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História Some Kind of Monster - Criança


Escrita por: cryomancer

Notas do Autor


Boa leitura!

Capítulo 10 - Criança


 

 

—     Cheguei!

Itachi apenas o observou por cima do ombro, sem fazer muito alarde. Estava falando ao celular, e o formulário em seu colo insinuava que estava trabalhando.

—     Sasuke, venha cá! – ele gritou, tapando o áudio de seu celular – É sério, vem aqui.

O mais novo arquejou tedioso. Queria ir para seu quarto e tomar um longo banho frio.

Não sabia o porquê, mas estava frustrado. Não queria ter saído com Sakura no início, mas já que estava descobrindo coisas sobre ela, não teria custado absolutamente nada continuar em silêncio e dizer coisas que não fossem constrangedoras.

Claro que era exigir demais de si próprio. Não era nenhum deus da comunicação.

Deteve-se no primeiro degrau, e logo caminhou até o sofá em frente ao qual seu irmão estava acomodado. O corpo de Itachi parecia perdido entre tantos papeis e pastas.

—     É o seguinte, se ele não gostou da comida do meu hotel, mande-o meu mais sincero foda-se. – ele bufou. A voz irritante em seu ouvido insistia pela milésima vez que reconsiderasse alterar o cardápio oferecido, mas Itachi estava irredutível – Eu sei que não posso dizer isso a meus clientes, mas olha só, outra vez, não estou nem aí. O último crítico culinário que passou por aí fez uma ótima resenha sobre meu restaurante, por que eu aceitaria como um decreto a opinião de um sem-noção?

Sasuke sentiu o velho impulso de passar o tempo fazendo coisas aleatórias em seu celular, porém, a pior tortura naquele momento foi sentir o bolso leve, vazio.

Alcançou o telefone residencial da casa do seu irmão, e discou preguiçosamente o número de seu aparelho perdido. Quem sabe, se alguém atendesse, talvez aceitaria uma oferta em troca do celular, isso se ele estivesse intacto ou houvesse sido achado por alguém.

Porém, a mensagem que ouviu nas três vezes em que tentou contato foi de que o dispositivo encontrava-se desligado ou fora da área de cobertura.

—     Certo, que seja então. Altere o cardápio e me mande as contas. – Itachi suspirou, massageando a ponte do nariz de maneira aborrecida – Amanhã? Claro, mas não ficarei por muito tempo. Tudo bem, até.

Ele inclinou o pescoço para trás e bufou expressivamente, ao finalizar a chamada. Depois, empurrou todos os papeis para o lado, sentindo-se aliviado ao fazê-lo.

—     Perdi meu celular.

—     Quer meu cartão de crédito?

—     O problema não é esse. A escola de direção está com o meu número antigo, eles disseram que me ligariam nesta semana para agendar um dia para que eu fosse tirar minha licença prévia. Preciso recuperar aquele número!

—     Nossa, que merda, hein. Eles também têm o número da mamãe lá, é para ela que ligarão antes de você. Relaxa.

—     Relaxar? Eu discuti com a mamãe e saí de casa, ela nunca vai me avisar.

—     Ela pode até não ser a melhor mãe do mundo, mas tenho certeza que ela me ligaria avisando. Ela sabe que isso é importante para você. – ele suspirou, deitando-se no estofado – E se ela não der notícias, eu passo lá.

Mais aliviado, ele observou que aquele era um momento ruim para seu irmão. A julgar pela maneira como o viu conversar no celular, minutos antes, supôs que ele estava com problemas, e a coisa mais educada a se fazer era perguntar o que acontecia.

Mas havia muitas coisas enchendo sua cabeça. Tudo que queria era dormir cedo e acordar tarde.

—     Mas então, o que você quer? – questionou, ao invés.

—     O papai vai embora amanhã, não acha que seria legal ir lá se despedir?

—     Não. – sua resposta fora seca, com tanta naturalidade que soou um tanto absurda até aos ouvidos do irmão, que se julgava acostumado a seu temperamento. – É só isso mesmo?

—     Bom, você que sabe, não vou insistir... Se nós brigarmos, você também vai agir assim? Sem nem tentar uma conciliação?

—     Se nós brigarmos, eu te encho de porrada. No papai eu não posso bater, mas em você sim... eis a sua resposta.

Itachi riu furtivamente, jogando a caneta que jazia em sua mão para o lado. O tipo de resposta dada por Sasuke havia dado um rumo totalmente novo a conversa.

—     Na sua idade, eu não era mais virgem.

Precisava admitir que seu irmãozinho havia se tornado um marginal precoce. A convivência entre os dois havia se tornado diária outra vez depois de muito tempo, mas ele ainda sabia perfeitamente o que dizer para ferir o ego imenso de Sasuke. Sentia que estava cumprindo a sua obrigação de irmão mais velho.

—     Você não aguenta dez minutos de briga comigo.

—     Eu só não vou bater em você agora porque estou muito estressado para isso.

—     E eu quero descontar meu estresse em você, Itachi.

—     Ai, que maldade! – ele fez uma careta, um longo bico – Estresse por quê?

Segundos antes, estava sendo caçoado por uma realidade em sua vida. A virgindade, algo que Itachi não precisava saber, e tratava como se fosse algo imenso. Expor a ele o que andava tomando todas as suas energias, e quem sabe, receber uma boa instrução de como resolvê-las pela voz de um homem mais experiente seria ótimo.

Porém, Itachi precisaria saber da situação mesmo assim. E isso era terrível aos olhos de Sasuke, que arquejou, observando as paredes daquela casa desejando atravessá-las como um super herói e fugir daquela situação.

Talvez se pudesse contar uma situação “hipotética”, seria mais bem interpretado.

—     Ouça bem. Se, hipoteticamente, você tivesse posse de um objeto, digamos, capcioso, bastante problemático. E se, hipoteticamente, o dono do objeto fosse alguém sério e importante. Você, hipoteticamente, devolveria?

Itachi o observou de maneira séria durante alguns segundos, mas logo desatou-se em risos histéricos. Por um momento, Sasuke esperou ouvi-lo dizer que achara a calcinha melindrosamente embrulhada entre suas roupas.

—     Me diz quem é, e o que é. Assim, vou poder ajudar.

—     É uma situação hipotética! Uma hipótese!

—     Fala sério, vou completar vinte e sete anos. Estou na metade do “livrinho da vida”, você mal começou. Pode falar no que está metido, vai ser divertido ouvir. Você está tendo uma adolescência bem melhor do que a minha, vai ter história para contar aos seus filhos.

—     “Filho, seu pai quebrou todo o tipo de leis antes dos dezoito anos, mas não quero que você faça isso. Faça o que digo, não o que fiz”. De fato, uma bela história para encher o coração da criança de orgulho do pai!

—     As memórias contam mais do que o orgulho. Você só vai ter dezessete anos uma vez na vida. Quando tiver um currículo, escreva nele “sei manusear perfeitamente um canivete; sou ótimo em cortar pneus; sou um servo do senhor, e fui virgem até os dezessete anos”, vai ser contratado na hora!

—     Ora, vá a merda! Não sou obrigado a ouvir isso!

Itachi o conteve com um chute na panturrilha, quando demonstrou que deixaria o cômodo. Sasuke o encarou furioso logo em seguida.

—     Me conta, o que aconteceu? Eu posso ajudar.

—     Ora, se quer mesmo saber, tudo bem. Mas não pergunte nada além do que eu lhe falar. Se houvesse roubado a calcinha de uma garota com o pavio muito curto, como devolveria?

O primogênito o encarou como se houvesse um grande inseto em seu rosto, ou mesmo algo pior. Logo em seguida riu, então analisou a situação em silêncio, ficando sério ao perceber a enrascada.

Ergueu o olhar outra vez a seu irmão jovem, respondendo com sinceridade:

—     Bom, eu não devolveria.

—     Isso não é muito útil. Eu quero devolver, preciso saber como, não se devolveria ou não.

—     Quem é? – indagou, curioso.

—     Não vou dizer. Agora se me der licença...

—     Espera, eu preciso ver essa calcinha!

 

                                                                       ∞

 

Quando retornou até sua vizinhança, sentiu um certo alívio ao perceber que o carro de Kakashi não estava mais lá. Logo, presumiu que seu dono também resolvera ir embora.

Com sorte, ele não seria tão duro quando se encontrassem. Entretanto, ter aquele tempo de sobra cairia como uma luva para a criação de uma desculpa convincente para explicar o absurdo que era circular pela cidade com seu aluno.

Depois do abuso de Sasuke, havia conversado com os mecânicos que cuidaram de seu carro e pediu copiosamente que um alarme muito bom fosse instalado.

Da próxima vez que alguém tentasse depredar seu automóvel, sairia seriamente machucado.

Antes de entrar em sua casa, caminhou até o lixeiro no poste para se desfazer do copo de plástico no qual tomara seu chocolate quente com Sasuke. Havia sido um dia e tanto, e não esperava que ele trouxesse a parte mais inóspita de sua manhã à tona durante o início da noite. Era simplesmente desnecessário recordar do deslize, que sequer chegou a ser consumado.

Cansada, sentiu preguiça em procurar cuidadosamente a chave de sua casa em meio àquele molho absurdo que carregava. As chaves do carro, armário do colégio, sua casa, o apartamento em Sumit e o pequeno loft em Padua. Havia feito aquela aquisição quando trouxera seu pai até o Instituto, nove meses antes. Havia anotado todos os seus planos, que seria, arranjar um emprego na mesma cidade na qual seu pai estava localizado e manter-se focada a sua vida profissional.

Mas tudo havia fugido a seus planos. Nenhuma das escolas em Padua ligou de volta, e quando decidiu tentar nas cidades próximas, conheceu um homem maravilhoso que deturpou completamente seus planos.

E quando chegou a cozinha, depois de sentir um forte aroma a incensar a casa, foi aquele homem que vira sentado à sua mesa, degustando uma xícara fumegante de café.

Havia, de fato, o oferecido uma chave, mas apenas por conveniência. Ele sabia que odiava surpresas, e jamais estaria “à postos” para alguma, mesmo que ele fosse o seu namorado.

Pálida pelo susto, Sakura o observou perplexa antes de abrir a geladeira e servir, trêmula, um copo de água para si própria. Sequer pensara no que inventar para explicar o passageiro de seu carro.

—     Eu não vi seu carro lá fora. – disse, mantendo a geladeira aberta com uma forte pegada à sua porta. Estava nervosa.

—     Se visse meu carro, mudaria sua rota. Quis ter certeza de que ele não viria para sua casa também, de que não estava me traindo...

—     Com Sasuke Uchiha?

—     Com o garoto rico e que demonstrou uma fixação absurda por você? Realmente não tenho o direito de sentir ciúmes? Melhor, o que ele estava fazendo no seu carro?

—     Ele trabalha onde meu pai está internado. A visita se prolongou e nós acabamos saindo na mesma hora, eu o ofereci uma carona, foi isso que aconteceu. Acredite se quiser, porém, eu ainda estou sentindo dificuldades em assimilar que você se utilizou do aspecto “garoto rico” como se isso representasse alguma qualidade que pudesse me atrair nele. Por favor, me diga, você é rico?

—     Sabe que não.

—     Oh, por que não me disse isso antes? Que merda, por que diabos estamos juntos? – gritou, reproduzindo sua ironia em tom ressentido.

—     Por favor, agora não é momento de sarcasmo, Sakura. – entonou.

—     Eu ainda não o perdoei por hoje cedo! Por favor, não me teste a paciência. Sasuke Uchiha tem dezessete anos, quem pensa que sou?!

Hatake suspirou, percebendo a veracidade em suas palavras. Talvez houvesse agido premeditadamente, mas qualquer um em seu lugar se sentiria da mesma maneira. Bastava olhar para Sakura e admirar sua aparência incrível antes de receber outra surpresa ao conversar com ela. Ouvi-la falar sobre livros e movimentos literários era revigorante, e nada tedioso.

—     Não são raros casos de relacionamentos entre professores e alunos, sabe disso. – ele a observou retirar o sobretudo e massagear os ombros com sutileza – Você deve ser a professora mais linda do mundo, e acredite, eu tinha uma professora bonita no ensino médio. Meus banhos eram, sem dúvidas, mais longos por causa dela.

—     E eu não precisava ficar sabendo disso. Muito obrigada.

Com um sorriso falso, ela o deixou sozinho na cozinha.

Subiu as escadas chamando por Ino, e assustado, Kakashi a seguiu. Ele esquecera-se completamente de avisar a Sakura sobre o bilhete que encontrara assinado pela loira sobre o balcão, e rapidamente interceptou sua namorada, que investigava o quarto de hóspedes.

—     Ino?

—     Ela deixou um aviso. – esticou o braço, entregando-a a página do bloco de anotações usada por Ino.

—     Passeando pela cidade com Joab? Sinceramente, ela foi a pessoa que mais criticou este lugar, quanta hipocrisia! Vai ouvir longas e boas quando chegar...

Seu discurso de ódio fora interrompido pelo caridoso abraço que recebeu de Hatake. Ele apoiou o queixo ao seu pescoço, cheio de remorso.

—     Desculpe-me.

 


                                                                  ∞

 

Quando a segunda-feira chegou, a rotina, naturalmente, voltara ao normal.

Mais aulas, livros, chateações e ensaios.

Quando Sasuke retornou a escola, o boato era que o sistema de câmeras já estava funcionando. Não era algo que o assustasse, afinal, todas aquelas grandes engrenagens sempre possuíam um ponto cego, necessário para alguma eventualidade.

Enfezado, ele observou Gaara por cima do ombro, sedento por uma discussão, ou briga propriamente dita.

—     Está exagerando! – entonou o ruivo, ainda sereno.

—     Por acaso eu me pareço com o Suigetsu? Eu tenho cara de palhaço?!

—     Não.

—     Ótimo. Onde está meu celular?

—     Eu não sei, você perdeu.

—     Por sua culpa! – esbravejou, em represália.

—     Você foi para o carro sozinho! Tudo que nós fizemos foi puxar as calças de vocês, só isso! E particularmente, não senti nada nos seus bolsos quando fiz isso!

—     Nunca, nunca mais faça aquilo comigo outra vez, entendeu?

—     Amigos costumam fazer brincadeiras com os outros.

—     Eu não dou a mínima importância para o que o seu manual de “o que amigos devem fazer ou não” diz. Foda-se! Vou quebrar o seu braço se fizer aquilo outra vez!

A classe estava mais engajada em assinar uma ata que estava sendo passada de mão em mão. Sakura aguardava a lista completa, distraída com os exercícios que havia aplicado no segundo ano, e que estavam se misturando aos do primeiro.

Naruto cutucou suas costas, e ainda focado na discussão que estava tendo, Sasuke explodiu.

—     O que é?!

O olhar verde sob as lentes dos óculos de descanso observou a sala aleatoriamente, logo depois da voz masculina que se sobressaiu entre as outras.

—     A ata. – Naruto apoiou o pulso aos ombros largos de seu amigo, balançando continuadamente a folha em sua mão.

Em um bote irritadiço, Sasuke amassou parcialmente o papel, observando randomicamente as assinaturas dos outros.

—     Me passa a caneta. – disse, abrindo a palma da mão sobre o ombro.

—     Droga, Sasuke, você vem para a escola e não traz uma mísera caneta?! – praguejou o loiro, procurando a caneta preta que usara para assinar seu nome anteriormente.

—     Deixei em casa, saí apressado.

Contrariado, Naruto entregou o objeto ao amigo, que levou menos de cinco segundos para assinar de maneira ilegível seu primeiro nome.

Ao terminar, Sasuke tocou o tornozelo de Suigetsu a sua frente, que rapidamente recebeu a ata.

Ele não devolveu a caneta a Naruto.

Sakura retirou os óculos, pondo-se de pé depois de organizar de maneira ridiculamente falha os exercícios. Depois de mais um minuto de espera, o papel assinado por todos estava em sua mão. Ela o ergueu, mostrando a sala inteira.

—     Tiveram tempo o suficiente para concluir O Sol é para Todos. Todos aqui ainda estão em posse do livro, a cada um que me devolver sua cópia, vou marcar como entregue. Vocês têm dois dias para me devolverem. – avisou, categoricamente.

Colocou a folha cuidadosamente dentro de sua agenda, e logo apoiou o quadril ao birô, observando cada um de seus estudantes.

—     Bom, antes de dar início ao estudo dos movimentos literários que nos antecederam, incluindo o que vivenciamos agora, eu gostaria de falar uma última vez sobre nosso primeiro livro. Eu, particularmente, o acho formidável e espero que tenham gostado, pois é um livro bastante elogiado pela mídia. Possui uma abordagem colorida, e ao mesmo tempo crua sobre a vida na cidade pequena. Eles adoraram a honestidade quando se trata de preconceito e hipocrisia, o que infelizmente foi um problema muito grande no momento da narrativa. E claro, os críticos adoraram, adoraram sua metáfora e sua chamada a um imaginário que ninguém houvera explorado antes, no entanto houve detratores, líderes que pensavam que o autor havia cometido uma espécie de traição em fazer o narrador um pouco perceptivo demais para uma criança de sete anos de idade, alguém concorda com isso? – erguendo brevemente as sobrancelhas em um gesto convidativo a que alguém se pronunciasse, ela viu, no canto esquerdo, um de seus alunos tentando esconder o celular dentro do estojo – Senhor Hyuuga?

Neji sobressaltou, recebendo todos os olhares da classe, entretanto, nenhum deles se igualava ao dela. Sakura não demonstrava qualquer irritação com a insolência de usar aparelhos eletrônicos durante a aula, mas estava determinada a fazê-lo passar um pouco de vergonha entre seus colegas.

—     Sim, senhorita Haruno. – arriscou.

—     Sim o quê? – deu de ombros, fitando-o com seriedade.

Engolindo em seco, ele abriu a boca, sem saber ao certo o que falar. Então, cabisbaixo, observou o caderno sobre sua banca e o celular aceso dentro de seu estojo.

Encabulado, ergueu o olhar outra vez. Ela ainda o encarava fixamente, e o silêncio que se instalou na sala não foi agradável.

—     Qual a... Qual a pergunta? – cerrou os lábios, apreensivo. Estava tentando manter o tom de voz calmo.

—     A pergunta é: “Sim o quê”?

—     Eu não... Antes, a pergunta de antes. Eu não ouvi.

—     O senhor se sente da mesma maneira sobre as percepções do autor, especialmente a respeito da narração infantil?

Cruzando os braços, Sakura aguardou outro longo intervalo silencioso da parte de Neji.

Percebeu também, que Hinata estava segurando a resposta perfeita em sua garganta. Era lógico que intercederia por seu parente, supôs ela, ao finalmente notar a similaridade dos sobrenomes.

Porém, não manteria contato visual fixo com a garota; talvez ela tomasse aquilo como uma permissão sutil para que respondesse. Sakura queria ouvir o aluno insolente.

—     E então? – pressionou.

—     Acho que quem disse isso só perdeu seu ponto de raciocínio. O autor estava escrevendo de uma perspectiva de adultos sobre coisas que ele se lembrava quando era criança. Coisas que, de certa forma, o afeiçoavam.

Porém, não foi a voz de Neji a dizer aquilo, tampouco de Hinata.

Sakura arquejou ao, rapidamente, desviar a atenção ao dono da voz. Sasuke manteve o olhar baixo enquanto rabiscava, e lentamente, suas íris escuras voltaram-se as dela.

Justamente quando o estava evitando, ele resolvia mostrar todo o seu domínio e opinião implacável sobre o livro. Não era o momento, simplesmente não era.

—     O senhor acha que é justo incitar em um retrospecto? – rebateu de imediato.

Compartilhava da opinião dele, mas era sua obrigação exigir dos alunos que esculpissem os próprios fundamentos baseados em argumentação.

—     Não, eu não. Só que, crianças veem muita coisa, provavelmente mais que adultos. Eles apenas, talvez, não tenham as palavras certas para expressar seus sentimentos. Talvez estejam confusas e, ao mesmo tempo, mais certas do que nunca.

—     O senhor expressa muita propriedade sobre isso. – foi um impulso. Antes que houvesse aberto a boca para comentar aquilo, ela havia pensado, e não houve tempo o suficiente para censurar a si própria.

Sasuke imediatamente arqueou uma sobrancelha.

A afirmação dela havia despertado os outros alunos à conversa.

—     Sim, muita gente diz que sou uma criança. Todos, inclusive os adultos mais boçais estão suscetíveis a serem surpreendidos por crianças.

Oh, seu olhar a atingiu como a lâmina afiada de uma espada. Aquela, sim, havia sido uma indireta e tanto.

—     De fato, ninguém nunca espera uma fralda cheia de, perdoem o termo, merda. – alguns risos tomaram o ambiente – É uma surpresa e tanto, não acha? – ela caminhou ao redor do balcão, acomodando-se na cadeira – Isso, se convertido aos traços que vivenciamos, pode ser comparado a palavras. As coisas que falamos geralmente não  podem ser revertidas. A palavra uma vez lançada, jamais tem retorno. Por isso, crianças, tenham cuidado com tudo que dizem. – em um tom de alerta, ela se dirigiu descontraidamente não apenas a Sasuke, como a toda classe.

Sasuke começou a mexer os pés impertinentemente.

—     Ah, voltando à discussão sobre o livro. O senhor disse que crianças veem mais, mas não disse o porquê disso. Por quê?

—     Porque crianças são naturalmente curiosas, e agem em seus sentimentos.

—     Essa seria uma habilidade que os adultos perderam? Adultos não agem em seus sentimentos?

—     Não os sortudos.

—     E o que acontece com estas pessoas que são incapazes de agirem de acordo com seus sentimentos? – ela alisou o próprio queixo, demonstrando interesse por sua resposta.

—     Elas ficam muito frustradas.

Sakura sorriu sutilmente, logo erguendo os ombros com contentamento.

—     Certo, com isso, encerramos O Sol é para Todos. Em breve, vou recomendar outra leitura obrigatória a vocês. Inclusive, esta é a semana da feira das faculdades. Vai ser um momento bem produtivo, nossa escola estará tomada por reitores e representantes das mais variadas universidades e, conversando com eles, vocês podem ter um melhor encaminhamento sobre seus futuros. Sugiro que aproveitem bem, tirem todas as suas dúvidas e peguem todos os panfletos possíveis! – com um sorriso no rosto, ela colocou os óculos outra vez e abriu o livro didático sobre a mesa. Voltando a seu foco, a feição tornou-se imediatamente neutra – Abram na primeira página do bloco cinco, e vamos discutir por que Hemingway disse: “Todas as coisas perversas começam da inocência”...

 


                                                                 ∞

 

Diante do fato que havia uma calcinha azul entre as suas roupas, era impossível para Sasuke manter-se focado no mundo ao seu redor o tempo inteiro. Com o horário seguinte de Filosofia, ele achou que estava fazendo jus ao direcionamento central da disciplina: O questionamento.

Como diabos devolveria uma calcinha àquela mulher?

Com sorte, ela passara o resto de seu horário sentada, apenas dando seus ensinamentos sem precisar escrever qualquer coisa na lousa. Porém, quando o sinal para o intervalo soou por todo o colégio, naturalmente todos deixaram suas salas para o lanche, e quando Sasuke ultrapassou a porta, viu os cabelos róseos à distância, comumente presos em um rabo de cavalo, e foi impossível não descer o olhar até o seu traseiro e se perguntar se ela estava usando aquele tipo de calcinha no momento.

Entretanto, Karin se materializou em sua frente.

—     Você não me ligou. – ela disse, cruzando os braços.

Estava no meio de seu caminho, atrapalhando o trânsito de pessoas.

Como ela poderia ser tão opulenta até na escolha de calcinhas? Será que usava as cintas-ligas que se lembrava de ver devidamente dobradas no fundo da gaveta?

—     Perdi meu celular. – respondeu, abrindo caminho ao lado de Karin para poder passar.

Não havia a ligado antes de perdê-lo, mas se servisse como desculpa, tudo estava nos conformes.

—     Nossa, sério? Onde você perdeu?

—     Se eu soubesse aonde perdi, teria voltado para buscar.

—     Ah, Sasuke, eu sei, mas... Como foi isso? Você já comprou um novo?

—     Não, ainda não.

—     Posso ir com você?

—     Não.

Sasuke sentiu uma mão em seu ombro, seguida por um forte abraço. Karin também foi afastada de si para que outro corpo pudesse ser inserido no meio dos dois.

Suigetsu riu alto, apertando as mãos nos ombros dos dois.

—     E então, jovens, qual é a boa da hora? – ele desviou o olhar de seu amigo até ela, que bufou – Pelo visto é você.

—     Nossa, que nojento! – exclamou ela, com uma careta.

Sasuke puxou a mão dele, retirando-a de si com violência, e desceu as escadas apressadamente para pegar um bom lugar na fila. Estava faminto.

Enfiou-se na frente de Naruto, que começou a gritar em falhos protestos.

Com a bandeja em mãos, ele sugeriu que fossem comer no campo, porém, Naruto recusou, afirmando que o dia estava úmido demais. Ele não viu muito sentido na resposta, mas simplesmente juntou-se a Neji e Gaara na mesa para degustar do lanche com rapidez.

Konohamaru sentou-se ao lado de Naruto, contando empolgadamente o resumo de seu final de semana e todos os jogos que havia experimentado, e até Suigetsu dava opiniões acerca do assunto. Porém, toda a comida em sua frente parecia sem dúvidas mais convidativa do que a voz irritante do porco-espinho, e naquele dia, ele não soltou sequer um insulto.

—     Nossa, você sempre deixa sobras e hoje comeu tudo? O que aconteceu? – Naruto indagou, assustado.

—     A comida do meu irmão é uma porcaria, isso que aconteceu.

—     Itachi está na casa dos seus pais?

—     Eu que estou na casa dele, estamos morando juntos.

—     Por quê?

Sasuke empurrou a bandeja para frente, como sempre fazia depois de dar como concluída sua refeição.

Porém, não importava o quão satisfeito estivesse, não era o suficiente para explicar a Naruto todos os desentendimentos que levaram até a situação atual.

—     Eu estava com saudades dele.

—     Emocionalmente emotivo, como todos sabemos! – exclamou Suigetsu – Emo!

—     Por que você não pega essa garrafa e enfia no rabo? Ou será que já está dormente? – retrucou, irritadiço.

—     Nossa, você me deixou dormente e agora usa isso contra mim? – contrapôs, com falsa tristeza.

—     Como assim, dormente? – questionou Konohamaru, confuso.

Naruto o observou instantaneamente.

—     Nada!

Enfurecido, Sasuke deixou a mesa sem pensar duas vezes. As brincadeiras de Suigetsu, assim como sua própria presença eram, na maioria das vezes, insuportáveis.

Ao invés de retornar à sala, ele saiu pelas portas traseiras, com intenções de ir até o campo de futebol e respirar ar fresco. Porém, ao passar pelos jardins, observou a silhueta feminina, em pé, apoiada à parede.

Deu meia volta sem hesitar, aproximando-se dela.

Como não havia tido uma ideia até então, estava certo de que a entregaria a calcinha com normalidade, como se fosse um educado aperto de mãos. Com sorte, ela não perderia as estribeiras, mas era utópico pensar daquela maneira. Qualquer mulher ficaria fora de si.

Então, não custava tentar diminuir a intensidade das futuras represálias sendo, de certa forma, legal. Como era difícil para ele ser sociável, pensou naquilo apenas como uma oportunidade sendo criada. Haviam debatido, antes, mesmo que com certas indiretas, mas o acordo feito no sábado permanecia de pé, e não se recordava de brigar outra vez com ela depois daquela ocasião.

Esperava ser bem recebido.

Porém, Sakura o observou de soslaio e ele percebeu que estava sendo evitado. Aquilo não deveria ter o incomodado, mas não conseguiria lidar tranquilamente com tal fato durante muito tempo.

A fumaça fluiu do nariz dela em duas torrentes espessas, e Sasuke sentiu-se momentaneamente chocado ao perceber o pequeno cigarro entre os dedos dela.

—     O que está fazendo? – perguntou impensadamente.

—     O que eu estou fazendo? Estou jogando fora quatro anos de força de vontade. E você? Veio brigar e dizer o quão injusto foi o que eu disse sobre crianças mais cedo?

—     Não, vim dizer que fumar na escola é proibido.

—     Para os alunos, realmente é. Aos professores, não. Eu estava aqui sozinha, sem que ninguém me visse, não estou influenciando ninguém.

—     Eu estou a vendo agora. Você está me influenciando.

Ela o observou com deboche, e começou a rir. Então, deu um passo a frente e espremeu o cigarro no tronco de uma árvore.

—     Então eu mereço ser castigada pelo diretor, conseguiu o que queria.

—     Não vou contar. – ele enfiou as mãos nos bolsos, desviando o olhar, encabulado.

—     E o que vem em seguida?

—     Como assim?

—     Não é do tipo que age baseado unicamente em bondade, é? Vai querer que eu tire as penas do chapéu? Não vai adiantar.

—     Não quero nada.

—     Oh, nossa... Você conseguiu me deixar surpresa.

Sasuke comprimiu os lábios, sentindo-se nervoso e tenso sem um motivo aparente.

Ele suspirou profundamente, observando a grama aparada a alguns passos de distância de onde estava.

Sakura manteve os braços cruzados, parecendo alheia a sua presença ali. A expressão no seu rosto era aflita, porém por outra adversidade, não aquele momento, não aquela conversa.

Algo estava acontecendo.

—     Na verdade, eu queria marcar um horário e encontrá-la em algum lugar, talvez uma pizzaria ou coisa semelhante. – foi lacônico. Criar curvas naquele assunto só atrapalharia tudo ainda mais – Seria muito estranho?

—     Eu sou sua professora, você é meu aluno.

—     Sim.

—     Então está me perguntando se um encontro seria estranho? Achei que fosse uma pergunta retórica. É lógico que seria estranho. – ela arquejou, com impaciência – Na verdade, a culpa é minha. Se chamá-lo para discutir aqueles desenhos em um momento privado o passou a impressão errada, eu sinto muito por isso, mas gostaria de deixar claro que nosso relacionamento é exclusivamente profissional. Aliás, estar aqui conversando também é inapropriado, o senhor deveria voltar ao seu intervalo.

—     Eu sei disso. Mas tecnicamente, também temos uma ligação pessoal, já que é sócia do meu pai.

Sakura o observou com incredulidade, porém, ele estava com o olhar baixo, observando o próprio tênis ao chutar poeira no piso de concreto.

—     Isso não muda muita coisa. Entenda, eu quis ser gentil, qualquer mínima possibilidade de um relacionamento fora do colégio se resumiu aqueles minutos, naquela cafeteria. Nada além disso. Absolutamente nada, entendeu?

Quando ele a observou novamente, foi de maneira glacial.

—     O problema é que, estou em posse de um objeto seu, e quero devolvê-la.

—     Que objeto?

—     Não espere que eu a diga o que é, não sei de que maneira reagiria, e não vou arriscar.

—     Então não espere que eu aceite qualquer tipo de “encontro” sem saber do que se trata.

—     Sakura... – ele cerrou os olhos, enchendo os pulmões de ar lentamente. Já era incômodo suficiente estar naquela situação, e ela não facilitava as coisas – Eu posso ir até sua casa devolvê-la, então?

—     Não leve a mal, mas não o quero em minha casa.

—     Então aceite meu convite. Ninguém nos conhece em Padua, poderia ser lá, eu em meu carro, você no seu. – ela ficou em silêncio, com as sobrancelhas retraídas, parecendo avaliar a proposta – Não estou tentando confundir as coisas, eu realmente só quero... Na verdade, eu só vou ter paz outra vez quando me livrar daquilo.

—     Paz? O que diabos poderia estar causando toda esta situação? Francamente, não consigo pensar em nada tão sério assim!

—     Você vai ficar surpresa.

Ela fez um muxoxo, seriamente insatisfeita com o rumo da conversa.

—     Isso é tremendamente inapropriado... – comentou, em um fio de voz.

—     É, eu sei, você já disse isso umas três vezes.

—     Não pode me entregar aqui na escola, amanhã?

—     Não.

Coçando a testa, ela deu dois passos adiante, pensativa.

Isso sem falar de toda a curiosidade que agora se manifestava em seu íntimo. O que poderia ser tão sério e importante assim ao ponto de exigir uma viagem até a cidade vizinha para ser entregue?

—     Que seja! – concluiu, enfim.

Sasuke não soltou fogos de artifício, mas estava, de certa forma, aliviado pelo convite aceito. Não entendia o porquê de não ser desejado em sua casa, mas ela tinha suas razões, especialmente depois das maneiras em que estivera lá.

—     O que acha de quarta-feira?

—     Quarta-feira? Nós vamos hoje. Quando sairmos do ensaio. E vou ser sincera, dependendo do que seja, vou querer ouvir boas justificativas!

—     Tudo bem.

—     Não vamos a pizzaria alguma, quando chegarmos lá, o senhor entrará em meu carro, me entregará seja lá o que for, e eu voltarei. Este é o acordo.

—     Certo.

—     E se for nada, aprenderá uma lição, senhor Uchiha.

—     Excelente, até seis e meia.

Ele foi o primeiro a sair, cada um para um lado.

Ao menos a primeira parte fora cumprida com sucesso, o que restava, era encontrar uma maneira de garantir sua segurança física quando ela finalmente visse o que era. Não conseguia se imaginar sendo agredido por ela, no máximo uma meia dúzia de xingamentos, ou talvez ela jamais o dirigiria a palavra outra vez. Sasuke não queria que nada daquilo acontecesse, mas estava certo de que as coisas fugiriam de seu controle.

Seria difícil.

 

 

 


Notas Finais


Fumar não é legal, não fumem.
Até a próxima!


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