História Simples assim... - Soluções

Sua estação favorita finalmente havia chegado. Londres já não estava mais tão tediosa, mas sim repleta das cores típicas do outono. As variações de marrom, laranja, vermelho e amarelo a encantavam, coisa que não podia sentir em qualquer outra época do ano. Apesar de tudo o que a fazia amar o outono, também fizesse com que lembrasse ainda mais de Viktor, seu humor melhorava mais a cada dia que o cenário se alterava.

Já estava há algumas horas voltada para a janela encantada de sua sala no Ministério, apreciando a vista magicamente proporcionada, enquanto ouvia a gravação da reunião em que seu chefe discutia a questão dos trabalhadores bruxos na Irlanda com o representante do Departamento naquele país. Seu cérebro trabalhava furiosamente para encontrar alguma solução para os problemas que os inventores e pesquisadores de poções estavam enfrentado. Estava tão concentrada que quase caiu de sua cadeira quando sentiu uma mão em seu ombro. Virou-se para olhar quem seria a pessoa que a assustou. Corou violentamente quando identificou o seu chefe com um olhar divertido e a sombra de um sorriso nos lábios. Tirou os fones em um movimento rápido, colocando-os sobre a mesa.

- Está ficando enferrujada, minha querida. Talvez deva transferi-la para um setor com mais ação? - brincou com o seu costumeiro tom sério, sendo reconhecível seu divertimento apenas para aqueles que de fato o conheciam.

Ela riu, enquanto observava mais atentamente o seu chefe. Ele parecia cansado. Apesar de já ter uma certa idade - número este que sempre se recusara a revelar-lhe - era um homem que transbordava autoridade e vida ao mesmo tempo, apesar do semblante quase constantemente sério. Tinha um tom de pele levemente bronzeada, cabelo grisalho de fios predominantemente brancos e brilhantes e astutos olhos azuis piscina. Entretanto, seu olhos pareciam mais apagados e até seu bronzeado natural parecia ter sumido, dando lugar a uma aparência pálida.

Não era para menos. Legislações de segurança no trabalho eram vistas com grande preconceito pela comunidade bruxa, que se achava tão autossuficiente por conta da magia em seu sangue. Eles estavam tendo muito trabalho para fazer com que os bruxos em geral entendessem que se tratava de uma questão de prevenção e não de atestado de incapacidade para os hospitais bruxos do Reino Unido. A intenção de seu chefe sempre fora melhorar as condições de vida daqueles que viviam sob a guarda do Ministério e, também, reduzir o contingente de acidentes mágicos, já que o número da nascidos trouxas aumentava a cada ano, o que já estava sobrecarregando o Departamento de Acidentes e Catástrofes Mágicas.

- Talvez eu deva falar para Harry se meter em alguma encrenca de novo para despertar meus instintos de duelista… - comentou sorrindo e entrando na brincadeira do chefe.

O homem balançou a cabeça em concordância ampliando um pouco o sorriso.

- Quero que me acompanhe em uma reunião com o Ministro. - voltou ao semblante sério - Draco já está nos esperando.

Hermione franziu o cenho. Não se recordava de nenhuma reunião marcada na agenda do Departamento para aquele dia. Como se lesse os pensamentos dela, Morgade prosseguiu.

- Não está agendada. Eu e o Ministro nos encontramos por acaso hoje mais cedo e tivemos algumas ideias que poderão nos ajudar.

Ela assentiu levantando-se e acompanhando-o até os elevadores. Encontraram Malfoy os aguardando no centro do saguão de elevadores. Ela sorriu o cumprimentando e em resposta recebeu uma piscadela e o costumeiro sorriso ladino, que transformou-se em um sorriso amplo quando o Sr. Morgade se aproximou dando uns tapinhas no ombro esquerdo do loiro.

A castanha não conseguiu conter o olhar curioso. A verdade é que, desde que Malfoy assumira o cargo de assessor, sempre fora curiosa sobre o relacionamento deles. Os dois homens pareciam nutrir um imenso carinho um pelo outro. Já vira incontáveis vezes o loiro perder a postura indiferente na presença do mais velho, na mesma proporção em que este abandonara a expressão séria quando próximo sonserino. Algumas vezes se pegava admirando-os, tentando usar de sua imaginação para entender a relação quase fraternal que tinham. Infelizmente para a sua curiosidade insaciável, nunca tivera coragem para perguntar a seu chefe, muito menos íntima o suficiente para o fazer ao loiro.

Balançou a cabeça, espantando os pensamentos e preparando-se para entrar no elevador. Graças a Merlin, teriam que descer apenas um nível. Aqueles elevadores eram a única coisa que odiava em todo o universo bruxo. Ela bufou assim que se segurou em uma das alças pendentes do teto, ouvindo um riso baixo e sarcástico do loiro, que entrou logo em seguida, o que ela ignorou prontamente. Sentiu o olhar de seu chefe permeando entre eles. As vezes sentia que a interação de ambos era a dose de diversão diária do Sr. Morgade. Podia até jurar que Lewis Morgade os colocava em um mesmo ambiente sob circunstâncias estressantes apenas para contemplar a lenha queimar.

Assim que as portas se abriram, caminharam pelo corredor de mármore negro e lustres dourados extravagantes. Passaram por quatro aurores antes de atravessar o véu desfazedor de magia, chegando finalmente às pesadas portas duplas que davam para a ala exclusiva do Ministro.

A secretária pessoal do Ministro levantou-se assim que atravessaram as portas, os cumprimentando e encaminhando-os até o Gabinete Ministerial.

Kingsley Shacklebolt ergueu-se saudosista de sua cadeira assim que notou a presença dos três junto de sua secretária. Apertou as mãos de Malfoy e Morgade e, em seguida, abriu os braços para acolher Hermione.

- É preciso uma reunião com o seu chefe para que eu possa vê-la, menina Granger! - bronqueou, ao passo que a ela somente restou corar.

- Prometo visitá-lo mais vezes, Sr. Ministro… - disse tímida pela presença dos outros dois homens.

O negro a encarou sério antes de chamar-lhe a atenção mais uma vez.

- Já conversamos sobre essa formalidade toda quando não estamos em público…

Ela apenas ergueu os ombros dando a entender que era apenas um costume seu. O Ministro gargalhou antes de sacar a varinha e duplicar uma das cadeiras para que todos pudessem ficar acomodados em frente à sua mesa.

- Vamos nos sentar e começar logo! Estou particularmente animado com este projeto!

Hermione e Draco sentaram-se um de cada lado do Chefe do Departamento, aguardando silenciosamente pelo que viria.

- Quer fazer as honras então, Kim? - questionou o mais velho.

- Oh não Lewis! O projeto e os assessores são seus. Estou aqui apenas para prestar-lhe apoio. - os olhos negros brilhavam.

Ela não soube se aquilo era algo bom ou ruim. Kingsley tinha um histórico de amor por ideias malucas e trabalhosas, mas que felizmente costumavam dar certo. Na última, ele tinha mobilizado quase todos os Departamentos do Ministério a fim de regulamentar a interação com sereianos de água salgada. Fora uma empreitada árdua até finalmente conseguirem estabelecer um contato maior com o mundo dos mares. Sereianos de água salgada são criaturas incrivelmente belas, inteligentes e reservadas - provavelmente por conta da riqueza de propriedades mágicas dos recursos naturais protegidos por eles. No ano anterior haviam conseguido inclusive desenvolver as relações comerciais. Foi também por esse motivo, pela infinidade de novos recursos mágicos, que os acidentes mágicos haviam aumentado consideravelmente. Os bruxos não tinham conhecimento suficiente das propriedades dos recursos recém acessados.

Apesar deste pequeno problema, o Ministério da Magia Britânico conseguira algo que há séculos bruxos do mundo inteiro almejavam. Para esta conquista, cinco dos sete Departamentos do Ministério foram envolvidos, tendo sido criadas ainda duas Seções especiais, a Divisão de Interação com Sereianos - vinculada ao Departamento para Regulamentação e Controle das Criaturas Mágicas - e, mais recente, o Controle de Mercancia Sereiana - atribuída ao Departamento de Cooperação Internacional em Magia, já que o objetivo era engajar num comércio internacional da matéria prima fornecida pelos sereianos sem que prejudicasse o ambiente marinho. Algo tão grande assim não passava despercebido. Kingsley já estava sendo reconhecido como o “Ministro inovador” no mundo todo..

Se sua intuição estivesse certa, aquela não era uma situação diferente. Ela só não conseguia imaginar que ideia milagrosa poderia fazer a comunidade bruxa apoiá-los.

Foi então que o Sr. Morgade começou a narrar a grande ideia. Conforme seu chefe despejava as palavras, Hermione se sentia cada vez mais animada, entendendo tudo imediatamente. Aqueles dois eram gênios! Para seu alívio, a ideia em si não era maluca, mas com certeza daria trabalho e eles precisariam solicitar a colaboração de pessoas confiáveis de alguns outros Departamentos. As engrenagens em sua cabeça se mexiam furiosamente a medida que o Sr. Morgade, e até mesmo Shacklebolt, acrescentava mais informações do projeto.

Durante o discurso do Chefe do Departamento, ela e Malfoy trocaram alguns olhares, como se pudessem conversar apenas por este meio. Em algum momento, ela conseguiu distinguir o brilho de empolgação nos olhos cinzas, levando ela a constatar que estavam no mesmo barco de esperança e excitação.

Ela se sentia em pólvora. Mais tarde, quando já estava em seu apartamento e olhou-se no espelho enquanto escovava os dentes, reconheceu em muito tempo um pouco da Hermione que o luto havia enterrado.