História The Galaxy - Ingênuo.

— You know, I’m sensitive.
It’s really hard on you.
Blue — Bolbbalgan4

Durante o caminho para o meu seguro e estimado lar, o qual felizmente se encontra isolado de todo e qualquer barulho emitido por uma específica fonte sonora indesejada — leia-se: a voz estridente da minha vizinha tagarela —, estive propositalmente mais quieto. E é claro que a doida não pôde deixar de notar. No fim das contas, o que se sucedeu foi que perguntas e mais perguntas foram despejadas sobre mim sem dó nem piedade até que eu finalmente me visse a salvo ao passar pela porta da residência Jeon.

Ufa.

Francamente? Achei que morreria. Entretanto, por um milagre divino, isso não aconteceu — então, vamos logo ao que nos interessa.

Já em casa, o fato de eu desperdiçar longos minutos pensando nos acontecimentos do dia faz com que eu inicie uma série de repreensões mentais por conta disso. Contudo, após refletir sobre o assunto e sobre as inconveniências que as atitudes recentes da garota vêm me causando, decido: eu estou imerso demais. Não me pergunte como. E, acredite, eu me odeio de verdade por isso, só que... Não há como negar. Porque seja através de suas brincadeiras ou de suas gracinhas, ou... Ou até mesmo por causa daquele sapo imbecil, eu me deixei levar. Envolvi-me em suas maluquices, quando tudo o que deveria ter feito era ter ficado quieto. Agora, até respondê-la com uma de minhas grosserias me soa perigoso. Mesmo deitado em minha cama — o meu consagrado refúgio —, não consigo parar de pensar na simulação extraterrestre idiota da qual ela falara e no que ela estaria fazendo àquela hora.

É aí que eu percebo que estou com sérios problemas.

Eu fiquei... Corado. Duas vezes em dois dias. Não me lembro de outra vez em que isso me aconteceu — não em função de algo que não fosse raiva —, e eu também não achei que fosse acontecer algum dia. Mas eu tenho certeza de uma coisa.

Não quero que aconteça de novo.

— Jeon? — mamãe me chama, do andar de baixo. Ah, não, mamãe. Deixe-me em paz, por favor. Não quero ser obrigado a te xingar. — Jeon, meu amor, desça aqui! Um amigo seu quer falar com você. — ela ignora meus protestos mentais e continua a grasnar.

Droga.

Levanto-me da cama, calço meus chinelos e desço as escadas de maneira preguiçosa. Quem será o petulante?, penso, embora não tenha de ficar com a dúvida por muito tempo.

No instante em que vejo Jimin, ela é sanada de pronto.

— Sojin ahjumma, pode nos dar licença, por favor? — minha mãe assente ao pedido do rapaz. — Obrigado. — exibe seu típico sorriso galanteador à mais velha, a qual deixa o cômodo segundos depois.

— Você não me engana sorrindo desse jeito, Park Jimin. — falo, de cara amarrada. — Desembucha, pilantra.

— Isso é jeito de recepcionar seu amigo e colega de time, Jungkookie-ssi? — arqueia uma sobrancelha. — Eu ia te fazer uma proposta, mas... Agora, estou repensando. Não devia ter sido tão mal-educado — diz.

Reviro meus olhos.

— Fala logo — rosno. — Ou então, pode sair da minha casa. Não tô com paciência nenhuma hoje, Jimin.

O garoto cruza os braços.

— Mas já brigou com a namorada, Jeon? — o rapaz provoca. — Não, não, isso não é bom. — nega com a cabeça. — Você tem que estar bem disposto pro que faremos hoje à noite — sorri de canto.

Ah, não.

O que é que esse idiota está querendo aprontar?

— Nós não faremos nada hoje à noite, Jimin. Nada que envolva álcool, drogas ou sprays. — sento-me no sofá. — Tenho compromisso.

Jimin, apossando-se de um banquinho perto de mim, imita meu gesto.

— Compromisso? — franze o cenho. — Que compromisso? — ele pensa por alguns instantes. — Ah, Kookie-ssi... Não me diga que tem planos com a novata? — abre um sorriso sugestivo. — Eu devia saber... Jungkookie vai namorar esta noite — coloca as mãos nas próprias bochechas, em uma falha tentativa de parecer... Fofo.

Que vontade de vomitar.

— Não é nada disso, seu otário — pego a revista que repousa sobre o braço do sofá e a atiro no garoto, que se esquiva aos risos. — Na verdade, eu... Não quero ir. É só isso. — minto. De repente, usar a desculpa batida do “compromisso” não me pareceu mais uma ideia tão boa, mesmo que... Seja verdade. Eu realmente tenho um compromisso nessa noite, e ele definitivamente tem a ver com a novata. — Não tô a fim de, hã... Fazer coisas ilegais hoje. — dou de ombros. — Agora, por favor, vá embora. — aponto na direção da porta. — Eu tenho mais com o que me ocupar, Jimin.

— O quê? — ele indaga. — Ah, fala sério, Jungkook, não acredito que você tá fazendo corpo mole — sorri. — Vamos, cara. Você não tem noção das coisas que consegui pra hoj...

— Não. — corto-o no meio de sua frase. — Você não entendeu, Jimin? Eu vou falar mais devagar pra ver se você entende. — profiro, ríspido. Descobri, agora, que minha paciência com o garoto acabou de se esgotar. — Vá. Embora. Daqui.

Jimin me fita por alguns instantes. Seu semblante, antes tão complacente, transborda incredulidade diante da minha reação. Eu não desvio em momento algum meus olhos dos seus, e o rapaz, após me estudar por algum tempo — ora esboçando sinais de fúria, ora aparentando divertimento —, simplesmente dá um riso soprado.

Ah, Jimin, não se engane.

Eu sou bem mais frio do que você pode imaginar.

— Tá. — responde, simplista. — Babaca.

Ditas essas palavras, o rapaz enfim se despede de minha casa — e eu posso, mais uma vez, respirar sossegado. Será que Jimin acha que me ofendeu falando daquela forma? Oh, tão ingênuo. Eu estou torcendo muito para que ele não ache que eu me importo, porque, bem, eu não me importo. Eu já disse isso outras vezes, mas não vejo problema em repetir.

Eu não me importo com nada. Nem com ninguém. Nem um pouco. Eu só faço o que eu quero, quando quero e como quero. E, vão por mim, eu não queria ir nesse jantar idiota. Acontece que há forças maiores envolvidas — culpem minha mãe por isso —, e eu estou muito curioso pra saber qual será a sensação de ludibriar mãe e filha com minha simpatia dissimulada.

Acho que... Será divertido.

— Mas o Jimin já foi, meu filho? — mamãe aparece na passagem da sala pra cozinha. Ela carrega um prato nas mãos e um pano velho no ombro. — Que pena... Eu ia pedir pra ele te ajudar a se arrumar pra hoje à noite — Credo, mamãe. Não repita essas coisas. — O que foi que aconteceu? — pergunta.

— Vai saber, mamãe. — finjo-me de desentendido. — Vai saber.