/ Kathie /
Algo de estranho se passa. Continuo em cima de William, todo o meu peso está em cima de si, tenho as presas de fora e uma enorme vontade de acabar, definitivamente com a vida do desgraçado. Se ele se fez de morto este tempo todo, não faz mal que realmente morra! Contudo, o homem deitado no chão não expressa nenhuma reação com a minha atitude violenta, não vejo medo nos seus olhos, está relaxado e vejo no seu rosto uma certa serenidade. É como se soubesse que merece isto. E merece.
E de repende, perco todos os meus sentidos. Deixo de ver o seu rosto ou qualquer outra coisa; deixo de ouvir a respiração calma de William, os gritos de todos ou qualquer coisa incluindo o coração descompensado de Matt e Emily; deixo de sentir as minhas mãos, os meus pés ou até mesmo o meu corpo; deixo de sentir sabor do sangue recentemente ingerido e da raiva que sinto; e deixo de conseguir cheirar o que me rodeia, os lobos, a colónia de William, o medo de Matt...
Apercebo-me então do que estás a acontecer.
Merda Louis, não tens de te intrometer! Solto um grito, amaldiçoando Louis Tomlinson e o seu maldito truque!
Perco a noção do que me está a acontecer, sei que me estou a mexer, porque quero mexer-me e estou a comandar isso ao meu cérebro, mas não sinto nada! É como se estivesse a flutuar, apenas eu e os meus pensamentos e vontades, assim como me sinto quando me encontro entre o mundo dos mortos e dos vivos.
Comeco a gritar, desesperada. Imploro a Louis para parar, para me devolver os sentidos. Mas nada… Não acontece nada…
/ Justin /
Queria estar junto de Kathie quando ela souber que na verdade o seu pai está vivo. É um momento importante para a vida dela, assim como para o seu irmão, e eu devia estar lá com ela. Não sei ao certo o que ela vai sentir… Não faço ideia, não consigo imaginar qual possa ser a sua ou a reação de qualquer pessoa em saber ao fim de dezoito anos da sua vida que afinal o pai que julgava morto, na verdade está muito bem vivo.
E agora com Kathie assim, sem qualquer pingo de emoção, tenho cada vez mais dúvidas de que a sua reação vá ser boa… mas talvez esteja errado.
Quero ter a esperança que as coisas não acontecem por acaso. Que o facto de William ter aparecido bem na hora em que o Jonathan ia arrancar o coração da Kathie não foi coincidência. Estava destinado o seu reaparecimento naquele momento, nesta situação.
A Emily tem a certeza que Kathie vai recuperar a humanidade quando souber que o pai está vivo, visto que os vampiros estão fartos de dizer que só um acontecimento muito impactante é que pode ajudar a trazer Kathie de volta, tornando-se assim a sua âncora. Eu quero que Kathie volte ao seu estado normal e espero que o palpite de Emily esteja certo, apesar disso, queria ser eu a trazê-la de volta mas depois do que aconteceu ontem à noite, tenho cada vez menos certeza de que vou ser eu a fazê-lo.
O nosso Imprinting é a maior ligação afetiva, espiritual, ou o que quiserem chamar, do mundo e ele falhou… Por momentos jurei ter visto um lampeijo de emoção, da minha Kathie, naqueles olhos que tão bem conheço, chocolate e caramelo… mas rapidamente essa emoção desapareceu. Começo a ficar desesperado, sinto-me inútil, sem forças, sem saber o que fazer…
Nem eu nem a minha matilha, o meu pai, a minha mãe, ninguém sabe o que estou a passar, o que estou realmente a sentir. Este desespero que me consome dia e noite desde que Kathie voltou. Ninguém sabe como lidar comigo ou como me ajudar. A minha mãe apenas abraça-me e diz-me que tenho de ser forte por Kathie, que tenho de reunir todas as minha forças, o meu amor por Kathie, e fazer de tudo para a ajudar a sair deste poço onde entrou. Se as coisas fossem assim tão fáceis… Lidar com a Kathie neste estado é o maior desafio que já encontrei na vida. É um misto de emoções das quais não sei lidar…
E não sei se consigo ultrapassar ou sequer enfrentar este desafio, esta nova Kathie.
Ontem à noite ela teve tanta facilidade em me manipular. Por minutos, ao deparar-me com as suas reações físicas ao meu toque, aos meu beijos… Julguei que estava a conseguir ter algum progresso. Como me enganei! Ao deparar-me com aqueels olhos frios, aquele sorriso malvado num rosto tão angelical, senti-me de novo perdido e desesperado… Se o Imprintg que temos não é a sua âncora… Se este falha de maneira tão desgraçada… Que merda a vai trazer de volta…?!
O meu pai, o alfa da matilha, já contactou com vários outros alfas do mundo. Está à procura de outro Lincantropo que já tivesse passado por uma situação destas, mas não existe ninguém. Vamos ser sinceros, a probabilidade de ocorrer um Imprinting com uma humana que aos dezoito anos se torna também vampira é quase nula. O nosso caso é único, não há ninguém no mundo que já tenha passado por isto. Não há ninguém que nos possa ajudar.
- Ainda vais cavar um buraco no chão, a andar assim de um lado para o outro.
Escuto a voz de Zara, que está encostada a uma árvore. Estamos a poucos metros de distância da casa dos vampiros. Nenhum de nós gosta de estar no interior do covil do nosso maior inimigo, então quando surge oportunidade mantemo-nos o mais longe possível, mas também suficientemente perto para entrar caso algo aconteça.
Tudo isto é uma situação bizarra. Antes do desaparecimento de Kathie tinha imaginado como seria a casa dos vampiros, o lado deles da floresta. Pensei que fosse tudo obscuro deste lado, uma densa camada de nevoeiro a penumbrar pela floresta, humidade constante, animais bizarros como corvos, uma casa alta cosntruída num estilo gótico…
Todavia, tanto aqui como na reserva onde a matilha vive, o sol tem dificuldades em passar pelas nuvens mas ele existe e dá vida à floresta e aos animais que aqui vivem. A casa deles é moderna, repleta de janelas do chão ao teto… É uma arquitetura interessante e um pouco estranha para vampiros, visto que eles e o sol não se dão assim tão bem. Pelo que sei, apenas ficam mais fracos quando expostos ao sol, daí viverem na floresta e em Cambridge, onde raramente há sol. E ainda não vi nenhum corvo desde o novo acordo entre vampiros e lobisomens.
Quem diria que este lado seria tão semelhante como o nosso.
- Ela tem razão, andar de um lado para o outro não vai resolver nada. Acalma-te Drew.
Encaro Adam, que está junto de Zara. Quem são eles para me dizerem o que devo ou não parar de fazer? Logo a seguir ao alfa, eu sou o membro da alcateia mais importante porque sendo filho do alfa é por meu direito que seja o seu sucedor. Não devem falar assim comigo.
- Não me digam para me acalmar! Vocês nem ninguém sabem da vontade que tenho de entrar por ali a dentro e arrancá-la daquele covil. Tenho a certeza que na reserva, só nós, a poderíamos ajudar. Já passaram dois dias e os sugadores de sangue em nada conseguiram ajudar! E odeio que eles estejam a ajudar, tenho de ser eu a ajudá-la!
Os olhos de Zara arregalam-se com a minha atitude revoltada, estou irritando com eles por estarem constantemente a dizer-me o que fazer! Sou bem crescido para saber o que fazer ou não fazer! Merda, só queria estar bem longe disto tudo com Kathie nos meus braços, assim como planeamos e tentámos executar não fosse Jonathan encontrar-nos!
Ainda hoje revivo mil vezes aquele dia. Se não tivesse perdido tempo com aquele maldito garoto da bomba de gasolina e a porcaria do troco nada disto estaria a acontecer neste momento!
- Justin, o que se passa? – Zara pergunta, dando um pansso em frente, na minha direção. – Vais transformar-te se continuas assim.
Adam também avança na minha direção. E percebo que estou a perder o controlo, os meus músculos contraem-se violentamento, estou cego de raiva por um motivo estúpido. Eles só pediram para me acalmar, eu sei que eles têm razão, ando muito inquieto e impaciente, mais do que o normal. Tenho sempre as emoções ao flor da pele, especialmente a raiva, a agressividade que me consome e que puxa o meu lobo interior a vir ao de cima.
Apercebo-me que todo o meu corpo está a tremer. Escuto o meu joelho a estalar, a quebrar. E de seguida o oposto. Caio de joelhos no chão com um grito que se alastra pela floresta, com ambas as mãos enterradas na terra húmida fecho os olhos. Os meu cotovelos partem-se em direções opostas ao que é anatomicamente normal e solto um grunhido de dor. Estou a transformar-me, sem motivo nenhum. A dor da transformação é algo à qual já me habituei, mas transformar-me quando não quero é sempre mais dolorso que o normal.
Oiço Zara e Adam a tentarem acalmar-me, mas não se aproximam. Ambos sabem que é extremamente perigoso aproximarem-se de um lobo em transformação, perdemos um pouco da razão e podemos atacar mesmo não querendo.
O que se está a passar? Começo a tentar fazer o mesmo que os meus amigos, acalmar o lobo.
Está tudo bem. Não há motivo para saíres. A Kathie está bem, os teus amigos só te disseram para parares quieto, não há ameaça!
Mas a raiva é cega, sinto-a a percorrer o meu corpo, alimentando o meu corpo à transformação.
As minhas costas partem-se também, obrigando-me a curvá-las para trás, num arco perfeito. Os meus dedos abrem-se muito e sinto as minhas garras a aparecerem. Luto e tento tomar o controlo. Parece impossível!
E de repente, faz-se luz na minha mente. Ultrapassando a ira, o pensamento atravessa a minha consciência como um letreiro néon. Kathie. O que estou a sentir não são os meus sentimentos. São os sentimentos de Kathie! É ela que está com esta raiva cega, esta vontade assassina de matar alguém, de perder o controlo.
Com a consciência disto, respiro fundo e o meu lobo interior recolhe-se de novo apercebendo-se também das razões destes sentimentos repentinos. Tomando de novo o controlo de mim próprio, levanto-me e escuto os gritos que vêm do interior da casa dos vampiros. Ignorando o facto de grande parte da minha roupa estar rasgada, começo a correr até à casa, sem pensar muito no que estou prestes a fazer. Adam e Zara estão a trás de mim, já devem ter percebido o que está a acontecer.
Esta raiva… Nunca senti nada assim, nem quando sou realmente eu a sentir ira.
Começo a correr como nunca. Kathie está em perigo, se ela faz algo os vampiros podem virar-se contra ela e isso não vai acontecer, terão de passar por cima de mim primeiro.
Embato com o ombro na porta da casa e esta abre-se com um estrondo. Mesmo estando na minha forma humana, tenho três vezes mais força que um humano, então não preciso sequer de me esforçar muito. Aviso Zara e Adam para ficarem cá fora. Oiço gritos, coisas a partir e rapidamente giro o meu corpo na direção dos mesmos. Vêm da sala de estar, consigo cheirá-los a todos no seu interior.
O que os meus olhos vêm faz com que o meu corpo se detenha apenas por uns segundos. O Niall está a segurar com dificuldade em Kathie com ambos os braços à volta da sua cintura, a mesma está a gritar e a espernear como se não tivesse a noção das coisas que está a quebrar à sua volta. Zayn aparece do nada e segura as pernas de Kathie, que nem por isso para de se mover com força e raiva. Reparo que Matt quer aproximar-se mas Emily sussurra que é melhor não, que eles sabem lidar com ela. Então reparo num corpo deitado no chão, no meio da sala. William. Simon aproxima-se dele e ajuda-o a levantar-se. Rapidamente tudo faz sentido na minha cabeça.
- Louis Tomlinson eu vou-te matar!! – Kathie berra e eu olho para Louis.
Este está parado a um canto da sala, sério e com os olhos em Kathie. Ele está a fazer-lhe algo, não sei o quê, mas pela maneira como a Kathie está a agir… De forma tão estranha e louca. Parece que não vê nada à sua volta…
O meu corpo, até agora paralisado um pouco atrás da entrada da sala, começa a dar resposta aos meus comandos. É a minha vez de interferir. Emily vê-me, diz algo e tenta impedir-me mas não a escuto e aproximo-me doss vampiro que seguram Kathie e lhe dizem para se acalmar. Os outros vampiros mostram-me as presas devido à minha presença e proximidade, exceto Simon que se mete à frente de William, a protegê-lo.
Percebo a força extrema que os vampiros fazem para segurar Kathie. Fico enjoado com o simples facto de o Niall lhe estar a tocar. Eu sei muito bem as intenções que ele tem, os sentimentos que nutre por Kathie. A Kathie é minha, pertence-me. Ele não tem sequer o direito de lhe tocar.
Sem dar tempo de alguém sequer se pronunciar, primeiro empurro Zayn com um ombro livrando as pernas de Kathie que continuam a debater-se. Posteriormente, em segundos, faço o mesmo ao loiro mas com mais brusquidão preparando o braço livre para quando ele soltar Kathie.
Já nos meus braços, Kathie continua a mover-se agressivamente, mas abraço-a, reconfortando-a. Por não estarem à espera todos os vampiros olham para mim, alguns deles com surpresa, mas o Niall com um profundo ódio. Ele estava concentrado em impedir a Kathie de continuar a lutar então nem deu pela minha presença e apanhei-o desprevenido.
Apercebo-me que Kathie relaxou, foi preciso apenas uns segundos. Ajeito-a melhor nos meus braços, está mole e não consegue manter-se em pé ao que tenho de a abraçar com mais força.
- O que pensas que estás a fazer? – O vampiro loiro pergunta, com os dentes cerrados, assim como os seus pulsos.
Ela é minha, transmito pelo olhar ao Niall.
- Não lhe toques. – Rosno para o vampiro percebendo a sua intenção. Ele avança na nossa direção sentindo o meu tom de ameaça, mas num piscar de olhos Liam e Zayn estão a segurar os braços dele, cada um de um lado. – Que merda estava a acontecer aqui?! – Grito.
- Justin…
A atenção de todos muda de mim para Kathie. Levo um tempo a processar que ela me chamou… A mim… Estou extremamente irritado, ainda não percebi o que estava a acontecer aqui. William estava no chão, Kathie cega de raiva a gritar, espernear, quebrar tudo à sua volta, os vampiros estavam nervosos… É isso, as peças do puzzle começam a juntar-se na minha mente. Kathie estava a atacar o pai, a tentar matá-lo. Porquê…? As previsões de Emily estavam completamente erradas!
Olho para Kathie, para o seu rosto encostado ao meu peito enquanto respira de maneira descontrolada. Os seus olhos andam de um lado para o outro, como se estivessem à procura de algo… De alguém… De mim.
- Tem calma meu amor, eu estou aqui… - Agarro-a com mais força com um braço e acaricio o seu rosto com a mão livre. Beijo-lhe a testa. – Acabou. Eu vou levá-la comigo. Vocês não a estão a ajudar, só estão a piorar isto tudo. Aliás, vocês são os culpados de tudo isto! – Grito apontando para todos os vampiros presentes. – E tu. – Aponto para Louis, que permanece no mesmo sítio, na mesma posição, com os olhos na garota que está nos meus braços. – Pára de fazer o que estás a fazer-lhe.
- Se ele parar, a Kathie vai voltar a atacar. E não vai querer saber se és tu, ou o pai dela, ou quem quer que seja. – Simon afirma. – O lugar dela, por muito que te custe, é com a família dela, com aqueles que são como ela. Não com um bando de cachorros.
Aperto Kathie contra mim. Eu também sou da família dela, ela é minha e eu sou dela. Por muito tempo que passe, este bando de sugadores de sangue nunca vão perceber o que existe entre nós. Só nós percebemos. O lugar de Kathie é com quem a ama. Não com um vampiro de mil anos que desde o início a queria estudar, obrigando os seus escravos a fazerem amizade com ela, iludindo-a!
Nenhum deles é realmente amigo dela, não a conhecem como eu conheço. Só querem perceber o que ela é!
- Há muito que tu não sabes, que apenas eu e William sabemos. Não tens qualquer direito sobre Kathie e muito menos autorização para a levares contigo.
- Eu sei que não me devo intrometer… - Assim como eu, todos olhamos para Emily, que avança um pouco. – Mas é inegável o efeito que o Justin tem em Kathie, ele é importante para ela mesmo que esteja sem humanidade. Ele acalmou-a, o interior dela sente-o. – A morena olha para mim, vejo uma certa preocupação nos seus olhos e frazo o cenho.
- Só consegue acalmá-la, porque eu lhe tirei os sentidos, está vunerável. Se ela estivesse como há minutos atrás, em controlo de tudo, ele não seria capaz de a acalmar. – Louis afirma.
- Não é isso que está em causa. – Sinto uma frieza na voz de Emily. Ela nem sequer olhou para o vampiro. – Oiçam… Desde que me trouxeram para esta confusão toda que digo e volto a dizer que para trazer a Kathie de volta temos de trabalhar todos em conjunto. Os vampiros, porque conhecem o estado em que ela está; os lobos, porque o Justin tem um imprinting com ela e eu, porque sei alguns feitiços.
- Feitiços que até agora não ajudaram em nada. – Louis diz num tom baixo.
- Eu estou a tentar, okay?! – Emily grita e olha, pela primeira vez para o vampiro. – Achas que eu gosto de ver a minha amiga neste estado? Esta não é ela. Desculpem se errei e que pensei que este fosse o melhor momento para lhe contar que o pai está vivo, eu achava que isso ia ajudá-la e não piorar tudo! Vocês próprios disseram que ela precisa de uma âncora, então porque não o pai dela?! Até agora só eu é que me tenho realmente esforçado para a ajudar, fui eu que estive horas a tentar todos os feitiços possíveis, fui eu que dei esta ideia mesmo que não tenha funcionado! E vocês o que fizeram até agora?! – Reparo nas lágrimas que se começam a formar nos seus olhos. Ela está tão desesperada como eu, porque afinal, Kathie também é importante para ela…
Todos estamos chocados com a sua explosão, mas apenas uma pessoa se move. Matt respira fundo e aproxima-se de Emily. Dá-lhe a mão, mas ela afasta-a mantendo os olhos no vampiro que olha para ela sem qualquer expressão.
- Emily, todos nós temos o mesmo objetivo. – Matt afirma.
- Então façam algo por isso, não deixem todo o trabalho para uma única pessoa! – A morena grita, virando o rosto para Matt. – Justin, vem comigo.
Assinto e sigo-a para fora da sala com Kathie nos braços. Vamos até à cave, onde deixo Kathie deitada no chão com uma manta a tapar-lhe o corpo. Ela ainda parece estar numa espécie de transe, realmente não sei o que Louis lhe fez. Tirar todos os sentidos, literalmente? Por isso é que ela parecia tão sem noção, parecia que não via nada à sua volta apesar de ter os olhos bem abertos.
Eu e Emily não trocamos nenhuma palavra, a situação lá em cima foi tensa e ela tem razão. Dia e noite ela tem tentado de tudo para trazer a humanidade de Kathie de volta, os vampiros só dão ordens e nós, os lobos, não sabemos ao certo o que fazer.
Voltamos para o andar de cima depois de nos certificarmos que Kathie ficou bem e fechada na cela.
- Já podes parar, ela está segura. – Emily avisa o Louis, com um olhar gélido e ele só responde com um assentir de cabeça. Segundos depois, oiço Kathie a gritar de novo e a bater na porta.
Meu Deus, será que isto nunca mais vai acabar?
- Ela fica bem. – Emily assegura-me, pousando uma mão no meu ombro.
Ouvimos alguém a limpar a garganta e todos olhamos para Simon.
- Visto que o reencontro entre pai e filhos não correu como esperado, ainda assim o Matt, assim como a Kathie claro, merecem uma explicação. – Simon olha para William. – A Kathie está lá em baixo, mas acredito que ela consiga ouvir a conversa.
William senta-se num sofá e faz sinal para que Matt se aproxime e se sente ao seu lado. Matt, ainda que hesitante, senta-se. Ambos ficam a encarar-se por um tempo e mais ninguém na sala se pronuncia. Acabo por me enconstar a uma parede, tentando passar o mais despercebido possível, assim como Emily que se junta a mim.
- Como disse à tua irmã, eu não desapareci das vossas vidas por completo, apenas não estive presente como todos nós desejávamos. Espero que vocês algum dia venham a entender e a perdoar-me por isto tudo. Percebo que a tua irmã tenha raiva de mim, até eu tenho um pouco, mas têm de entender que eu não podia estar com vocês. Estar agora aqui, à vossa frente, já mete a minha vida em risco. – William olha para uma parede. – Sei que o Simon já contou a minha história à tua irmã e que ela posteriormente te contou a ti no seu aniversário. Portanto, vocês sabem que eu tenho de estar constantemente a fugir, a mudar a minha identidade, aparência, tenho de mudar tudo e passar despercebido, não é fácil viver uma vida de fugitivo e não o podia fazer com duas crianças. Não tinha o direito de vos tirar a oportunidade de viver uma vida normal. No dia do acidente, ninguém sabe como eu o quanto foi duro deixar-vos para trás. A vossa mãe e irmã, sabia que nunca mais as veria, mas tu e a tua irmã tinha esperança que tivessem uma vida feliz. Ficar com vocês poderia significar a vossa morte e não fui egoísta a esse ponto…
As palavras de William tiveram efeito em toda a gente. O silencio na sala é pesado, admito que eu estou comovido e dou por mim a olhar para a ponta das minhas sapatilhas sujas de terra. Nunca damos importância às coisas mais simples da nossa vida como ter uma família, neste caso, nisso fui um sortudo, tenho um pai, uma mãe, irmãos, tios, tias… Uma família feliz apesar de tudo. A Kathie e o Matt, e até o próprio William, não tiveram isso em conjunto. Acredito que deixar os filhos para trás tenha sido uma decisão difícil de tomar e ele carregará nas suas costas essa decisão a vida toda. Contudo, o que aconteceu não pode ser mudado, o que interessa é que agora está aqui. Está a arriscar a sua vida, salvou a filha, está aqui a pedir perdão…
Pelo canto do olho vejo Emily a limpar uma lágrima da bochecha. Não digo nada, mas percebo a sua reação.
- Porque é que voltaste? Como sabias onde encontrar-nos?
Perante as perguntas de Matt, William volta a olhar para o filho e mantém-se em silêncio por uns segundos, é como se estivesse a analisar todos os traços do filho.
- Vocês são muito parecidos com a vossa mãe, sabem disso? - William sorri, um sorriso um quanto que triste.
- A Kathie estava sempre a dizer isso, ela passava horas e horas a ver e a rever os álbuns de fotos da família porque ela não tinha as memórias que eu tenho de vocês. Ela imaginava que tipo de vida teríamos se não tivesse acontecido o que aconteceu, o quanto seriamos felizes. Dizia que temos os olhos e a cor de cabelo da nossa mãe, mas a boca e o nariz do nosso pai.
Ambos riem juntos, uma risada baixa. Trocam um olhar e o ambiente na sala parece amenizar, toda a gente relaxa de alívio. Sinto que estou um pouco a mais, como um instruso. Este é um momento que deviam estar a partilhar juntos e sozinhos, não com oito pares de olhos em cima deles.
- Ao longo destes anos todos, onde quer que vocês estivessem, tinham alguém que eu conhecia a vigiar-vos, visto que não poderia ser eu a fazê-lo, iria por em risco tanto a minha vida como a vossa. Sempre estive muito longe de vocês, mas tendo pessoas em quem confiava e que me contavam tudo sobre vocês, senti-me perto e que vos conhecia. - William troca um olhar com Simon. – E a verdade é que quando soube que iam sair de Nova York para se mudarem para Cambridge contactei um velho amigo para estar de olho em vocês. Só ele sabia a verdade, nenhum dos rapazes ao início sabia que vocês são meus filhos e Simon nunca lhes contou que me conhecia ou que era eu que tinha pedido que vos vigiassem, ainda por mais a tua irmã. Eu tinha esperança que um de vocês fosse como eu, tu já não poderias ser… mas a tua irmã era a minha última esperança. Depois de vocês não tive mais filhos, não quero correr o risco que corri com vocês…
Sinto algo a catucar o meu braço. Olho para a minha direita e percebo que é Emily com o cotovelo. Franzo o cenho quando ela faz um sinal para a seguir. Ela sai da sala e antes de a seguir, olhos para a sala. Alguns dos vampiros também já não se encontram presentes não dei por sairem, apenas continuam aqui o Niall, o Liam e o Simon. Não quero nem saber onde os outros três se meteram. Sigo Emily, que entrou na cozinha mas percebo que não quer ficar ali quando sai pela porta dos fundos, que dá para a parte de trás da casa.
Ela caminha um pouco na direção da floresta, pisando e desviando-se de pedras, galhos e folhas secas. Durante um minuto ou dois os únicos sons que se ouvem é os sons naturais da floresta e o nosso caminhar ruidoso. Cada vez mais confuso e cada vez mais embrenhado no meio das árvores, detenho Emily de continuar a andar.
- Vamos afastar-nos demasiado da casa, não puderei ouvir a Kathie caso precise de mim.
- Não te preocupes tanto, ela sabe defender-se e não vai acontecer nada, só preciso de uns minutos. – Ela respira fundo com os olhos fechados. Encolhe os ombros ao ver-me a encará-la confuso e retoma a caminhada para o interior da floresta. – Precisava de sair um pouco dali e vi que tu também…
- É muita coisa para assimilar.
Emily assente afirmativamente. Não dá para negar que todos na sala sentimos a tensão na sala, o ar estava carregado de energia negativa, bem pesado. Admito que eu também precisava de tomar ar fresco.
Paro de andar ao observar Emily a olhar à volta e encostar as costas a uma árvore.
- Justin, não te pedi para me seguires apenas por precisarmos de apanhar ar fresco. Tudo o que aconteceu hoje abriu-me os olhos para algo muito importante.
- O quê? – Questiono perante o seu silêncio repentino. Ela encara o chão enquanto morde o lábio inferior.
- Há algo que precisas de saber, antes de toda a gente…
Dou um passo na sua direção, nervoso com o que aí vem. Vejo pela sua expressão que é algo extremamente importante e que é algo relacionado com a Kathie. O que puderá ser?
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.