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História Subversos - Contos da Escuridão - O Sedutor das Sombras - VII


Escrita por: WilkensOficial

Notas do Autor


Esse capítulo também é meio filler, mas serve para estabelecer uma pequena calmaria antes da tempestade que está por vir.


Espero que gstem.




Conheça NAS PROFUNDEZAS DO DESESPERO, já disponível para leitura. Link nas notas finais.

Capítulo 17 - O Sedutor das Sombras - VII


Capítulo Sete:Psicose

[Douglas]

 

Eu não fazia ideia de que horas eram, mas a escuridão no céu me fez lembrar de Esteban e do quanto ele deveria estar sofrendo com a solidão por todo esse tempo. Olhei para a flor azul em minhas mãos e me dei conta de que poderia ajudá-lo de alguma forma. Se a rosa realmente realizasse desejos, poderia ser de grande utilidade.

Caminhei até o casarão do outro lado da rua e observei atentamente. Não tinha campainha, o portão estava enferrujado e entreaberto, as plantas não eram aparadas há muito tempo e a impressão que dava era de que realmente se tratava de um cenário de filme de terror.

O barulho da chuva no telhado era muito forte, por isso não adiantava gritar ou bater na porta, eu precisava entrar, mesmo não tendo sido convidado.

Abri a porta e me deparei com uma sala completamente desarrumada. O chão e as paredes tinham manchas vermelho-escuro e os móveis estavam surrados, com marcas de arranhões e mordidas violentas, era como se naquela casa habitasse uma terrível fera.

— Esteban? — falei quase sem voz, não pelo frio que fazia meus dentes baterem uns nos outros, mas pelo medo de estar me entregando ao lobo literalmente.

Eu subia as escadas à medida em que eu o chamava e não obtinha respostas.

O segundo andar possuía um extenso corredor com muitas portas, entretanto, não precisei de muito esforço para saber onde ele estava, pois uma delas estava entreaberta.

Caminhei cautelosamente até lá e então o vi.  Ele estava tão frágil e indefeso deitado em sua cama, encolhido, talvez chorando e se sentindo solitário.

Esteban usava apenas um short de tecido fino, o que me fez ver o excesso de hematomas e ferimentos por todo o seu corpo.

— Esteban? — falei baixinho enquanto o tocava cautelosamente. Sua pele estava mais pálida do que eu me lembrava e aparentava ser frágil, como um cristal. Ele era a pessoa mais linda que u já tinha visto em toda a minha vida.

— O que faz aqui? — perguntou escondendo o rosto avermelhado, foi então que vi marcas de corda em seu pescoço. Uma tentativa de suicídio, talvez.

— Tenho algo pra você. — falei estendendo a rosa azul para ele, que a olhou com desdém.

— Que brincadeira é essa?

— Essa flor pode te curar, você só precisa pedir. — falei insistindo que ele a pegasse.

— Do que você está falando?

— O Conde D… bem… não importa, apenas aceite!

— Não quero, obrigado!

— Mas… por que não?

— Porque essa flor não é deste mundo, deve ser amaldiçoada! — disse Esteban levantando-se da cama com certa dificuldade e parando antes de chegar à porta — Se quer um conselho, pare de tentar me ajudar e viva sua vida. Nem nos conhecemos, não somos nada um pro outro. Você não precisa sentir pena de mim. — sua voz fraquejou e ele quase chorou diante de mim, mas conseguiu se conter.

— Não seja burro! Essa é sua chance de acabar com seu sofrimento! — quando eu disse isso, ele soltou uma risada cheia de sarcasmo — Qual é a graça?

— Você acha mesmo que me transformar em um monstro é o menor dos meus problemas? — Ele suspirou e me encarou com fúria nos olhos — Quando eu me mudei pra essa casa havia um tambor, um maldito tambor que me fez ir para o outro mundo e foi onde adquiri esta maldição. Depois disso, meu irmãozinho desapareceu e eu matei toda a minha família. Ainda que eu deixe de me transformar em uma fera, continuarei sendo um monstro e permanecerei sozinho.

— Você não precisa ficar sozinho. Você tem a mim.

— Agora quem está sendo burro é você! Por que faria isso por mim? — fiquei calado olhando para as marcas em seu pescoço, percebendo isso, Esteban suspirou suavizando as expressões faciais — Foram muitas as vezes em que tentei tirar minha vida, mas não consigo. Uma força maior toma conta do meu corpo e me traz de volta a essa tormenta sem fim! — Esteban sentou-se novamente, agora um pouco mais calmo — Toda vez que eu me transformo, essa marca em minha perna cresce. Sinto que um dia desses a transformação poderá ser irreversível.

Sentei-me ao lado dele e lhe fitei por um instante. Seus olhos estavam marejados e suas mãos tremiam.

— Eu sei que somos estranhos um pro outro, mas não precisa ser assim. Olha… não somos tão diferentes assim. — agora ele me olhava com atenção, curioso para saber o que eu estava a dizer — Quando eu era criança, meus pais geralmente saíam e me deixavam com uma babá, Iolanda. Seu rosto angelical e sua voz doce escondiam uma pessoa perversa. — suspirei fundo, era doloroso reviver as dores do passado — Ela chamava o namorado para que pudesse abusar de mim sexualmente. Isso foi algo que se repetiu por várias vezes.

— E você nunca contou a ninguém?

— Meus pais nunca deram muita atenção e quando tentei chamar a polícia, acharam se tratar de um trote.

— O que aconteceu depois?

— O Centro de Compras Vassago inaugurou no dia do meu aniversário, foi naquele dia que tudo ficou ainda pior, pois meu pai mudou repentinamente e se transformou em uma pessoa fria e cruel o suficiente para participar das violências que eu sofria. Há seis meses matei meu pai esfaqueado e minha mãe foi presa depois de assumir a culpa.

— Eu sinto muito. — disse Esteban.

— Não sinta. O homem que eu matei não era meu pai, pelo menos foi o que o Conde D disse. — suspirei hesitante, apertando os dedos, nervoso — Meu pai de alguma forma ficou preso em um outro lugar e alguma coisa assumiu sua identidade. Aquela coisa se alimentava da minha dor. — Virei-me de frente para ele e segurei sua mão.

— Se essa rosa realmente pode conceder um desejo, por que não traz seu pai de volta?

— Porque o Conde D foi bem claro quanto a isso.

Esteban ficou calado e por um momento girou a rosa lentamente nas mãos, talvez imaginando todas as possibilidades que poderia ter.

— Eu não posso fazer isso, desculpa. — disse me devolvendo a rosa — O desejo é seu, além do mais, você mal conhece esse tal de Conde D. Quem garante que ele disse a verdade?

— Mas…

— Só mais uma coisa… ham… o que aconteceu com a babá e o tal namorado estuprador? Você também os matou?

— Eles estão vivos, moram há duas quadras daqui.

Esteban ficou pensativo e me olhou lançando um pequeno sorriso malicioso.

— Você é a primeira pessoa com quem converso depois de tanto tempo. Obrigado. — disse ele emocionado — Mas agora você precisa ir. Não é seguro ficar perto de mim. Daqui a pouco será tarde demais e… eu preciso me acorrentar. Leve sua rosa e deseje ter seu pai de volta.

— Eu posso ao menos te ajudar a… bom… a prender você nessas correntes? — falei olhando para algumas correntes presas à parede e mordaças ensanguentadas pelo chão.

Esteban me olhou desconfiado, mas assentiu de bom grado.

Depois de prender Esteban devidamente, sentei-me na cama e fiquei lhe observando.

— Sabe Esteban, existem monstros muito piores do que você por aí, é por isso que você não me assusta.

— Você é louco! — ele disse isso e então se jogou violentamente no chão.

Estava acontecendo.

Eu podia ouvir seus ossos quebrando e seu corpo mudando de forma. Ele gritava de dor e gesticulava para que eu fosse embora, mas eu precisava ficar ali, era como se uma força me mantivesse perto dele, algo além de minha compreensão.

Quando sua transformação foi completada, percebi que havia poucos traços do Esteban original ali. A criatura rosnava incessantemente, mas isso não me impediu de ficar ali, observando-o e observando a lua gigantesca no céu.

Ѫ

Foi uma madrugada longa e difícil, em alguns momentos, tive a impressão de que a criatura estava prestes a se soltar para então arrancar meu coração, mas isso não aconteceu graças às correntes bem reforçadas nas paredes.

Adormeci e quando acordei, Esteban já estava em sua forma humana. Mesmo sonolento levantei e o desprendi. Ele estava machucado, por isso cuidei de seus ferimentos e hematomas, limpando-o delicadamente por cerca de uma hora. Seu corpo estava tão cansado que não importava o barulho que eu fizesse, ele se mantinha em sono profundo.

 

[Esteban]

 

Acordei sentindo cheiro de pão fresco e café moído. Por um instante pensei que estava de volta à minha infância, quando minha mãe preparava a mesa do café da manhã antes que meus irmãos e eu acordássemos, porém, quando abri os olhos, meu coração apertou dolorosamente ao perceber que eu ainda estava dentro do meu eterno e maldito pesadelo.

Olhei para as correntes e para a cama à minha frente. Havia alguém lá. Me esforcei para lembrar da noite anterior e tudo o que eu via era um rosto doce e gentil me encarando cheio de disposição.

— O que você está fazendo aqui? — perguntei olhando para meu vizinho, que mesmo com o rosto cheio de olheiras e evidentemente cansado, estava ali, pronto para tentar me fazer sentir menos sozinho, mas… por quê?

— São duas da tarde. Tem café da manhã lá embaixo. Aproveitei e trouxe toalhas limpas pra você tomar um banho decente e…

— Por que tá fazendo isso? Quer dizer, eu matei a sua tia e posso matar você também! — alterei o tom da minha voz. Por mais que fosse uma surpresa agradável tê-lo ali, era só uma questão de tempo até que seu sangue estivesse em minhas mãos.

— Acho que você pode conviver com isso se tiver alguém ao seu lado e assim, nenhum dos dois se sentirá sozinho novamente. — seus olhos brilharam em minha direção. Me desarmei na hora. Ele estava sendo tão gentil e tão legal comigo, eu não merecia nada daquilo. Sorri e balancei a cabeça quando ele estendeu a mão para me ajudar a levantar — Tá rindo de quê?

— É que… eu queria ser normal ao menos por um instante, assim eu poderia tentar conquistar você. — Ele ficou vermelho e escondeu o rosto quando falei isso.

— Tá me dando uma cantada? — disse Douglas sorrindo. Era o sorriso mais bonito do mundo — Vai tomar banho. Te espero lá embaixo.

Ѫ

Aquele foi o meu primeiro café da manhã em muito tempo e mesmo não admitindo, ter a presença de Douglas ali estava sendo essencial para que eu me sentisse ao menos um pouco normal.

— Posso te fazer uma pergunta? — Assenti suavizando meu rosto — Existe um padrão para suas transformações? Quer dizer… agora você está normal, mas quando vai estar na outra forma novamente?

Pigarreei e sorri. Seu jeito de falar era fofo e demasiadamente encantador.

— Como eu disse, acabei matando minha família e quando acordei eu estava no meio da floresta sujo de sangue. No começo me isolei na floresta, mas quando a criatura passou a me trazer para casa ao amanhecer, percebi que precisava fazer alguma coisa. Então preparei meu quarto para me prender nas noites de Lua Cheia.

— Então suas transformações são como as de um lobisomem?

— Não exatamente. Quer dizer, pode acontecer esporadicamente em noites comuns, mas geralmente, acontece em Lua Cheia. — parei para comer mais um pedaço de bolo e então prossegui — Como suicídio nunca deu certo, me isolar do mundo foi a melhor alternativa, pelo menos até aparecer no seu quarto semana passada. A propósito, o que fez com o corpo da sua tia? Tenho certeza de que não chamou a polícia.

Douglas deu uma risada.

— Minha vizinha Vilma me ajudou a mutilar e depois congelar num freezer. — foi nesse momento que olhei para ele e caí na gargalhada, Douglas também ria certamente dos mesmos motivos que eu: parecíamos dois psicopatas de sangue frio falando sobre suas vítimas durante o café da manhã. Era estranhamente agradável.

— Sabe, às vezes, quando a criatura assume meu corpo, consigo ver tudo pelos olhos dela, mas é como se eu estivesse preso num sonho onde não posso controlar minhas ações.

— Dói? — perguntou Douglas com um olhar inocente.

— É uma dor indescritível. Eu sinto minha carne em chamas e então meus ossos quebram e meu corpo começa a mudar. Acho que qualquer outro ser humano não suportaria tal dor, mas a criatura me mantém acordado para sentir tudo até que ela se apodere por completo de mim. Talvez essa tortura seja pior do que a morte.

— E o que você costuma fazer nos dias em que não se transforma?

— Eu espero.

Ficamos em silêncio por um instante, mas logo o rosto de Douglas se iluminou.

— Sei que pode parecer loucura, mas, que tal um cinema? Você precisa redescobrir a vida!

— Não!

— Vamos! Você ainda pode ser normal nas noites em que não se transforma e quando for Lua Cheia, estarei aqui para te ajudar com as correntes.

— E se eu me transformar no meio da sessão?

— Sei lá eu… posso andar com focinheira e algemas na bolsa. — abri uma gargalhada quando ele disse isso — Podemos tentar fazer alguma coisa, mas antes, o que vai fazer com a rosa?

— Bom, eu esperava que fizesse seu desejo ainda e…

— Você ainda pode ter seu pai de volta. O desejo é seu. Faça-o, por favor.

Douglas segurou a rosa e fechou os olhos, como se estivesse em oração.

A rosa se desfez e então… nada aconteceu. Desejo desperdiçado. Seu pai não havia retornado, ainda estávamos sozinhos.

 


Notas Finais




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