Millie
Finn reividicou minha boca me beijando com vontade, tanta vontade que me fez ficar trêmula e ansiosa muito rápido. Eu estava triste e também furiosa por que aquele cara estava me confundindo de todas as formas possíveis. Primeiro deixando claro que não queria nada comigo e praticamente me forçando a ir embora, depois pego aquele comentário no meu vídeo. Eu decorei o que ele havia dito, era óbvio que alguém que não me conhecesse e que não se importasse comigo não teria capacidade de escrever aquilo e por isso soube na hora que era dele. Só poderia ser.
Agora estávamos perdidos um no outro, nos beijando com ainda mais urgência do que a última vez. Talvez pela minha frustração contida durante todo o dia, eu estivesse mais engajada na tarefa de tomar tudo dele, sua boca, seu corpo e quem sabe algo mais no meio do processo. Era isso que eu estava fazendo com o beijo, lhe mostrando o quanto poderia ser bom, o quanto nos encaixavamos e que poderíamos resolver nossas diferenças daquela forma.
Não importava que ele gostasse de outra mulher, não era com ela que ele estava e eu duvidava muito que Finn tivesse essa opção. Senão estaria com ela e para começo de conversa nunca teria aceitado passar aqueles dias comigo.
Tirei aquilo dos meus pensamentos me concentrando apenas nas sensações que aquele beijo estava me causando. Rodeei minhas pernas ao redor de seu corpo e me segurei em seus ombros deixando nossos peitos unidos, subindo e descendo com o vacilar da nossa respiração. Diferentemente da última vez, Finn não estava contido e quando suas mãos seguraram minhas pernas me puxando cada vez mais ao seu encontro senti por baixo da água e por cima do tecido de sua calça o quanto ele me desejava.
Era ridículo pensar aquilo, mas perceber sua nítida ereção me deu uma sensação única de triunfo. Ele poderia negar o quanto quisesse, mas seu corpo estava expressando sempre o contrário. Forcei nossos lábios a se separarem ansiosa para provar mais de sua pele e sem esperar, tracei um beijo delicado em seu maxilar indo direto até a parte côncava de seu pescoço. Ele estava quente apesar da água fria que escorria de seus cabelos.
Ele me pressionou contra a parede quando suguei a sua pele sorvendo o seu gosto com os labios. Eu queria mais, sempre mais. A música ecoando em meus ouvidos era um estímulo a mais para que eu nunca parasse.
Minha cabeça estava girando ainda sob o efeito do álcool porém eu me sentia mais sóbria do que nunca. Enquanto me concentrava em beijar seu pescoço ele me deu atenção beijando meus ombros, por cima da alça do biquíni, a sensação de calor só foi crescendo e eu me empurrei contra ele afim de acabar com a dor que se concentrava entre minhas coxas.
Finn praguejou alguma coisa e senti seus dentes se arrastarem na minha pele quando forcei nossos corpos a colidirem. O atrito me fez revirar os olhos e quase implorar por mais. Como se soubesse disso, Finn também estremeceu e segurou meu queixo levantando-o para cima. Nossos olhos se encontraram e temi que acontecesse o mesmo da última vez, que ficassemos estranhos e tudo acabasse, porém ele apenas me olhou com aquela expressão de quem não acreditava que estávamos ali, e não disse nada a princípio, passou o polegar por cima do meu lábio inferior inchado e sorriu.
-Acho que estamos malucos. -Falou ainda fitando minha boca.
-Com certeza, estamos.
Sorri de volta e beijei a ponta de seu dedo. Ele hesitou de surpresa e eu agarrei seus cabelos para beija-lo de novo.
Dessa vez o beijo foi mais calmo, lento e menos desesperado. Nossas bocas se moviam com mais cuidado, mas ainda com a precisão necessária para que o desejo continuasse ali. Suas mãos alisaram gentilmente minhas costas por baixo da água e eu enrolei mechas de seu cabelo entre meus dedos. Não me lembrava da última vez que havia feito aquilo, aproveitado um beijo de verdade, geralmente quando ficava com alguém os beijos sempre antecipavam apenas o sexo e embora eu quisesse também aquela última parte, me acalmei para que fosse tudo mais devagar.
Depois de um longo tempo ele se afastou um pouco ainda com os olhos fechados. Sob a luz da lua sua pele branca ficava brilhante, era incrível como Finn se tornava cada vez mais bonito. Ele encostou a testa na minha e respirou fundo.
-Acho melhor a gente entrar, está ficando tarde.
Senti um profundo buraco se abrir sobre minhas pernas e meu corpo ficou tenso. Me afastei dele de súbito.
-Não. Não faça isso. -Falei.
Ele abriu os olhos e juntou as sobrancelhas ainda me segurando próximo.
-Do que está falando?
Sua dúvida parecia ser genuína, mas não foi o bastante para me fazer relaxar.
-Você vai fazer de novo. Vai se afastar e vai me dizer que foi um erro.
Odiei a forma como minha voz tremeu ao dizer aquilo e apesar do que eu mesma disse, empurrei um pouco seus ombros. Ele me deteve, segurando meus braços.
-Ei, não. Não vou fazer isso. -Soltou uma lufada de ar. -So acho que está tarde, mesmo.
Ele sorriu para aliviar a tensão.
Sair da água e voltar para casa ainda parecia uma ideia impossível de aceitar, aliás eu queria ficar ali o quanto tempo pudesse, mas ele tinha razão, era tarde e eu já havia bebido demais.
-Tudo bem. -Afirmei soltando minhas pernas para alcançar o chão.
Sem dizer mais nada Finn passou as duas mãos por volta da minha cintura me erguendo até que eu estivesse sentada na borda da piscina, depois saiu sacolejando os cabelos para tirar o excesso de água.
Quando subimos para o andar de cima ainda estávamos em silêncio e ele foi o primeiro a falar;
-Você quer que eu fique para apagar sua luz?
Não contive um sorriso ao ouvir aquilo e respondi, antes de abrir a porta:
-Sim, eu gostaria.
Nós entramos no habitual silêncio novamente. Finn tinha recolocado a camisa, mas sua calça ainda pingava água assim como seus cabelos. Percebi que havia um pouco de tensão sobre ele e eu suspirei tentando conter a minha também.
-Então...hum. -Pigarrei limpando a garganta. -Você.. não quer entrar comigo? Digo, no chuveiro?
Assim que falei aquilo me dei conta do meu erro. Finn não parecia ser acostumado com esse tipo de abordagem e suas sobrancelhas se levantaram de surpresa.
-Bem, eu acho melhor não. Definitivamente acho melhor não. -Ele negou com a cabeça.
Apesar da decepção não vi aquilo como uma rejeição, afinal eu havia comprovado que ele tinha ficado excitado com meu beijo, ele só era... Recato demais?
Assenti em concordância e virei de costas para ele, indo em direção a porta do banheiro, porém eu parei antes de entrar para desatar o nó do meu biquíni. De repente senti um calor se estabelecer atrás de mim e suas mãos me pararam antes que eu pudesse tirar a peça.
-Millie, não faça isso, por favor. -Ele praticamente sussurrou.
Eu não era exatamente tímida e não tinha nenhum tipo de insegurança com meu corpo, mas de repente me senti uma idiota me dando conta do que eu estava prestes a fazer. Era efeito da bebida também, mas essa era eu de verdade. A Millie que não tinha pudor e que não se importava de tirar a roupa na frente de um cara. Respirei fundo e me virei de novo, Finn não se afastou então ficamos parados um na frente do outro.
-Não é como se ninguém tivesse visto antes. O mundo inteiro...-Ele me silenciou com um dedo sobre minha boca.
-Mas eu não vi. -Respondeu.
Em algum momento eu havia pensado se ele tinha visto minhas fotos e não foi exatamente uma surpresa saber que não, mesmo assim era difícil de acreditar. Não que Finn tivesse um pingo de algo pervertido, mas por que seria praticamente impossível que as minhas fotos não tivesse chegado até ele.
-Não viu? -Fiz a pergunta com um tom abaixo do usual.
Meu coração estava acelerado mas eu não compreendia exatamente o por que.
-Não. Claro que não. Eu nunca faria isso. -Ele ponderou bastante sério, quase como se a ideia fosse impossível.
Ter a constatação só me fez ficar mais derretida ainda. Finn me respeitava tanto ao ponto de nunca ter procurado ver minhas fotos e até mesmo naquele momento quando eu estava disposta a fazer qualquer coisa se mantinha me respeitando. A sensação de felicidade no entanto passou depressa e fui tomada por tristeza, vergonha e medo.
Eu tinha evitado pensar nas minhas fotos, pensar na polêmica e nos comentários, mas tudo voltou de repente. Eu não me importava que me vissem, a única parte ruim daquilo fora a repercussão negativa, mas o peso de saber que todos tinham me visto me assolou naquele momento e mais do que nunca eu quis que ninguém tivesse me visto.
Cobri meus ombros com os braços me sentindo nua e Finn me abraçou puxando minha cabeça para seu peito.
-Eu sei. -Ele disse sobre meus cabelos. -Não é culpa sua. Nunca foi.
Eu já havia me convencido de que a culpa não era minha, inclusive por isso gravei o vídeo, mas aquela era uma certeza oscilante, afinal lá estava eu de novo quase ficando nua na frente de um cara que mal conhecia. Era por isso que coisas ruins aconteciam comigo.
Eu solucei mas lágrimas não vieram, o que era um alivio por que eu não queria chorar. Me senti protegida naquele abraço, como se apenas pelo fato dele nunca ter me visto me deixasse menos vulnerável, mais forte.
Eu o abracei de volta, passando meus braços por sua cintura e engoli golfadas de ar para alimentar meus pulmões.
-Obrigada. -Falei de olhos fechados. -Não só por isso, mas por tudo.
Eu tinha que agradecer. Por ele ter passado as férias comigo, por ter me feito esquecer, por ter se importado comigo, por ter me protegido, por ter me ajudado com o vídeo, por ter me apoiado, por ter me beijado, por ter permitido mesmo um pouco que eu me aproximasse.
Ele inalou o cheiro dos meus cabelos, então seus lábios tocaram a minha testa.
-Você não precisa me agradecer por nada.
Eu apenas assenti, ter uma discussão sobre aquilo não era o que eu queria.
Somente depois de um longo momento me afastei e entrei dentro do banheiro. Tomei um banho longo, lavei meus cabelos e ensaboei o corpo com cuidado, sentindo na minha pele os arrepios constantes cada vez que me lembrava das sensações dos nossos beijos. Eu tinha ficado excitada, mas muito mais do que isso, a excitação era apenas algo a mais, por que o restante foi muito maior. Me senti valorizada, livre e com algo que me preenchia por dentro e só excitação nunca me causou nada disso antes.
Quando sai do banheiro Finn não estava mais em meu quarto. Quase fui consumida pela frustração de ter sido deixada sozinha quando a porta se abriu e ele entrou novamente. Estava usando calça de moletom e uma camisa simples preta, seu rosto estava limpo e exalava um cheiro de creme dental, então eu soube que ele também havia tomado banho e voltara para cumprir sua palavra.
Não dissemos nada um para o outro. Eu tirei o hobe que estava por cima da camisola e me deitei na cama afastando os lençóis. Finn ficou parado perto da porta esperando o momento em que eu dissesse para apagar a luz, mas eu não queria que tudo acabasse e eu sabia que era o que iria acontecer quando tudo ficasse escuro.
-Você pode ficar aqui? -Perguntei depois de cobrir minhas pernas.
Era uma pergunta idiota, por que claramente ele acharia errado fazer aquilo, porém Finn levou apenas meio minuto para ponderar e caminhar até a minha cama.
Havia um pouco de indecisão então eu mesma puxei a outra parte do lençol e lhe dei espaço para se deitar comigo. Como imaginei, ele não deitou, mas se sentou na cabeceira esticando as pernas ao meu lado.
Ficamos em silêncio de novo. Eu queria dizer alguma coisa, pedir para ele ficar de verdade e dormir comigo, mas já tinha esgotado toda a minha coragem depois do meu último pedido. Como se ele soubesse disso seu braço se esticou para o lado em direção a minha cabeça e sem pensar duas vezes eu me empolerei nele, passando meu outro braço por cima de sua cintura.
Senti quando ele riu e em seguida começou a mexer nos meus cabelos. Eu não queria dormir embora estivesse realmente exausta então eu disse, quando a dúvida surgiu em minha mente:
-O que mudou para você?
Finn ficou um pouco tenso ao me ouvir, mas não parou de mexer nos meus cabelos.
-Em relação a que?
-Você disse que eu não poderia gostar de você e agora está aqui comigo.
Aquela dúvida tinha passado inúmeras vezes em minha mente, eu jurei nunca perguntar mas a questão estava me consumindo.
Ele hesitou por um momento.
-É meio difícil de resistir. -Seu tom soou divertido, mas não era verdade, pelo menos não completamente.
-Eu sei. Sou irresistível. -Fiz uma careta desdenhosa para minha resposta, mas Finn apenas riu. -Você não se esforçou muito. Ainda gosto de você.
Naquele momento minha cabeça deu um giro ao me lembrar da outra mulher. Havia uma. Eu tinha certeza. Mas tinha algo sobre ela, algo realmente terrível.
Esperei que Finn dissesse "Mas eu não gosto de você, sou apaixonado por outra" porém não foi sua resposta.
-É por isso que é irresistível. Também gosto de você.
Eu não sabia se o gostar dele era o mesmo que o meu, aliás podia nem significar nada, mas naquele momento serviu. Lembrei também do comentário que Finn fez em meu vídeo especialmente a parte do "não sobrou nada em mim". O que aquilo queria dizer? Ele estava magoado com alguma coisa, isso era óbvio e por que eu tinha o poder de mudar isso? Como eu faria algo como aquilo quando me restava apenas três dias?
As perguntas estavam dando um nó na minha cabeça e eu não queria mais pensar em nada, mas era inevitável. Finn pareceu perceber meu desassossego e levantou minha cabeça para me encarar, seus olhos estavam mais firmes e suas palavras demonstraram isso.
-Escute, não pense demais tudo bem? Estamos aqui agora e temos três dias para aproveitar, não vamos disperdisar esse tempo fazendo perguntas que não vão ter respostas. -Ele passou o dedo sobre meus lábios. -Depois, quando formos embora...-Sua voz ficou mais densa, menos segura. -A gente vê no que vai dar.
Aquela sugestão era cheia de buracos, eu sabia que ele estava apenas tentando me deixar calma mas não havia um pingo de verdade naquilo. Não haveria depois. Na minha vida era impossível ter, e ele sabia daquilo tanto quanto eu. Talvez isso o tenha convencido de ficar comigo, exatamente por que depois nunca precisaríamos nos encontrar de novo. Aquilo doeu, mas eu não disse nada, por que não havia nada que eu pudesse falar. Ele se abaixou sobre mim e sua testa encostou na minha, em seguida me beijou calmante, sorvendo meu hálito e resvalando apenas a ponta da língua sobre minha boca.
Era um beijo de contentamento, como se me dissesse "aproveite isso por que vai acabar" ou talvez um apelo "lute por mim para que nunca acabe". A resposta eu nunca ia saber então deixei aquilo para trás e me desfiz embaixo dele, ate que nada mais existisse.
--
Na manhã seguinte despertei sozinha com o outro lado da cama arrumado como se alguém tivesse colocado tudo em ordem antes de levantar. Apesar de Finn ter me deixado no meio da noite, eu sorri com a lembrança doce de que ao menos ele tinha ficado até que eu dormisse e de todos os beijos que demos.
Levantei depressa ao perceber segundos depois que já deveria ser tarde e eu passara a maior parte da manhã dormindo. No meu celular haviam inúmeras mensagens se amigos e colegas de trabalho, todos perguntando como eu estava ou me parabenizando pelo vídeo. Decidi ignorar todas exceto as de David lhe respondendo o bom dia com uma carinha animada ao lado.
Depois que vesti qualquer coisa desci as escadas sabendo que Finn provavelmente já teria acordado, porém a sala e o corredor estavam vazios. Rumei esperançosa até a cozinha mas apenas Rose estava lá.
-Hmmm. Bom dia. -Ela me cumprimentou com um sorriso presunçoso enquanto preparava algo no fogão. Seus cabelos enrolados estavam presos em um coque frouxo por onde mechas escapavam.
Foi inevitável que eu retribuisse com um sorriso satisfeito no rosto.
-Bom dia. -Caminhei até a mesa e me sentei em uma das cadeiras.
Estava morta de fome e quase gemi quando olhei que haviam panquecas e frutas a minha espera. Uma das partes boas de ter me tornado amiga de Rose era que agora ela preparava comida para mim e Deus, ela sabia o que estava fazendo.
-Pela sua cara vejo que a noite foi excelente. -Ela comentou me olhando por cima dos ombros. -Quando fui dormir, vocês ainda nem tinham entrado em casa.
Eu sorri outra vez, mas de repente me senti desconfortável em ter aquela conversa. Rose gostava de Finn e seria muita crueldade despejar toda a minha felicidade por cima de seus sentimentos.
Ela notou minha hesitação e suspirou.
-Pode parar com isso. -Resmungou impaciente. -Você não vai deixar de me contar o que aconteceu, vai?
Mordi o lábio inferior, indecisa.
-Eu acho melhor....
-Não Millie, qual é? -Ela se virou para mim e despejou uma panqueca quentinha em meu prato, sentando-se na minha frente. -Esta tudo bem, eu quero mesmo saber.
Sua expressão era de curiosidade e não de quem perguntou apenas por educação.
-Você não vai ficar chateada? -Perguntei enfiando um pedaço da panqueca na boca.
Rose rolou os olhos.
-Olha Millie, eu realmente achei que gostasse do Finn, ainda acho as vezes não vou negar, mas me dê um pouco de crédito, ele é o primeiro cara da minha idade que aparece por aqui. Além disso, eu realmente torço para que vocês dêem certo juntos.
-Ok. -Eu disse de boca cheia. -Foi... Incrível, ele é incrível.
Nós duas sorrimos ao mesmo tempo.
-Quer dizer que... -Ela fez uma pausa. -Voces dormiram juntos?
Eu engasguei de repente e comecei a tossir cobrindo a boca e acenando ao mesmo tempo com a cabeça.
-Não. Nós não transamos se é o que você pensa. -Deus, eu estava suando. -Mas isso é algo bom, se quer saber.
Eu fui sincera. Eu e Finn estávamos em uma fase muito delicada, nos conhecendo e aprendendo a lidar um com o outro. Se tivéssemos transado provavelmente teríamos estragado tudo.
Rose assentiu, mas não me passou despercebido seu nítido alívio.
-Acho que teria sido muito rápido. -Ela comentou capturando um pedaço de comida também.
Sim com certeza seria rápido, mas isso não significa que eu não queria.
-Ele é bonzinho demais para se aproveitar de mim e eu estava bêbada também. Não teria sido legal. -Falei aquilo tentando me convencer de que era verdade, embora eu soubesse que poderia ter sido incrível.
-Ele tem cara mesmo. -Ela concordou. -Finn não faria algo assim e se quer saber essa é uma qualidade perfeita.
Eu desviei o olhar quando uma parte de mim ficou em alerta com o elegio que Rose fez. Era verdade, porém não deixei de ficar incomodada.
-Pare de ser boba. -Ela disse quando reparou minha expressão. -So estou dizendo que você tem sorte. Quando acontecer, vai ser especial.
Ok. Eu queria parar de falar sobre a possibilidade de transar com Finn, especialmente com uma garota que eram afim dele. Pigarreei e Rose mudou o assunto, para um pior ainda.
-Ja pensou como vai aproveitar os três dias? Quer dizer, agora são apenas dois.
Eu praticamente gemi ao me lembrar.
-Hm, não. Eu tenho evitado pensar sobre isso.
Rose concordou e me deu um sorriso reconfortante.
-Não precisa acabar, você sabe, David é tio dele, de qualquer forma vocês ainda terão uma ligação. Mesmo que seja complicado, não é o fim.
Eu queria muito acreditar nisso, mas pelo que pude perceber David e Finn não eram exatamente próximos então isso não iria me ajudar muito, além disso nem sabia como ia contar isso a David.
-Minha vida por si só é complicada. Viajo muito e mal fico em casa, seria difícil manter alguma coisa, ainda mais com alguém que não seja da minha área. O Finn tem uma vida simples, ficar comigo significaria abrir mão de muita coisa e além disso eu não acho que seja o que ele quer.
Quando nos falamos ontem ele deu o entender que poderíamos ver como as coisas ficariam, mas eu sabia que era da boca para fora.
Rose suspirou e começou a mexer a colher no copo de leite pensativa.
-Eu entendo. De qualquer forma vocês não podem se enganar, nem ficar aqui para sempre como eu.
Quando ela disse aquilo, me lembrei de algo em que eu havia pensado antes. Afastei o meu prato e encarei Rose.
-Eu estive pensando... Gostaria que você viesse comigo, para minha casa.
Rose levantou as duas sobrancelhas de repente e deixou a colher cair no prato com um tintilar ruidoso, porém o choque passou depressa dando lugar a irritação.
-Ora Millie, não seja ridícula. O que diabos você quer? Me salvar? Está com pena de mim?
-Não. Nada disso. -Me apressei em explicar. -Eu sabia que você faria essa cara, e eu não estou oferecendo isso por pena. Tenho um emprego para você, como minha assistente pessoal.
Rose ouviu tudo negando com a cabeça, mas na última parte parou e levantou a cabeça me encarando.
-Como é?
-Exatamente o que você ouviu. Eu tenho uma equipe grande mas sempre precisamos de mais pessoas e bem, eu preciso de alguém que fique comigo. Seria incrível não acha?
Ela bufou descrente.
-Eu não tenho qualificação nenhuma Millie, nem se quer terminei o colegial.
-E o que isso tem a ver? Olha, você não vai precisar trabalhar em um escritório nem nada do tipo. Só tem que me ajudar em algumas coisas.
Eu não havia pensado ainda quais coisas exatamente, mas encontrar uma função para Rose não seria problema. Eu queria tir-la daquele lugar, tinha que fazer isso.
Rose balançou a cabeça novamente.
-Desculpa, mas eu não posso. -Sua expressão decaiu. -Não lido muito bem com pessoas e você sabe.. fora daqui eu não tenho uma fama muito boa.
-Primeiro: não tem que lidar com pessoas, somente comigo. Segundo: ninguém que trabalhe comigo te conhece e além disso você vai poder ser quem quiser fora daqui. Não estou dizendo que precisa fingir, só não tem que se importar com o que passou.
Ela ponderou minhas palavras e um leve sorriso cobriu seus lábios.
-Serio legal, mas eu tenho meu pai, moro aqui a muito tempo não sei se posso deixa-lo, muito menos se ele permitiria algo assim.
Droga. Convencê-la seria mais difícil do que eu imaginava.
-Rose, seu pai não é o seu dono. Essa é uma oportunidade boa para você, além disso eu posso até tentar conseguir algo para ele também como motorista ou...
-E vai colocar nós dois em sua casa? Não, Millie, pare, isso já está passando dos limites. -Ela me interrompeu agitando as mãos como se fosse impensável.
-Seria algo temporário, depois que vocês se estabilizarem podem alugar um apartamento.
Ela sorriu, sem humor.
-O David sabe que você está me propondo isso?
Eu não havia pensado em David ainda.
-Não, mas ele não tem nada a ver com minhas decisões. David cuida da gestão da minha carreira, mas ninguém é contratado ou despedido sem passar por mim antes. Acredite, eu ainda tenho um pouco de autonomia sobre minha vida.
Eu ri e Rose também, depois de um tempo ela maneou a cabeça.
-Eu posso pensar? Quer dizer, por mim, não pelo meu pai por que acho que ele não aceitaria, mas realmente pode ser algo bom para mim.
Eu sorri condescendente.
-Claro que pode pensar, você tem um prazo longo de até dois dias para decidir. -Pisquei o olho para ela. -E não pense que terá pouco trabalho, a Millie famosa pode ser bem pé no saco e mais patricinha do que eu aparento agora.
Puxei o tecido da minha camisa velha e mostrei a ela a mancha de leite que agora enfeitava a parte de cima do meu busto. Rose tampou a boca com a mão abafando uma risada e eu ri também.
Seria ótimo ter alguém por perto o tempo todo e eu sentia falta de pessoas da minha idade ao meu redor. Lexi costumava me acompanhar na maioria dos trabalhos, por que ela não era tão famosa e trabalhava apenas como modelo, mas bem, Lexi pode ser um pouco difícil de lidar e Rose seria diferente. Pensar nisso me fez pensar que eu teria que dar um jeito de mante-la longe de Lexi o quanto tempo conseguisse. As duas tinham muitos atritos e com certeza aquela decisão não seria muito bem aceita por Lexi. Porém, um problema de cada vez.
-Então, onde o Finn está? -Perguntei depois contendo um sorriso pelo simples fato de falar o nome dele.
Ridícula.
Rose fez aquela mesma expressão presunçosa e apontou para fora com a cabeça.
-Esta fazendo alguma coisa lá fora com a picape. Na verdade ele saiu bem cedo para a cidade e voltou com uma porção de bugigangas, acho que está fazendo algum conserto.
Eu nunca havia visto Finn com a mão na massa, quer dizer, somente quando ele tentou consertar meu ar-condicionado, então levantei da cadeira.
-Se você me der licença, preciso averiguar se ele está trabalhando direito. -Falei rindo com ironia.
Rose abanou a mão.
-É, eu sei. Vai lá, mas cuidado para não distrai-lo.
Oh, era exatamente o que eu queria fazer.
Na parte fora da casa o Sol forte me deu as boas vindas junto com um vento abafado carregado de poeiras minúsculas. Era um terror para o cabelo, mas eu gostava tanto daquele lugar. O simples fato de sair de casa e não ver nada lá fora já era incrível para mim que sempre fui acostumava com hotéis, mansões e condomínios.
Mas havia algo sim na parte de fora, algo que logo me chamou atenção. Finn estava parado do outro lado da cerca sentado de cócoras perto da picape girando uma peça metálica em cima do pneu dianteiro. Estava usando uma calça jeans escura, boné preto e camisa azul quase que completamente suja de graxa. Ok. Não era a visão de um mecânico musculoso sem camisa e suado, mesmo assim a parte indecente de mim ficou com água na boca.
De mansinho saí da varanda e fui andando vagarosamente até que estava próxima, reparei que ele cantarolava alguma música e então vi que ele estava usando fones de ouvido e por isso não percebeu minha presença. Minhas mãos formigaram para toca-lo e eu não pensei nisso demais quando Finn ficou de pé ainda de costas para mim.
Enrolei meus braços ao seu redor sentindo o quanto ele estava quente e úmido por causa do suor e do sol. Seu corpo ficou rígido e minhas mãos em sua barriga sentiram que ele havia parado de respirar por alguns segundos. Estava quase arrependida de ter feito aquilo quando ele se virou em minha direção, tirando os fones. Seu rosto estava manchado de graxa também especialmente na parte que seguia da bochecha até metade do pescoço. Droga, odeiei que meu coração acelerou quando nossos olhares se encontraram.
Ele abriu um sorriso e suas mãos ficaram nos meus ombros, porém os dedos sujos apontando para cima para não me sujar.
-Ei. Bom dia. -Ele disse levantando um pouco o boné.
Quase tive que abrir mais meus olhos para ter certeza de que estava vendo de fato um sorriso em seu rosto, mas muito mais do que um sorriso, ele parecia radiante sob os óculos.
-Bom dia.
A parte alvoroçada de mim, a que nunca se continha, agiu rápido me fazendo ficar de ponta de pé e eu o surpreendi com um beijo. Sua boca tinha um gosto inconfundível e delicioso de café, junto com algo doce que eu presumia ser mel ou caramelo das panquecas. Delicia. Lambi seus lábios desesperada por mais daquilo e Finn retribuiu com igual necessidade.
Droga, seria muito difícil não passar dos limites, mas eu estava tão feliz que ele não havia me rejeitado, que não estávamos estranhos um com o outro, que me deixei levar pelo momento.
Só depois de um tempo nos afastamos e Finn passou a mão pela testa suada.
-Você não deveria ter feito isso. Eu estou um nojo. -Porem falou sorrindo, as bochechas rosadas por causa da timidez.
Agora eu também estava suada, então não me importei.
-Não ligo para isso. -Eu disse reajustando os seus óculos nos olhos. -Você... Está muito ocupado?
Apontei para a picape que só agora havia reparado que estava erguida por um macaco.
Finn me largou e então se virou para verificar.
-Um pouco. Tinha que trocar o pneu da frente por que estava detonado.
Algo me veio a cabeça assim que ele disse aquilo. Era óbvio que Finn estava se preparando, preparando o carro por que dali a dois dias teria que pegar a estrada outra vez. Um novo rombo se fez em meu peito ao me lembrar. Eu tinha que fazer alguma coisa, senão enlouqueceria com aquele pensamento.
-Podemos fazer alguma coisa hoje, diferente?-Pedi para mudar de assunto.
O que eu realmente queria era poder ficar sozinha com ele, o que seria estranho e errado fazer na casa com Rose e Carter lá dentro.
Finn juntou as sobrancelhas e encarou os pés.
-Você tem alguma sugestão?
Eu não tinha, mas rapidamente algo me veio em mente.
-Poderiamos sair com o carro, dirigir um pouco pelo menos até o outro lado do rio.
Era uma boa ideia, a única possível. Eu não podia ser vista, então não teria como irmos muito longe.
Finn maneou a cabeça de forma pensativa.
-Acho que não deveríamos sair assim. Se alguém ver você?
Mordi o lábio pensando sobre isso. Estávamos muito afastados, quem quer que morasse nas redondezas provavelmente não era tão próximo de onde estávamos e eu tinha que insistir naquela ideia.
-Não acho que isso vai acontecer. Vamos com o carro e só pararemos do outro lado.
Ele encarou a picape de novo e soltou um longo suspiro.
-Tudo bem, podemos ir quando eu terminar.
Bati as palmas das mãos em vitória e em segundos já estava de novo em seus braços.
Finn colou meu nariz com o dele e foi um gesto que nunca achei possível que ele fizesse na vida, portanto fiquei paralisada.
-O que você não me convence de fazer, não é? -Ele murmurou, mais para ele do que para mim exatamente.
Eu sorri.
-Foi você mesmo que disse que eu sou irresistível.
E eu o beijei. De novo.
--
Finn
O almoço ocorreu bem, apesar de vez ou outra sentir que Rose me encarava do outro lado da mesa. Eu não sabia exatamente o que falar, por que já era esquisito demais aceitar a ideia de que eu e Millie estavamos... Sei lá? Ficando? Ainda mais estar num lugar com ela e com Rose ao mesmo tempo.
Apesar disso, ninguém falou nada sobre o assunto. As duas ficaram jogando conversa fora como se fossem amigas de longa data e eu fiquei calado, apenas comendo e observando por cima dos óculos.
Depois disso chegou a hora de sairmos. Millie e eu. Aquela ideia ainda me parecia absurdamente errada, porém eu havia aceitado. Era louco como ela conseguia me convencer de qualquer coisa que quisesse e eu simplesmente não conseguia negar. Depois da noite passada em que deixei que as coisas fossem por outro rumo eu estava estranhamente bem, embora ainda existisse uma grande parte que me assustava naquilo tudo.
Eu queria ficar com ela. Isso era um fato indubitavel, porém tinha que manter a cabeça no lugar e aceitar que não passaria de dois dias. O problema era que não se tratava apenas de uma mera atração física, se fosse, eu teria resistido e evitado. Mas o que fazer quando você não sabe nomear um sentimento que parece maior a cada vez que estávamos juntos?
Millie e eu tínhamos um tipo de conexão. O que eu comecei a comparar como uma espécie de imã onde os polos positivos se atraem por polos negativos e não conseguem mais se separar, sempre puxando um ao outro e o resultado daquilo, se não fosse contido, poderia ser desastroso.
Apesar de todas as minhas tentativas não consegui evitar, e se eu teria apenas uma parte daquilo, mesmo que pouco, não poderia fazer nada, se não ir.
Pegamos a estrada quando o sol parecia mais quente e Forte do que nunca e pela primeira vez eu quis ter um carro melhor, mais moderno que possuísse pelo menos um ar-condicionado. Eu nunca me importei com isso, gostava de carros antigos e aprendi a lidar com a minha picape como se fizesse parte da minha família, porém levar Millie dentro dela naquele momento me fez me sentir muito desconfortável.
Quer dizer, ela com certeza era acostumada a andar em conversíveis ou carros esporte daqueles blindados com todo conforto possivel e de repente estar dentro de uma picape muito mais velha do que ela poderia muito bem ser uma tortura.
No entanto Millie parecia a vontade lá dentro. Com os vidros abaixados o vento entrava e balançava seus cabelos enquanto ela escolhia uma estação de rádio onde a música The lazy song, do Bruno Mars tocava. Claro que eu também não tinha o melhor equipamento de som, mas ainda assim a acústica do carro ajudava a música reverberar mais alto.
Demorou cerca de vinte minutos para que chegássemos ao outro lado do rio, durante todo o caminho eu olhava para os lados atento a presença de qualquer pessoa que pudesse nos ver, porém a estrada estava vazia e além de nós só havia um rastro denso de poeira a nossas costas.
A outra margem era cheia de árvores e a grama quase alta demais, porém era bem mais confortável do que do que do outro lado e as plantas altas quase impediam que o sol nos torrasse ali. Além disso, não havia sinal de outras pessoas, o que para mim foi realmente um alívio.
Millie não esperou nem mesmo meia hora para decidir tirar o vestido floral que usava e experimentar a água da margem.
Me perguntei quantos pares de biquíni ela possuía, por que cada vez usava um diferente do outro e desta vez a escolha foi um amarelo fosco mais puxado para um tom mostarda.
Se isso fosse possível eu diria que todas as cores ficavam bonitas nela, mas aquele ainda mais.
Com passos precisos, Millie chegou rapidamente em uma parte que a água cobria seu busto e em seguida mergulhou fundo no rio. Eu estava começando a pensar que talvez ela tivesse algum vício em água partindo do ponto que ela tinha uma quantidade inifinta de biquínis e como passava o tempo na piscina. Demorei esperando que ela submergisse na água outra vez para que eu pudesse entrar.
A troca da calça por uma bermuda não era algo que eu estava acostumado a fazer, mas valia o esforço.
Nós nadamos um ao lado do outro, indo até a parte mais funda depois voltando ao raso, subindo ocasionalmente para respirar e nos beijar. Cada beijo era diferente, e eu sei que é clichê falar isso, mas é como se cada vez que fizéssemos aquilo fossem despertadas novas sensações e isso só me fazia querer mais, como se não fosse o suficiente.
Quando finalmente saímos da água estava quase escurecendo apesar de ser cedo. Ali não havia postes nem eletricidade, o que fazia com que parecesse muito tarde. No entanto, eu não queria ir embora para casa, e esse pensamento me levou a discernir que minha vontade não era apenas de não voltar para a casa de David, mas sim para a minha própria que era o que eu faria dali a dois dias. Eu não queria ir embora. Não queria que acabasse. E a agonia de pensar sobre aquilo foi mais forte do que todas as outras vezes.
Millie deitou sobre a grama mirando a luz da lua que beijava sua pele bronzeada. Sob o sol ela era linda, mas sob a lua era simplesmente divina, quase ao ponto de não parecer real.
Me deitei ao seu lado em silêncio e comecei a observar as estrelas. Lembrei do comentário que eu havia feito no vídeo dela, aquela parte específica em que disse que a luz das estrelas não se comparavam com o brilho dos olhos dela.
Virei meu rosto para encara-la apenas para comprovar que eu estava certo, que não tinha sido apenas um lapso momentâneo que havia me feito fazer aquela comparação. E eu estava realmente dizendo a verdade. Havia algo naqueles olhos que era mil vezes mais bonito do que qualquer coisa que eu já tinha visto.
Devo ter ficado um grande tempo calado apenas a olhando como um psicopata, pois Millie sorriu de uma forma estranha.
-No que você está pensando? -Ela perguntou franzindo o cenho.
Em como seus olhos são lindos.
Era o que eu deveria ter respondido, mas ao invés disso apenas limpei a garganta e dei de ombros.
-Em nada. Especificamente.
Millie fez uma expressão cética, mas não insistiu no tópico, para meu alívio.
-Vamos fazer um jogo. -Sugeriu pressionando os lábios juntos.
Foi a minha vez de ficar incrédulo.
-Da última vez que fizemos um jogo não deu muito certo.
De recordação, havia na minha mente a imagem dela beijando Louis e isso era algo que eu realmente não queria pensar.
Millie balançou a cabeça, como se tivesse compartilhando da minha mesma lembrança. Depois virou o corpo sustentando a cabeça sobre o cotovelo
-Um jogo diferente, sem desafios, apenas verdades.
Eu engoli em seco. Verdades para mim eram um verdadeiro desafio.
-Não sei como se joga assim. -Falei desviando o olhar para que ela não percebesse meu incômodo.
Obviamente não foi o que aconteceu e Millie insistiu.
-Por favor, não precisamos entrar em detalhes, podemos somente falar por cima. -Ela exalou o ar. -Eu quero saber sobre você.
Eu temia que aquilo fosse acontecer algum dia, porém não estava preparado para ter aquela conversa, não naquele momento, não quando eu me sentia tão bem. Com certeza, verdades estragariam tudo.
Hesitei e peguei meus óculos que estavam jogados no chão, meio como se eles fossem encobrir o meu rosto.
-O que você quer saber? -Me forcei a perguntar e coloquei as mãos para trás da cabeça fingindo estar avontade.
Millie nem se quer precisou pensar.
-Como foi a sua primeira vez?
Eu precisei olhar para ela para saber se tinha sido real ou uma brincadeira. Ela estava séria então era de fato o que queria saber. Minha mente divagou, voltando para quando eu tinha dezesseis anos, muitos hormônios e um coração partido. Não havia nenhuma outra palavra para descrever o momento senão:
-Esquisita.
Millie rolou os olhos.
-Só isso?
-Sim. Você disse que não precisávamos entrar em detalhes. -Usei suas próprias e Millie socou de leve meu ombro.
-Mas a primeira vez de todo mundo é esquisita, essa não é uma resposta valida.
Droga, ela tinha uma resposta para tudo.
-Esta bem. -Eu enchi as bochechas de ar. -Foi... Legal.
Claramente também não era o que ela queria saber, mas eu não tinha mais nada para falar. Sophia foi a única garota com a qual eu tinha tido todas as experiências sexuais então eu não sabia exatamente como definir aquilo. Era bom. Só. Mas dizer que sexo é bom não era exatamente um segredo para ninguém.
-A minha foi um desastre. -Ela murmurou e cobriu o rosto com a mão. -Tinha esse cara, ele era apressado e durou menos que quinze minutos. Er.. nem gosto de lembrar.
Ela fez uma careta reprovatoria. Eu ri, mas ao mesmo tempo não queria fazer aquilo. Garotas costumam ter uma grande expectativa sobre primeira vez, ou não?
-Você não o amava? -A pergunta escapuliu antes que eu tivesse pensado sobre ela.
Millie mexeu a cabeça para trás como se eu tivesse lhe disparado um soco.
-Não. -Ela disse praticamente com a boca cheia. -Eu acho que nunca amei ninguém, na verdade.
-Ah, não. Fala sério. -Eu falei incrédulo. Eu não sabia muita coisa sobre a vida dela, mas já tinha tido conhecimento de que existia um ex namorado. -E o tal de Jacob?
Eu não sabia quem era, porém o nome me veio na memória quando lembrei de alguém comentando na época. Millie literalmente quase vomitou.
-Oh por favor não fale esse nome nunca mais quando estiver perto de mim. -Ela cobriu os olhos. -Aquele desgraçado me traiu tanto que eu devo colecionar uma parede completa de pares de chifres com ordem numérica, alfabética, cor e cronológica.
Apesar de ter dito cada palavra com um pouco de mágoa, ela estava sorrindo no final.
Que tipo de cara tem coragem de fazer isso?
-Desculpe. Não falo mais. -Eu respondi, sentindo minha boca amargar com o pensamento
Porém aquilo também foi uma surpresa. Era verdade então que ela nunca foi apaixonada por ninguém?
-E você? Já amou uma pessoa? -Ela dispersou meus pensamentos.
Um grande alerta de Pânico surgiu na minha visão ao ouvir aquela pergunta. Teria sido mais fácil responder um livro inteiro de equações ou simplesmente morrer. Não era o melhor momento para Susan vir na conversa e eu poderia mentir, mas nunca fui muito bom em fazer isso, em esconder sim, mentir não. Ainda mais quando ficava claro na minha expressão o horror que aquele assunto me causava.
-Sim. -A resposta saiu mais como um engasgo.
Não me pergunte quem. Não me pergunte quem.
-Por que não deu certo? -Foi a pergunta dela.
Chegamos ao ponto do empasse. Eu não queria mentir, mas dizer os motivos pelos quais Susan e eu não demos certo também não era uma opção. Minhas mãos estavam suando e eu raspei as palmas sobre a grama. Millie estava nitidamente tensa e ansiando por uma resposta ao mesmo tempo.
-Muita coisa. Tempo, distância, pessoas. A lista é infinita. -Eu disse sem tomar um fôlego entre uma palavra e outra.
Eu poderia dizer: por causa da nossa diferença de idade, por ela casada com um lunático abusivo, por ter um filho dele, por ela ter ido embora, por não fazer ideia de onde ela está. Porém dizer que a lista era infinita abrangia tudo, pelo menos era o que eu esperava.
Millie assentiu com os lábios fechados, pensativa. Depois ajeitou o cabelo molhado para trás da orelha.
-E você ainda a ama. -Dessa vez não foi uma pergunta. Era uma simples afirmação.
Eu amava, com certeza, porém me sentia diferente agora. Tinha se passado muito tempo e embora eu quisesse reencontra-la aquele pensamento me dava mais pânico do que amor de fato.
-As coisa não são simples assim. Não é tudo preto no branco. -Eu disse me virando para encara-la e eu não deveria ter feito isso, pois as palavras foram escorregando sem nexo da minha boca quando olhei em seus olhos. -Não vai fazer sentido, mas é como se fosse uma história mal resolvida, algo que está borrado e incompleto. Ou como quando você risca um papel com um lápis usando muita força e mesmo quando usa uma borracha para apagar, o papel nunca vai voltar a ser limpo e transparente, sempre vão haver marcas e isso vai ser visível.
Millie pestanejou, absorvendo minhas palavras. Para mim fazia sentido e talvez para ela também fez pois seus olhos brilharam com uma espécie reconhecível de pavor.
-E você quer isso, não quer? Quer dizer, você quer completar os espaços e resolver essa história? -Sua voz tinha se tornado um susrrurro.
As minhas próximas palavras me pegaram de surpresa.
-Não. Eu não quero. Existe uma forma de fazer com que essas marcas sumam e é cobrindo-as com outra coisa.
Tentar apagar Susan da minha vida era inútil, mas eu podia colocar outra coisa em seu lugar, outra pessoa.
Escrever algo bonito por cima das marcas que Susan havia deixado em mim.
Millie captou minhas palavras com igual entendimento, pois se tinha uma coisa que ela era, era perceptiva e não demorou meio segundo para que se atirasse em meus braços e me beijasse em resposta. Como se silenciosamente estivesse se doando para mim, como se quisesse me dizer "eu posso fazer isso." E sim, eu também queria.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.