História Solangelo - Paraíso de Verão - As vozes dos mortos

Jason on

Quíron havia falado comigo sobre a situação do Nico. Eu realmente não prestei muita atenção no que ele falava, apenas captei algumas partes importantes como: “não fale do Will perto dele” e “mantenha o Nico longe do Mundo Inferior”. A primeira ordem eu até poderia conseguir, mas impedir ele de ir aos domínios do pai dele? Só podia ser piada.

Deveria ter perguntado o motivo? Deveria, mas eu conheço muito bem o centauro. Nada que eu falasse o faria soltar qualquer palavra. Teria que agir por minha conta.

E tinha a questão do Nico ter esquecido o Will. Pensei sobre inúmeras possibilidades para isso ter acontecido: trauma, perda de memória ou até mesmo que ele impôs esquecê-lo. Nenhuma dessas fazia sentido. Conhecia muito bem aqueles dois, podiam brigar por tudo, porém no final sempre estavam rindo da situação.

Ainda tinha o fato de dois dias depois de encontrarem o Nico desmaiado na praia, Will ter desaparecido sem avisar ninguém. Quando isso acontece no mundo da mitologia nunca é coincidência. Precisava conversar com o ele melhor sobre isso sem deixar a mostra o meu real objetivo.

Já estava quase na hora da janta então pensei em passar no chalé dele para conversarmos e também para eu pedir desculpas, admito que passei dos limites gritando com ele.

Bati na porta do seu chalé. Sem resposta.

Insisti em que ele me atendesse. Será que estava dormindo?

- Já vai! – diz Nico gritando dentro do chalé.

Depois de alguns minutos ele finalmente abre a porta.

- Veio me julgar de novo? – aquelas palavras machucaram.

- Olha desculpa... Eu sei que passei dos limites. Eu só não esperava tudo aquilo. – digo realmente arrependido.

- Tudo bem, relaxa. Eu também ficaria abalado com tudo isso. – diz Nico.

- Podemos conversar um pouco? – digo.

- Entre. – diz Nico abrindo espaço para eu entrar.

O chalé apesar de não ter sido hospedado por ninguém durante um ano estava bem arrumado. Fico feliz que as filhas de Afrodite tenham atendido o meu pedido. Sim, eu sabia que um dia ou outro Nico iria voltar para o acampamento. Era como um imã.

Na sua cama percebi que tinha uma foto do Will. Onde ele tinha arranjado aquilo? Aproximei-me dela e peguei a foto.

Espera...

Eu me lembrava daquele dia, eu tinha tirado aquela foto ou pelo menos era para ter sido isso. Recordava que era o dia em que Percy e Annabeth iriam para Nova Roma e decidimos fazer uma pequena despedida para eles na praia. Ah e nesse dia levamos uma bronca tremenda do Quíron porque estávamos usando uma câmera digital sem ele saber. Foi divertido.

Naquele momento da foto eu lembro que foi quando Will empurrou o Nico dentro do mar e ele acabou ficando todo molhado, e para registrar o momento eu tinha tirado uma foto. Nela deveria estar Will rindo olhando para a câmera e o Nico caído na parte rasa do mar rindo da situação também. Porém não era isso que estava na foto, só tinha o Will rindo nela. Era como se o Nico tivesse sido apagado daquele momento...

Aquela história definitivamente não estava cheirando bem.

- Aconteceu alguma coisa Jason? – diz Nico atrás de mim. Tinha me esquecido da sua presença.

- Ah foi mal, me distraí com essa foto. Fui eu que tirei sabia? – digo sorrindo olhando para a foto.

- Não sabia, Quíron que me deu ela. Como ele era...? – diz Nico me olhando agora com uma voz triste.

- Ele era... Irritante. – digo rindo. – Não sério, Will vivia rindo e fazendo palhaçada por aí. Imagina ele o Leo juntos então, era um circo. Apesar disso tudo ele sempre ajudava as pessoas e era amado por todos. Sempre gostei de conversar com ele, sabia ouvir as pessoas e fazê-las se sentirem bem. Era um ótimo amigo e  conselheiro...

- Queria ter conhecido ele. Todos parecem falar bem dele. – diz Nico direcionando seus olhos para a foto em minha mão.

Você o conhecia como ninguém Nico.

- Um dia você vai conhecê-lo. Não acredito na morte dele, era esperto demais para morrer assim. – digo. O que era verdade. Acreditava que a qualquer momento veria Will rindo por aí.

- É realmente estranho isso tudo. Pensei em ir falar com meu pai sobre isso ou até mesmo investigar. – diz Nico determinante.

“Mantenha o Nico longe do Mundo Inferior”, Quíron me pediu isso. Não se esqueça.

- Não precisa disso tudo, é melhor deixar isso quieto. Só vai piorar as coisas. - digo tentando convencê-lo.

- É... Você pode até ter razão, mas algo me diz que preciso ir lá. Ainda mais que faz mais um de ano que não vou lá. – diz Nico.

- E por que você tem que ir lá sempre? – digo.

- Eu gosto de olhar os Elísios. – diz Nico.

- Por que? Sei lá é meio...

- Estranho eu sei – diz ele agora sorrindo. – Enfim, pode ir jantar sem mim hoje. Vou tirar minhas roupas da mochila, tomar um banho e dormir. A viagem foi longa.

- Tem certeza? – digo preocupado.

- Tenho sim, relaxa. A gente se vê amanhã. – diz Nico enfatizando que queria ficar sozinho agora.

- Beleza. A gente se vê amanhã então. – digo me despedindo dele e devolvendo a foto.

Saí do seu chalé e me direcionando ao refeitório.

Precisava conversar com Piper, Percy e Annabeth sobre tudo aquilo. Eles eram os únicos que sabiam do relacionamento do Will com o Nico. Sim eu sabia, Percy “sem querer” acabou me contando na época.

Nico on

Guardei a foto em minha jaqueta. Não sei por que queria ficar com ela ainda, só queria.

Fui até o banheiro e tomei um banho quente.

Que dia agitado aquele...

Não tinha reparado até aquele momento, mas estava exausto com tudo aquilo. Nunca tinha sido cansativo ficar naquele acampamento.

Vesti-me e fui me deitar na cama. Torci para que os sonhos dessa vez não me perturbasse. Queria ter uma semana sem preocupações.

Acabei ficando mais do que três dias no acampamento. Se Hazel brigou comigo? Com certeza, mas consegui convencer ela que logo voltaria para Nova Roma, que antes precisava fazer uma coisa.

Sim, a ideia de ir ao Mundo Inferior não tinha sumido da minha mente. Queria ver os Campos do Elísios de novo e precisava falar com meu pai.

Já era de noite então seria melhor para sair do acampamento sem ser perturbado por ninguém. Vesti minha jaqueta e verifiquei se a foto e o colar ainda estavam guardados nela. Conferido e tudo certo.

Abri a porta do meu chalé devagar para não fazer barulho e adentrei a floresta em direção ao Punho de Zeus. Sempre achei o lugar mais seguro do acampamento para se andar nas sombras. Paranóia minha.

Não esperem que eu descreva como era me transportar pelas sombras, era um mistério ainda para mim tudo aquilo apesar de ter andado nelas milhares de vezes. Pouparei vocês dois detalhes dessa viagem doida.

Depois de chegar ao Mundo Inferior comecei a andar em direção ao Elísios. Queria passar ali primeiro para admirá-lo. Esperava um dia poder fazer parte dele.

Já era a minha sétima ou oitava vez que ia até lá e todas às vezes eu tinha a mesma reação: ficava de boca aberta. A imensidão dos campos era surpreendente, aquele verde vivo que ia de extremidade em extremidade. Havia árvores grandes e algumas rochas distribuídas pelo lugar. Como sempre estava com muitas pessoas sorrindo, brincando e conversando com tranquilidade. Era lindo de se ver e até meio surreal pensar que existia um lugar desses no submundo.

Adentrei mais aos campos passando por adultos, jovens e crianças.

Foi quando eu escutei uma voz. Era suave e penetrante na alma. Olhei ao redor tentando identificar a origem dela. Ali ou ali? Se concentre Nico. A voz não está muito longe.

Continuei andando procurando pela voz até que vi, encostado em uma pedra o possível dono da voz.

I can move mountains

I can work a miracle, work a miracle

Oh, oh, keep you like an oath

May nothing but death do us part

Posso mover montanhas

Posso fazer um milagre, fazer um milagre

Oh oh, te guardo como um juramento

Nada além da morte pode nos separar

Era um rapaz de estatura um pouco alta, pele bronzeada, cabelos loiros como os raios solares. Não conseguia ver direito o seu rosto, seus cabelos o cobriam... Mas eu sentia que o conhecia.

Foi quando liguei tudo. Peguei a foto do filho de Apolo em meu bolso. Mesmo tom de pele, mesmos cabelos... É ele.

Fiquei um bom tempo o encarando cantar. Não acredito que tinha encontrado o menino que desapareceu por um ano, e que agora estava na minha frente.

Limpei minha garganta e quase como um sussurro chamo por ele:

- Will...?