História Sinto que te amei a vida inteira - É hora de partir, Wuxian.

Em toda a vida, você passa por muitas pessoas. E todas elas, levarão algo de ti. Como também, todas elas, deixarão algo. Há até uma frase conhecida, do livro O Pequeno Príncipe que retrata muito bem isso. 

"Aqueles que passam por nós, não vão sós, não nos deixam sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós" 

"O que… o que quer de mim?" perguntou Wei Wuxian, após chegar em frente a casa do outro. Ele questionou com pesar, como se aquelas palavras fossem as mais difíceis de ser pronunciadas em toda sua vida. 

E de fato eram.  

Wangji olhou no fundo de seus olhos, para logo em seguida engolir em seco, abaixando a cabeça, como se estivesse envergonhado demais para olhar para o outro. 

"Você… você quer entrar?" perguntou, abrindo o caminho para o outro passar. O Wei suspirou, entrando de braços cruzados. 

"Vejo que ainda não consertou a parede…" disse baixinho, em uma pequena observação. Ele se referia a parede danificada, que havia sido quebrada há um tempo atrás. 

Wangji suspirou. Ele balançou a cabeça levemente, enquanto caminhava hesitante ao lado do outro, que observava a parede. Ambos ficaram olhando para aquele ponto, sentindo cada átomo de seus corpos vibrarem ao estarem do lado um do outro. 

"Por que me chamou aqui?" questionou o Wei, irritadiço. "Eu tenho que pegar o avião daqui algumas horas, não tenho muito tempo…" Alertou, querendo que toda aquela situação constrangedora que havia se envolvido acabasse. 

"Wei Ying está ainda mais lindo" constatou sua observação, mirando suas orbes castanhas no outro, que sentiu a irritação esvaziar, dando lugar a saudade e melancolia. "O tempo apenas lhe fez bem."

"Lan Wangji…"

O Lan ficou em silêncio. Conhecendo do jeito que conhecia, Wuxian sabia que ele estava travando uma batalha interna consigo mesmo, hesitante em falar ou não falar. Wangji era uma pessoa difícil, sempre calada, e parecia que o que quer que queria falar, não estava devidamente preparado; como se o chamar para aquele lugar novamente fosse uma de suas raras atitudes impensadas e impulsivas. 

Wuxian olhou impaciente para seu relógio, ignorando o elogio feito pelo outro anteriormente, virando seu corpo para o lado direito, encontrando Wangji ainda em silêncio, olhando para a parede. Wei Ying sorriu incrédulo, sentindo seu coração pulsar em pura decepção e descontentamento por ver que vir até a casa do Lan foi uma má ideia. 

O mais velho deu uma última olhada no outro, virando seu corpo completamente, indo em direção a porta na intenção de dar adeus a toda aquela situação sufocante que o cercava. 

Wuxian mantinha o pensamento de que se abrisse aquela porta e desse um passo para fora, ele finalmente estaria deixando para trás todo o sentimento que estava lhe perseguindo nos últimos dias. Ele foi determinado, mas toda sua coragem de passar pela porta se esvaziou assim que escutou a voz rouca, levemente baixa soar por todo o cômodo. 

"Wei Ying…"

Seus pelos se arrepiaram. O Wei sentiu seus pés lhe traírem, se firmando sob o chão, e todos os seus membros traírem o comando de seu cérebro, lhe abandonando, como também sentiu cada átomo do seu corpo corresponder ao chamado do outro, virando-se. Seus olhos, lacrimejaram levemente, e tudo que Wei Wuxian desejava era que aquele história tivesse um final digno. E que esse final, fosse o mais rápido possível. 

"Wei Ying…" a voz soou hesitante pelo apartamento desorganizado. "Wei Ying…" pausou, se sentindo ansioso. Wangji suspirou, continuando: "Você quer aquela sopa?" perguntou, com a voz meio quebradiça. O corpo de Wangji havia se virado por completo, agora, o Lan mantinha seus olhos nas costas do outro. "Sopa de raíz de lótus com costela"

Wuxian respirou fundo. 

"Se eu quero sopa?" questionou, soltando uma risada sarcástica. "Você me chamou aqui para o que?" se virou. Seus olhos estavam afiados, acusatórios, raivosos, magoados. O coração do Lan bateu mais forte dentro do peito. "Para me oferecer uma sopa? Uma sopa, que ainda por cima, quem fazia era minha irmã?"

"Não é isso, Wei Ying…" tentou se justificar, mesmo que minimamente, sentindo o peso daquelas palavras lhe atingir a ponto de lhe tirar a órbita. 

"Pare de me chamar assim!" pediu, praticamente suplicou, prestes a ter um surto. 

"Me desculpe Wuxian" sussurrou, a voz soando mais baixa a cada sílaba jogada no ar. 

"Por que me chamou aqui Lan Zhan? Para me machucar ainda mais? Olha… eu estou prestes a viajar e dar um adeus para toda essa merda. Porra… eu pensei que você havia me chamado para falar algo importante. Mas a primeira coisa que você me pergunta é se eu quero sopa. Eu não quero. Eu não quero mais. Não pode me deixar em paz?"

"Eu te chamei aqui justamente por isso, Wei Ying. Eu quero me despedir de você, de vez, te libertar disso. E acho que Wei Ying nunca seria libertado de toda essa história sem falar diretamente com quem te faz sentir isso" respondeu Wangji, se aproximando cada vez mais do Wei, que estava parado no meio da sala bagunçada. "Vem aqui" estendeu a mão. 

Wuxian olhou para a mão em sua direção, e logo em seguida levantou seus olhos para o dono de quem a estendia. Seu coração começava a bater de forma frenética dentro do peito, e o nó na sua garganta se formava cada vez mais forte. 

A realidade, é que Lan Wangji foi o amor da sua vida. De todos os amores, ele era o próprio. O único que lhe iluminou, que lhe deu discernimento, apoio. Talvez, Wei Wuxian estivesse com outra pessoa, mas ele não precisava estar com outro alguém para saber que Lan Zhan seria o único em sua vida, por toda a eternidade, até mesmo depois da morte. Não, ele não precisava. Ele sabia que Wangji era a sua pessoa, a sua única pessoa. 

E mesmo com tanto sofrimento causado, mesmo sabendo que não poderiam ficar juntos, doía. 

Ele estendeu sua mão também, pegando firme naquele que lhe olhava com melancolia, mas ao mesmo tempo, com gentileza. O Lan segurou firme a mão gelada e delgada, o puxando para si, em um abraço. Os corpos se bateram gentilmente, e Wuxian congelou no lugar, sentindo a respiração quente de Wangji bater contra seu pescoço assim que o mesmo colocou sua cabeça lá. As mãos de Lan Zhan foram para suas costas, o apertando em um abraço confortável. 

Wangji, nunca havia o abraçado daquela forma. Nem quando estavam juntos. 

Wei Wuxian não retribuiu seu abraço. Suas mãos ficaram congeladas, paradas para cima, atrás do corpo de Wangji, que o apertava cada vez mais. As lágrimas que antes tentava esconder, agora, caia sem parar. 

"Me desculpe Wei Ying, por tudo. Por cada lágrima que o fiz derrubar, por cada momento que fiz Wei Ying sofrer, inclusive por este momento. Me desculpe, me desculpe, me desculpe. Wei Ying merece ser feliz, merece ter alguém que possa te fazer feliz. Alguém que faça você transbordar, e que não tire as suas energias como eu fiz nos últimos tempos" ele levantou a cabeça, olhando nos olhos escuros do outro, que a cada segundo, soltava ainda mais lágrimas. Wangji deu um sorriso melancólico, levantando suas duas mãos, passando seus dedos por debaixo dos olhos de Wuxian. "Não chore, Wei Ying. Wei Ying é muito bonito para chorar. E ainda mais, eu não mereço essas lágrimas. Se for para você chorar, que seja por felicidade, por favor."

"Por que dói tanto Lan Zhan?" perguntou, colocando suas mãos por cima das quentes de Wangji. O cheiro de sândalo invadia suas narinas, e o olhar banhado de tristeza não saia de si por um momento sequer. "Você não é de falar muito e… te ver falando tanto, ainda mais sobre o nosso ex relacionamento e sobre minha felicidade, faz com que meu coração arda como o inferno."

Wangji não respondeu. Não era necessário haver uma confirmação, um conforto, algo que preenchesse o que Wei Ying queria tanto saber; eles sabiam bem qual seria a resposta desse questionamento. 

Naquele momento, Wuxian chorou ainda mais. Ele pulou nos braços de Wangji, o apertando forte, como se fosse a última vez. Porque de fato, seria última vez. Mesmo que Wangji e Wuxian fossem almas gêmeas, e se pertencessem, não existia mais eles; não existe mais Lan Zhan e Wei Ying, agora cada um seguiria seu caminho, como deveria ter sido desde o início. 

"E-eu me perdi em tanta coisa" começou Wuxian, com a voz quebradiça. Ele ainda estava abraçado a Wangji, sem sinais de que iria soltar. Lan Zhan, o agarrava com a mesma intensidade, passando sua palma sob os cabelos macios do outro. "Em tantas cores, sabores, pessoas" ele levantou a cabeça dos ombros de Wangji, olhando em seus olhos. "Por que eu tive que me encontrar logo em você?" 

"Wei Ying…"

"Me desculpa também, Lan Zhan. Por tudo. Por cada incompreensão minha, cada palavra desnecessária que disse. Me desculpa" 

"Está tudo bem Wei Ying" disse o Lan, passando novamente as mãos no cabelo de Wuxian, se afastando dele. 

Wangji não chorou como o Wei, mas ele sentia seu coração ser pisoteado. O nó que se formava em sua garganta, as mãos suando, a falta de palavras. Os seus olhos claros demonstravam toda a dor do qual ele não conseguia. Mas ele também, não precisava de muito para ser lido por Wei Ying. Ninguém o conhecia como Wuxian.

"Eu te amo Lan Zhan" disse Wei Ying, passando uma das mãos na lateral do rosto de Wangji.  "E eu sinto que sempre vou te amar."

"Eu também amo Wei Ying" respondeu Wangji, sentindo os olhos arderem. "Eu nunca deixei de amar. Nem por um segundo, nem por um instante. Nem se eu quisesse, nem se sonhasse com isso."

Existem muitos amores. Wangji era sim, na vida de Wei Ying, o próprio; entretanto, o amor, há suas formas. Ele pode ser afetuoso, sensual, divertido e principalmente: consolador. Wuxian e Wangji botavam fé em algo que talvez fosse inexistente; mas eles esperavam que o amor que sentiam um pelo outro, poderia ser usado para confortar ambos os corações, e ainda ajudar a seguir em frente. 

Afinal, o amor estava em tudo. Ele é as trevas e a luz, a tempestade e o sol. Ele é a única razão; o único "porquê". O amor mastiga a carne e vomita a alma. 

Wuxian, no fim, confiava no amor. Pois ele via todos os dias no olhar de Lan Zhan; mesmo que no futuro fosse evitar o olhar afetuoso dele para o próprio bem. 

"Wei Ying…" chamou. Ambos agora estavam separados, de frente um para o outro, enquanto Wuxian limpava os últimos resquícios das lágrimas salgadas. 

"Sim?"

"Wei Ying tem um vôo para pegar" disse Wangji, lembrando Wuxian. O coração de ambos pesou. 

"Eu sei"

"Vá. Está na hora de encontrar a felicidade plena" pegou em uma das mãos do outro, a beijando cuidadosamente. 

"Um dia… um dia vamos nos reencontrar?"

"Eu espero que sim. Mas eu não sei. Talvez seja nessa, ou na próxima vida. Só o tempo dirá"

Dizem que o tempo cura todas feridas. O amor é criação, e a morte, a destruição. O tempo é o que fica entre eles; e o tempo é um presente. A vida deve ser vivida intensamente, pois cada segundo é precioso. 

Wuxian assentiu, soltando sua mão da de Wangji cuidadosamente. 

Apaixonamo-nos o tempo todo. Apaixonamo-nos a todo instante, para durar uma vida inteira, ou até o próximo da fila chegar. Amor não é tirado, removido, ou apagado. Ele permanece em nossos corações e não perece; o amor é dança suave e bonita, repleto de recaídas, que te faz desafiar os próprios limites. 

O amor é perigo, daqueles incansavelmente bom de correr. 

O amor trouxe a Wuxian e Wangji os seus melhores lados. E por esse motivo, era hora de partir.

A partida dos dois, seja para qual lado for, será o início de uma aventura para conseguirem se encontrar novamente. Para buscar novas e melhores versões de si mesmos; descobrir novas composições.

Lan Zhan puxou Wuxian delicadamente, colocando seus lábios em sua testa, fazendo o Wei fechar os olhos pelo carinho singelo. Logo depois, e ele mais selinhos em ambas as bochechas macias, e um mais demorado na ponta do nariz do Wei, partindo em seguida para a pinta bonita que ficava próxima de sua boca, dando um beijo gentil. Em seguida, se afastou, observando Wuxian ainda de olhos fechados. 

"Se cuide, Wei Ying. Não esqueça de se alimentar direito" disse, carinhoso. Wuxian abriu os olhos. 

"Se cuide também, Lan Zhan" 

E sem mais delongas, Wuxian se virou e caminhou em direção a porta. Ele a abriu, sentindo os olhos de Wangji queimarem em suas costas, mas não parou sua ação. Tudo que ele mais queria era se virar, e correr para aqueles braços e corpo quentes, implorando para que ele não o soltasse nunca mais. Todavia, não se pode ter tudo que quer. Ele passou pela porta, decidido a não olhar para trás, mas deixando seu coração junto com aquele que estava plantado no meio da sala; no entanto, levando junto o coração daquele que deixou. 

"Aqueles que passam por nós, não vão sós, não nos deixam sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós"