História Um Novo Olhar - Despertar

JUGHEAD JONES

Ouço vozes baixas e distintas, que se misturam dentro da minha cabeça com lembranças do passado. Sinto meu estado de consciência alternar entre lucidez e escuridão, porém, fisicamente nada mexe. Meus olhos e minha boca, estão resolutamente recusando a se abrir. Estou preso, dentro do meu próprio corpo.

— Por que ele ainda não acordou doutor Hunt? — Mãe? Quando ela chegou aqui? Sua voz está tão angustiada.

— Infelizmente, não tenho resposta para essa pergunta. — essa é a mesma voz que estava conversando com Betty a algum tempo atrás.

—O senhor disse 48h,já fazem mais de 72h. — o quê? Fazem três dias que estou assim?

— Acalme-se senhora Jones. Os exames do Jughead estão bons. Operamos ele a tempo, resolvemos a hemorragia e repusemos o sangue que ele perdeu, sem que o coração sentisse grandes impactos. Apesar da forte pancada na cabeça, e da gravidade dela, ele teve sorte, o cérebro está intacto, com todas as funções preservadas, sem edemas ou inchaços .

— Então por que ele ainda está assim?— a voz dela é triste e chorosa.

— Cada pessoa tem seu próprio tempo de recuperação. Vamos aguardar o tempo do Jughead.

De repente as vozes se afastam, a neblina surge e meu mundo afunda na inconsciência outra vez.

Estou novamente numa espécie de limbo. O lugar não está escuro e sombrio como da última vez, está iluminado e tranquilo. Olhando para os lados não consigo ver onde ele começa ou termina e isso me causa um frenesi assustador.

A minha frente está novamente a porta vermelha de outrora, por minha última experiência sei que ela me levará a algum lugar do meu passado e estou curioso para saber onde. Giro a maçaneta , abro-a e caminho para dentro , afim de descobrir o quê ela me reserva desta vez.

Três passos e estou no refeitório da escola Riverdale. Olho em volta e vejo rostos conhecidos por toda parte, inclusive o meu, o de Betty, Archie e Kevin. Estamos sentados em uma das mesas terminando nosso almoço — eu me lembro disso, estávamos no 8° ano ,faltavam 3 dias para o baile de primavera e esse era exatamente o assunto da conversa— minha mente trás vívida a lembrança. 

Caminho aproximando-me da mesa, eles não conseguem me ver , nem ouvir e eu os analiso.

— Então vocês já tem companhia para o Baile? — pergunta Betty encarando deliberadamente Archie, que a ignora parecendo nem perceber que na verdade a pergunta dela foi para ele. Ela desvia o olhar envergonhada.

— Não curto bailes. Então... — diz o jovem Juggie inclinando a cabeça e fazendo uma leve careta.

— Já eu, amo bailes!!! Minha roupa é divina e já pensei em todos os acessórios. Pena que não tenho um acompanhante para irmos com ternos combinando. Garotos assumidamente gays na nossa idade são itens raros. Nem todos tem coragem como eu. — diz Kevin sorrindo e jogando um beijinhos na direção de seu ombro direito.

—Archie? — pergunta Betty tímidamente.

— Ahhh... Ainda não sei. Talvez eu leve uma das líderas de torcida que eu pequei na semana passada. — solta uma gargalhada como quem se gaba pelo feito. — Ou se nenhuma delas aceitar, talvez eu leve você. Pode ser?

A jovem Betty se surpreende com a resposta de Archie e vejo-a empalidecer decepção, por ser a última opção do cara por quem ela é apaixonada

—Cla..Claro! Sem problemas. É só dizer. Se nenhuma delas quiser, vou adorar ir com você.— diz a loira esforçando-se para parecer indiferente. — Bem, sobre trabalho de biologia, podemos marcar hoje depois da escola lá em casa?

— Beleza, mas temos que terminar até as 18 h. Marquei de ir ao Pop's a Jilian Kim, não quero ter que remarcar. — impõe o jovem Archie.

— Ótimo —responde Betty, revirando os olhos de irritação e desaprovação. — Kevin? —questiona ela e ele assente positivamente com a cabeça— Jughead?

— Depois da escola, na sua casa. Estarei lá. — afirma meu eu do 8° ano.

Parado ao lado da mesa observo Betty passar por mim, triste e irritada. Sinto a necessidade de segui-la, mesmo que não consiga notar minha presença, não quero deixá-la sozinha. Ela deixa a bandeira do almoço na bancada, atravessa a porta do refeitório e eu faço o mesmo. Ao invés de ir parar no corredor do colégio como o esperado, fui transportado e agora estou na sala da casa dos Cooper onde os jovens Betty, Archie , Kevin e Jughead estão terminando o Trabalho de Biologia.

— Bem, acho que fotossíntese era nosso último tópico. Então ...terminamos! — diz Kevin sorrindo.

— Show. Assim não me atraso pro encontro com a gata da Jilian. — Archie sorri e mexe as sobrancelhas. — Estou pensando em chamar ela para ir ao baile comigo, o que acham?

— Legal! — reponde Betty com uma animação forçada. — Vou pegar um refrigerante, alguém quer? — diz ela ansiosamente querendo mudar de assunto para disfarçar seu desapontamento. Todos respondemos que sim e ela sai da sala para pegá-los. O Juggie mais novo, percebendo o seu desconforto levanta-se e a acompanha até a cozinha.

— Tá tudo bem? — pergunta ele a ela.

— Sim. Está tudo ótimo. Por que não estaria? — responde ela suprimindo um suspiro.

— Talvez por que, você tenha jogado indiretas para o Archie sobre o baile a tarde inteira e ele ainda esteja agindo como um idiota. — argumenta diretamente o jovem de gorro cinza.

— O que?? Não... Não! — ela sorri nervosamente. — Nada a ver.

— Sabe... sou amigo do Archie, e eu adoro aquele cara, mas ele pode ser bem insensível quando o assunto é garotas. O jeito como ele trata você as vezes não é legal. Por quê você permite?— Betty parece não saber o que responder.

— Tá, eu admito. — ela fala revirando os olhos— ao menos uma vez eu gostaria que ele me notasse mais. Talvez se eu mudasse um pouco o visual, me vestisse mais como as outras garotas, ou passasse maquiagem, quem sabe? — fala tristemente encarando os próprios dedos.

— Tá vendo. É disso que eu estou falando. Por que sente que deve mudar para chamar a atenção dele? —ela dá de ombros sem ter resposta para a pergunta — Você tem os olhos mais azuis e brilhantes que eu já vi na vida, esse rosado da sua pele combina perfeitamente com o dourado do seu cabelo, quando você sorri, faz todos a sua volta quererem sorrir também e surgem duas lindas covinhas, bem aqui.— o Juggie do passado toca delicadamente o dedo indicador no rosto de Betty para lhe mostrar o lugar e ela lhe oferece um sorriso tímido e charmoso— Você é linda Betty , e não precisa mudar nada.

Ela o olha fixamente, emocionada pelos elogios recém recebidos, e ele retribui o olhar e respira fundo como quem está tomando coragem para algo.

—Betty...Você... quer ir ao baile comigo?

—Quer ir ao baile comigo? — Ele faz que sim com a cabeça —Mas você disse que não gosta de bailes.

— Acho que esse não vai ser ruim, com tanto que eu esteja com você. — ele responde meio desconcertado e o semblante dela se alegra num sorriso brilhante.

Antes que ela tenha tempo de aceitar, ou falar qualquer coisa, sua mãe aparece na cozinha interrompendo-os.

— Ah... Isso é muito gentil Jughead, Mas não será preciso . — diz Alice Cooper de repente.

— Mãe??? O que, você fala por mim agora??? A quanto tempo você está aí?

—Tempo suficiente. — ela encara Betty como se a estivesse repreendendo e depois vira-se para Juggie. — Você foi um fofo em oferecer-se para ir com ela , mas ela já tem companhia para o baile.

— O quê? — Betty pergunta a mãe ao mesmo tempo em que Kevin e Archie juntam-se a eles na cozinha.

— Ei... do que estão falando? Quem vai ao baile?— Pergunta Archie inocentemente.

— Archiezinho, aí está você! Vêm já aqui me dar um abraço — ele obedece — Eu estava aqui dizendo ao Jughead que você e Betty vão juntos ao baile, não é mesmo? Diga a ele!

Após alguns segundos e trocas de olhares constrangidos entre ele e Betty, Archie responde a contragosto.

— Claro tia, como quiser. Agora eu preciso ir, tenho um compromisso. Até mais Tia. Vejo vocês na escola pessoal. — despede-se ele parecendo irritado.

— Na verdade, se vocês já terminaram o trabalho. Acho que deviam ir também. — sugere a mãe de Betty.

— Mãe! Por favor, não seja desagradável. — repreende a filha.

— A querida foi só uma sugestão. Os pais dos seus amigos devem estar preocupados. — responde a mãe com um sorriso falso enquanto ela e Betty se encaram.

— Tudo bem, preciso mesmo ir, combinei com meu pai de encontrá-lo na delegacia. — conta Kevin.

— Também preciso ir. Foi bom ver você senhora Cooper. — o jovem Juggie acena com cabeça e sorrir para ela com a mesma falsidade que ela sorrir para ele. Betty suspira.

— Levo vocês até a porta. — Kevin se despede dela com um caloroso abraço e sai apressado para encontrar seu pai.

— Então... Meu convite. Ainda está de pé. — diz o jovem Juggie cheio de esperança em seu olhar.

—Obrigada Juggie. Mas minha mãe...— ela não termina a frase—Acho melhor eu ir com Archie. No fim era mesmo isso que eu queria- ela acrescenta e sorri, mas seu sorriso não tem sinceridade nem o mesmo brilho de antes.

— Você não deveria ser a última opção de ninguém, devia ir com alguém que queria mesmo estar com você. — Ele abre um pequeno sorriso e a beija no rosto — Nos vemos na escola amanhã. — então vai embora.

A imagem dos jovens a minha frente começa a se desfazer feito fumaça, diante dos meus olhos. Sou puxando novamente, para o meu limbo, e começo a ouvir as vozes que vem das pessoas a minha volta.

— A culpa é minha. Nós estivermos afastados nos últimos dias. Eu não sabia que ele estava passando por algo difícil. — é voz de Emy. Não sabia que ela estava aqui também. Sinto meus dedos do pé formigarem e minha boca seca.

— Você não teve culpa querida. Ninguém podia imaginar que passaríamos por dias tão difíceis — ouço a voz da minha mãe responder e sinto minha cabeça pinicar de ansiedade, a quanto tempo será que estou aqui?

— Se eu tivesse respondido as mensagens... talvez ele não tivesse vindo até aqui atrás de mim. Eu sou um desastre.— diz Betty. Ela segura em minha mão e sinto meu corpo estremecer. O rosto de Betty está molhado por causa das lágrimas e posso senti-lo quando ela se senta ao lado da minha cama e o encosta em minha mão direita.

De repente me dou conta que consigo controlar meu corpo novamente. O peso sobre mim sumiu e a única coisa que me impede de abrir os olhos é a iluminação forte do quarto.

Abro os olhos com dificuldade tentando ignorar a claridade. Com os olhos semicerrados tento levantar a cabeça do travesseiro para olhar em volta, mas sou parado pela dor cortante em minha nuca . Mais escuto que vejo, mas pude perceber que as lágrimas de Betty comoveram também a Emy e minha mãe que juntam-se a ela em choro

— Por quê vocês estão chorando? — falo com dificuldade enquanto encaixo o rosto de Betty em minha mão e o acaricio limpando a lágrima que cai.

— Jughead! — surpreendidas, elas dizem meu nome em coro.

Continua....