Desde o desagradável ocorrido o clima entre eu e meus patrões está estreito. A partir do momento que saio da cozinha, automaticamente abaixo a cabeça e só respondo "sim,senhor" e "não,senhor" ou "sim,senhora" e "não,senhora". Brock fica emburrado quando está perto de sua mãe, o senhor Matt só os observa e tenta puxar assunto durante as refeições. A senhora Lisa fala com Brock normalmente, mas ele finge não escutar ou responde com poucas palavras. Eu fico me sentindo ainda mais desconfortável quando Brock faz isso, ela deve achar essa atitude do filho desnecessária,ainda mais se tratando de uma mera empregada. Na verdade, sinto que ela só não me dispensa pela consideração à minha mãe e ao meu falecido pai.
Minha mãe só não esqueceu o que aconteceu porque ela vê e sente como a senhora Lisa se dirige à mim, é chato e,às vezes, humilhante. Ela se desfaz de mim e, de repente, me dá mil tarefas para fazer e reclama que estou muito lenta. Não repara na minha presença, na frente de Brock não me pede nada, de vez em quando fico parada próximo a mesa de jantar e ela chama outra empregada para lhe servir.
Quando chego do serviço procuro algum outro trabalho pela internet. Ás segundas, o dia da semana que tenho folga, distribuo currículos em lojas de diversos tipos: Materiais de construção, roupas, calçados, decoração...Tudo para ficar longe do condomínio Vert.
Hoje é quinta-feira, mais um dia de trabalho e tive que ficar responsável pelo almoço acompanhada de Wanda, que me observa para saber se está tudo conforme o gosto dos patrões...pouco sal,presença de especiarias, sem temperos industrializados,essas coisas.
Katy adentra ofegante (e suada) na cozinha, acabara de fazer seus exercícios matinais na companhia de seu personal trainer.
— Emma, minha garrafa está seca. Bebi até a última gota. Pode encher para mim? - Ela me entrega a garrafa e eu já coloco na pia para lavar. - Vou tomar um banho. Quantos minutos para o almoço?
— 15. - Wanda responde
— Ah,sim,dá tempo de tomar um banho demorado e recompor minhas forças.
Escuto ela subindo as escadas cantarolando. Continuo fazendo o almoço. Filé mignon com purê de batatas, aspargos e tiras de cenoura.
Quando termino de cozinhar, começo a por a mesa com a ajuda de Wanda, que tem mais prática que eu.
— Emma, pode voltar a cozinha. Dona Elisa já deve estar descendo e vamos poupar a arrogância dela para de noite.
Sorrio e volto a cozinha. Vejo se está tudo em ordem e abro o armário na área de serviço onde os empregados deixam seus pertences. Pego meu celular para ver as notificações...uma chamada perdida? Tento recordar do número,sem sucesso. Retorno a ligação e depois do terceiro toque uma moça atende.
— Styl,Caroline,boa tarde.
— Boa tarde, Caroline...vocês me ligaram?
— Hm...é Emma Colline Flynn?De Brixton?...
— Sim.
— Emma, a gerência da Styl está lhe convocando para se apresentar. Nossa loja fica na Bond St, Mayfair. Amanhã pelas 8h, tudo bem?
— Hm...ok.
— A Styl agradece a atenção. Boa sorte, Emma.
Desligo o telefone animada. Styl é uma loja de roupas femininas recém inaugurada na Bond Street, shopping center luxuoso em Mayfair (onde fica o condomínio Vert)..
Me seguro para contar a Wanda, estou tão empolgada!
Quando Wanda me chama para recolher os pratos do almoço,lhe conto a novidade.
— Que ótimo, Emma! Assim você pode começar de novo. E a dona Lisa não precisar implicar com você e a Styl, a loja dela fica na Califórnia...
— Ela tem uma em Chelsea também,Wanda.
— Mas o apelido de Dama de Ferro na Califórnia,é na Califórnia!
Eu rio. Lisa Sam tem nacionalidade americana, especialmente californiana. Casou-se com o britânico Matt numa viagem à tradicional Londres. Pelo que minha mãe me contou, Lisa só tinha o primeiro ano de Moda quando conheceu Matt, eles namoraram por um tempo e ela não quis desmanchar com ele, então, ele fez com que ela terminasse a faculdade em Londres e, por fim, ele cresceu sendo empresário,e ela uma grande estilista. Os dois têm uma casa em L.A e viajam na maior parte do ano para lá.
Eu nem sei o que é colocar um pé pra fora de Londres.
—
Quatro dias se passaram após a minha apresentação na Styl. Já pedi as contas ao senhor Matt, que não gostou muito e se desculpou pela forma que a esposa me tratou. Eu estava tão empolgada com o novo trabalho que não queria ouvir nada de Lisa.
Brock e Katy não sabiam da minha demissão, minha mãe, mesmo com toda a sua segurança, pediu para que eu contasse a Brock,mas preferi não o fazer.
Meu primeiro dia de trabalho foi, quase que totalmente, um treinamento. Eu era jovem e sem experiência com vendas,o que encheu os olhos de Sully, a gerente da loja. Já me sinto aliviada de não ficar tensa com a presença de Lisa.
Bond Street é cercada de lojas de luxo.Prada,Colcci,Channel...
A Styl é uma nova grife que está crescendo pelos arredores de Londres e outras cidades do Reino Unido. Vive cheia, tive a sorte de colocar um currículo assim que a loja abriu por aqui, são dois turnos, cada turno composto de,pelo menos,oito atendentes.
Deus é bom,consegui o primeiro turno. De 8:00am às 4:00pm, posso ir tranquila para casa e descansar. A loja abre depois das 10:00am e eu não trabalho,aos domingos e feriados são outros oito atendentes.
—
Depois de um mês de trabalho e,rapidamente,efetivada,fico confortável com meu novo trabalho e benefícios. Minha mãe fala que Brock quase não aparece em casa, na última semana então vive fora, e senhora Lisa faz questão de avisar que ele vai dormir fora "mais um dia", não sei com quê propósito.
Finalmente sento para jantar na companhia de minha mãe quando ela começa a mastigar rápido, se preparando para falar.
— Neste fim de semana os Sam darão um jantar em comemoração ao aniversário de Katy. - avisa enquanto mexe em sua comida com o garfo
— Hm...- Solto,pouquíssimo empolgada. - Vai dobrar no serviço?
— Sim, filha. Acho que terei que dormir por lá. Eu e Wanda. Você sabe como as festas são longas...
— E a senhora sempre fica pra dormir. - Completo
— Pois é. - Ela me olha. - Eles precisam de ajuda para servir. O buffet contrato de confiança deles não conseguiu completar a quantidade de garçons.
— Tomara que encontrem alguém às alturas da família. - Falo pegando meu prato e o levando para pia
— Coloquei seu nome. Eles aceitaram.
Paro pra digerir o que minha mãe acabara de me dizer. Na minha cabeça só penso "NÃO!"
— Como assim,mãe? Eu não quero! - Exclamo voltando a mesa e sentando
— Filha, por favor. Vai ser uma grande ajuda.
— Mas poderiam arrumar outra pessoa. A senhora não me avisou.
— Porque eu sabia que você negaria. Por favor...
A feição dela me desmorona. Eu conheço essa feição. De quem precisa da minha ajuda.
— Emma...
— Ok, mãe. Mas se eu ouvir uma graça vindo da Lisa...
— Pode me entregar o seu avental. - Ela sorri
— Ótimo.
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