Havia convocado a reunião com a diretoria da London Stock Exchange e Emma e eu nos encontrávamos dentro da sala, esperando o restante dos executivos tomarem seus lugares. Assim que todos assumiram seus postos, incluindo o diretor de investimentos, Jim Folks, fui para a frente da sala, me posicionando em um lugar que todos pudessem me ver e coloquei os slides que havia preparado.
— Esse é o ex chefe de operações na filial de Denver — disse, mostrando a foto de um homem.
— Nós somos pessoas ocupadas, srta. Gilbert. O que realmente estamos fazendo aqui? — perguntou um homem entre todas as pessoas na mesa.
— Essa moça que estão vendo — ignorei-o, mostrando agora a foto de uma mulher —, dirigia a divisão de ações em Dallas. Morreu asfixiada em 2005, quando um cano de gás natural perto de sua casa se rompeu, mesmo nunca tendo problemas com a tubulação.
Todos na sala converteram suas expressões de tédio para horror e espanto.
— Esse outro homem trabalhava em Nova York, ganhou um bônus de 5 milhões de dólares em 2009, depois morreu afogado enquanto nadava em um lago. — disse e direcionei meu olhar para Jim Folks. — O fato estranho da morte desse homem é que quando estava na faculdade, trabalhou como salva-vidas em uma praia.
— Com todo respeito, srta. Gilbert — disse Folks com desdém. — A senhorita encontrou Peter Downey, teve uma overdose em seu apartamento, caso encerrado.
— Peter Downey foi assassinado. — Declarei, atraindo olhares confusos e assustados. — A polícia está investigando. E o que todas essas pessoas têm em comum com Peter? Bem, eu acho que a pessoa que matou Peter, também matou Garry Noris, o antigo diretor de operações e essas três outras almas infelizes que mencionei.
Jim Folks desviou seu olhar de mim e passou a encarar o chão, e então um agito na sala de reunião iniciou.
— Eu não consigo achar um motivo plausível para alguém de fora dessa empresa ter cometido esses crimes — disse e o tumulto intensificou-se. — Acho que pode haver um sociopata no meio de vocês. Um assassino astuto e muito metódico.
— Está dizendo que alguém está matando para chegar ao topo da empresa? — perguntou uma mulher. — Isso parece loucura para mim.
— Eu adoraria estar errada, mas alguém batizou a salada de Peter Downey — disse e a mulher contraiu-se. — Quanto ao restante, deixem-me trabalhar.
Voltei meu olhar a Jim Folks, que me observava atentamente e direcionei minha fala a ele.
— Preciso de acesso a seus arquivos. Se a pessoa estiver aqui, vou encontrá-la.
— Isso já deu, srta. Gilbert. Tenho certeza de que não é necessário — protestou Folks, olhando para todas as pessoas na mesa em busca de apoio, encontrando apenas olhares duvidosos e julgadores.
— Pode ter um assassino na London Exchange!
— Não tem nenhum assassino, e sabe como eu sei? Porque o único com o plano de carreira que você descreveu sou eu. O que? Está dizendo que eu matei cinco pessoas? — exclamou, forçando uma risada, percebendo os olhares que recebeu.
— Bem, isso foi bastante constrangedor, sr. Folks, mas o senhor é um suspeito sim.
Emma e eu voltamos para casa, uma vez que minha amiga tinha um compromisso profissional. Estava me dedicando ao preparo do almoço com Amélia quando a campainha tocou. Atendi a porta e me deparo com Jim Folks. Faço um sinal para que entre.
— Vim entregar seu cheque pessoalmente — disse e direcionou-se para a sala, sentando-se no sofá. — E precisamos conversar.
— Precisamos? — perguntei.
— Eu vim acabar com isso. — respondeu.
— Isso é muito simples, confesse. Nos pouparia muito tempo e trabalho.
— Tem ideia do que fez comigo hoje? — perguntou. — Sabe como é sobreviver em um lugar como a London Exchange?
— Acho que sair do seu caminho seria um bom começo — ironizei, sentando-me na poltrona em sua frente.
— Lutei muito durante anos para alcançar o cargo de diretor de operações, e todo mundo sabe que é apenas um degrau para a presidência. E você me acusa de assassinato? — perguntou ofendido. — Acha que não estão comentando? Fofoca é o veneno daquele lugar. Não importa se sou inocente, nunca conseguirei aquele cargo.
— Depois que você disse a palavra “inocente” referindo-se a você mesmo eu desconsiderei todo o resto.
— Então terei que te provar, certo? Aquele homem que mostrou hoje, a primeira das supostas vítimas, desapareceu em um acampamento em agosto de 2003. Ele viajou em 7 de agosto. Então volte em 9 de agosto — disse, pegando alguns papeis em sua pasta, entregando-me.
— O que é isso? — perguntei, pegando os papeis.
— Meus registros médicos. — respondeu. — Eu fiz uma cirurgia no dia 6 de agosto de 2003. Houve complicações e não recebi alta antes de 12 de agosto. Eu não poderia ter matado aquele homem. Acha que tem um sociopata entre nós? Então te contarei um segredinho, srta. Gilbert: todos somos sociopatas.
O homem levantou-se, entregando o cheque com meu pagamento e foi embora. Logo Emma chegou e contei para ela o que havia acontecido.
— Jim Folks não matou o primeiro homem — refleti em voz alta.
— Parece que não — disse Emma, fazendo uma pausa. — Elena? Tenho um encontro agora a noite com um rapaz que conheci pela internet.
Olhei-a com entusiasmo e fiz sinal para que continuasse.
— Mas não sei se devo ir. Faz muito tempo que não faço isso, estou um pouco enferrujada.
— É claro que você vai! — disse, segurando suas mãos. — E se por acaso nada der certo, pode usar como oportunidade para praticar os métodos de investigação que tem visto.
Emma logo arrumou-se e estava saindo. Disse que eu podia mandar mensagem a qualquer momento, mas neguei dizendo para aproveitar, pois não iria atrapalhá-la.
Voltando para o caso que estava em minha frente, folheei novamente as páginas do registro médico de Folks e encontrei algo que havia passado despercebido. O nome de Donna aparecia como contato emergencial na ficha.
Chamei um táxi até a London Exchange na esperança de não ser tarde demais, visto que o relógio beirava as 22 horas.
Entrei na empresa e encontrei meu alvo no elevador.
— Com licença, Donna! — chamei a mulher. — É Donna, não é?
A mulher assentiu com a cabeça retribuindo com um sorriso.
— Ninguém se lembra da secretária, não é Donna?
— Desculpe, o que? — perguntou.
— Como carreira, tem seus limites, mas o cargo de secretária proporciona um certo manto de invisibilidade. — Respondi, parada em frente ao elevador junto dela.
— Eu não sei do que a senhorita está falando, mas sei que o senhor Folks a expulsou do prédio — respondeu.
— Você está com ele há um bom tempo, não está? — perguntei retoricamente. — Até esta noite eu achava que você tinha começado a trabalhar com ele depois de ele ter se mudado para Londres. Mas então eu vi o seu nome como contato de emergência em uma cirurgia que ele fez em Denver. E foi com ele para Dallas também.
— O sr. Folks é um bom chefe e somos leais um com o outro.
— Jim Folks não foi o único a ganhar com as mortes, não foi?
— Devo chamar os seguranças, srta. Gilbert?
— Ah, claro que sim! Vamos incluí-los na nossa conversa. — Disse sarcástica.
O elevador chegou e entramos juntas nele, que descia em direção ao estacionamento.
— Toda vez que Jim Folks subia de cargo, você se beneficiava com algo, aumento de salário, opções de ações, a empresa até contribui com sua aposentadoria. — disse.
— E daí? Eu tenho dado anos da minha vida a eles. — Rebateu.
— Sugiro que comece a tagarelar, talvez assim pegue uma pena menor. — Disse me aproximando.
— Você se acha tão esperta que realmente me seguiu desarmada até um estacionamento vazio! — disse e tirou de sua bolsa um aparelho de choque e usou contra mim.
Eu caí no chão sentido meus músculos se contraindo, perdendo gradativamente a visão até ficar completamente escuro.
Aos poucos fui abrindo os olhos e senti minha cabeça doer e latejar. Tentei levar a mão nela, mas estava presa. Olhei em volta e me encontrava no banco traseiro de um carro.
— Você acordou! Ótimo! — a voz de Donna veio do banco do motorista.
— Devo admitir que aprecio essa sua iniciativa — disse, percebendo que meus pés também estavam amarrados. — Mas acho que isso não dará certo para a senhora. Foi muito precipitado.
— Contou a alguém sobre mim? — perguntou e eu não respondi. — Chegaremos à casa de campo do senhor Folks em alguns minutos. Em uma semana ou duas, por uma ligação anônima de alguém dando uma dica, a polícia vai encontrar seu corpo enterrado na propriedade e todos saberão que você estava certa e que o senhor Folks lhe matou antes que pudesse provar.
— Vai incriminar seu chefe, e depois se aproveitar de algum outro executivo que será promovido. — Disse.
— A senhorita é muito inteligente mesmo!
Chegamos ao destino que Donna havia informado e escutei meu celular recebendo uma mensagem.
— Emma é a mulher que está sempre com você, não é? — perguntou, lendo a mensagem que eu havia recebido. — É a quinta vez que ela manda mensagem nos últimos vinte minutos.
— Ela não vai para... É bastante insistente. Eu não ficaria surpresa se ela chamasse a polícia — disse, provocando-a.
— Bom, nesse caso, é melhor que ela saiba que está tudo bem. — Disse e começou a responder as mensagens.
Donna me tirou do carro e me fez ficar em pé ainda amarrada em uma parte de terra. Olhei em volta e era um lugar imenso, escuro e totalmente afastado.
— Você literalmente vai me fazer cavar a minha própria cova? — perguntei, rindo sarcástica.
— Você já levou um tiro? — perguntou, irritada com a minha provocação, com a arma apontada para mim.
— Não, mas imagino que dificulte um trabalho manual. Pode atirar em mim, arrancar minhas unhas, mas minha resposta é não. Eu me recuso a cavar um buraco para você me enterrar — disse e ouvi um barulho vindo das árvores.
— Não tem problema, eu mesma faço isso — disse Donna, pegando a pá.
— Eu estou quase morrendo, acho que é uma boa hora para você compartilhar seus planos. — disse, tentando desamarrar minhas mãos.
Nesse momento, ouvi o barulho de eletricidade e tinha certeza de que a mulher tinha usado aquela arma de choque contra mim novamente, até ver seu corpo estirado no chão. O choque havia sido na mulher, fazendo-a cair e impedindo seus movimentos pela dor. Tentei ir pulando para perto do carro a fim de me proteger, mas encontrei dificuldade por meus pés estarem amarrados. Então, senti mãos puxarem meus braços me virando e senti cortar a corda que prendia meus pés. O cheiro da mistura do mesmo cigarro Dunhill e um perfume que eu já reconhecia soprou e eu já sabia quem era, e pressentia o pior.
— Por que está fazendo isso? — perguntei atônita. Quando ajustei meus sentidos, ele ainda me desamarrava. — Talvez eu tenha subestimado sua burrice, já que comigo morta você poderia executar seu plano sem ninguém atrapalhar. Mas aí está você, me libertando.
— Você tem algo que me pertence. Meu plano envolve algo que você está escondendo. Salvei sua vida e agora você está em dívida comigo. — Ele disse calmamente.
— Certo, eu realmente subestimei o quanto você pode ser tolo. — Disse sarcástica, com minhas mãos livre, massageando o local em que as cordas estavam amarradas. — Você me desamarrou porque quis. Eu não lhe devo nada.
— Eu não diria isso em seu lugar, Elena. Preferia morrer? — Damon se afastou. — Tenho muitos truques contra você que estão implorando para serem usados.
Damon manteve seus olhos cravados em mim durante um longo tempo, tempo o suficiente para eu conseguir analisar sua aparência. E então virou-se e foi embora.
Logo ouvi as sirenes dos carros da polícia e um alívio instalou-se em meu peito.
Os paramédicos chegaram e começaram a me examinar. Emma se aproximou e sentou-se comigo.
— Foi muito conveniente a polícia chegar naquela hora. Conveniente demais para ser coincidência — disse para ela. — Foi aquela mensagem do meu celular, não foi?
— “Está tudo bem. Celular desligado, erro meu! Te vejo mais tarde”. Só isso. Sem emojis nem abreviações indecifráveis. Não parecia uma adolescente, ou seja, não tinha sido você quem digitou. — Emma disse com um sorriso.
— Eu a induzi a digitar por mim. Sabia que ela não iria utilizar meu estilo de linguagem avançada — disse cutucando-a. — E sabia que você entenderia. Muito obrigada, Em.
Chegamos em casa depois de conversarmos sobre tudo o que havia acontecido, incluindo o episódio com Damon, e já me sentei na sala com Emma, percebendo seu desconforto por algo.
— Como foi seu encontro? — perguntei.
— Bem, nada do que eu esperava. Ele me contava as coisas e eu percebia de diversas formas diferentes suas mentiras, ou alguns detalhes que ele escondia — respondeu triste.
— Tem um preço.
— O que? — perguntou.
— Aprender a ver quebra-cabeças em tudo. Estão por toda a parte, e uma vez que começa a procurar, é impossível parar. — Fiz uma pausa, refletindo sobre mim mesma. — O que acontece é que as pessoas, e todos os enganos e ilusões que informam tudo o que elas fazem, tendem a ser os quebra-cabeças mais fascinantes. Mas claro que nem sempre elas gostam de ser vistas desse jeito.
— É um jeito solitário de viver — disse Emma.
— Como eu disse, tem um preço.
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