Escrita por: fallen_freesia
[ TAEHYUNG ]
— E aí, Taehyung-ah? — A voz que perturbava meu sono e minha vida em geral fez-se presente, tornando meus pensamentos turvos de imediato. — Está fugindo de mim, princesa?
Não demorou para que eu sentisse algo batendo fortemente contra o meu corpo e eu derrapasse pelo chão com extrema facilidade. Sentia-me desnorteado e minha cabeça começou a latejar, como se gritasse as palavras "perigo" e "fuja" sem parar. Realmente, eu deveria levantar e fugir, porém, havia sempre alguma coisa que me fazia congelar no lugar, estático, como se uma força do universo segredasse a mim: "Você sabe que merece passar por isso, então, fique parado aí e aceite sua punição".
— Me contaram que você estava aqui, Taehyung... — Senti um braço envolver meu pescoço, quase que em um gesto amigável, o que estava longe de ser de verdade. — Ainda bem que você existe para me tirar do tédio, hein? Já deu a bunda hoje, Taehyung?
Sua risada preencheu aquele corredor vazio, como se tivesse contado uma piada engraçadíssima. Parecia uma ironia do destino, mas sempre que Kyle Manson e seu grupinho encontravam-me, tudo ficava silencioso e não havia uma viva alma por perto para me ajudar a sair daquela situação. Bom, não era problema dos outros, não é? Eu deveria me virar e revirar para sobreviver a mais um dia naquele campus.
Nessas horas eu sempre ficava tentado a gritar, mas minha garganta fechava em medo, decepção e, talvez, resignação. Não funcionaria pedir ajuda mesmo, afinal, já havia tentado uma vez e fui ainda mais humilhado. Eu deveria arranjar uma saída sozinho, deveria mostrar que não era apenas desajustado, deveria de alguma maneira provar que eu não era um erro.
— Por que não está falando, hein? — Seus dedos seguraram meu queixo com violência e ele me forçou a fitá-lo, divertindo-se com as lágrimas que começavam a se acumular em meus olhos. — Está querendo chorar, Taehyung? Que menininha frágil você é!
Ele estava sozinho dessa vez, afinal, era final de semana. Sua vida deveria ser realmente tediosa para preferir ir à universidade para incomodar um aluno a dormir até tarde ou a sair com amigos. Bom, aquele era Kyle Manson, o aluno transferido de uma faculdade do exterior que logo adquiriu fama entre as garotas por seus olhos azuis e físico atlético. Aquele era Kyle Manson, o cara que fez minha graduação ser um pesadelo pessoal, embora eu estivesse plenamente acordado.
Eu não sabia o que era pior, na verdade. Quando com os amigos ele era mais violento, optava por palavras mais agressivas e costumava me fazer sangrar de alguma maneira. Os aplausos que recebia por seu show vinham na forma de explosões de risadas dos companheiros e lágrimas de minha parte, algo de que nunca me orgulharia, minha fraqueza em lidar com tudo aquilo. Quando estava sozinho, no entanto, ele era mais irônico e gostava de me tocar com aquelas mãos nojentas algumas vezes, como se quisesse me provocar por saber que homens me atraíam e tirava proveito da situação. Ele gostava de me ter na mão, humilhado.
A vida era uma merda. A vida naquela faculdade em si era uma merda. Eu já estava velho demais para passar por aquilo, mas vê como as coisas são fodidamente enraizadas? Não há uma idade certa para passar por um inferno como aquele, porque ninguém deveria vivenciar dores e humilhações como essa. Só que, lá no fundo, uma voz distorcida dizia maldades dolorosas: que eu merecia ser punido de alguma maneira, porque eu não era capaz de mudar quem eu era. Talvez meus pais tivessem razão, afinal, pais sempre têm razão, não é? Eles são mais sábios e sabem transmitir preocupação e amor das mais diversas maneiras, ainda que seja de um jeito frustrante às vezes... Pais são assim: querem o melhor para seus filhos. Não é?
Talvez fosse uma maneira de consertar meus erros. Minha vida em especial havia virado de cabeça para baixo, tudo começou a desandar tão de repente que perdi a noção do que era real e do que era paranoias minhas. Eu sabia que a faculdade não era meu único pesadelo. Eu vinha cultivando pesadelos dentro de mim há vários meses, então, como fugir de algo que está dentro de você? Por mais que eu tentasse me esconder, eles me encontravam.
— Aish, Taehyung, se arrumou todo para estudar no final de semana? Está se encontrando com alguém escondido? — Seu tom de voz havia mudado: era mais grave e conciso, indicando plenamente o que estava por vir. — Veio dar o cu para alguém, é?
Estremeci com a respiração falha quando senti meu corpo ser bruscamente levantado e prensado contra a parede com violência. O ar parecia não chegar aos meus pulmões, meu coração estava disparado e eu tentava a todo custo me soltar de suas mãos, debatendo-me, mas ele era mais forte, eu já sabia disso e sabia o que eu passaria naquele corredor, onde ninguém se atrevia a ir assim que percebiam o que estava para acontecer. Eu tinha noção de que, mais uma vez, eu já havia perdido.
— Uma bichinha covarde como você deveria estar de quatro no chão, Taehyung... — Sua risada estava mais baixa, como se dedicasse toda a sua atenção a mim. — Fique quietinho, sua aberração.
Não demorou para que eu sentisse uma de suas mãos começar a me tocar. Primeiro o meu rosto, ele passou seus dedos por meu maxilar travado e pareceu se divertir bastante ao ver que eu mordia os lábios, suprimindo um grito de socorro. Sua pele em contato com a minha queimava de uma forma extremamente dolorosa e, quanto mais o tempo passava, mais sujo eu me sentia.
Faça alguma coisa, Taehyung! Fuja! Grite! Faça alguma merda para não passar por isso de novo!
Ele então segurou meu queixo com brutalidade antes de erguer meu rosto, puxando-me pelo cabelo e fazendo-me grunhir em desconforto. Pelo palavrão que Kyle Manson soltou ele estava longe de estar satisfeito: ele queria mais; seu desejo insaciável por destruir corações fracos era evidente. Eu só sairia dali quando o vazio me consumisse completamente.
— Abra os olhos, bichinha! — Ordenou. — Quero você olhando pra mim.
Eu tremia, sabia que sim. O único motivo para ainda estar de pé era sua outra mão sustentando meu peso contra a parede, pois minhas pernas fraquejavam a todo momento e queriam que eu desistisse, afinal, do que adiantava lutar se eu já havia perdido? Eu me encolhia como podia, mas eu estava ali, vulnerável e ao alcance de suas garras: eu era um perdedor que sempre perderia batalhas perdidas.
Olhar para ele sempre era a pior parte: ter que olhar nos olhos de um monstro, enquanto era tocado e humilhado daquela maneira. Sentir que era um inválido e que, por algum motivo, eu era tão descartável a ponto de poder ser usado por outros e abandonado logo em seguida. Ver como ele não sentia qualquer remorso pelo que fazia... Isso sempre me sugava qualquer esperança de que valia a pena tentar sobreviver. Quantos outros Kyle Manson existiam por aí? Quantos Kim Taehyung estariam passando pela mesma merda que eu?
Não faça o que ele quer, Taehyung. Você ainda não perdeu! Chute suas bolas e saia correndo antes que seja tarde demais!
Quando abri os olhos, de início não pude ver o que estava acontecendo, ainda que sentisse tudo, desde sua mão descendo de meu rosto para outras partes do meu corpo até o forte tapa que recebi no rosto ao tentar cerrar meus olhos novamente. Seu rosto estava turvo, pois minha visão estava embaçada pelas lágrimas, porém, eu sabia que ele estava sorrindo sadicamente para a vermelhidão que se acumulava em minha face, marcando minha bochecha com seus dedos. Eu queria dormir e nunca mais acordar, queria apenas ser capaz de descansar depois de tanto tempo... Por que não me deixavam descansar? Eu só queria descansar... Descansar.
Você pode descansar depois que sair daí, Taehyung! Saia daí!
Sempre que sua mão alcançava meu membro, as coisas deixavam de ter qualquer sentido, era o momento em que o vazio realmente tomava meu corpo por completo. Eu continuava de olhos bem abertos, no entanto, tudo ficava nublado e o sentimento de impotência simplesmente carregava minha mente para longe, como em um ridículo mecanismo de defesa, já que fugir eu nunca era capaz. Como se dissesse "ok, estou dando a você um desconto: não precisa sentir ou ver o que está acontecendo, mas continue aí, parado, porque você não merece descansar". E era assim que passavam os dias e nada mudava...
Quando estava sozinho, ele gostava de me tocar, violava-me com seus toques e suas palavras, mas nunca se atreveu a passar disso, e infelizmente isso era um alívio para mim. Saber que, apesar de toda aquela merda, uma coisa ele não teria capacidade de fazer contra mim... Eu me contentava com tão pouco, não é? Sentir que isso era, de certa forma, uma vitória para mim... Eu era ridículo.
Gostava de lembrar do passado nessas horas tenebrosas, esperando que em algum momento ele estivesse satisfeito em me humilhar e simplesmente me abandonasse ali, destruído, rindo consigo mesmo como se tivesse feito algo grandioso a seu ver. Sim, nessas horas, o passado parecia doce como um sonho, colorido e vívido nas mais diversas lembranças de risadas e bons sentimentos. O aroma de geleia de morango sendo preparada na casa de meu tio aguçava meus sentidos e, inerte, eu afundava em lembranças, esperando que pudesse enfim me afogar naquele oceano azul.
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