História There Is Love? - Papai, eu te amo

Eu não consegui dormi essa noite. Fiquei me movendo de um lado para o outro da cama sem parar e quando percebi que poderia acordar a Belle a qualquer momento, eu me movi para a poltrona que ficava ao lado oposto da cama.

Desde o ultimato de Killian eu fingi estar tudo bem, que tudo estava "ok" e que eu deveria apenas deixar fluir, mas eu não consegui. Desde que entrei novamente na casa, uma chuva de emoções e recordações me atingiram e eu tentei arduamente não demonstrar para ninguém, mas eu sei que a Tara percebeu. Ela me conhece muito bem.

Eu estava enganando a mim mesma pensando que no momento em que eu colocasse os meus pés na casa que as ações e pensamento do Killian iria mudar, mas não mudou. Ele desapareceu por todo tempo em que não estava no meu quarto e isso fazia eu me sentir ferida, magoada e machucada. 

Eu deveria saber melhor que sua raiva não passaria em um piscar de olhos só porque eu e a Belle viemos pra cá. Eu sei que levará um longo caminho para isso acontecer, mas eu só esperava que ele aparecesse nem que fosse para desejar a Isabelle um "boa noite", e isso não aconteceu. Então eu fiquei com raiva dele me perguntando como ele pôde fazer isso com ela.

Eu não aguentava ficar mais tempo no quarto pensando, remoendo coisas e ficando com raiva, então decidi sair do quarto e começar a cozinhar. Era uma coisa que me acalmava, algo que herdei da minha mãe.

A casa estava silenciosa e eu estava grata por isso. Era muito cedo de qualquer modo. Eu fui para cozinha e cozinhei. Cozinhei mais do que eu poderia comer, do que qualquer um poderia comer. E em algum momento eu até tive que ir ao supermercado que ficava aberto vinte quatro horas para comprar alguns suprimentos que precisava e faltava. Eu perdi completamente a noção do tempo até Caleb surgir na cozinha.

- Pelo que vejo você não conseguiu dormir. E eu não consegui porque o que quer que você esteja fazendo, tem um cheiro muito bom.

- Então sente-se.

Ele se senta e eu coloco ovos com bacon, bolo, panqueca, waffles, torradas, salada de fruta, suco, café e bagel na mesa.

- Deixe-me adivinha... é por causa do meu irmão.

- Em parte.

- Você sabe... ele só está de cabeça quente, é muito para assimilar.

- Eu tenho ouvido muito isso. - falo, me movendo pela cozinha e me encostando no balcão. - Eu esperava que ele ao menos fosse desejar uma boa noite para a filha, sabe, apenas isso. Ou que parasse para me ouvir. Mas é do Killian que estamos falando, eu já deveria saber que ele não é o mesmo de sempre.

- É... você se foi.

- Eu precisei ir, Caleb.

- Eu entendo, de verdade, mas Killian não ver dessa forma. Ele está vendo isso tudo como se fosse uma traição sua. Você não esteve aqui para vê-lo como ele ficou depois que você se foi. Foi ruim, Julie. Muito ruim.

- Isso serve para mim também. - Eu suspiro e afasto uma cadeira para que eu possa me sentar. - Eu sofri bastante, chorei noites e dias, perdi alguns quilos e quase perdi a Belle por isso. Não foi fácil ficar longe dele, Caleb. Não foi fácil ficar longe de todos vocês. Mas eu não podia deixar que vocês se machucassem e então eu fui embora. Eu precisava fazer isso.

- Você quase perdeu a Belle? - ele pergunta logo após tomar um gole do seu café.

- Sim. Ela nasceu com oito meses... teve que ficar internada porque não conseguia respirar direito... mas ela me mostrou ser tão forte, Caleb, tão forte que... - eu suspiro, tentando controlar minhas emoções. Foi um momento difícil e eu só tinha a Tara e o Albert para me apoiar, e ainda assim eu me sentia sozinha. - Ela tem a força dele. Ela é toda ele, sabe? Desde a aparência física quanto a aparência interior. Eu amo aquela menina e faria qualquer coisa por ela. Eu só espero que Killian entenda isso.

- Ele entende, Julie.

Pouco depois o barulho de uma porta se abrindo chama a nossa atenção e nos viramos para ver Killian levar uma mulher bem alta e cheia de curvas até a porta e se despedir dela.

- Você só pode estar de brincadeira comigo. - sussurro, mas o Caleb ouve e me da um olhar triste, eu apenas ignoro e finjo que não vi e não falei nada.

Killian não me cumprimenta quando se senta a mesa, muito menos diz um bom dia, o que me faz pensar que sua raiva ainda não passou. Todos nós ficamos em silêncio até a campainha tocar, e eu me levanto para atender a porta pronta para expulsar qualquer outra mulher que aparecer, mas me surpreendo quando vejo o Albert na porta.

- Você chegou mais cedo do que eu esperava. - falo lhe abraçando e dando espaço para que ele entrasse na casa.

- Mas você já está acordada, então presumo que não dormiu muito bem.

- Você tem que parar com esse seu lance de me ler perfeitamente, parece até o papai. - falo sorrindo enquanto andamos até a cozinha. - Venha, vamos tomar café da manhã e depois você me conta tudo que descobriu.

- Bom dia. - Albert cumprimenta Caleb e Killian quando sentamos a mesa.

- Você já os conhece, mas não pessoalmente. Esses são Caleb e Killian. Este é o Albert, era amigo do papai. - falo e os dois assentem cumprimentando o Albert.

- A Julie nos contou rapidamente ontem que você descobriu que o cara do hotel tinha uma ligação com o Mouse... - Caleb fala e Albert o encara um pouco confuso.

- Mouse?

- É o Donovan, Albert. Esse é o outro nome que o Donovan é conhecido por aqui..

- Sim, certo. Eu esqueci desse pequeno detalhe. Obrigado. - fala quando o sirvo uma xícara de café.

- Então, o que você descobriu? - pergunto curiosa.

- Foi um pouco difícil de conseguir essas respostas, mas ao que tudo indica o Donovan soube que você estava na cidade e mandou aquele homem que eu descobrir se chamar Frederic, comprar algo e levar até o hotel, até você.

- Eu não estou surpreso com isso. - Caleb fala e eu assenti concordando, da mesma forma que concordei com a Tara ontem a noite quando ela disse a mesma frase.

- Então o que era esse presente?

- Eu não acho que você deva saber. - Albert diz me olhando parecendo preocupado.

- Besteira. Você sabe que eu só descansarei até souber o que era o presente. - falo e mordo um pedaço de bolo.

- Tudo bem... ao que parece era uma boneca com as roupas rasgadas, mas também tinha um cartão... - Eu espero que ele continue mas ele parece não querer fazer isso. Então eu o forço a dizer.

- Vamos, Albert, me diga o que tinha no cartão.

- Julie Anne...

- Eu não vou falar de novo. O que tinha no cartão?

Ele respira fundo e por fim, decide falar.

- "Primeiro foi com você, depois será com sua filha. Mal posso esperar."

Assim que as palavras saem da sua boca eu corro até o banheiro e coloco tudo que comi no café da manhã pra fora. Eu estava enojada, enjoada e com raiva.

Volto para cozinha algum tempo depois e encontro o Albert e o Caleb conversando, o que me deixa curiosa para saber qual o assunto. Ou melhor, saber detalhes sobre o que eles conversavam.

- Onde está Killian? - pergunto quando não o vejo mais.

- Ele disse que precisava ir para a academia e se mandou. Você está bem? - Caleb me pergunta parecendo bastante preocupado.

- Ah, ok. Não, não estou bem. Só ficarei bem quando o desgraçado morrer.

- Mamãe....

Olho para trás e vejo a Isabelle com cara de sono e vou até ela.

E com a minha filha em meus braços eu me forço a esquecer de tudo.

Só ela importa.

*****

- O jantar estava incrível, Julie. - Kim comenta e eu sorrio.

- Verdade, você parece cozinhar ainda melhor do que antes. - Caleb fala enquanto me ajuda a colocar a louça para lavar.

- Obrigada pessoal, foi apenas prática.

- Tudo bem, deixe-me que eu lavo a louça, você precisa descansar. - Tara diz e eu suspiro, sabendo exatamente o que ela quer dizer.

Amanhã era o dia em que eu teria que enfrentar o Donovan perante a justiça e a sociedade. Não vou negar e dizer que não estou com medo, porque estou. Toda essa situação é estressante e me deixa com os nervos a flor da pele.

Quase todos nós teremos que ir até o tribunal falar e reviver aquele terrível dia, e eu não sei como me sentir com tudo isso, principalmente com o que pode ou não acontecer.

- Tudo bem, mocinha. Já brincou tempo o suficiente com todo mundo, agora é hora de dormir. - falo para a Isabelle que está sentada no chão brincando com o David e Killian.

Killian tinha chegado cedo do seu trabalho e trouxe junto com ele o David - que descobri trabalharem juntos. A Kim já estava aqui quando eles chegaram, e acabou que todos jantamos juntos. Killian ainda não falava comigo.

- Mas mamãe...

- Mas nada, Belle. Amanhã será um dia cheio e precisamos dormir. - falo com a voz calma, a pegando nos braços assim que ela ameaça abrir um berreiro. É quase sempre assim na hora de dormir. - A mamãe promete que amanhã deixa você dormir tarde. Agora se despeça de todos.

Ela faz como lhe foi dito, mas acaba me surpreendendo ao falar com Killian.

- Você conta uma "histolinha" "pla" eu "domi"?

- Você quer que eu conte uma historinha? - Killian pergunta a encarando enquanto ela segura sua mão após eu tê-la colocado no chão para se despedir de todos.

- Sim. Você e a mamãe.

- Mas eu... bem... eu não sei contar historinha, princesa.

- A mamãe te ensina, não é mamãe?

Ela me encara com aqueles grandes olhos brilhantes e eu não sei o que fazer.

- Filha, seu pai deve estar cansado, outro dia ele conta uma historinha pra você. - falo, me aproximando dela.

- "Po favo". - ela encara Killian e ele suspira, deixando claro que ele tinha perdido aquela batalha.

- Tudo bem, eu vou contar uma historinha pra você.

Ela sorri e desajeitadamente tenta arrastar Killian para o quarto. Eu sigo atrás deles, bem a tempo de ver a Belle pegando um livro e entregando para o pai.

- Você quer que eu leia A Bela e a Fera?

- Sim. Ela tem o cabelo e olhos iguais ao meu, a mamãe me disse.

- Tudo bem. - Killian fala visivelmente sem saber o que dizer e eu vou até a Belle, a colocando-a na cama e cobrindo seu corpo por causa do frio.

- Você lê a fera. - Belle diz olhando para o pai e ele sorri assentindo, ainda sem saber o que fazer.

Pego o livro da sua mão e sento na cama começando a ler, Killian segue o meu exemplo e senta ao meu lado tão perto que as nossas pernas se tocam algumas vezes enquanto lemos a história.

- E fim. - falamos ao mesmo tempo e a Isabelle abre um enorme sorriso.

- Agora que a história acabou, você precisa dormir. Boa noite filha, eu amo você. - falo, beijando a testa da Belle.

- Boa noite, mamãe, eu também amo você.

- Boa noite, princesa, durma bem. - Killian diz fazendo o mesmo que fiz a segundos atrás e a Belle agarra o seu pescoço.

- Boa noite, papai. Eu te amo.

Encaro Killian e ele parece ter dificuldades para respirar. Seus olhos brilham com lágrimas não derramadas quando me encara. Saímos do quarto e ele soca a parede do corredor capturando os olhares dos nossos amigos que continuavam na sala. O vejo respirar fundo várias vezes antes de uma única lágrima cair dos seus olhos, e ele ir embora.

- O que foi isso? - Calbe pergunta estranhando o comportamento do irmão.

- A Isabelle o chamou de pai e disse que o amava. - falo.

Respiro fundo e sem pensar por muito tempo sigo o mesmo caminho em que Killian fez a quase dois minutos atrás.

O encontro na parte de trás da casa socando sem parar um saco de pancada vermelho que ele usava - e parece ainda usar - para seu treinamento e para relaxar quando precisa diminuir o stress.

Eu me aproximo sem falar nada e seguro o saco enquanto ele desfere soco atrás de soco. Seus olhos ainda brilham, sinal de que ainda está balançado com o momento anterior com a nossa filha, e eu continuo em silêncio sabendo que ele precisa de tempo para digerir o que aconteceu.

Seus socos parecem se intensificar e eu não me importo se me machucarei nesse processo. Ficamos assim por alguns minutos e ainda consigo perceber a dor em seus olhos e decido por fim falar.

- Minha vez.

Ele segura o saco e eu do meu jeito um pouco torto, já que faz anos que não faço isso, e começo a socar o saco. Me surpreende ver que ele não me empurrou para ir embora, sinal de que ele ainda está emotivo o suficiente para me deixar ficar sem uma luta.

- Eu desejei todos os dias que você estivesse lá... - começo - Eu queria que você estivesse lá quando eu descobri que estava grávida, queria que você estivesse lá na primeira vez que fiz uma ultrassonografia, eu queria que você estivesse lá no dia que ouvi o coração da nossa filha bater pela primeira vez e ter se emocionado junto comigo. Eu queria que você estivesse lá comigo em todas as minhas consultas e que me ajudasse a montar o quarto da Isabelle...

Respiro fundo e continuo a socar enquanto falo, Killian me ouve atentamente.

- Eu queria que você estivesse do meu lado quando a Belle nasceu, que tivesse presenciado o parto e ter visto a nossa pequena vindo a mundo. Eu queria que você fosse o primeiro a segurá-la nos braços e beijado suas bochechas fofinhas. Eu queria que você estivesse lá nas noites que fiquei em claro sem dormir porque ela estava tendo cólicas e eu não sabia muito bem como acalma-la. Eu queria que você estivesse lá quando os seus primeiros dentes começaram a nascer, eu queria que você estivesse lá quando a Belle engatinhou e queria que você estivesse lá quando ela me chamou de mamãe pela primeira vez, porque eu sei que se você estivesse lá ela chamaria por você e não por mim.

Soco o saco ainda mais forte pela última vez e respiro fundo, secando o suor da minha testa.

- Eu queria que você estivesse lá e participasse de todos os momentos da Isabelle. Eu não queria que você perdesse absolutamente nada. Mas isso não aconteceu porque eu tive que proteger vocês e principalmente ela. E para proteger a minha filha, Killian, eu faria tudo de novo.

O encaro mais uma vez e vou embora, deixando-o parado no mesmo lugar.