Na terceira vez que encontrei Hyukjae, pouco mais de uma semana depois de tê-lo visto na academia, nós tivemos o primeiro contato físico, de fato. Como explicar? Foi a primeira vez que nos tocamos pele na pele, lábios contra lábios, peito contra peito, como eu talvez sempre quisesse que acontecesse desde a primeira vez que o vi. Meio que eu começava a acreditar que coisas poderiam funcionar “à primeira vista”, porque só poderia ser chamada de paixão a coisa que eu sentia por estar longe de Hyukjae e por estar perto também.
O inverno se apressou mais rápido do que tinha direito e em uma manhã de domingo, que estava incrivelmente fria, fazendo a madeira do assoalho de casa estalar a cada passo que eu dava com os pés vestidos com meias grossas, protestando contra meu peso, eu parei em frente a janela da sala de estar e empurrei as cortinas. Através do vidro eu vi o resultado do frio da noite. Ainda não nevava, porém havia uma camada fina de um gelo cristalino cobrindo cada centímetro do gramado da frente da minha residência, quase como se cintilassem por cima de tudo que havia na rua.
Na cozinha não havia um mísero pão para que eu pudesse fazer uma refeição decente de café da manhã e a geladeira estava vazia de modo alarmante. Eu não tinha muita opção senão sair de casa naquele frio solitário e ir em busca de algo que pudesse esquentar-me o estômago antes que ele mesmo desse o jeito de devorar algo. Meu banho demorou mais do que diziam ser permitido para a preservação do ambiente, mas eu não me importei, já que a água morna caía contra minhas costas curvadas de forma que meus músculos relaxavam e se aqueciam rapidamente, me tomando até a coragem de sair de debaixo do jato.
Os cabelos úmidos roçavam em minha nuca e minhas orelhas começavam a esquentar naturalmente, então busquei um cachecol azul, o único que eu possuía e tinha uma cor viva, e enrolei em volta do pescoço, enterrando o rosto no tecido de lã grossa em seguida. Com as mãos nos bolsos do jeans escuro, eu caminhei pela calçada, lentamente, seguindo o movimento inexistente, até que eu chegasse ao centro da cidade, onde havia padarias, cafeterias e lanchonetes abertas durante o dia em que muita gente tinha preguiça de cozinhar a própria comida.
Havia uma cafeteria ao ar livre, próximo a uma pequena fonte d'água que esguichava para todos os lados de modo que não parecia que congelaria algumas horas mais tarde. O sol começava a aparecer por trás das nuvens que rondavam o céu da cidade, então me permiti sentar em uma das mesas vazias e buscar no cardápio que a célere atendente me ofereceu. Quando terminei de fazer meu pedido, ela me perguntou se eu queria mais alguma coisa, jogando os cachos castanhos e bem armados para trás do ombro, como se fizesse charme, e me sorriu com os lábios rosados. Eu poderia ter dito que queria mais alguma coisa só para agradar e a elogiaria por ser tão bonita, mas minha atenção foi tomada por algo muito mais aprazível vindo de trás da garota, tomando a atenção que me era cobrada pela atendente.
Hyukjae andava como se fosse um modelo, quase desfilando com aqueles passos firmes e queixo levantado. Vi quase em câmera lenta ele passar a língua sobre os lábios e sussurrar algo que não pude compreender direito. Talvez somente um “olá”, mas até para isso o meu cérebro se recusava a absorver. Seus olhos estavam escondidos por uns óculos de sol que combinavam com o moletom cinza e contrastava com o cachecol vermelho. Talvez ele sentisse tanto frio quanto eu. A atendente virou para trás e compreendeu que eu talvez estivesse acompanhado, então bateu em retirada com uma expressão magoada estampada no rosto, mas que nem me importei.
- Donghae, feche a boca.
Seus dedos finos vieram de encontro ao meu queixo, fazendo que meus lábios se colassem um no outro mais uma vez. Eu ao menos havia percebido que estava com a boca aberta e o queixo caído. Ele riu e falou que eu ficava engraçado com aquela expressão abobalhada, e só aí eu percebi de verdade o quão doce e melodiosa sua voz era, levemente fanha e anasalada, mas que combinava com o seu jeitão, descomunalmente. Hyukjae não pediu permissão, apenas se sentou na cadeira ao meu lado e colocou um dos pés calçados sobre o joelho, ficando ligeiramente recostado no assento e incrivelmente sedutor ao apoiar o rosto na mão direita.
- Você já tomou café da manhã?
- Já, agora vou esperar você terminar de comer e vamos a um lugar.
A atendente voltou com meu café e salgados em mãos – ou bandeja, como quiser –, e se demorou ao olhar para Hyukjae com os olhos delineados e brilhosos, talvez se perguntando a razão de um cara pintar o cabelo daquele loiro platinado ou o achando tão bonito quanto eu achava. Enfim ela foi embora e ele sorriu de lado, quase debochado. O encarei, tentando desvendar a razão daquele risinho que adornava sua boca cheinha.
- O que foi?
- Nada, Hyukjae.
Ele ao menos questionou, mas me olhou como se soubesse algo que eu não sabia. Talvez ele visse através de mim e me conhecesse melhor do que eu mesmo. Hyukjae tirou a carteira de cigarros do bolso, da mesma marca anterior, e puxou um maço de lá, deixando entre os dedos enquanto a outra mão caçava um isqueiro com temática inglesa no jeans. Não imaginaria que um dia ele pararia de fumar por minha causa, mesmo que eu gostasse de ver seus dedos prenderem o cilindro, mesmo que eu adorasse ver como seus lábios formavam um bico meigo demais, ele entendia que eu sentia medo de vê-lo morrer, entretanto eu continuei a achar única a forma como aqueles dedos se movimentavam.
Após várias goladas de café e várias mastigadas consecutivas, eu terminei o meu café da manhã e paguei a conta com a mesma atendente que se mostrava rabugenta depois que me viu com Hyukjae, que amassava o cigarro no cinzeiro. Nós nos levantamos e ele me ofereceu seus óculos escuros, que deixei em meu rosto por algum tempo até me sentir quase cego debaixo da sombra que fazia ao lado da cafeteria, sob as poucas árvores que havia ali.
- Eu não estou enxergando, Hyukjae.
- Está frio, não está?
Ele me ignorou, mas eu também não me importei. Eu valorizava demais as pequenas coisas para me importar em ser ignorado.
- Me abraça?
Fiquei confuso.
- O que? Ah, Hyukjae... É estranho.
Mesmo assim ele me puxou contra seu corpo e passou as mãos grandes por minhas costas. Aquilo me aqueceu de verdade, como as roupas grossas que eu vestia não conseguiam fazer. Senti meu rosto ficar cálido, provavelmente avermelhado e fechei os olhos após sentir o choque dos óculos de sol contra meu rosto.
- Me desculpa, Hae.
Hyukjae tirou os óculos de meu rosto e eu soltei um gemido, mais desgostoso por me afastar de seu corpo do que o baque da armação em minha pele. Ele guardou os óculos no bolso de trás e segurou meu rosto entre as mãos e começou a beijar meus olhos, e então minhas bochechas, seguindo pelo meu nariz e descendo pelo queixo...
- Eu vou te beijar.
Ele disse e roçou o nariz no meu ternamente, com o corpo colado em meu peito. Sua boca deslizou sobre a minha em uma carícia e prendeu meu lábio entre os seus, para então passar a língua na brecha de minha boca e adentrar a cavidade. Fechei os olhos mais uma vez e me deixei levar pelo movimento que Hyukjae fazia contra meus lábios. Seu beijo tinha um gosto doce e de cigarro.
Principalmente, gosto de Hyukjae.
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