O silêncio que se instalou no escritório do xerife era quase constrangedor. As únicas coisas que era ouvidas eram as vozes do lado de fora, e o som dos dedos de Parrish no teclado do notebook do xerife.
Derek estava encostado em uma estante atrás do policial, vendo ele tentar hackear o aparelho estranho do assassino sem boca. O xerife estava a um metro dele, olhando na mesma direção.
Atrás do beta, haviam pelo menos três painéis cheios de papéis alfinetados a eles. Derek percebeu que a maioria deles foram colocados recentemente, apesar de algumas das manchetes de jornal serem datadas de anos antes. Derek franziu as sobrancelhas para eles.
Tirou sua atenção do notebook por uns instantes e começou a ler as notícias. Percebeu que todas elas eram acontecimentos estranhos. Relatos de ataques de animais selvagens, pessoas desaparecidas, casos bizarros de vandalismo. A maioria das notícias ali se encaixaria no que Derek chamava de "coisas que a polícia nunca vai descobrir". Eram aqueles casos que os policiais nunca desvendariam sem entrar dentro do sobrenatural.
Seu olhar se voltou para o xerife. Ele sabia do sobrenatural agora. Não era surpresa que ele estivesse se certificando de que não havia deixado nada passar. Ele então olhou nas notícias de pessoas desaparecidas. Não se lembrava de nenhum daqueles nomes: Roger White, Matthew Carter, Mali...
- Certo, - a voz de Parrish chamou a atenção do beta de volta. Ele voltou seu olhar para a tela do notebook. - acho que encontrei um endereço de IP.
O xerife se desencostou da escrivaninha, se inclinando sobre o ombro de Parrish para ter uma melhor visão do computador.
- Significa que podemos rastreá-lo, certo?
- Com certeza. - respondeu o mais novo. - Principalmente se...
Sua voz foi interrompida por um bipe vindo do "gravado" sobre a mesa. Os olhares de todos caíram sobre ele, que permaneceu calado.
- O que foi isso? - Derek perguntou.
- Acho que encontrei uma mensagem. - Parrish voltou seu olhar para a tela. - Alguém conhece o nome"Benfeitor"?
Derek andou até os dois, curvando as coisas e apoiando as mãos na mesa. O fundo da tela era todo preto, não verde, como Derek sempre via em filmes de hacker. Mas o resto era igual. As linhas de código em uma fonte branca e quadrada. E, no final da tela, o nome Benfeitor parecia se destacar, assim como a mensagem ao lado dele.
- "Dinheiro transferido". - ele leu. - O que significa?
O xerife endireitou as costas, parecendo tenso.
- Ele não é só um assassino. - lançou um olhar carregado para Derek. - É um assassino de aluguel.
***
Talvez tenha realmente sido uma boa ideia prender Liam na casa dos barcos ao invés do porão. Sim, havia sido bem mais difícil levar ele até lá do que seria no porão, que era bem mais perto, mas, pelo menos ali era mais difícil Liam fugir e matar alguém.
E, naquele momento, era muito fácil para Liam matar alguém. Extremamente fácil.
A casa dos barcos ficava praticamente em cima do lago. Era parecida com uma garagem,com apenas três paredes, e uma área aberta para que os barcos fossem arrastados direto de lá de dentro para a água. Prático. Dentro dela, haviam quatro vigas que suportavam o teto, apesar de Scott desconfiar que elas eram apenas decorativas.
Scott e Isaac lutavam para segurar Liam no chão, enquanto Kira passava as correntes envolta dele e o prendia a uma das vigas. Os rugidos do garoto ficavam cada vez mais altos, e ficava cada vez mais difícil mante-lo no lugar.
Liam se debatia e jogava suas garras nos dois lobisomens. Isaac empurrava seu tronco contra a viga, enquanto Scott tentava segurar suas mãos. O calouro parecia completamente descontrolado, entregue à lua cheia. Não parecia reconhecer ninguém, ou sequer ter consciência do que estava fazendo.
- Kira! - Isaac gritou. - Mas rápido!
- Não dá! - ela gritou de volta. - Segura ele direito!
- Não é tão fácil quanto parece!
Kira gritou mais alguma coisa que Scott não entendeu. Então, de repente, ela simplesmente soltou as correntes e se levantou, se afastando da onde eles estavam.
Liam aproveitou a força a menos que o segurava e começou a se debater ainda mais. Scott gritou por Kira, ouvindo gritos vindos também de Isaac. Ele queria ver para onde ela tinha ido, mas não podia desviar sua atenção do beta descontrolado a sua frente.
Tão rápido quanto havia saído, Kira voltou. Em suas mãos, segurava um remo de barco.Com um golpe certeiro, atingiu a cabeça de Liam, que parou de se debater no mesmo instante e tombou o corpo para frente, inconsciente.
Tudo ficou em silêncio, os rugidos e o bater das corretes cessaram. Kira largou o remo no chão, arregalando os olhos para Liam.
- Oh, Deus. - ela se abaixou ao lado dos garotos. - Eu não matei ele, matei?
- Não, ele só está inconsciente. - Isaac respondeu. - Nocautear ele foi uma boa estratégia. Vamos prende-lo.
***
Não, se estresse, Lydia. Estresse não é bom para você. - a garota repetia para si mesma enquanto andava no meio da multidão de estudantes do primeiro ano.
Talvez fizesse algum tempo desde que ela havia dado uma festa. Tudo bem, fazia bastante tempo. A última foi em seu aniversário. Ela não foi exatamente um sucesso, e ser controlada para trazer Peter de volta dos mortos abalou de forma severa o espírito festeiro de Lydia. E depois, ser atacada por demônios japoneses na festa no loft de Derek definitivamente o matou. Pelo menos por um tempo. Um bom tempo.
Ela estava frenética. Olhava para todos os lados. Além de ter que se preocupar com o fato de que a qualquer momento um lobisomem descontrolado podia entrar ali e matar a todos, tinha que se preocupar com qualquer danos na casa. Qualquer dano. Nada podia ser quebrado, riscado, manchado... ou seja, depois daquela festa, a casa tinha que estar em perfeito estado. Sua mãe pensava que somente Lydia e seus amigos estariam ali naquela noite.
Aquela musica eletrônica soava alta em seus ouvidos. Ela quase não podia ouvir a si mesma dizendo para os calouros não tocarem nas coisas. Ela tinha mandado Stiles ajuda-la a tirar tudo que era frágil e parecesse valioso do andar de baixo e guardar em um dos quartos no andar de cima. Mas agora, Stiles parecia estar muito ocupado discutindo com alguns calouros. Ela realmente torcia para que aquela briga não ficasse mais séria.
Então ela viu um garoto entrar na cozinha. Era o garoto loiro que havia falado com ela mais cedo. Oh, o que ele queria na cozinha? Tinham tantas coisas frágeis ali... não, ele tinha que sair.
Correu até a cozinha. Ao mesmo tempo que chegou lá, um homem entrou pela porta dos fundos, que ficava praticamente ao lado dos armários. Ele parecia ser bem mais velho do que ela, tinha barba e cabelos longos e parecia não se importar com o que vestia. Arrastava consigo um grande suporte com rodinhas, onde carregava o que Lydia reconheceu ser um barril de cerveja.
A garota suspirou. Ela ia ter que ignorar o garoto loiro por enquanto, apesar de ele estar abrindo os armários da parede.
- Oh, não, não, não. - ela balançou a cabeça para o homem. - Eu não encomendei cerveja nenhuma. Muito menos doméstica.
- Bom, alguém pediu.- ele respondeu, olhando em volta. - Está me dizendo que ninguém aqui quer beber?
Lydia revirou os olhos. Ela olhou para os lados, procurando algum adolescente que seria suspeito de ter encomendado a bebida. Seu olhar caiu sobre a mesa no meio da cozinha, onde seu notebook de algum jeito tinha ido parar. Estava aberto, e na tela o navegador avisava que não havia conexão com a internet.
Como aquilo estava ali? Aquele notebook devia estar...
Então ela percebeu que, além de terem pegado o laptop, haviam deixado um copo com restos de alguma bebida em cima do teclado.
- Quem colocou isso aqui? - ela perguntou para ninguém em particular. Pegou o copo, fechando o notebook. - Esse laptop custou dois mil dólares...
Ela se virou para colocar o copo na pia, mas percebeu que o garoto loiro agora segurava uma garrafa de vinho nas mãos. Colocou o copo na mesa e tomou a garrafa do calouro, bufando de raiva.
- Essa garrafa de vinho custa quatrocentos dólares. - suspirou, se virando para lidar com o cara com o barril de cerveja. - Quanto é?
O homem não respondeu, apenas pegou um pequeno papel do bolso de sua camisa e o entregou para a garota. Lydia o pegou com grosseria, desdobrando-o.
- O que são esses extras cem dólares aqui? - perguntou, analisando os números a sua frente.
- É uma taxa especial. Eu chamo ela de "sim, você parece ter mais de 21 anos pra mim". - piscou com apenas um dos olhos.
Lydia suspirou. É claro que ela ia ter que pagar ainda mais por aquilo. Ela andou até a pia, colocando a garrafa de vinho ali. Com o canto dos olhos, viu o garoto moreno que havia falado com ela mais cedo subindo as escadas. Não, ninguém podia ficar no andar de cima.
Olhou para os lados, procurando Stiles, mas ele ainda estava discutindo com uns garotos. Ela mesma teria que lidar com aquilo.
- Eu vou buscar o dinheiro. - ela disse para o homem, se virando e correndo para a escada logo em seguida.
***
Kira suspirou enquanto deixava seu corpo cair sentado no chão ao lado de Scott e Isaac. Eles estavam a poucos metros de onde Liam estava amarrado, ainda inconsciente.
- Ele parece tão novo. - ela disse, um pouco triste.
- Ele é. - Scott respondeu. - Ele só tem quinze anos.
Isaac soltou uma pequena risada.
- E você só tem dezessete. - cruzou as pernas. - Pare de falar como um velho.
- Para de me zoar. - Scott retrucou, com um pequeno sorriso.
- O que vamos fazer com ele? - perguntou Kira. Um clima pesado pareceu se instalar novamente.
- Vamos ajuda-lo. - o Alpha respondeu, não parecendo muito confiante.
- E se ele não quiser nossa ajuda?
- Ele vai querer. - disse Isaac. - Parem de se preocupar tanto, ele vai ficar bem.
Kira viu Scott se virar para o namorado com uma expressão preocupada.
- Você está bem? - seu tom era baixo.
Oh, Deus. Aquele tom de voz... aquela era uma daquelas conversas privadas de casal? O que Kira devia fazer? Continuar ali? Ir embora? Seria rude ir embora, não seria?
Isaac franziu as sobrancelhas.
- O que quer dizer?
- Todos nós estamos preocupados. Eu estou me sentindo extremamente culpado. Mas você parece tão... eu não sei. Você está tão calmo. Está agindo estranho.
Aquela definitivamente era uma daquelas conversas. Kira abaixou a cabeça, desconfortável. Arrastou seu corpo para o lado discretamente, tentando dar um pouco mais de privacidade aos amigos, e pegou seu celular para fingir estar conversando com alguém.
- Eu não sei. - Isaac deu de ombros. - Não estou preocupado. Eu sei que vai ficar tudo bem.
- Tudo bem? Nós arruinamos a vida dele.
- Nós não arruinamos a vida dele. - revirou os olhos.
- Certo, eu arruinei a vida dele.
- Para com isso, Scott. Ele é um lobisomem agora, e dai? Nós também somos.
- E a nossa vida não é exatamente normal. Muito menos segura. E se ele se machucar? E se acabar morto?
- Como o Boyd e a Erica?
Kira sentiu o clima ficar ainda mais pesado. Ela não sabia de quem eles estavam falando, mas, aparentemente, Allison não tinha sido a única que o grupo havia perdido. A garota arrastou o corpo um pouco mais pro lado, se sentindo extremamente envergonhada de estar escutando uma conversa particular.
- Talvez. - Scott abaixou a cabeça. - Mais ou menos.
- Eles sabiam no que estavam se metendo.
- Eu duvido. Se eles soubessem...
- Teriam feito a mesma coisa.
- Como você pode dizer isso?
- Scott, - o tom da voz do loiro ficou mais grave de repente. - eles foram a minha família por um tempo. Eles foram tudo o que eu tive depois que o meu pai... - houve uma pausa. - Eu conheci eles. Não muito, mas bem mais do que você.
- Isaac...
- Você sabe como a Erica era antes da mordida. Ela não se arrependeu por ter escolhido aquilo nem por um segundo, eu tenho certeza. E Boyd... Boyd tinha sérios problemas também.
- Ele me disse uma vez que só queria amigos. - Scott desviou o olhar. Kira teve a impressão de que ele se sentiu mal dizendo aquilo.
Droga, Kira. - a garota se repreendeu, se arrastando um pouquinho mais para longe. - Pare de ouvir a conversa deles. Você nem sabe quem essas pessoas são.
- Era mais do que isso. - ela ouviu Isaac responder, apesar de suas tentativas de não prestar atenção. - Boyd tinha sérios problemas com depressão. Ele não queria só amigos, ele queria outra vida. Ele teria feito qualquer coisa para mudar as coisas, e ele fez. Ele também não se arrependeu nem por um minuto.
Scott respirou fundo.
- Você tem razão. Se lembra da última coisa que ele disse?
- Ele disse que valeu a pena. - Isaac assentiu. - E ele estava falando sério, eu sei que sim.
- Eu sinto muito, Isaac. Eu não sabia que...
- Tudo bem. - o loiro o cortou. - Enfim, virar um lobisomem não foi o que arruinou a vida deles. O que fez isso foram as circunstâncias. Pack de Alphas e tal.
- Okay. E quanto a você?
- O que foi que arruinou a minha vida? Você, com certeza.
- Ouch. - Scott sorriu. - Você entendeu o que eu quis dizer.
- Se eu me arrependo? - o menor assentiu. - Nem um pouco. Não consigo imaginar um cenário em que minha vida seria melhor se eu não fosse um lobisomem. Talvez seja por isso que eu não esteja tão preocupado com o Liam.
- Era tão ruim assim?
- Você sabe como era a minha vida antes. Clássico caso de abuso doméstico. Se eu tivesse dito não ao Derek, Jackson teria matado meu pai de qualquer jeito, e eu estaria onde quer que o serviço social me mandasse. Sendo um lobisomem, eu consegui enfrentar o meu pai pelo menos uma vez. Consegui me defender. Ganhei um mínimo de autoconfiança. - houve uma pequena pausa. Ele se virou para Scott. - E, é claro, eu conheci você. O que é uma coisa que, sozinha, já ganha de todos os outros argumentos que eu usei.
Kira arregalou os olhos. A rapidez com que Isaac ia de "obscuro e pessoal" para "romântico e divertido" era impressionante. Ela se arrastou mais um pouco para o lado. Estava cada vez mais difícil fingir que continuava conversando com alguém no celular. Ela nem ao menos tinha internet ali.
- Claro que ganha. - Scott pareceu sorrir.
Os dois ficaram em silêncio por algum tempo. Kira pensou que a conversa tinha acabado, até ouvir aquele som de troca de saliva. Oh, Deus, eles estavam se beijando. Bem do lado dela.
A garota desejou que Liam acordasse e tentasse escapar, que Stiles aparecesse para ver se estava tudo bem, que algo desse errado na festa e Lydia a chamasse, que qualquer coisa... espera, isso não é uma má ideia, na verdade.
- Eu vou ver se precisam de mim na festa! - ela falou, tropeçando nas próprias palavras. Se levantou rápido e correu para fora da casa dos barcos, não dando tempo de nenhum dos dois garotos responder.
***
Stiles olhava de um lado para o outro, consideravelmente desesperado. Onde diabos estava Lydia?
Tinha gente demais naquele lugar. Gente demais. Era impossível manter os olhos em todo mundo. E com tantos objetos decorativos naquela casa, era impossível evitar que ninguém encostasse em nada.
Respirou fundo. Tudo bem, ele podia fazer aquilo. Ele não precisava se estressar, não precisava se preocupar. Era só uma festa cheia de calouros. Ele podia lidar com aquilo. Quer dizer, ele já tinha brigado com metade dos calouros ali, então metade do trabalho já estava feito, não? Ele só tinha que cuidar da outra metade agora. E, é claro, esconder as coisas que parecessem ser mais valiosas.
Checou seus bolsos outra vez. Ele havia pegado alguns objetos que achou que seriam ótimos alvos de roubo. Suspirou aliviado quando percebeu que eles ainda estavam ali.
Algumas risadas vieram de trás do garoto.
Seu coração começou a bater mais forte. De repente, todos os sons da festa pareceram abafados. Todos os gritos, a música, o som dos pés no chão, as vozes. Tudo pareceu silenciar, e aquelas risadinhas ganharam destaque na mente de Stiles. Tudo o que ele ouvia era aquele som, e as batidas pesadas de seu próprio coração em seus ouvidos.
Sua respiração ficou pesada. Não estavam rindo dele, estavam?
O garoto se virou, seguindo o som. Quem estava rindo era um grupo de garotos do outro lado da sala. Stiles sabia quem eram, ele estava brigando com aqueles calouros a alguns minutos atrás. Será que ele tinha dito alguma coisa que o comprometeu? Não podiam estar indo dele, podiam?
Outras risadas surgiram atrás de Stiles. O garoto se virou de novo, sua respiração cada vez mais rápida. Dessa vez, era um grupo de meninas rindo. Stiles não as conhecia, mas não importava.
De repente, o cômodo todo se encheu de risadas. Sons que pareciam atacar Stiles, prende-lo, sufoca-lo. Cerrou os olhos com força. Ele começou a ouvir pessoas sussurrando em meio às risadas. Não pensou no quão improvável era ele poder ouvir alguém sussurrar no meio de uma festa. Não conseguia pensar em nada.
Levou uma das mãos até a cabeça, sentindo-a latejar. Cada pontada era forte e o fazia tremer. Os sons ficavam cada vez mais alto. Uma dor profunda se instalou em seu estômago, e ele sentiu bile ameaçar subir por sua garganta. Cobriu a boca com a mão trêmula, prevendo que pudesse vomitar a qualquer momento.
Sentiu alguém sacudir seu ombro com força. Ele se encolheu, abrindo os olhos para ver quem o estava atacando. Levou alguns segundos para ele reconhecer a garota a sua frente.
- Stiles? - Kira o encarava com os olhos arregalados e uma expressão assustada. - O que foi? O que está acontecendo?
- O quê?
Tão rápido quanto haviam aparecido, as risadas sumiram. A música eletrônica voltou a tocar nos ouvidos do garoto. Os calouros conversavam e gritavam, mas nada mais parecia ser direcionado a Stiles. Ele olhou para os lados. Não tinha ninguém apontando para ele e nada do tipo, como pensava.
- O que está acontecendo? - Kira voltou a perguntar. - Parecia que você ia desmaiar.
Stiles não respondeu. Sua cabeça ainda latejava, ele não conseguia respirar direito, e seu estômago continuava revirando. Oh, ele estava tendo um ataque.
- Stiles! - a garota agarrou os braços do amigo, como se esperasse que ele caísse a qualquer momento.
Aquilo com certeza atraiu a atenção das pessoas. Stiles podia quase sentir o olhar delas formigar em sua pele.
- Eu... - ele começou a falar. - Eu preciso... eu preciso sair daqui...
- Tudo bem. - ela assentiu, levemente desesperada. - Tudo bem, vamos lá pra cima.
Kira apoiou um dos braços de Stiles em seus ombros e o ajudou a abrir caminho entre os calouros. Quanto mais pessoas olhavam para eles, pior Stiles se sentia. Milhões de pensamentos passavam por sua cabeça. Aquelas pessoas com certeza o reconheceriam na escola. Com certeza falariam dele. Espalhariam coisas sobre ele.
Você está tendo um ataque, Stiles. - ele disse para si mesmo enquanto subia as escadas, totalmente apoiado em Kira. - É tudo da sua cabeça.
Todo mundo estava te olhando.
Kira deve achar que você é maluco.
Todos devem achar que você é problemático.
Você é problemático, Stiles.
- Aqui. - disse Kira enquanto abria a porta. Stiles não tinha nem percebido que eles já estavam no andar de cima. Só o fato de não estar mais na festa já o fez se sentir melhor. Não que ele não estivesse mais passando mal, mas pelo menos os pensamentos acalmaram um pouco.
Ao atravessar a porta, Stiles percebeu que eles estavam em um quarto. Havia um guarda roupa moderno, uma cômoda, alguns quadros e uma grande cama de casal no centro. As paredes eram brancas, o que deu a Stiles uma leve sensação de sufocamento, por alguma razão.
Kira o ajudou a se sentar na cama. Stiles se inclinou para frente, apoiando os cotovelos em seus joelhos. Cerrou os olhos, tentando acalmar sua respiração. Sentiu a ânsia de vômito novamente, mas fez um esforço para engoli-la. O quarto todo parecia girar.
- Stiles? - a garota se abaixou na frente do amigo, encarando-o com um olhar preocupado. - O que foi?
- Está tudo bem. - ele mentiu. - É um... ataque de pânico.
- Ataque de pânico? - ela arregalou os olhos.
É claro, Kira não sabia nem a metade de tudo aquilo.
- É, pois é. - respirou fundo novamente. Seu peito queimava, mas ele tentou respirar o mínimo possível. - Eu tenho ataques de pânico desde pequeno. Se bem que... pensando bem, isso não foi um ataque de pânico. Seria bem pior se fosse. Esse deve ter sido só um ataque de ansiedade.
- Ansiedade, certo. E por que agora?
- Eu não gosto de festas, tenho ansiedade social. - suspirou. Sua cabeça ainda latejava. - Eu vou ficar bem. Eu sei lidar com isso. Você devia voltar lá pra baixo.
- Eu não vou te deixar sozinho aqui.
- É melhor me deixar sozinho do que deixar a Lydia cuidando sozinha de um bando de calouros. Você já viu ela irritada? Confie em mim, ela vai traumatizar todos os calouros para a vida toda. Vão precisar contratar mais orientadores na escola. E, considerando que a última era o Druida do Deucalion, eu diria que eles não são muito confiáveis.
- O quê? - Kira franziu as sobrancelhas.
- Oh, desculpe. Você não estava aqui. De qualquer jeito, eu já estou melhor. Vai ajudar a Lydia lá embaixo, eu vou ficar bem.
- O que você faz pra controlar isso?
- Bom, a internet diz pra você pensar em momentos felizes. - sua respiração se normalizou, mas sua cabeça ainda doía, assim como seu estômago. - Eu vou só... repassar toda a história de Star Wars na minha cabeça e vai ficar tudo bem.
- Oh, eu nunca assisti.
Stiles quase se esqueceu de tudo o que estava acontecendo por um momento.
- O quê? - sua voz subiu algumas oitavas. - Oh meu Deus, como foi que eu te deixei entrar no grupo?
Kira sorriu de lado.
- Eu vou assistir, prometo.
- É bom mesmo. - ele fez uma careta, sentindo seu estomago revirar particularmente forte.
- Tem certeza que não quer que eu fique?
- Eu estou bem. - mentiu de novo. - Pode ir.
Kira pareceu não gostar da ideia, mas assentiu mesmo assim.
***
Isaac bufou, apoiando seus cotovelos em suas pernas cruzadas.
- O que foi? - Scott perguntou, levantando uma das sobrancelhas.
- Está ouvindo a música da festa?
- Aham. O que que tem?
- Odeio música eletrônica.
- O quê? - o Alpha sorriu, achando adorável a expressão emburrada do loiro. - Por quê?
- Todas são a mesma coisa! - a voz de Isaac subiu algumas oitavas. Ele realmente parecia estar indignado. - É só a mesma batida. Me irrita.
- Bom, não tem como dançar uma música que não seja batida.
- Claro que tem.
- Me dê um exemplo.
Houve uma pausa.
- Droga. - Isaac cedeu. - Ainda sim, não gosto de música eletrônica. Não gosto de festas, também.
- Do que você gosta?
- Gosto de músicas que realmente tenham uma letra.
- Você está muito revoltado hoje. - Scott levou a mão até o bolso, pegando seu celular e desbloqueando a tela.
- Desculpe. - o loiro bufou. - É a lua cheia.
- A lua cheia te deixa muito sensível. - ele abriu o aplicativo de música de seu celular, procurando alguma coisa que Isaac pudesse gostar.
- O que ela faz com você?
- Nada. - deu de ombros, sorrindo. - Eu tenho total controle.
- Impossível.
- Eu estou agindo diferente, por acaso? - ele finalmente escolheu uma musica, aumentando o volume no máximo. - Está melhor agora?
- Bem melhor. - Isaac sorriu. - Me conta então: como você se controla tão bem?
- Eu tenho uma âncora, lembra. - bateu seu ombro no do namorado, gentil.
- Me sinto lisonjeado. - Isaac aproximou seu rosto do do menor, beijando sua bochecha. - Quando Derek me ensinou a controlar, ele disse que usava a raiva para fazer isso.
- Ele me disse a mesma coisa quando o me ensinou . Você acha que ele ainda usa a raiva?
- Eu usaria se estivesse namorando o Stiles. Deve ser uma vida difícil.
- Isaac!
- O quê? Ele é irritante.
- Estou começando a me preocupar com vocês dois.
- Por quê?
- Vocês se alfinetam demais. E se vocês forem um daqueles casais que começam o relacionamento se odiando?
- Pensei que Derek e Stiles já fossem esse tipo de casal.
Scott abriu a boca para contra-argumentar, mas acabou sorrindo.
- Droga, esse foi um ótimo argumento.
- E eu nunca te trocaria por ele. Você é bem mais bonito.
- Ouch. - Scott colocou uma das mãos sobre seu peito dramaticamente. - Você só se importa com a aparência?
- É assim que o mundo funciona, Scott. Sinto muito que você teve que descobrir desse jeito.
- É por isso também que Stiles não trocaria Derek por você?
Isaac piscou.
- Espera. - endireitou a coluna, lançando um olhar indignado para o menor. - Está dizendo que Derek é mais bonito do que eu?
- Sinto muito que você teve que descobrir desse jeito.
- Ouch! - ele riu, cruzando os braços. - Que droga. Não posso competir com aquele abdômen.
Scott riu também. Deu um leve empurrão no ombro do maior.
- Claro que pode.
- Não, você tem razão. - levantou a mão, dramaticamente. - Eu aceito minha derrota. Stiles ganhou.
- Você é muito... espera, está dizendo que o Derek é mais bonito que eu?
- Oh. - apoiou a testa em uma das mãos, ainda rindo. - Então você pode falar e eu não?
- Me sinto extremamente ofendido.
- Não sinta. Eu nunca escolheria o Derek à você.
- Ah, é?
- Claro. - deu de ombros. - Não é só a aparência que importa.
- O que mais?
- Status social.
Scott riu, balançando a cabeça.
- Vai se ferrar, Isaac.
- Estou falando sério. - insistiu. - É assim que a sociedade funciona, Scott. O que realmente importa é a aparência e o status social.
- E que tipo de status você ganha estando comigo?
- Está brincando? Você é o Alpha do pack. Com você, eu sou tipo a primeira-dama.
- Oh meu Deus. - Scott enterrou o rosto nas mãos, abafando sua risada.
- E você também é o capitão do time de lacrosse. Então eu tenho status no mundo sobrenatural e fora dele. Xeque-mate, Stiles.
- Aham. - abaixou as mãos. - E o que é que eu ganho estando com você?
Isaac não respondeu. Levou ambas as mãos até o pescoço do menor, puxando-o para si e juntando seus lábios. Isaac enterrou seus dedos nos cabelos do outro, sentindo a pele de Scott se arrepiar. Adorava fazer aquilo. Havia descoberto que Scott era bem sensível a toques daquele tipo.
Scott levou suas próprias mãos até a cintura do outro, acariciando a pele por debaixo da camiseta. Aquele era definitivamente um dos lugares favoritos de Scott. Ele podia passear com as mãos o quanto quisesse. Pelas costas, lateral, abdômen... hey, Isaac podia muito competir com Derek em questão de abdômen. Pelo menos na visão de Scott.
Quando se separaram, Isaac estava sorrindo.
- É isso que você ganha. - levantou uma das sobrancelhas.
- Um beijo? Qualquer um pode me dar isso.
- Não um beijo. - levantou o indicador e apontou para si mesmo. - Meu beijo. Eu beijo muito bem.
- Meh... - Scott deu de ombros.
- Eu beijo muito bem! - Isaac bufou. - Você até perdeu seu grande autocontrole!
- O quê? - o Alpha olhou para suas mãos. Suas unhas estavam normais. - Não perdi não.
- Por que seus olhos estão brilhando então?
Scott levou um tempo para entender. Suspirou, cerrando os olhos e balançando a cabeça, sentindo seus olhos voltarem ao normal.
- Droga. - sorriu. - Você trapaceou.
- É que eu achei que você tivesse total controle. - provocou.
- Minha própria âncora se virou contra mim. Me sinto traído.
- Você escolheu uma péssima âncora.
- E você? Como você controla?
De repente, o clima alegre e despreocupado pareceu desaparecer. Isaac abaixou a cabeça, o sorriso sumindo de seu rosto quase imediatamente. Scott franziu as testa. O que ele tinha dito de errado?
- Isaac? - o chamou, cauteloso. Levou uma das mãos até o cabelo do maior, acariciando os fios loiros. - O que foi?
- Nada, é que... - deu uma risada irônica. - Quando aprendi controle com Derek, eu usava meu pai como âncora.
Scott ergueu uma das sobrancelhas.
- Seu pai? - sua voz era baixa. - Sua... raiva dele?
- Não! - aquilo foi tão repentino que Scott se afastou, receoso. Isaac pareceu realmente ofendido. - Ele era meu pai, Scott. E ele tinha acabado de morrer. Ele era a minha âncora. Ele era... a única pessoa que eu tinha.
- Mas ele...
- É, eu sei. - ele abaixou a cabeça. - Pode chamar de Síndrome de Estocolmo. Mas eu realmente senti falta dele.
- Não sente mais?
- Eu não sei. - respirou fundo. - Acho que agora eu entendo melhor. Quer dizer, eu sei que ele não era uma boa pessoa... ele era uma pessoa horrível, na verdade. Por isso disse sim a Derek. Mas... mas ele não...
A voz de Isaac morreu. Scott levou sua mão até a do maior, entrelaçando seus dedos. Não podia nem imaginar o quão doloroso aquilo era para o outro. Se lembrou de quando foi com Derek à antiga casa de Isaac, de quando viu o porão, e o frezeer. Era todo arranhado. Cada pedacinho dele.
- Não precisa falar, se não quiser. - falou em voz baixa.
- Não posso te deixar curioso. - sorriu de lado. - Ele não foi sempre daquele jeito. Só depois que... depois que meu irmão morreu.
Scott piscou. Ele sabia que Isaac tinha tido um irmão mais velho que morreu . Mas ele nunca tinha pensado no que aquilo afetava Isaac realmente. Nunca havia pensado em como aquilo impactava quem Isaac era.
- Sinto muito pelo seu irmão.
- Camden. - o loiro sorriu de lado. - Ele cuidou de mim a maior parte da minha vida. Nossa mãe nos deixou quando eu ainda era pequeno. Foi quando o meu pai começou a beber. Então Camden se alistou e nos deixou também. Acho que meu pai não suportou ter que ficar com o filho errado. Quando Cam morreu...
- Seu pai surtou?
- Basicamente. - assentiu. - Não que ele não me espancasse antes, mas ficou pior. Acredite, bem pior. Eu odiava ele.
- Eu imagino.
- Depois que ele morreu... depois que Jackson matou ele, eu me senti muito culpado por odiá-lo. E por me sentir melhor sem ele.
Scott sentiu um peso em seu peito. Aquilo era tão obscuro. Da onde tudo aquilo estava vindo?
- É claro que você se sentiria melhor sem ele. - apertou a mão do loiro. - Eu sinto muito, Isaac, mas seu pai não merecia que tivessem pena dele.
- Não, - ele balançou a cabeça. - não merecia mesmo.
- Por que você nunca disse nada a ninguém?
- Porque... - ele bufou, dando de ombros. - O que eu posso dizer? Era meu pai. A única pessoa que eu tinha. Eu não queria parar em algum orfanato. E, na época, eu meio que achava que merecia.
- Você sabe que isso não é verdade.
- Agora eu sei. - fez uma pausa. - Quando eu me transformei, era como se eu tivesse virado outra pessoa. Eu sou bem diferente do que eu era.
- Eu gosto do novo você. - Scott sorriu de lado, tentando reconfortar o namorado.
Isaac finalmente ergueu a cabeça. Seus olhos se encontraram com o do menor. Mas, ao contrário do que Scott pensou, eles não estavam tristes, estavam confusos.
- O que estamos fazendo? - Isaac riu.
O Alpha piscou, sem entender.
- Como assim?
- Por que estamos falando disso? Como foi que isso surgiu? - balançou a cabeça, como se fosse para afastar seus pensamento. - Estávamos rindo, e agora o clima está super depressivo.
Scott franziu as sobrancelhas.
- Parece que eu estava certo. - disse. - Você realmente fica mais sensível nas luas cheias.
- Eu não fico sensível. Foi você quem perguntou.
- Eu perguntei sobre a sua âncora, você quem começou o assunto depressivo.
Isaac bufou, aceitando a derrota.
- Droga.
- A lua cheia funciona como uma TPM pra você.
- Cala a boca, Scott.
- Eu vou ter que esperar mês que vem pra saber mais segredos profundos da sua alma.
- E quando é que eu vou saber os seus?
- Você sabe os meus.
- Os seus segredos profundos da alma? Sei todos?
Scott deu de ombros.
- Acho que sim. Não é como se eu tivesse muitos segredos. Ou algum grande segredo.
- Que vida entediante, Scott.
- Minha vida não é entediante! - protestou.
- Hey, - Isaac sorriu. - não precisa rosnar pra mim.
O Alpha paralisou no lugar, seu coração começou a bater mais forte.
- Isaac? - sua voz ficou tensa.
- O quê?
- Não fui eu.
O loiro não demorou nem um pouco para entender. Se levantou imediatamente, puxando Scott junto. Os dois se viraram para onde Liam estava amarrado.
O garoto tinha acordado. Seus olhos cheios de raiva brilhavam em amarelo, enquanto ele se debatia e lutava para sair. O barulho de rugidos e batidas de corrente voltaram a encher o ambiente.
- Essas correntes são fortes o suficiente para segura-lo? - Isaac se colocou na frente de Scott, protegendo-o.
- Ah... aham. - não havia um pingo de certeza na voz do menor. - Ah... definitivamente. Ele não pode ser tão forte.
Como se fosse uma deixa, Liam rugiu ainda mais alto. Se debateu tão forte que as correntes que prendiam seu corpo se soltaram da viga, se espalhando pelo chão, e ele correu na direção de Scott e Isaac.
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