— Por que não? — Rachel jamais questionaria a decisão de Quinn, se ela não a olhasse com tamanha arrogância.
— Porque assim decidi — ela ralhou. — Se houvesse mais a dizer, eu lhe diria.
— Mas…
— O que foi? — Ela fazia questão de sustentar o sorriso petulante. — Não gosta que lhe oculte a verdade acerca de minhas decisões?
Ao sentir a raiva crescer, Rachel calou-se. Não era isso que ela fazia toda vez que Quinn lhe perguntava algo? Não se recusava a dar detalhes da desordem que as crianças aprontavam na casa?
— Sei qual é sua intenção — ela concluiu. — Está me pagando com a mesma moeda.
Quinn se aproximou.
— Eu diria que sim.
— Mas são situações totalmente diferentes — Rachel insistiu.
— Por quê?
— Bem… São diferentes.
— Oh, certo. Isso explica tudo. — Quinn sentou-se na beirada do alçapão, diante dela.
— Quer dizer que não posso usar um dos vestidos? — Rachel ensaiou um sorriso frágil.
— Não, até me contar por que você e as crianças estavam chorando.
— Quinn, você está exagerando. Não foi nada demais.
— Não gosto de segredos.
Ambas se encararam durante um momento. Finalmente, Rachel se rendeu.
— Está certo. As crianças arruinaram meus vestidos — ela revelou. — Contudo não quero que as castigue. Na verdade, foi melhor assim. Elas me testaram, e, enfim, fui aprovada. Estamos nos dando bem agora. Ginny me ofereceu as roupas.
A princípio, Quinn pareceu duvidar. Porém, aos poucos, cedeu.
— Muito bem. Vou aceitar essa explicação.
— E quanto aos vestidos?
— Há algo mais que devo saber?
Ela a fitava ansiosa e Rachel quase sucumbiu. Quão tentador era contar-lhe toda a verdade para aliviar o fardo que carregava. Quinn entenderia, não? Talvez. Provavelmente.
Mas e se não entendesse?
— Não — Rachel respondeu, por fim. — Não há nada para lhe contar.
— Escolha a roupa que quiser. — Ela levantou-se. — Alguém tem de usar aqueles trajes.
— Obrigada.
— De nada.
Quando ela fez menção de descer, Quinn chamou-a:
— Rachel?
Ela parou e fitou-a.
— Tem certeza? Não quer me contar mais nada?
— Não. — Rachel desceu o mais rápido possível.
Por quanto tempo alguém poderia suportar?
Quinn jogou os diagramas na mesa e virou-se. Como conseguiria se concentrar no trabalho com tamanha algazarra do lado de fora? Com tantas gargalhadas e diversão?
Através da janela, avistou os raios da manhã sobre as árvores do jardim. As crianças brincavam à sombra com Rachel.
Observava-os por algum tempo, ao invés de estudar os diagramas da máquina de ceifar que Thomas Douglas lhe dera. O fato de o inventor ter saído naquela manhã para outro passeio errante não ajudava.
Rachel e as crianças haviam decidido erguer uma tenda sob as árvores. Quinn os vira sair do celeiro, carregando o material necessário. Com a orientação de Rachel, esticaram uma corda entre duas árvores, penduraram mantas sobre ela e prenderam as pontas com pedras para formar uma tenda.
Quanta paciência ela tinha. Levou o dobro do tempo para os três terminarem a construção da tenda. Rachel os acompanhara passo a passo, mostrando o que fazer, encorajando-os e rindo com eles. Entoaram algumas cantigas. Ela correu atrás das crianças até caírem no chão às gargalhadas.
Após uma rápida viagem à casa, os quatro se instalaram no interior da tenda para divertir-se com os brinquedos que haviam levado. Quinn não podia enxergar o que acontecia. Somente escutava as vozes suaves.
Porém, gostava de observá-los. Todos eles. Inclusive Rachel.
Não se lembrava de ter escutado o riso dos filhos. Fazia quanto tempo? Meses, sem dúvida. Os três não se mostravam felizes desde a morte de Lídia.
Rachel ria também. Na verdade, parecia uma criança. Era visível o cuidado extremo que despendia aos três.
Até agora Quinn estivera satisfeita por esconder-se em seu estúdio. Devido ao evento daquela noite, a casa encontrava-se em plena atividade. As criadas corriam de uma lado para o outro, limpando e arrumando. Ela não tinha a menor idéia do que faziam exatamente. A sra. Royce levantara antes do amanhecer para cozinhar.
Quinn temia que, se colocasse o nariz para fora do estúdio, alguém lhe perguntaria algo sobre o cardápio ou as flores. De quando em quando, uma das criadas ia ao jardim e conversava com Rachel. Ela não sabia de que se tratava.
De repente, uma rajada de risadas reverberou pelo estúdio. O doce som de seus filhos. Quinn mirou os diagramas na mesa e, em seguida, olhou pela janela. Levantou-se e foi ao jardim.
A tenda não era alta suficiente para as crianças ficarem em pé. Portanto, Quinn ajoelhou-se e espiou o interior. Havia um cobertor sobre o gramado. Rachel estava sentada em uma extremidade, com Hannah no colo. Os outros três encontravam-se ao redor entre livros, bonecas e brinquedos.
— Papa! — Cassie exclamou, ao vê-la.
Ela sorriu, feliz ante a reação alegre dos filhos.
— Que bela tenda vocês montaram.
— Foi idéia da srta. Rachel — Ginny contou.
— Entre, papa— Cassie convidou-a. — Estamos tomando chá.
Cada uma das crianças segurava uma boneca e uma xícara de chá em miniatura. Todas, inclusive Drew.
— Srta. Berry, podemos conversar um minuto?
De joelhos, Rachel aproximou-se da abertura da tenda, ainda segurando Hannah.
— Sim?
— Por que meu filho está com uma boneca? — Quinn sussurrou.
— Porque estamos brincando de casinha.
— Entendo. — Quinn refletiu por um instante. — E por que meu filho está brincando de casinha?
— Porque, em maioria, somos meninas e escolhemos essa brincadeira. Ele é minoria.
— Sei. — Quinn afastou-se da entrada. — Drew! Venha aqui!
O menino saiu, assustado.
— Não fiz nada.
Quinn abraçou-o pelos ombros.
— Tudo bem brincar de...Casinha, mas talvez você pode-se vim ao celeiro comigo. Tenho trabalho a fazer e preciso de sua ajuda.
— Verdade? — Drew sorriu, encantado.
— Verdade. — Quinn olhou Rachel.
— Nossa...Talvez vocês devessem depois do trabalho, mastigar tabaco e tomar um gole de uísque. Talvez possam cavalgar até o povoado para procurar algumas mulheres.
__Nao vejo como isso possa ser uma ideia ruim.
Rachel riu, ciente de que ela estava brincando.
— Que bom. Nós continuaremos nosso chá.
Quinn e Drew começaram a se afastar quando Rachel a chamou. Agora o lindo rosto expressava certa preocupação.
— Vai tomar conta dele?
— Vou. — A devoção para com o menino emocionou-a de forma inesperada. — A propósito, descobri a ligação entre sua mãe e o sr. Douglas.
Ao meio-dia, Rachel levou as meninas para almoçar. A sra. Royce e as ajudantes saracoteavam pela cozinha em uma coreografia impressionante. Sem atrapalhar a movimentação, Rachel tirou do forno um prato de carne com legumes e um jarro de leite. Logo após servir a refeição, Quinn e Drew chegaram. As crianças ficaram surpresas quando a mãe sentou-se à mesa com elas.
— Como foi o trabalho? — Rachel perguntou, segurando Hannah e servindo o menino.
— Eu e papa trabalhamos muito, não é, papa? — O rosto de Drew estava iluminado.
— Muito mesmo. — Sem pedir, Quinn pegou Hannah para que Rachel pudesse atender os outros.
— Posso trabalhar com você, papa? — Cassie perguntou.
— Sempre preciso de ajuda, Cassie.
Ela exultou de felicidade.
Enquanto almoçavam, as meninas contaram a mãe o que fizeram na tenda, e Drew relatou a Rachel o trabalho que realizara no celeiro. Quinn carregou Hannah quanto pôde, mas não estava acostumada a comer e lidar com um bebê. Por fim, desistiu e entregou-a a Rachel.
— Podemos brincar na tenda? — Ginny pediu, ao terminar a refeição.
— Somente algumas horas — Rachel determinou. — Vocês precisam tomar banho e vestir-se antes de os convidados chegarem.
Quando as crianças saíram da cozinha, Rachel virou-se a Quinn.
— Drew pode acompanhá-las? Ou pretende mandá-lo caçar um cervo para o jantar?
Quinn riu.
— Notei que preciso passar mais tempo com ele. E com as meninas também.
— Vão adorar.
— É agradável almoçar com as crianças — Quinn comentou.
— Você não realizava as refeições com elas… antes?
— Às vezes. Separou o vestido que irá usar hoje à noite?
Rachel sorriu. Camille viera visitá-la na tarde anterior e, com as crianças, elas vasculharam as arcas de roupas e encontraram duas peças que necessitavam de poucos ajustes.
— Sim. Também encontrei um vestido para Camille. Espero que não se importe.
— Não me importo. — Quinn reparou que Hannah adormecera no colo de Rachel. — Quer levá-la para cima?
— Não até você me contar o que há entre minha mãe e o sr. Douglas. Estou morrendo de curiosidade.
— De acordo com Thomas, ele e sua mãe se conheceram quando jovens. Ele a cortejou durante um tempo.
— É mesmo? — Rachel ficou pasma. — O sr. Douglas lhe contou?
— Parece que o relacionamento era sério. Thomas pretendia pedi-la em casamento quando Shelby terminou a relação.
— Mas por quê?
— Ele não sabe.
— Ou talvez não queira dizer?
— Não, creio que Thomas ficou surpreso e magoado diante da decisão de Shelby.
— Deus meu… — Rachel meneou a cabeça. — Eu não sabia. Por isso ela desmaiou quando o viu. O homem que ela amava, de repente, aparece… Quem podia imaginar?
— Não penso que Thomas esteja disposto a relevar o assunto — Quinn comentou.
— Como assim?
— Desde que chegou, ele passa boa parte do tempo indo ao povoado para, supostamente, conversar com os habitantes.
— Acha que ele anda visitando minha mãe?
— Pode ser. Camille comentou alguma coisa?
— Não. Mas estávamos tão ocupadas com os vestidos que ela deve ter esquecido.
— Pelo jeito, a festa de hoje será muito interessante.
— Tem razão. — Rachel levantou-se. — É melhor colocar Hannah no berço.
A medida que subia a escada, ela não conseguia deixar de pensar no comentário de Quinn. As Berry, a mancha negra do povoado, iriam comparecer à festa. O convidado de honra, aparentemente, fora rejeitado por uma delas. A outra vivia sob a proteção dos Fabray's. Eleanor e Constance Baird atuariam como anfitriãs. Todos os habitantes da região testemunhariam a cena.
— Oh, sim — Rachel murmurou — será uma festa e tanto.
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