História Sorteados em 1971 - Aproximação fracassada

Nem mesmo Lily achava que iria se adaptar tão bem a Hogwarts. Gostava de todas as aulas, de todos os professores e tinha muitos amigos.

O problema é que seu melhor amigo era uma das pessoas mais odiadas da escola: Severus Snape. Ele podia ter um gosto duvidoso para roupas, uma aparência repulsiva e um jeito retraído, mas para Lily, Severus também era gentil, prestativo e um pouco estabanado. Claro que ele também tinha alguns defeitos: era orgulhoso, mandão e não tinha muito critério na hora de escolher suas companhias. Lily não simpatizava nada com alguns amigos sonserinos dele, notadamente Avery e Mulciber, além de saber dos rumores do envolvimento destes com Artes das Trevas (o que era veementemente negado por Severus), mas mesmo assim, Lily achava que excluí-lo por causa disso era uma grande injustiça.

- Vocês duas vivem dizendo que é errado excluir as pessoas por causa do dinheiro e do status de sangue, mas fazem o mesmo com Severus – disse ela para Marlene e Hestia, suas outras melhores amigas e colegas de dormitório, que ainda não estavam convencidas.

- Tá, Lily, mas onde você quer chegar com isso?

- Eu proponho que vocês deem a ele a chance de mostrar que é uma pessoa melhor. Como uma espécie de primeiro encontro. Eu o chamo, o apresento a vocês e nós quatro conversamos. Que tal? – as outras duas permaneciam caladas – Lene?

- Ainda acho que não é uma boa ideia.

- Hestia?

- Eu... – Hestia ainda estava indecisa. Olhava para Marlene, cujo semblante estava fechado. E para Lily, que a fitava com ansiedade – Topo – Marlene xingou e Lily deu pulinhos de alegria.

- Ah, Hestia, que bom, eu tenho certeza de que você vai gostar do Sev, ele é uma pessoa muito legal... – Lily desandou a falar sobre as inúmeras qualidades de seu amigo, mas nada do que ela dissesse fazia Marlene mudar de opinião. Se sua mãe estivesse lá, diria que ela estava sendo teimosa, como sempre. Mas Marlene não via as coisas dessa forma. Ela tinha uma intuição muito forte, principalmente no que dizia respeito a sondar a personalidade das pessoas, e a sua intuição sobre Severus Snape não era nada boa. Seus olhares se cruzaram uma vez durante as aulas de Poções, e o sonserino ostentava um brilho sombrio quando era contrariado, fora que muitas vezes não conseguia disfarçar sua empolgação ao se deparar com qualquer coisa que remetesse à Magia Negra. Mas tinha uma coisa sobre ele que deixava Marlene ainda mais aborrecida: a forma com que Lily o descrevia. Os olhos de Lily brilhavam ao falar dele, e aquilo lhe causava uma péssima sensação. Ciúmes, era o que diria o seu pai se ele estivesse ali naquele momento. Talvez fosse, mas para Marlene, era o seu instinto de proteção falando mais alto.

Severus se juntou às duas poucos dias depois, numa tarde de estudos na biblioteca. Ele parecia ansioso, só tinha ido para agradar Lily, mas se esforçava ao demonstrar simpatia às outras duas garotas. Ao apertar a mão dele, Hestia reparou que ela estava fria e úmida devido ao suor.

- Vamos, Sev, sente-se ao meu lado – disse Lily, deixando Severus de frente para as duas meninas.

- Então, Snape... – sibilou Marlene, o encarando fixamente – Lily nos disse que você a conhece há muito tempo...

- Sim, desde os nove anos, moramos na mesma vizinhança... – respondeu ele, mas Marlene estava determinada em prosseguir com o interrogatório:

- Você deve ter ficado muito chateado em saber que ela não foi pra Sonserina, não é?

- Lene! – protestou Lily.

Severus titubeou. Ele ficara chateado sim, mas não queria admitir, até por que a Grifinória estava em maior número.

- Você não respondeu a minha pergunta... – rosnou Marlene, que já tinha adivinhado a resposta.

- Ô Lene, assim você vai acabar assustando o garoto! – disse Hestia, fazendo Severus dar uma risada nervosa – Fica tranquilo, Snape, a Lene adora bancar a durona, mas no fundo ela é gente boa.

Severus riu mais, acabou simpatizando com Hestia.

- Eu devo admitir que preferia que a Lily tivesse ido pra Sonserina, assim como eu, mas acho que de nós quatro aqui, a McKinnon é a que preenche mais requisitos – isso fez Marlene se calar.

- Lene na Sonserina? Não vou mentir, seria engraçado – Lily ria, o que tirava Marlene do sério.

- Jamais iria para uma casa que é conivente com a Magia Negra! – o grito de Marlene fez Madame Pince chamar a atenção do grupo.

- Viu o que você fez, sua esquentadinha? – cochichou Hestia, puxando Marlene pelo braço.

Os quatro ficaram no mais absoluto silêncio a partir dali. Para Lily, aquilo estava sendo um desastre. Severus foi de boa vontade, no entanto, Marlene não estava sendo nada gentil com ele.

- Vocês já responderam todo o questionário sobre as propriedades da Poção Wiggenweld? – indagou Hestia, rompendo o silêncio.

- Já... – respondeu Lily – tem alguma dúvida?

- A questão 7, sobre a importância de usar o muco do verme-cego...

- O que você quer saber?

- Ele tem alguma propriedade específica, como dar força ou mesmo resistência física?

- É óbvio – interrompeu Severus – O muco serve pra dar consistência à poção!

- Sim, mas...

- Não tem mistério, na página 323 de “Mil Ervas e Fungos Mágicos” tem dizendo sobre isso, apenas dê uma olhada.

Foi exatamente o que Hestia fez, mas isso não fez com que Severus subisse no conceito de Marlene.

- É, Snape, você tem razão, aqui tem exatamente o que você disse: “o muco do verme-cego é um ingrediente ideal para dar mais consistência às poções, notadamente a Wiggenweld”... Mas eu ainda acho que pode ter alguma finalidade oculta que não está nos livros...

- Se você tem tanta certeza disso, coloque na resposta, Hestia. E perca alguns pontos em sua nota, porque você está sendo teimosa demais...

- E você está sendo muito imbecil – disse Marlene, se levantando da cadeira.

Lily entrou em pânico. Tudo o que não queria era que Marlene resolvesse duelar com Severus agora.

- Ora, ora, ora, o que se passa aqui? – o que parecia ruim só piorava: James Potter e seus infames amiguinhos Sirius Black, Remus Lupin e Peter Pettigrew foram até eles.

- Nada, Potter. Agora, pode sair daqui.

- Uau, Evans, resolveu bancar a durona? – pirraçou James, deixando Lily ainda mais irada. Sirius estava no canto oposto, em pé ao lado de Marlene, perguntando:

- Diga, McKinnon... O que foi que ele fez? Ele está te fazendo algum mal?

- Não é nada, Black. Eu resolvo.

- Uau, pelo visto, a Evans não é a única durona desta mesa! – James continuava com suas brincadeiras, aquilo estava tirando Lily do sério...

- Você vai sair daqui por bem ou por mal.

Ninguém esperava ver Lily Evans agindo daquela maneira. Lily nunca erguera a varinha para alguém, muito menos de forma desafiadora como aquela. James ainda não a levava a sério, achava que ela estava fazendo tipo. Hestia se mantinha sentada, imóvel, se culpando por ter levantado aquela discussão. Já Severus fez menção de se levantar, mas Peter empurrou a cadeira dele para a frente, prensando o sonserino e o forçando a se sentar novamente.

- Boa, Peter! Você fica, Ranhoso – rosnou James, apontando a varinha para ele.

- Deixe-o em paz ou eu acabo com você – Lily ainda estava com a varinha apontada para James.

Hestia começava a ficar mais nervosa. Madame Pince se aproximava deles, e tudo o que a morena não queria era ver suas amigas em detenção.

- Deixa disso, gente... Está tudo bem! Lily, o Potter também é da nossa casa, abaixa essa varinha... Potter, não tá acontecendo nada, só estávamos conversando aqui com Snape – os olhares de Hestia passavam por todos os envolvidos. Marlene estava furiosa, Lily ainda mais, Severus só queria sair dali, James, Sirius e Peter queriam confusão, Remus parecia ser o único que concordava com ela:

- É, caras... Vamos embora, deixem eles aí... – murmurou ele, que foi saindo, com Peter logo atrás. Hestia, Marlene, Lily e Snape acharam que seria uma boa ideia saírem também, Madame Pince ainda os olhava de forma ameaçadora. Mas só haviam duas pessoas que não se intimidavam com ela, e eram justamente James e Sirius.

- Agora, Sirius!

James e Sirius aproveitaram que Severus saiu correndo dali para promover uma série de ataques.

- Expelliarmus!

- Petrificus totalus!

- Boa, Sirius! Ei, que tal despetrificarmos só pra depois o petrificarmos de novo?

- Não se atreva, Potter!

Lily estava novamente com a varinha apontada para James, e ela mirava na cabeça. Ela estava mais enraivecida do que antes, até mesmo Sirius começava a ter medo dela, mas James não.

- E o que você é capaz de fazer, hein, Lily Evans?

O rosto de Lily estava vermelho e ela sentiu seu sangue ferver por dentro. Ela queria acabar com aquela marra do Potter, e só havia um jeito de fazer aquilo: calando-o.

- PIMENTATUS!!!

Dessa vez, foi o rosto de James que se avermelhou. Ele sufocava, sua garganta ardia em brasa como se ele tivesse engolido dezenas de pimentas malaguetas de uma vez. Foi uma azaração tão forte que ele caiu ajoelhado, segurando o pescoço e tentando respirar.

- Essa é pra você aprender. Vamos, meninas.

Lily desfez o feitiço de petrificação e Severus saiu com elas, encarando James ajoelhado e rindo de forma depreciativa. Eles saíram, mas não sem punição (no caso de Severus). Sirius aproveitou que ele estava de costas e fez a Azaração do Rabo de Porco, fazendo com que todos que passassem por eles apontassem para as nádegas de Severus e rissem descontroladamente.

- Essa foi boa, Sirius – disse Peter, que tentava fazer James voltar ao normal, sem sucesso. Foram Remus e Sirius quem conseguiram reverter a azaração de Lily.

- Ufa, obrigado, caras... Sirius, aquela última foi demais... Eu teria te parabenizado, se não fosse aquela Bafo de Pimenta...

- Podíamos nos vingar da Evans também, afinal ela atacou um de nós – sugeriu Peter.

- Não – interveio James – Deixa pra lá.

- Deixa pra lá? Cara, você nunca deixa essas coisas pra lá! – dessa vez, até Sirius achou estranho.

- Mas eu vou deixar passar dessa vez, qual o problema? A Evans foi brilhante, eu não vou atacar ninguém por isso.

Sirius, Peter e Remus ficaram surpresos. O último comentou:

- James Potter, sempre surpreendendo.

No dormitório feminino da Grifinória, Lily lamentava o seu fracasso. Ela queria muito ter feito Severus se aproximar de pessoas diferentes, tinha a esperança de que se ele ficasse amigo de mais gente de fora da Sonserina, ele poderia escapar um pouco da influência negativa que alguns alunos sonserinos poderiam exercer sobre ele.

- Quer saber a verdade, Lily? – falou Marlene – Se não fossem aqueles garotos, eu mesma teria atacado o Snape.

- Lene...

- Ué, Lily, você viu lá na hora, não viu? Como ele foi grosseiro com a Hestia?

- Sim, mas...

- Só acho que ela também merecia o mesmo empenho que você teve na hora de defender o Snape daqueles dois.

Lily e Marlene não se falaram mais pelo restante do dia. A primeira ficou meio ressentida com as palavras da outra. Já Marlene sentiu uma sensação ruim se apoderar dentro de si. Lily estava gostando de Severus mais do que como uma amiga, e aquilo era um péssimo sinal.