Narrado por Max Thunderman
Existem dois extremos em absolutamente tudo nesse mundo. Bem e mal. Sim e não. Frio e calor.
Mas eu jamais estive realmente em um dos extremos.
Por mais que lutasse para fazer todos acreditarem que eu era um terrível vilão, sempre houve bondade em mim, por mais que eu buscasse fazer ela passar despercebida. Nunca fui 100% mal. E atualmente não era capaz de dizer que era 100% bom.
E era ali que eu me encontrava sempre. No meio termo, no limite do positivo e do negativo. Eu estava sempre no talvez.
Talvez eu seja bom.
Talvez eu seja mal.
Talvez eu faça isso.
Talvez eu sinta aquilo.
Minha vida era rodeada disso dia após dia. Mas haviam raros momentos em que eu tinha algumas certezas bobas. Como a certeza que tinha, de que precisava proteger minha irmã depois do que Link fez. Não havia espaço para talvez, ele havia ferido ela e ponto. Precisava curar a ferida de Phoebe de alguma forma.
Me sentei longe dela no almoço, como sempre. Mas estive com os olhos pregados na minha irmã todo o tempo. Ela estava com suas amigas, e parecia feliz. Mas eu sabia que no fundo ainda estava remoendo o que aconteceu com Link.
– Cara, não vai comer, eu como – disse Gideon levando a mão a minha bandeja tentando puxar meu sanduíche. Dei um tapa forte em sua mão e ele recuou mal humorado.
– Minha comida, Gideon – disse olhando para ele – Toque nela de novo, e eu não respondo por mim.
– Você não está nem aí pra comida, Max – disse Oyster – Afinal o que você tanto olha?
Ele se virou, Gideon se inclinou para observar também. Os dois me olharam de forma estranha e Oyster estreitou os olhos.
– A Cherry, cara? Sério? – perguntou Oyster – Fica longe dela, tá cheio de garota solteira por aí!
Fiz uma careta e revirei os olhos. Aquilo era o cúmulo.
– Não inventa, Oyster – eu disse – Estou de olho na Phoebe.
Gideon abriu um sorrisinho malicioso.
– Hmm...a Phoebe – ele disse me cutucando com o ombro. Oyster e eu franzimos a testa enquanto encaravamos. Gideon pareceu perceber o que estava dizendo e abriu a boca horrorizado – Cara, ela é sua irmã!
– Não é estar de olho desse jeito Gideon – disse Oyster.
– O canalha do Link terminou com ela ontem – comentei levando o copo a boca e bebendo um gole de suco. Gideon e Oyster arregalaram os olhos.
– Quem é idiota de terminar com a Phoebe? Ela é...– Gideon começou a dizer com um sorrisinho sugestivo. Lhe dei um tapa forte na nuca que fez ele soltar um gritinho de dor.
– Cuida o que vai dizer, ela é minha irmã – repreendi. Suspirei – Como eu ia dizendo...ela ficou muito mal, e eu só queria saber se ela está bem.
– Fala com ela – disse Oyster dando de ombros.
– Eu já falei, mas ela parece irritada com a minha persistência – disse para eles. Apontei a minha bandeja – Enfim, alguém quer?
Gideon não demorou um segundo para agarrar meu sanduíche. Olhei em volta.
– Onde tá o Wolfgang? – perguntei franzindo a testa.
– Ah, ele pegou catapora – disse Oyster com tranquilidade. Bufei olhando para Phoebe mais uma vez. Ela parecia rir de algo que Ashley contava.
Naquele instante, ela ergueu a cabeça ainda rindo e seu olhar pousou em mim. Haviam poucos momentos na vida em que eu podia dizer que tudo ao meu redor sumiu. E aquele poderia ser acrescentado a lista. Os olhos dela cintilavam, e ela me encarou por alguns segundos. A risada vacilou e se tornou um singelo sorriso. Havia algo nos olhos dela que eu jamais tinha visto.
Talvez...
Apenas talvez, as coisas tivessem mudado.
As bochechas dela assumiram um tom rosado mais forte, e ela por fim desviou o olhar voltando a prestar atenção em Ashley.
– Max? – Gideon chamou e ergui os olhos. Os dois já estavam de pé me aguardando, e eu nem havia notado que já tinham terminado – Vamos?
Pisquei algumas vezes.
– Ahn...claro – respondi.
O que havia acontecido?
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Estava escorado na parede do lado de fora da escola a cerca de cinco minutos. Phoebe tinha aquele costume irritante de ficar cochichando com a Cherry depois da aula. Diversas vezes dei as costas e comecei o trajeto sem ela, para segundos depois ouvir seus passos apressados e receber um tapa acompanhado de um "porque não me esperou".
Mas naquele dia, tinha sido invadido por uma onda de generosidade e paciência, a ponto de estar ali parado aguardando.
Phoebe se despediu de Cherry e deu alguns pulinhos até me alcançar. Ela enlaçou seu braço no meu e me puxou com delicadeza.
– Pronto, podemos ir – disse ela sorrindo.
– Finalmente... achei que ia criar raízes de tanto esperar – disse para ela. Phoebe revirou os olhos.
– Não exagera, Max – disse ela me soltando.
– Maaaxxx! – Phoebe olhou para trás de mim e uma fúria discreta se ascendeu em seus olhos. Assim que ouvi a voz, soube que teria algum tipo de incomodação ainda ali.
Senti o corpo se chocar contra o meu e me abraçar a cintura por trás. Ergui o braço e a puxei para meu lado.
– Allison – sorri.
– Amor, precisa vir comigo agora, tipo agora mesmo – disse ela animada e afoita. Olhei para Phoebe. Como sempre ela estava desconfortável. Na maioria das vezes eu a acusava de ciúme e ficava por isso, mas aquele com certeza não era o dia para isso.
– Não posso – eu disse a Allison – Eu preciso levar a Phoebe pra casa.
– Ah ela sabe o caminho – disse Allison com um gesto de desdém. Pela primeira vez, consegui ver Allison pelos olhos da minha irmã.
Phoebe vivia falando que Allison era dissimulada, narcisista, individualista e egoísta. Mas eu jamais via isso. Tudo que enxergava era a doce e bonita Allison, minha namorada maravilhosa.
– Eu vou com a Phoebe, vejo você mais tarde – afirmei. Allison se afastou de mim bruscamente, olhei em seus olhos e vi o fogo puro de sua raiva acesa. Ela estreitou os olhos.
– O que você disse? – ela desafiou.
Me aprumei e ergui a cabeça, tentando transparecer segurança enquanto olhava nos olhos dela e dizia:
– Disse que vou com a minha irmã.
Ela parecia prestes a me matar. Talvez matasse se eu não tivesse super-poderes.
– Max Thunderman, você não sabe com o que está brincando...
– Ele te liga mais tarde, Allison – Phoebe segurou meu braço apoiando o queixo no meu ombro. Olhei para ela e notei o sorrisinho vitorioso e cínico. Tive que prender o riso, Phoebe Thunderman também tinha seu lado malvado.
E então ela me puxou para a rua. Sem escolha a segui, ainda ouvindo os berros de Allison nas nossas costas. Phoebe me soltou e ajeitou a mochila enquanto andava de cabeça erguida ao meu lado pela calçada.
– É impressão minha, ou você realmente estava provocando a Allison? – perguntei fingindo inocência. Phoebe sorriu torto.
– Vai defender ela, irmãozinho? – Phoebe me fuzilou com um olhar que me dizia que a resposta correta àquela pergunta com certeza era um curto não.
– Jamais seria capaz disso – respondi. Ela sorriu.
●------■------●
Desci pelo escorregador e nem me dei o trabalho de tirar os sapatos para ficar deitado. Suspirei encarando o teto completamente extasiado. Pela primeira vez desde que começamos a sair, eu tinha dito um "não" para Allison.
Isso era assustador, nem sabia o que havia me dado tanta coragem.
– Mais uma vez esse sorrisinho bobo, suponho que isso se deva a sua preciosa Allison – Dr. Colosso disse, me lembrando de que eu nunca estava sozinho naquele quarto.
Me ergui apoiando o peso do corpo nos cotovelos para avistá-lo na gaiola.
– Digamos que tenha – eu sorri – Eu disse "não" pra ela, Colosso!
Colosso pareceu surpreso.
– Nossa, que romântico – disse com sarcasmo. Revirei os olhos e me sentei direito – E porque isso te deixa tão feliz?
– Porque eu descobri que eu tenho vontade própria! – respondi – Isso não é incrível? Allison não é a dona da minha vida!
– Tá, isso não foi nada romântico – disse Colosso. O mirei confuso e Colosso suspirou parecendo que viria a dar um longo sermão – Se se sente preso com ela, porque ainda está com ela?
Franzi a testa. O que Colosso estava falando?
–Ahn?
Colosso fez o mais perto de um revirar de olhos que conseguiu. Depois se aproximou mais.
– Porque você está com a Allison? – perguntou ele.
Tive de pensar. Eu não deveria ter de pensar. Eu deveria ter a resposta na ponta da língua, deveria simplesmente dizer tudo como quem declama um poema. Mas nada saia.
– Ela é bonita – consegui dizer gaguejando – É le...gal?
Fiz uma careta. Não era para ser uma pergunta, mas foi como saiu. Colosso mais uma vez tentou revirar os olhos.
– Está vendo, você não ama essa garota – afirmou ele.
Eu ri.
– Ah Colosso. Claro que amo, a Allison é... a garota que todos querem – justifiquei.
– Mas ela não é a dona da sua vida – rebateu ele. Eu havia sido calado por um coelho.
Colosso deve ter notado que aquilo me desarmou. Eu havia dito aquela frase minutos antes, mas não notei o peso dela.
Allison era linda, era inteligente e a garota perfeita. Mas talvez não fosse perfeita para mim. Eu entendi naquele instante que amor não era apenas atração física. Como pude ser tão cego?
Eu não a amava. Simples assim.
Quando havia decidido que não queria mais viver me esquivando dela nos corredores ou inventando desculpas para não estar com ela, algo me atigiu como um raio: o rosto molhado de Phoebe na noite anterior.
O que Link fez com ela, eu o achava o maior canalha do mundo por ter partido o coração dela, e se fizesse o mesmo com a Allison, estaria me tornando aquilo que repudiava.
Senti minha respiração pesar e meu coração acelerar. Estava agoniado e nem sabia ao certo o motivo.
– Não posso terminar com ela, Colosso – sussurrei encarando o nada pensativo.
– Talvez precise – respondeu ele – Porque existe uma garota por aí, Max. Uma garota que está esperando por você mesmo que não saiba. Que só vai se sentir completa quando você a beijar e que vai te completar como Allison jamais conseguiu. E se quiser encontrá-la, não pode ter amarras.
Colosso falava sério. Meu amigo estava me dando um conselho, e vi em seus olhos que dizia aquilo com base em sua experiência pessoal.
Allison não era a dona da minha vida.
Mas quem era afinal?
●------■------●
Já havia jantado, e estava a caminho do quarto. Pretendia usufruir de uma boa noite de sono, até que percebi que isso não aconteceria tão cedo.
– Max – mamãe chamou no instante que ameacei descer pelo escorregador. Suspirei e me afastei dele me virando na direção da cozinha onde dona Barb me olhava com ar pidão.
– Sim? – disse.
– Preciso te pedir uma coisa – disse ela. Nem tinha percebido! Assenti para que ela dissesse – Pode sair com a Phoebe?
Franzi a testa.
– Hoje e sexta-feira e ela não saiu de casa a não pra ir a escola – disse ela preocupada – As amigas dela estiveram aqui mais cedo insistindo pra ela sair, mas ela não quis. Eu não quero que ela fique no quarto trancada pensando no Link, ela precisa sair.
– E onde quer que eu leve ela? – perguntei.
– Vou deixar você escolher – respondeu ela sorrindo – Podem pegar a Thundervan e...o cartão de crédito do seu pai.
Era desespero mesmo. Eles nunca, em hipótese alguma liberavam o cartão de crédito, a não ser que fosse emergência médica.
Em todo o caso, eu mesmo não queria que Phoebe ficasse se lamentando pelo idiota Link. Ela merecia se divertir. E ficar com minha irmã gêmea não podia ser assim tão tedioso.
– Vou subir pra falar com ela, prepara o cartão mamãe – eu disse subindo as escadas.
Me aproximei da porta do quarto dela e girei a maçaneta. Trancada. Usei telecinese para abrir a tranca e entrei no quarto sem sequer bater.
Como imaginei, Phoebe estava deitada. Usava o pijama cinza com bolinhas cor de rosa e mantinha os olhos fechados com fones de ouvido provavelmente no volume máximo.
– Phoebe, se arruma, porque vamos sair – anunciei. Ela se assustou, sentando bruscamente e tirando os fones do ouvido furiosa.
– Max! – gritou ela – Para de invadir o meu quarto!
– Ouviu o que eu disse? – cruzei os braços olhando para ela no meio do quarto – Vamos sair, agora mesmo, sem protestos.
Phoebe revirou os olhos e se deitou novamente.
– Some daqui! – disse ela.
– Não me faça usar a força – eu disse. Phoebe bufou e me ignorou. Exatamente a reação que eu esperava.
Me aproximei da cama e sem cerimônias, puxei Phoebe a erguendo da cama em meio a alguns gritinhos e esperneadas, a coloquei sobre o ombro e comecei a andar na direção da porta.
– Max! Max! – ela me batia na tentativa de se soltar – Me solta agora antes que eu te frite!
– Vai fundo, mas acho que mamãe ia ficar muito zangada se você matasse o anjinho dela – eu disse ainda a carregando.
– Me coloca no chão! – Phoebe gritou quando saímos no corredor.
Poucos segundos depois, Nora, Billy e Chloe surgiram sonolentos nas portas dos quartos e estranharam o alvoroço. Billy nos encarou e em seguida entreabriu os lábios.
– Estão sequestrando a Phoebe! – disse ele. Nora lhe deu um tapinha leve no braço.
– É só o Max, Billy – disse ela.
– Ah – Billy disse – Max ta sequestrando a Phoebe!
– Tá bem, tá bem! – Phoebe se rendeu – Me coloca no chão pra eu me trocar!
Sorri vitorioso e a coloquei no chão. Phoebe me fuzilou com o mais mortal dos olhares e bufou, marchando até o quarto.
– Eu te odeio, Max Thunderman! – gritou ela após bater a porta.
Suspirei prendendo o riso. Ponto pro papai aqui.
●------■------●
Estava sentado no sofá aguardando. Mamãe e papai estavam assistindo alguma telenovela mexicana ruim enquanto Phoebe parecia ter esquecido da hora.
Quando estava prestes a subir e arrastar ela novamente, ouvi o som dos passos na escada. Revirei os olhos e me levantei me virando para falar com ela.
– Finalmente, achei que nunca mais... – perdi a fala. Nem lembrava da última vez que havia perdido a fala.
Mesmo de cara amarrada por estar sendo forçada, Phoebe foi capaz de tirar meu fôlego. Isso não deveria acontecer.
Ela usava um simples vestido florido, marcando a cintura e descendo com um volume gracioso. Um batom avermelhava os lábios dela, destacando sua pele branca e seus cabelos escuros estavam presos com duas mechas curtas pendendo ao lado do rosto.
Olhei para ela de cima abaixo e Phoebe abriu um sorrisinho enquanto descia as escadas. Pisquei algumas vezes tentando voltar a mim e amansar o ritimo frenético do meu coração.
Talvez...
Mas já era tarde.
O talvez havia sumido. Ele havia me abandonado a deriva em um mar de certeza desconhecido e assustador.
Por mais que fosse negar e lutar contra aquilo por quanto tempo pudesse resistir, foi naquele instante que tive a resposta para a dúvida que Colosso colocou em meu coração mais cedo.
Era ela. Era Phoebe.
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