Ele não se lembra ao certo de quando ele surgiu. Era uma daquelas coisas que simplesmente eram: o céu era azul, os olhos de sua irmã tinham cor de chocolate e o cachorro dormia aos pés de sua cama.
Cachorro.
Law nunca deu um nome para ele.
— Por que não dá um nome? — seu pai perguntou certa vez, quando eles estavam jantando — Ele é todo pintadinho, peludo também, parece…
— Um sorvete de flocos! — Lami o interrompeu, erguendo a colher vazia no ar.
— Tudo parece sorvete para você — Law reclamou, ainda que no fundo achasse a atitude encantadora. — Não vou chamá-lo de Floquinho só porque ele parece um sorvete de flocos, Lami. Ele é só um cachorro, então deixe-o ser um cachorro.
E ele era um cachorro.
Ele fazia buracos pelo quintal, pegava a bola quando Law jogava, e parecia ter um sorriso eterno na cara boba.
Law ainda se lembrava de como ele esfregava o focinho gelado na palma de sua mão, como deitava no chão para receber carinho na barriga e como sempre deixava a ração cair para fora do pote quando comia.
De como ele sempre estava no portão, quando Law chegava da escola. Como ficava arranhando a porta e choramingando quando ele estava no banheiro. Como se esgueirava para baixo de suas cobertas quando ninguém estava vendo.
Era só um cachorro.
Mas era o cachorro de Law.
O cachorro que ele viu crescer, que estava em todas as suas memórias mais felizes ou tristes.
O cachorro que, assim como tudo mais que ele amava, se foi por causa do chumbo em suas veias.
Law não o viu morrer. Talvez fosse melhor assim.
Um dia ele simplesmente saiu para brincar no quintal, quando a epidemia começara a se agravar, e não voltou mais.
Law escutou a mãe dizer para o pai que o acharam morto, cerca de três dias depois, perto do muro de um vizinho.
Talvez fosse melhor assim.
Law já tinha traumas demais para lidar.
Ele não precisava lembrar da morte nos olhos de seu melhor amigo, não quando tudo antes era vida.
Ele não precisava lembrar de seus pelos cobertos de formigas e sujeira, não quando era melhor pensar em como eles eram macios e quentes sob os seus dedos.
Talvez fosse melhor assim.
Mas às vezes, quando o sono não vem, Law se acha um pouco egoísta.
Por que ele estava grato por não tê-lo visto morrer, quando o cachorro teve que enfrentar a morte sozinho e no frio, sem a companhia das pessoas que mais amou em todo o mundo?
Law sabe que não pode mudar o passado, mas se pudesse, teria ido atrás dele quando ele saiu. Ainda que sua morte fosse inevitável, Law estaria ao seu lado, acolhendo o rosto bobo na palma das mãos e sussurrando que estava tudo bem, você teve uma boa vida, pode ir em paz.
Era só um cachorro.
Mas era o cachorro de Law.
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