História Cisne Negro. (Taekook) - Que os jogos comecem.

— Classe liberada. Até amanhã, pessoal. 

Taehyung correu para fora da sala como a bala de uma espingarda. Não teve nem tempo de guardar suas coisas, foi com tudo nas mãos. Não tinha como esperar pelo elevador e ele também não queria ir para o térreo. Seu objetivo era o primeiro andar, e desceu as escadas com grandes pulos. 

Tendo um pouco mais de um ano de aulas com o Jeon, se tinha algo que ele tinha percebido, era que ele quase nunca pegava o elevador. Ia pelas escadas e deixava seus amigos saírem na frente, andando sozinho pelos degraus escuros — as luzes quase sempre falhavam. Isso dava ao Kim uma única chance de colocar seu plano em prática. 

Ele não podia falhar. Sua vida dependia disso. 

— VOCÊ! 

No momento que chegou no primeiro andar, o Jeon saia pela saída de incêndio com um capuz sobre a cabeça. Pegou ele pelo colarinho sem sequer parar para pensar nas consequências e prensou o garoto contra a parede. Jungkook nem mesmo parecia bravo, estava um tanto confuso. Franziu as sobrancelhas e retirou seus fones de ouvido. 

— Boa tarde pra você também, Kim. 

— Boa tarde? Que merda de boa tarde! — falou com ódio — Foi você não foi? Que me enviou aquelas fotos? Por que fez isso? Por que!? Eu pensei que me odiasse, mas querer que eu vá preso!? Você perdeu a cabeça, Jeon!? 

— Que fotos...? 

— As fotos que você tirou de mim dançando, seu sonso! Não finja que não sabe! 

Ele tirou o celular do bolso quase rasgando a calça que estava usando, abrindo no contato desconhecido. As fotos continuavam ali — ainda bem que não haviam câmeras nas escadas, o Diretor estava cansado de pegar os alunos transando. 

— Ah... — tombou a cabeça — No Cisne Branco. 

— Claro que sim, porra! Onde mais? 

— Kim. — ele estalou a língua — Você sabe que tem meu contato, né? Na turma de dança? 

— Você é rico! Pode pagar cinco desses!

— E por que eu faria isso? Tirar essas fotos? 

— Pra me ameaçar! — bateu a mão na parede furioso — Eu estou falando sério, Jeon, eu sabia que você era ruim, mas isso? 

— Não fui eu. — disse — Eu estou falando sério. 

— Ah, tá bom. Você é a única pessoa que conheço que sabe do clube e coincidentemente eu recebo isso logo depois que você aparece lá!? 

— Coincidências acontecem. — balançou os ombros — Eu não faria isso. 

— Me diga porque estava lá, então. 

— É um clube de stripper, Kim. — falou simples — Você viu como eu estava acabado. Só queria curtir um pouco... Geralmente vou em boates, mas bateu vontade. 

— Bateu vontade!? — ele tremeu — Essa é a melhor desculpa que tem!? 

— Não é uma desculpa. Eu honestamente nem sabia que era você dançando. Desconfiei no banheiro... — Jungkook falou sério — Achei que podia ser um efeito da falta de iluminação ou da bebida ou alguma peça que minha peça estava me pregando por te achar extremamente atraente ou apenas por você ter sido a última pessoa que vi antes de ir até lá– 

Engasgou-se. 

— Você... Me acha extremamente atraente? 

— Acho, oras. — estalou a língua novamente — Enfim, eu só descobri mesmo porque você chamou meu nome... E eu não tinha dito qual era. Só que você foi embora, então... Eu também fui. 

— Você ia transar com um completo desconhecido em um banheiro?!

— Hum... É. 

— Eu não sei se devo confiar  em você. 

— Provavelmente não. Para várias outras coisas. — o Jeon disse — Mas, eu realmente não faria isso. Você me ajudou duas noites atrás, eu não sou cruel assim. 

— Você era meu único suspeito. — suspirou, finalmente soltando a camisa do outro — Você pode ir até meu dormitório? Para conversarmos e saber se você viu algo? 

— Posso. Só não agora. 

— Por que!? 

— Eu trabalho, se lembra? — sorriu pequeno — Consigo estar lá umas 19:30. 

— Tudo bem, tudo bem... — disse abatido — Não conte– 

— Para ninguém? — olhou — Acho que agora estamos quites, Kim. 

— Te vejo no dormitório, Jeon. 

Sem se despedir ou dizer mais nada, ele se virou de costas e tornou a descer as escadas. Andou inquieto até seu dormitório, sua mente certamente não parava de falar. Não conseguia prestar atenção no texto que deveria estar revisando ou no desenho animado que tinha tentado ver. A ansiedade já estava o comendo por dentro. 

Tomou banho, retomou o loiro do cabelo, fez as unhas, colocou máscara facial, jogou cartas online, olhou roupas num site que nunca iria comprar, tirou a máscara facial, fez o jantar, tentou ver um filme... Nada adiantava. O tempo não passava nunca. 

— Tae. 

— Hum? 

— O que está acontecendo? 

— Oi? 

— Sem brincadeiras. — Yoongi se sentou sério à sua frente — Você está estranho desde ontem à noite. É por causa do cara que você beijou!? 

— O que!? 

— Eu vi você com alguém, achava que não tínhamos segredos... — balançou a cabeça — Sabe, não tem problema, todos nós beijamos de vez em quando... Você até recusou o serviço do Sr. Park! Estou preocupado. 

— Yoon... Eu estou completamente bem. 

— Taehyung, você nunca faz o jantar! Você arrumou nosso quarto pela primeira vez na vida! E jogou cartas! Você odeia jogos de azar! — exclamou — O que aconteceu, hein? 

— Só estava entediado, isso não tem nada haver....

— Eu te conheço, Tae. — suspirou — Aconteceu alguma coisa? Alguém mexeu com você? 

— Não, não, não é nada disso, eu juro. — ele mordeu os lábios — Não tem nada acontecendo. 

— Você é meu irmão de coração, Taehyung. Estamos nisso juntos faz anos. — Yoongi segurou suas mãos — Você pode confiar em mim. Pode contar comigo pra qualquer coisa nesse mundo, sabe disso, não é? 

— Claro que sei! — exclamou — Você é a pessoa que eu mais confio de toda minha vida, Yoon. 

— Então me conte o que foi. — pediu — Eu não aguento ver você sofrendo, Tae. Por favor. 

— Eu só... — o Kim desviou o olhar — Estou um pouco ansioso. 

— Para o que? 

Yoongi não podia saber. O ameaça do Cisne Negro o quebraria por dentro. Taehyung não podia fazer isso com seu melhor amigo. Ele já tinha tantos pesos para carregar nas costas... Não. Ele não podia saber. Tinha de inventar algo para que ele não suspeitasse, é claro. Algo que ele não poderia discutir. Algo que nunca faria ele suspeitar que estava sendo ameaçado... 

E a solução veio em sua mente, dois coelhos com uma cajadada só. 

— Você estava certo. 

— Hum? — O Min franziu o cenho — Sobre o que? 

— Jungkook. — ele engoliu o seco — Estávamos discutindo na sala de dança e... Eu não sei como chegou a esse ponto... 

— Ele te bateu!? 

— O que!? Não! — arregalou os olhos — Nós... Nos beijamos. 

— VOCÊ BEIJOU O JUNGKOOK!? 

— É... — coçou a nuca — Por isso eu beijei aquele cara ontem. Para ver se esquecia... 

— Puta que pariu! E o que você fez depois!? 

— Eu disse que precisávamos conversar. — respirou fundo — Ele vem aqui um pouco antes do nosso horário de trabalho... 

— Eu realmente nunca imaginaria isso! — sorriu — E você gosta dele? 

— Eu... Não sei. — mentiu. Nunca gostaria daquele desmiolado. — Estou confuso... Talvez você tivesse razão, sabe? Que toda essa discórdia fosse apenas tesão incubado e eu secretamente gostasse que ele enchesse meu saco. 

— Bom, não deixe a confusão te parar! — exclamou — Eu sabia! Eu sabia! Ah, Taetae, estou tão feliz por você! 

— Não exagera, Yoon... É só uma conversa. — disse — Teremos que esperar para ver o resultado, não é? 

— Já vejo você todo derretido por ele! Que coisa linda! — bateu palmas — Tudo bem, melhor eu, sair então, não é? 

— Quando ele sair eu te mando mensagem. — sorriu — Obrigado, Yoon. 

— Vou ver se o Hobi quer comer comigo. — ele agarrou sua mochila e beijou o rosto do mais novo — Até mais tarde! Vai me contar todos os detalhes! 

— Pode deixar! — ele acenou enquanto o outro fechava a porta. 

Fez uma careta amarga assim que o amigo saiu de vista. Odiava ter que mentir para ele. Mesmo sabendo que era necessário, sabia o quanto ele ficaria magoado se soubesse a verdade. Ele se deitou na cama frustrado para esperar a chegada do Jeon. 

— Taehyung!? Está aí!? 

Ele pulou da cama com o susto. Foi mais rápido do que esperava. Na verdade, nem mesmo achava que ele apareceria. Talvez não quisesse ter que olhá-lo nos olhos depois dele ver seu local de trabalho e passar as mãos pelo seu corpo — e ele tinha gostado. Era tão embaraçoso que teve que tomar alguns segundos de ar antes de abrir a porta. 

— Oi. 

— Oi... — Jungkook encarou — Posso entrar? 

— É! Entre rápido ou todos vão falar disso amanhã! Sabe como as fofocas correm rápido aqui no Minerva. 

— Quem liga para fofocas? 

— Sua irmã liga. Ela adora. 

— Você acha? 

— Só entre! 

Ele agarrou o casaco do mais novo e o arrastou para dentro do quarto. Jungkook tirou alguns segundos para analisar o quarto. Era arrumado, diferente do seu. Tinha várias fotos e posteres pendurados em diferentes lugares, até mesmo decorações com bonecos e enfeites. Taehyung indicou para que ele se sentasse na mesa no canto do quarto. 

— Você quer alguma coisa? — perguntou tentando não olhá-lo nos olhos — Água, suco? 

— Estou bem. Obrigado. — ele se sentou — O que você queria falar?

— Bem... Primeiramente. — ele cravou as unhas na madeira da mesa — Vamos esquecer que aquele beijo aconteceu, O.K.?  

— Certo. — falou indiferente — Posso fazer isso. 

— Por que você estava no Cisne Branco? — perguntou — Por favor, seja honesto comigo. 

— Eu te disse mais cedo. Eu normalmente vou em boates, mas algumas semanas atrás alguém comentou como os dançarinos de lá eram bons. — balançou os ombros — Eu tinha o endereço e ontem bateu vontade. 

— Alguém sabe que você foi pra lá? — perguntou — Alguém poderia ter te seguido? 

— Não. Ninguém. — Jungkook falou certeiro — Só eu. 

— Você reconheceu alguém lá além de mim e do Yoongi? 

— Pera, o que!? — ele arregalou os olhos — Yoongi estava lá também!? 

— É. Ele é o SUGA, você é cego por acaso? 

— Eu te disse que nem tinha reconhecido você! — falou — Imagina seu amigo que eu só vejo de longe durante o almoço! 

— Mas ele está saindo com o Hoseok... 

— Sim. Com o Hoseok, não comigo. — balançou a cabeça — Eu estava prestando mais atenção em outro dançarino. 

Suas bochechas queimaram de vergonha. Foco, Taehyung. 

— Você deve estar adorando isso, não é? — Taehyung fez uma careta — Já tem outra coisa que pode usar nas nossas brigas. 

— Hum? — olhou confuso — Você acha que vou te zoar por ser stripper? 

— Oras, sim. — afirmou — Vendendo meu corpo... 

— Você está apenas dançando, Kim. O que você faz fora das aulas não tem nada haver comigo. — ele cruzou os braços — Cada um ganha dinheiro do jeito que pode. Eu faço capuccino com espuma de coração. 

— Tá de brincadeira!? 

— Não. — disse — E é difícil de fazer, tá bom? Requer muita prática. 

— Oh, eu aposto que sim. — brincou — Anos de treinamento. 

— Exatamente. — Jungkook falou — Não tem nada de errado em você ser stripper. 

— É literalmente ilegal na Coreia. 

— E eu tenho cara de policial, Kim? — olhou — Você é bom, foda-se a legalidade. Está ganhando seu dinheiro com talento. Só não pode deixar que isso vaze. 

— Por isso eu tenho que descobrir quem me mandou aquilo. — suspirou — Eu nem queria ficar trabalhando no Cisne Branco por tanto tempo... 

— Não? 

— Eu e Yoongi viemos pra Seul procurando trabalho depois de nós dois sermos expulsos de casa. Mas ninguém aceitava. — falou cabisbaixo — O Sr. Kim, dono do Cisne, nos acolheu. E acabou pagando pelos primeiros meses aqui no dormitório quando fomos aceitos. Agora estamos devendo, entende? 

— Isso sim soa ilegal. — Jungkook falou — Parece feudalismo. 

— Olha, alguém estudou história. — ele riu. 

— Tive meus momentos. — balançou os ombros — Falta muito para vocês pagarem? 

— Se conseguirmos alguns trabalhos a mais, acabamos antes do último ano de faculdade. Talvez esse ano ainda.

— Sinto muito... 

O Kim não disse nada. Apenas encarava suas mãos. Talvez Jungkook estivesse fingindo tudo aquilo para humilha-lo depois. Até mesmo poderia ser o Cisne. Uma tristeza incomum queimava em seu peito, abaixando a cabeça para que não visse as lagrimas que se formavam. 

— Eu sou filho bastardo. 

— Oi? — ele levantou a cabeça, esquecendo de toda a tristeza que o inundava segundos atrás — O que disse? 

— É. Minha mãe era empregada na mansão dos Im. Jeon Sihee. — falou — O Jeon vem dela. Por isso meu pai briga tanto comigo. Ele odeia qualquer coisa que lembre dela porque, de acordo com ele, ela estragou a família perfeita que ele tinha. E eu sou uma cópia cuspida dela. Quer enterrar a existência dela e insiste que eu use Im como sobrenome. Im Jungkook soa ridículo. 

— Soa mesmo. — riu baixinho e limpou suas lágrimas, fingindo que não sabia de tudo aquilo graças a Jimin — Por que está me contando isso? 

— Porquê... — ele mordeu seus lábios — Eu só achei que como você compartilhou algo muito pessoal comigo... Se sentiria melhor se eu compartilhasse algo também. 

— Oh. — falou — Obrigado. 

Jungkook desviou o olhar com um suspiro. 

— Você quer sair de casa, não é? — perguntou — Por isso está trabalhando. 

— Ah, é. Eu amo a Nayeon, mas meu pai me odeia. Nunca me quis debaixo daquele teto e minha madrasta muito menos. 

— Por que mora com ele, então? 

— Minha mãe foi assassinada quando eu tinha 13 anos. — falou — Pela lei, ele era obrigado a me dar abrigo e comida até eu fazer vinte e um anos. Eu faço vinte um esse ano. Mesmo que seja uma tortura pra mim, é uma tortura pra ele também. Vou ordenhar o dinheiro dele pra colocar minhas coisas em ordem até ser expulso de casa. 

Taehyung tombou a cabeça e riu. 

— Você tem um jeito único de pensar. 

— Acho que esse é o primeiro elogio que já disse pra mim. 

— Não se acostume. — falou — Sinto muito. Pela sua família... 

— Não sinta. Você já tem muito para sentir por si mesmo. 

— Obrigado, Jeon... Jungkook. 

— Tudo bem. Você pode me chamar pelo sobrenome. — falou — Eu gosto dele. Contanto que não seja Im igual o Diretor faz. 

— Certo... Você podia me chamar de Taehyung, sabia? — ele se virou — Eu sei que Kim é um sobrenome comum, mas eu continuo não gostando. 

— Também tem problemas com a família? 

— Mais do que você imagina. 

— Como quiser, Taehyung. 

O Kim sorriu novamente e balançou a cabeça. 

— Tudo bem, foda-se. Eu te ajudo. 

— Como é que é? 

— Eu te ajudo a descobrir quem é o Cisne Negro. 

— Mas... — olhou incrédulo — Por que? Você me odeia. 

— E daí? Não estou fazendo isso porque gosto de você. Pode não achar, mas sou uma boa pessoa. Às vezes.  — balançou os ombros — É a coisa certa a se fazer. Eu ajudaria qualquer um nessa situação. 

— Mas... 

— Sem mas. Pense assim, você fica com seu segredo seguro e eu paro de te encher. Todos ganhamos, não acha? 

— Parece que só eu ganho... 

— Pare de pensar tanto, Taehyung! — reclamou — Vou te ajudar e ponto. Seja um bom garoto que aceite a ajuda. 

— Idiota. — revirou os olhos — Tem algo em mente? 

— Na verdade... — falou — Eu conheço alguém que trabalha com informática. Posso levar seu celular até lá e tentar rastrear as mensagens. 

— Sério? Faria isso? 

— Já disse que sim, não disse? 

— O Cisne disse que eu tenho 24 horas para aceitar as exigências dele ou tudo será vazado. Meu tempo está acabando. 

— Ligue para ele e grave. — falou — Amanhã levo seu celular lá. 

— Ah, não. Eu vou junto. — disse — Não quero você trabalhando para mim. 

— Certo... Só ligue logo, deixe de encher. 

— Vá se foder. 

Ele resmungou mais alguns xingamentos e abriu seu celular. Olhou de relance para Jungkook, nervoso. 

— Alô? 

— Taehyung. — a voz falou — Bom ouvir sua voz. 

— Não posso dizer o mesmo. — falou — Se eu aceitar, até quando terei que fazer isso? 

— Até eu cansar de você. — riu amargamente — Serão, digamos... 30 tarefas. 

— Trinta!? 

— É. Algum problema? 

— Não... Não... — respirou fundo. Jungkook o encarava com seus grandes olhos negros. — Eu aceito. 

— Fez a escolha certa, meu patinho feio. Entrarei em contato em breve com sua primeira tarefa. Por agora, pode descansar. 

A risada fria fez um arrepio correr pela espinha de Taehyung. 

— Que os jogos comecem.