- Você pirou de vez!? – Lysandre gritou e bateu com o punho fechado na porta atrás de mim. Seu rosto estava próximo do meu e eu podia ver a fúria em seus olhos. Talvez contar sobre a condição de Valete tivesse sido uma péssima ideia.
- Será a nossa chance! Ninguém vai sentir falta dela! Lys, nós podemos sair daqui! – Tento pegar em sua mão, mas ele se esquiva.
- Se você fizer isso, nunca vou te perdoar. – Ele me empurra da frente da porta e sai do quarto. Matar o Dakota pode, não é?
Suspiro, derrotada. Eu não poderia fazer isso se ele não me apoiasse. Disse ao Valete que concordaria se ele levasse Lysandre junto, então o plano seria inútil se ele não quisesse vir comigo. Eu poderia fechar este lugar se contasse as coisas horríveis que fazem conosco aqui dentro.
Droga, Lysandre!
Saio do quarto e vou até o pátio. Hoje era o dia das visitas. Eu não sei por qual motivo ainda insistia em vir aqui e achar que meus pais estariam.
- Querida? – Uma voz conhecida chama e eu me viro bruscamente para trás, me deparando com a minha mãe. Levanto uma sobrancelha e cruzo os braços. – Como você está? – Ela me abraça com força, mas não correspondo. Seu olhar era de pura tristeza.
- O que você está fazendo aqui?
- Ora, eu vim te ver! – A mulher abre um sorriso enorme e passa as mãos pelo meu cabelo armado. Como ela conseguia agir tão normalmente? Como ela conseguia fingir que não me abandonou em um hospital psiquiátrico sem hesitar? Isso era nojento, eu nunca poderia perdoá-la por ter me jogado aqui.
- Como está a Sam, a Sarah, o Josh? – A pergunta faz com que ela arregalasse os olhos bicolores. Seus lábios se apertaram e suas mãos começaram a brincar com o colar de ouro que antes tinha um pingente de uma garotinha.
- Chaper, eu já devia ter te dito isso há muito tempo.
- Dito o quê?
- Seus amigos não existem, querida. Brian era o único que realmente existia. Meu amor, você era tão doente...não tínhamos outra opção. – Seus olhos se enchem de lágrimas, mas um sorriso ainda estava no seu rosto. Me afasto dela devagar, com uma expressão desconfiada. Coloco as mãos na cabeça e me jogo de joelhos no chão.
Eu brincava com todos como se aquilo fosse real. Tinha que ser real! Não era coisa da minha cabeça, eu os sentia me tocar!
“Estávamos aqui o tempo todo, Chaper. Nunca te abandonamos.”
A voz ecoa pela minha cabeça, fazendo com que eu tampasse os ouvidos.
“Não está vindo de fora. Nós estamos dentro da sua cabeça. Eu, Sarah e Josh. Os outros estão brincando lá no fundo.”
Risadas infantis invadem meu cérebro. As crianças gritavam e cantavam alguma coisa sem nexo, até que uma delas gritou “mate a mulher” de uma forma estranha. Parecia a minha voz, mas eu sabia que não era.
Minha mãe estava me sacudindo e me chamando, mas eu não conseguia acordar. Estava tendo mais um surto. Eu não aguentava mais ter surtos e isso não ia parar enquanto eu estivesse viva.
“Isso, junte-se ao novo mundo, Chaper. Aqui você será normal e poderá se divertir conosco. É só bater a cabeça com força, Chaper. Vamos, você consegue!”
Balanço de um lado para o outro, e então jogo meu corpo para frente, acertando minha testa no chão. Senti minha têmpora latejar e então acerto minha cabeça mais uma vez, e outra, e outra até braços fortes se enlaçarem em mim, segurando meus braços. Cabelos azuis acertam meus olhos, e então eu viro minha cabeça para cima. Lá estava Alexy com um olhar desesperado.
Ele me puxa para cima e me pega no colo, sacudindo-me com muita força.
“Livre-se dele, Chaper! Você estava quase conseguindo!”
Me balanço com força outra vez e Alexy acaba não conseguindo me segurar, derrubando-me no chão logo em seguida. Me levanto com rapidez e começo a correr em direção da porta de entrada desviando das pessoas que tentavam me pegar. Os guardas vieram para cima de mim, mas eu os empurrei com uma força inacreditável e saí do sanatório. A neve começou a esfriar minha pele quente e eu precisei me abraçar enquanto corria para trás de River Side, onde o Capturandam aguardava dentro de seu galpão solitário.
Fico de frente com as portas de madeira gigantescas do lar do grande urso e as abro com um pouco de dificuldade. O monstro rugiu e veio em minha direção. Abro os braços e fecho os olhos. Eu estava pronta para ir.
Alguns segundos se passaram e não senti nenhuma mordida ou arranhão, então volto a observar o galpão. Estava vazio.
- Chaper! – Lysandre grita para mim, e bem do meu lado ele estava sendo atacado pelo animal. O urso enorme estava em cima dele, tentando o arranhar. O platinado estava com um pedaço de madeira entre a boca do urso e seu peito.
Sou eu quem vai morrer, não ele.
Corro até ele e tento empurrar o bicho, mas ele era muito grande e pesado. Sua pata acerta meu braço e eu caio gritando no chão. Eu nunca poderia tirá-lo de cima de Lysandre, mas eu não poderia deixá-lo morrer assim.
Os guardas do sanatório chegam em nós e acertam um dardo tranquilizante em Capturandam. Ele cai duro ao nosso lado e o Valete aparece com um sorriso malicioso no rosto.
“Não, Chaper! Olha o rio, ele com certeza vai te matar!”
Sem pensar duas vezes, eu corro em direção do rio. O vento gelado acertava o meu rosto e os gritos de protesto eram completamente ignorados.
Eu pulo sem pensar duas vezes e a água entra em minha boca e penetra meu pulmão como se fossem lâminas. O ar já começava a faltar, e eu finalmente teria paz.
“É só você fechar os olhos. Em um segundo já vai estar aqui conosco”.
E eles começam a se fechar lentamente. A correnteza levava o meu corpo de um lado para o outro, mas isso não me incomodava. Eu amo o Lys, e é por isso que eu deveria partir. Eu não suportaria sujeitá-lo ao horror de me ver deteriorando. Ele merece mais do que isso.
Mãos fortes seguram em meus braços e me puxam para cima. Tento voltar, mas a pessoa me segura fortemente.
- Eu não vou deixar você morrer! Eu não vou deixar você morrer! – Lysandre estava com lágrimas nos olhos. Sua testa estava com sangue escorrendo.
Eu abro um sorriso fraco antes de desmaiar, pois meu braço estava completamente rasgado. Esse não seria o dia de eu ir embora, mas com certeza chegaria e não demoraria muito.
Só espero que da próxima vez ninguém me interrompa.
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