que estamos só nós dois aqui, precisamos voltar…— lamentou após esconder o rosto em seu pescoço. — Os outros devem estar preocupados, tenho certeza que Luísa informou a todos de como ela estava aflita com o seu estado…

— Como ela é solícita, não? — ironizou.

— Certamente, ela precisa anunciar o quanto ela se preocupa e está disposta a ajudar os outros…muito bonito isso…

— Certo vamos, vou inventar uma desculpa qualquer para o meu estado… — disse depois eles pararam de rir.

— Não se preocupe quanto a isso, eu invento uma desculpa. Você vai direto para seu quarto, parece exausto. 

Ele estava mesmo, por isso fez exatamente o que Teresa havia mandado. Se despediu dela recebendo mais um beijo na bochecha que o surpreendeu positivamente e foi dormir. Ou ao menos tentou fazer isso, mesmo cansado, sua mente parecia incapaz de desligar. Ao mesmo tempo que seu cérebro parecia obediente e não permanecia acordado numa tentativa de lembrar do passado ao mesmo tempo que lutava para não pensar no assunto, ele estava assim porque o coração e a mente do astrônomo se enchiam de esperanças quanto ao futuro. 

Pedro não estava assim porque começava a traçar plano e sim pelo contrário. Ele não sabia o que fazer a seguir. Estava completamente no escuro, livre para decidir o que fazer. Seria aquela a segunda chance de sua segunda chance?

Não perdeu tempo pensando nisso, primeiro ficou deitado na cama observando o teto e mentalmente se despedindo daquela casa enquanto ouvia Domingos e seu pai andando pelos cômodos da casa. Quando finalmente ficou entediado decidiu num momento de inspiração ler um dos livros que se encontravam na prateleira do quarto, passou os dedos pelos nomes até encontrar um título que ele conhecia bem ao mesmo tempo que não. Abriu a obra prima de Camões que sua irmã Francisca havia lhe dado de presente, o livro custava uma fortuna, era uma edição especial que ele nunca havia ousado tocar. Sua irmã ingenuamente acreditava que era porque ele valorizava demais o presente, mal sabia ela que Pedro não tinha interesse nenhum em ler o livro, ele sentia que não precisava. Entretanto, agora ele não estava disposto a ter as experiências que ele totalmente se negara a disfrutar como o astrônomo estava curioso para ler o conteúdo.

“As armas e os barões assinalados, Que da ocidental praia Lusitana, Por mares nunca de antes navegados,”

Começou a ler e entre o Canto II e o Canto III ele acabou pegando no sono. Quando Pedro acordou o estava prestes a se pôr, a casa estava silenciosa o que indicava que as visitas provavelmente estavam do lado de fora. No andar de baixo ele descobriu através das mensagens de melhoras para um amigo de infância dele que o astrônomo qual foi a desculpa que Teresa havia arrumado para justificar sua ausência. Aparentemente um de seus amigos mais queridos havia sofrido um acidente e estava no hospital. 

Ele então sentou na varanda e observou Domingos e seu pai conversarem sobre futebol animadamente. Enquanto isso, Teresa e sua mãe uma exposição de arte rupestres que ambas estavam interessadas em visitar. Foi então que Luísa sentou na escada ao lado dele. Por alguns instantes permaneceram em silêncio admirando a vista, um esperando que outro dissesse algo.

— Teresa me contou o que aconteceu com seu amigo, sinto muito. Espero que ele fique bem. 

— Ele vai — mentiu. — Quero pedir desculpas pelo meu estado mais cedo, a notícia e a gravidade do acidente me deixou muito perturbado…

— Está tudo bem, você só me assustou pálido e desnorteado daquele jeito.

— Que excelente primeira impressão eu passei, eu deveria estar parecendo um louco.

— Quanto a isso não se preocupe, eu não tenho costume de me apegar a primeiras impressões.

—  Isso quer dizer que vocês viram aqui mais vezes avaliar a casa?

— Se depender de papai ele compraria agora mesmo, ele está encantando. — era impossível deixar de notar que dessa vez Luísa sotaque baiano denotando mais uma mudanças entre ela e seu eu do passado. Contudo Pedro estava ignorando aquele fato, assim como ignorava as sensações negativas que sentia ao estar ali conversando com ela. Portanto seguiu puxando assunto e estimulando a conversa.

— E se depender de você?

— Se depender de mim seus pais e eu teremos longas negociações pela frente, a casa é bonita e é exatamente o que procuramos, mas o preço está certamente salgado.

— Isso de preços é com eles…tenho certeza que chegaram a um acordo.

— Assim espero — eles ficaram em silêncio por alguns instantes até que ela trocou de assunto. — Sua mãe me contou que vocês costumavam vir aqui todos os fins de semanas, deve ser difícil se despedir. 

— É eu tenho muitas memórias daqui — pensou em momentos da sua infância quase apagados em suas memórias, dias ruins, dias tristes e outros ótimos, excelentes talvez os melhores de sua infância. Por mais que sentisse saudades daquela época, Pedro percebia que agora ele entendia o que sua mãe tinha na última viagem deles a casa de campo: era hora de seguir em frente. Era hora de viver com as memórias em seu peito e não viver em função delas. — Eu sequer me lembro da primeira vez que vim aqui, eu provavelmente deveria ser um bebê de colo. Até minhas melhores e mais recentes memórias foram feitas aqui, eu conheci Teresa aqui…

Ele soltou uma risada leve, o astrônomo nem sabia o porquê de estar dizendo aquilo tudo e se antes Luísa não o achava louco antes, provavelmente estaria agora. Foi então que ele viu Teresa banhada pelo Sol que se punha, linda. A pele dela parecia reluzir e só não era mais brilhante que o sorriso feliz que ela estampava no rosto. Ao contemplá-la, Pedro soube o que estava fazendo, estava se dizendo adeus.Estava deixando tudo aquilo para trás, seguindo o rumo da vida, afinal o tempo passava por um motivo não era mesmo? Ele seguiria em diante rumo a imensidão tão escura quanto o espaço, mas estava tudo bem porque ele teria o mais brilhante dos astros para ajudar a norteá-lo.

—Essa casa presenciou várias etapas da minha vida, mas está na hora de carregar essas experiências comigo e deixá-la vazia, pronta para que outras pessoas também possam cultivar bons momentos nela.  Espero que vocês façam bom proveito dela e decidirem ficar  — disse sinceramente, no final das contas conversar com a filha de Domingos não tinha sido nada do que ele havia imaginado assim como ler o livro que ele jurava que já sabia qual seria sua impressão dele. Então olhando para frente, para seu futuro. — Se você me der licença, vou encontrar minha namorada.

Ele então caminho, passou pelo jardim bem cuidado até onde Teresa estava. Leopoldina gentilmente seguiu em direção ao ex-marido deixando os dois a sós. Por um tempo Pedro a apenas a observou e ela esperou que dissesse algo.

— Obrigada.

— Pelo o que? — ela perguntou confusa.

— Por tudo. Por você. 

— Pedro, o que você está esperando para me beijar? 


Notas Finais


E então?? Foi um balde de água fria né?? Perdão pelo falso cliffhanger e pela quebra de expectativa (espero que vocês me perdoem com o beijo do final foi um presentinho meu pra vocês) Eu sei que muitos queriam que a Teresa finalmente soubesse, mas por ela as coisas ficam como estão mesmo. Isso não quer dizer que o assunto morreu, que escritora eu seria se não explorasse a Teresa descobrindo sobre o seu passado?? O problema é que agora não é o momento.
Dito isso talvez vocês tenham notado o clima meio de despedida desde capítulo, pois bem, está finalizada a primeira parte dessa história com Pedresa decidindo por um fim as preocupações com visões e afins, mas não se preocupem que há muito mais por vir...estamos agora numa fase de transição (que eu gosto de chamar mentalmente de quase lua de mel)! Não se preocupem eu não esqueci o do fake dating ou da festa, nem muito menos o que o Pedro I e as intenções dele, mas isso é assunto pra os próximos capítulos.
Quanto a Luísa eu já tinha tido antes que não tinha interesse trazer ela aqui, apenas o fiz para que chegássemos nesse ponto em que o Pedro toma a decisão ignorar o passado pela Teresa. Ver alguém do passado dele e constatar que não era o que ele esperava foi o empurrão que eu encontrei para que o personagem tomasse essa decisão. Enfim não pretendo que ela apareça mais eu nem desgosto dessa Luísa (apesar de ter zuado com a falsa prontidão dela porque não sou de ferro), fim.
Mais uma vez indo me esconder nas montanhas até mais.


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