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História Valente - Parte II - Capítulo XIX - Revisado


Escrita por: Aella

Notas do Autor


Desculpem a demora, quando a gente viaja tudo fica bagunçado, né? Espero que gostem e não esqueçam de conferir as notas finais para ver as respostas que o Aidan deu às perguntas de vocês!

Capítulo 20 - Parte II - Capítulo XIX - Revisado


Fanfic / Fanfiction Valente - Parte II - Capítulo XIX - Revisado

Kenna

 

Era uma vez, em um mundo tão, tão, distante, eu gostava de usar vestidos. Gostava daqueles compridos, floridos, que esvoaçavam ao vento. Sentia-me maravilhosa, parte da realeza com uma vestimenta daquelas. Com o passar do tempo, porém, minhas preferências mudaram para um velho e simples par de calças cargo.

 

Naquela noite, porém, eu estava novamente me sentindo maravilhosa com o fino tecido azul claro que me cobria. Simples, mas comprido como eu antigamente gostava. Cobria-me de meus seios até os tornozelos, onde encontravam um par de sandálias adornadas com pequenas pedrinhas de cor turquesa. Era um traje que eu havia praticamente esquecido que possuía, já que nunca mais tinha o tirado do guarda-roupas. Contudo, senti que naquela noite em específico eu deveria desenterrar roupas como essas, nem que fosse apenas por um curto período.

 

Já fazia algum tempo que Maxwell tinha invadido a alcateia, e também que Aidan tinha exterminado sua miserável existência. Eu já estava completamente curada de minha mandíbula quebrada – que, confesso, demorou muito mais do que eu imaginei – e demais ferimentos, assim como todos os outros lobos que tinham se ferido. Aidan também já havia terminado de coordenar as últimas reformas e consertos, o que significava que podíamos novamente ter nossos grandes jantares e almoços nos finais de semana, assim como maratonar filmes e séries na nova TV.

 

Rebecca estava melhor. Fisicamente estava cem porcento, e psicologicamente também estava lidando surpreendentemente bem com a situação. Já conseguia interagir comigo normalmente. Talvez o fato de eu ser uma fêmea como ela me fizesse não parecer tão ameaçadora, apesar de dividirmos dominância.

 

Com os lobos submissos ela também já conseguia passar tempo, tendo voltado a demonstrar os claros sinais de seu real posto na alcateia por sempre querer estar perto deles e protegê-los. Eu sabia que, se o Letum mudasse as regras de hierarquia, eu e Rebecca disputaríamos o posto de Beta. Mas isso era algo distante, algo que talvez nunca chegaria. Independentemente, fazia parte de Rebecca se importar com eles, mesmo que não tivesse o cargo para acompanhar.

 

Aidan havia convocado pequenos grupos para ir a um dojô, no qual ele aparentemente costumava treinar. Eu já havia ido um bocado de vezes e, apesar de não ser minha praia, confesso que me diverti com meus irmãos e Becca, e conseguia compreender o que Aidan estava tentando fazer. Era um ambiente controlado, onde os demais podiam relembrá-la de que, apesar de serem predadores, dominantes, todos aqui faziam parte do mesmo time. Graças a essas atividades, Becca também já conseguia interagir com os lobos mais dominantes, como seus grandes amigos Riley e Clayton. Percebi que ela havia tomado gosto pelo hobby, e provavelmente seria mais uma para o clubinho que ia para lá regularmente.

 

O comportamento dela, porém, era completamente diferente perante os três lobos do topo da cadeia alimentar: Connor, Trevor e Aidan. Ela conseguia passar tempo com os outros dominantes, mas com Connor e Trevor especificamente, nunca passava sozinha. Era visível que cada dia ela progredia, mas eu imaginava que, para ela, cada dia era uma luta também. Ela precisava se forçar a encará-los nos olhos, vencer a vontade de ou desviar o olhar para evitar um conflito, ou de seu lado selvagem querer atacá-los como medida de autopreservação. Nenhuma das duas reações eram naturais, não para uma loba dominante. Para dominantes, ver quem desviava os olhos primeiro poderia significar uma batalha de dominância, por mais idiota que parecesse. E nenhum dos dois homens pareciam nada confortáveis com a situação, pois certamente não desejavam que a Becca os visse como ameaças.

 

Mas as marcas do que Maxwell pretendia fazer com ela – e que quase havia conseguido – ainda não estavam totalmente curadas.

 

E sobre Aidan... isso era um mistério. Desde o começo ela havia se apegado a ele, pois via nele sua única forma confiável de proteção nos primeiros dias, enquanto ela ainda não tinha forças para se defender. Aidan era seu salvador, aquele que a havia vingado e que a ajudava, a cada dia, a queimar toda sua frustração. Era visível em sua linguagem corporal que ela sentia gratidão pelo Alfa, mas também percebi hesitação em algumas interações, como se ela não confiasse em si mesma perto dele.

 

Eu acreditava que alguma coisa havia acontecido no dojô, pois foi logo após que o comportamento dela perante Aidan mudou. Alguma coisa aconteceu que explicasse por que ela parecia fugir de situações em que ela e ele ficassem sozinhos, fato que não passou despercebido por mim e pelos demais. Mas isso era um assunto entre ela e ele, e portanto eu não iria enfiar meu nariz nisso.

 

Suspirei para meu próprio reflexo, vendo a cor dos meus olhos mudarem por uma fração de segundo enquanto minha loba nos admirava. Estávamos muito bonitas.

 

Saí pela porta do que era provisoriamente meu quarto. Tinha acabado de anoitecer e a casa estava tomada pela leve penumbra, já que nenhum lobo tinha tido a ideia de acender nenhuma das luzes ainda. E não havia motivo, visto que estavam todos apenas me aguardando para sair.

 

– Fiu fiu, novinha – Becca brincou ao me ver fechar a porta.

 

Saía de seu próprio quarto, do outro lado do corredor. Carregava uma pequena mochila cheia de coisas. Eu havia esquecido, Rebecca estava de mudança. Sua casa, que como me contaram havia sido destruída pelos próprios lobos dessa alcateia, já estava há tempos arrumada, desde antes de ela acordar de seu coma. Estavam todos só esperando Becca estar pronta ela mesma para retornar ao seu lar. E parecia que agora estava.

 

– Fiu fiu para você também. – Pisquei para ela, flertando de brincadeira, absorvendo a imagem de Rebecca com um short camuflado e uma regata preta simples. Roupas que eu normalmente gostaria de usar, mas, como eu havia escolhido, havia deixado de lado ao menos por uma noite. – Vai direto pra casa depois da corrida?

 

Ela sabia a qual casa eu estava me referindo.

 

– Vou – respondeu com um sorriso, certamente ansiosa para voltar para seu próprio canto.

 

Eu lamentava, pois nessas últimas semanas na casa do Alfa eu e ela tínhamos nos tornado muito próximas. Passávamos as tardes juntas enquanto ela me ajudava a procurar emprego e ela aproveitava o resto de sua licença médica. À noite, enquanto os meninos não chegavam para jantar, assistíamos televisão ou saíamos nós duas juntas pela cidade. Algumas noites até mesmo jantávamos só nós duas e Aidan, o que era um pouco constrangedor para mim, tendo em vista o clima estranho que circulava os dois.

 

– Finalmente vou, ainda mais que Aidan gentilmente terminou todas as revisões do carro. – Aidan havia a ajudado a achar um novo sedan, pois aparentemente tinha pulado e destruído seu antigo veículo também.

 

Clayton havia me fofocado que o Alfa queria ter arcado com todos os custos, pois ela não teve culpa alguma que seu carro foi completamente destruído ao ponto da inutilização. Mas ela havia tido uma briga tremenda com Aidan quando ele sugeriu isso, do tipo de briga que faz as paredes tremerem. Clayton tinha ficado surpreso que ela aceitou Aidan ter pagado os consertos na casa dela, achava que ela não teria aceitado nem mesmo isso.

 

– Vou sentir saudades de passar o dia inteiro com você – confessei. Não pude deixar de demonstrar meu carinho. Na alcateia de Joe eu não tinha desenvolvido nenhuma amizade verdadeira, e certamente não com nenhuma das fêmeas. Nem mesmo com Corrie, que era tão amiga de Rebecca, tive a oportunidade.

 

– Ah, não fique assim, Kenna. – Veio até mim e afagou meus braços, abraçando-me levemente. – Apareça sempre que quiser. Se quiser, tente convencer o Aidan de que você quer se mudar para minha casa. É pequena, mas é confortável. Caso não queira procurar um lugar só seu, podemos dividir as contas.

 

– Irei pensar nisso. – Sorri, passando a mão de forma carinhosa por suas costas.

 

– Não esquenta. – Ela riu. – Eu sei que é difícil dizer adeus a essa casa maravilhosa. Não irei culpá-la se preferir ficar aqui do que dividir minha choupana comigo.

 

– Um pouco você tem razão – provoquei-a. – Aqui as chances de Trevor aparecer para fazer o café da manhã são bem mais altas. E quando ele não vem, tem sempre a chance de Riley aparecer. Não sei se estou preparada para abrir mão disso.

 

Nós duas rimos e descemos as escadas até a sala embaixo. Quase todos os meninos já nos aguardavam, os poucos outros que faltavam iriam nos encontrar na floresta próxima ao aeroporto, que descobri ser a floresta favorita de Rebecca. Aidan o único que não estava sentado no sofá, estava apoiado na parede ao lado da escada, espiando a TV com uma lata de Pepsi em mãos.

 

– Preparada, Kenna? – perguntou-me com a voz suave. Não esboçava um sorriso, mas seus olhos brilhavam o suficiente para eu saber que ele também estava ansioso como eu.

 

– Mais do que nunca.

 

– Então vamos. – Tomou o resto de sua bebida e moeu a lata na mão, fazendo-a ficar muito mais compacta para se jogar no lixo reciclável.

 

Os meninos passavam por mim e faziam algum tipo de leve carícia, como um tapa nas costas ou um afagar do cabelo, ao irem para seus carros. Era não somente um sinal de aceitação, mas de apoio. Queriam que eu fizesse parte da família deles, e eu não poderia estar mais grata.

 

Ao chegarmos na floresta, esperamos pouco tempo para os outros, que estavam vindo do trabalho, chegarem. Liam pediu para todos nós nos agruparmos para ele tirar uma foto e todos fizemos sem hesitar. Caminhamos como humanos até uma bela clareira e, ao ver os meninos se movimentando para se posicionar, eu sabia que seria nesse local que iria começar.

 

Todos os dez lobos fizeram um círculo envolta de mim, eu posicionada justamente no centro de todos. A maioria sorria, mas alguns já estavam tão focados no que viria a seguir que apenas me contemplavam com seus olhos mudados, olhos lupinos. Uma leve brisa começou a ventar, sinal claro de que o tempo estava mudando para chuva, mas Aidan não parecia ligar. Chamou-me para perto dele.

 

Eu sabia o que viria e já conseguia sentir sua energia lupina dominando a todos nós naquela clareira, o ar carregado com a essência que compunha um Alfa, que compunha Aidan. Ele levou o próprio antebraço à boca e, com um movimento rápido e calculado, mordeu-se. O canto de sua boca se levantou em um sorriso para mim, divertindo-se tanto quanto eu com a selvageria da cerimônia. Seu próprio sangue escorria pelos cantos de sua boca e pude ver seus caninos afiado reluzirem contra a luz da lua. Lua cheia.

 

Aidan me chamou com o braço saudável para vir até ele. Olhei de relance para Becca e para os outros, mas a atenção que antes me banhava, agora estava toda voltada para seu Alfa. Alfa que, em poucos segundos, também seria meu.

 

Dei os últimos passos que nos separavam e peguei o braço de Aidan em minhas mãos. Fiquei um tempo apenas olhando para o ferimento, o sangue escorrendo sem piedade da enorme mordida que Aidan certamente só conseguiu fazer graças a seus poderes de lobisomem.

 

– Prove de meu sangue, Kenna, e torne-se minha. – Levantei meu olhar para o dele. – Prometo que farei de tudo para honrar sua decisão de fazer de mim seu Alfa.

 

Respirei fundo e aproximei seu braço de minha boca. O cheiro metálico de seu sangue impossível de ignorar. O gosto era tão forte quanto o cheiro, mas não consegui ficar no mundo terreno tempo o suficiente para identificar outro sabor.

 

Com seu sangue em meu sistema, já comecei a sentir as mudanças principais. Minha loba acordando totalmente, reconhecendo e aceitando Aidan como nossa autoridade e protetor. Uma tremenda ligação entre eu e todos os outros dez lobos se formou, laços que só seriam quebrados se eu renegasse meu Alfa, ou se um deles morresse. Família.

 

Abri meus olhos para encarar o céu estrelado, suspensa em nada além do próprio ar. Era aquele pequeno momento em que nos reuníamos na ponte entre os mundos – o nosso, e seja lá o que vinha após – apenas nossos espíritos lupinos correndo juntos sob os céus.

 

O lobo de Connor foi o primeiro a me achar, pulando de alegria e logo depois esfregando-se em mim em uma espécie de abraço, seu pelo contra minhas pernas humanas faziam-me sentir uma leve cócega. Logo em seguida vieram Spencer e Liam, e depois desses dois todo o resto. Bexi corria euforicamente ao meu redor, a língua solta em um claro sinal de completo contentamento. As estrelas emoldurando cada um dos meus irmãos, como se estivéssemos passeando no espaço sideral, era uma imagem que eu queria poder gravar para sempre, como a nossa fotografia na clareira.

 

Mas o ar ficou mais denso nessa outra dimensão quando as patas pesadas de Aidan se fizeram notar. O lobo enorme e de coloração marrom-avermelhada aproximava-se lentamente, imponente como nenhum outro. Sem pressa. Quando finalmente chegou até mim, todos os lobos já tendo se afastado, abaixei-me para ele poder encostar seu focinho em minha testa humana e, como se isso fosse um sinal, flutuei cada vez mais alto até achar que poderia tocar em uma das estrelas.

 

A transformação veio, mas as dores que eu conhecia não vieram na mesma intensidade. Uma nova alcateia, uma alcateia tão unida e em tanta harmonia, fazia minha transformação ser significativamente menos dolorosa do que antes. Havia aquele velho desconforto, as mesmas pontadas e sensação de queimação, mas o contraste de como estava agora e como era antes me trazia um alívio. O restante das dores eu sabia que só iria se dissipar se eu acasalasse. Mas tudo já estava melhor do que eu poderia imaginar. O que mais eu poderia pedir, senão uma alcateia que me deixasse ser eu mesma, que me tratasse com dignidade sem eu ter que me submeter a uma espécie de ascensão social para consegui-lo?

 

Desci flutuando até a altura em que todos estavam, eu agora como loba e pronta para correr. Aidan sorriu para mim, meus pelos se arrepiando, e empurrou-me para correr atrás de meus novos irmãos.

 

Pisquei meus olhos algumas vezes ao perceber que havíamos retornado ao mundo terreno, à nossa floresta, e que, apesar da experiência que tivemos, estávamos como humanos novamente. Como se tivéssemos alucinado coletivamente aquilo.

 

Becca desfez o círculo quase que de imediato, abraçando-me forte. Quem diria que aquela que eu enfrentei, achando que queria roubar meu maldito ex-namorado, seria uma amiga tão importante para mim? Amiga não, definitivamente irmã. Esmagando minha nuca contra seu próprio pescoço, embaraçou todo meu cabelo antes de se afastar. Besta.

 

– Rebecca! – reclamei.

 

– Vai ter que me pegar se quiser se vingar! – provocou, já se virando de costas para todos e tirando seu short.

 

Ao vê-la apenas de calcinha, instintivamente virei meu olhar. Os outros lobos vinham aos poucos me abraçar e me dar as formais boas-vindas, mas consegui ver Aidan espiando a moça enquanto ela sofria em tirar a regata, enroscando a gola no cabelo. Os olhos negros dele de repente encontraram os meus e, naquele instante, compreendi tudo.

 

Aidan abaixou seu olhar no mesmo segundo em que ele percebeu que eu havia visto, e apenas se aproximou de mim para colocar um beijo desajeitado em minha testa. Becca e os outros todos já estavam como lobos, já entravam na floresta, e por isso, por nossa breve privacidade, segurei seu braço por um instante, chamando sua atenção. Relutante, Aidan encontrou meus olhos e, quando franzi o cenho para ele, ele apenas deu de ombros.

 

– Nem sempre sou eu que faço essas coisas. – Como minha expressão certamente demonstrava confusão, ele explicou. – Meu lobo não consegue se conter, e fica martelando em minha mente até eu obedecê-lo.

 

– Ah – falei simplesmente, sem saber ao certo o que responder. Soltei seu braço então, para podermos nos juntar e eu poder realizar minha primeira caçada com minha nova família.

 

-x-

 

Era final de semana e todos os lobos já estavam na casa do Alfa. Aos sábados nós normalmente saíamos em grupo, quem já não tinha compromisso, ao menos. Aos domingos, era praticamente mandatório todos arrumarem um tempo para passar na casa de Aidan, o jantar era sagrado. Não era um costume de todas as alcateias, mas Aidan parecia gostar e, honestamente, eu também.

 

Desde minha indução à alcateia, eu gostava cada vez mais de passar tempo com todos eles. Antes eu já gostava deles, mas agora era gratificante de uma forma totalmente nova. Era como se eu soubesse que tudo ficaria bem. Mesmo se eu estivesse totalmente machucada, em uma situação sem esperanças e de total desespero, eu sabia que tudo ficaria bem desde que meus irmãos estivessem comigo. Minha vida nessa nova alcateia era assim.

 

Estávamos jogados pela sala, alguns na cozinha ajudando, alguns na mesa de jantar jogando truco. Estávamos apenas esperando o grande prato de rondelli que Trevor estava fazendo ficar pronto e Rebecca chegar.

 

Becca era a única que faltava, mas todos sabíamos o que ela provavelmente estava fazendo. Era o último dia de sua licença médica, ou seja, o último dia antes de ela voltar a trabalhar dando aula de música. E, conhecendo-a, provavelmente estava preocupada. E eu a entendia. Se estivesse no lugar dela, eu estaria achando que meu chefe poderia não ter gostado de minha ausência prolongada, seja por qualquer motivo que fosse. Temia ser mandada embora, e não havia exatamente uma enorme procura por professoras de violão em Columbus. Justamente por esses medos – e eu tinha certeza, devido a nossas últimas mensagens trocadas – ela havia passado os últimos dias entocada dentro de sua casa praticando e, nas palavras dela, “desenferrujando” suas habilidades e preparando suas próximas aulas.

 

Por causa disso, e todos compreendíamos, não estávamos preocupados com a demora de Rebecca. Ela chegaria atrasada, provavelmente, mas entendíamos que ela precisava priorizar sua carreira.

 

– Merda.

 

Todos nos entreolhamos ao ouvirmos o xingamento vindo do escritório de Aidan, que ficava logo ao lado da sala. Eu estava deitada em um dos novos sofás que o Alfa havia comprado quando vi ele chegar pelo corredor. Endireitei-me. Aidan não era de falar muito palavrão, e por isso fiquei com um mau pressentimento.

 

– Trevor – chamou o moreno. – Tem como você abaixar a temperatura do forno um pouco? Preciso falar com vocês. Com todos. E não acho que ninguém quer comer massa queimada.

 

Pelo tom de voz dele, percebi que ele não estava mal-humorado de fato, mas eu não conseguia sequer dar um palpite sobre o que o estava afligindo tanto.

 

– Consigo sim, Aidan. Só um minuto. – Soou a voz de Trevor da cozinha.

 

– Enquanto isso, quero que todos venham aqui para a sala – ordenou e eu me sentei reta no sofá, dando espaço para outros se sentarem de cada lado meu.

 

O pessoal que estava na mesa largou as cartas e vieram até nós, os que estavam na cozinha vieram assim que Trevor conseguiu arrumar todas as coisas por lá. Com os seus lobos reunidos, exceto por Rebecca, esperávamos Aidan conversar sobre seja qual fosse o assunto que estava levando-o a xingar por aí.

 

Ele estava prestes a começar, mas ao invés de palavras, soltou um suspiro. Parecia incerto sobre como nos dar a notícia que precisava. Franzia o cenho e seus olhos nos varriam, sem se fixar em nenhum de nós em particular.

 

– Não é fácil para mim falar o que pretendo falar agora, mas é algo que vem me incomodando há muito tempo e sinto que preciso esclarecer. – Finalmente pareceu encontrar as palavras. – Alguns de vocês devem até ter percebido, devem ter uma ideia do que seja, mas eu, como Alfa, acho que tenho certa obrigação de comunicar isso para vocês sem maiores dúvidas.

 

– Não acha melhor esperar a Rebecca chegar? – indagou Liam, mas Aidan apenas olhou para o submisso com uma expressão divertida.

 

– Eu acho que esperar Rebecca seria uma péssima ideia.

 

Connor, que tinha sentado ao meu lado, deu uma risada contida. O que tinha de engraçado nisso? Por que Aidan queria excluir Rebecca disso? Ela tinha tanto direito quanto qualquer um aqui de ouvir o que Aidan tinha a dizer.

 

– Já faz tempo que tomei essa decisão. Faz tempo que refleti sobre isso, e como! – explicou. – Mas infelizmente fico esperando o momento certo e acabo não agindo como queria. Por isso meu lado animal está me infernizando desde o dia em que tomei essa escolha e, talvez para apaziguá-lo ou apaziguar a mim mesmo, vim aqui deixar claro como cristal para vocês o que pretendo. E, talvez, consiga encontrar nisso também um jeito de eu me sentir melhor.

 

Todos ouvíamos atentamente. Pelo olhar de alguns, como Connor ao meu lado, percebi que eles já desconfiavam do que se tratava, mas eu estava totalmente confusa e não era a única.

 

– Quero deixar claro que não estou aqui para mostrar que desconfio de nenhum de vocês. Mas meu lobo acha certo eu fazer isso, acha que eu devo, então farei.

 

Ele fez uma pausa, seus olhos negros parando nos meus por um momento e, apesar de antes parecer incerto, agora ele esboçava um sorriso.

 

– Acontece que eu tenho novas intenções. Novas intenções em relação a certa pessoa.

 

– Ah não, Alfa. Não acredito que esse dia chegou. – Clayton se levantou e, com uma risada, deu dois tapinhas nas costas de Aidan. – Eu sabia que quando a boneca entrasse na alcateia ela iria mudar tudo. Só não sabia que seria assim.

 

– Eu não entendi direito, alguém pode elaborar? – forcei-me a perguntar, lutando contra a contagiante alegria dos demais.

 

Clayton deu-me um olhar sugestivo e voltou a se sentar em seu lugar de antes. Aidan respirou fundo, mas parecia farto de seus tormentos internos e pronto para soltar o que tinha para contar.

 

– Vou chamar Rebecca para sair, tá legal?

 

Pisquei algumas vezes, procurando nos outros lobos a mesma confusão que eu sentia, mas sem achá-la. Muitos dos que estavam confusos antes, como Liam, agora pareciam ter compreendido tudo.

 

– Tá, mas e daí?

 

Minha resposta arrancou de Clayton mais uma alta gargalhada, que logo contagiou Nate e Riley.

 

– Kenna, eu decidi compartilhar isso com vocês porque entendo que minha vida pessoal não pode ser tão pessoal assim – Aidan esclareceu, com um sorriso divertido nos lábios, causado pelos lobos. – Eu sou o Alfa de vocês e, para deixar as coisas ainda mais inusitadas, Rebecca é uma irmã loba de vocês. Mas, confesso, esse não é o único motivo de eu estar aqui feito um tolo na frente de todos falando sobre uma das coisas mais mundanas possíveis. A única forma de eu apaziguar meu lado lupino, até eu achar uma brecha para chamar ela para sair, é avisando vocês sobre meus planos. Na falta de palavra melhor, meu lobo quer marcar território, entendeu? Ao menos até eu conversar com ela, e ela me aceitar ou recusar.

 

Fiquei em silêncio por alguns momentos, absorvendo a explicação dele sobre como estava tentando conciliar lado humano com animal. Os demais espelharam meu silêncio, esperando para ver se ele tinha mais alguma coisa a dizer.

 

Lembrei-me do que havia presenciado na clareira, no dia de minha indução, em como Aidan parecia atraído a ela como um imã. Como se, realmente, o cortejo entre dois lobos fosse diferente do que o de dois humanos. Essa realização reabriu uma ferida em meu coração, que provava, novamente, que o que eu pensei que tivesse tido com Maxwell nunca havia sido genuíno. Eu deveria me sentir grata até, considerando os acontecimentos passados, mas se Maxwell sentisse por mim uma fração do que Aidan mostrava sentir por Becca, eu certamente veria essa mesma intensidade que Aidan tinha ao, simplesmente, avisar-nos que estava interessado nela. Por fim, Trevor desencostou-se da parede em que havia se apoiado e soltou uma baixa risada, livrando-me do sofrimento de ter que relembrar meu passado.

 

– Bem, boa sorte com ela, Aidan. Você vai precisar.

 

– Honestamente, não tenho nenhum palpite sobre como ela vai reagir quando souber que você está a fim dela – Clayton acrescentou.

 

Aidan apenas suspirou e relaxou sua postura, um sinal para Trevor e os demais voltarem à cozinha e que todos estávamos liberados.

 

– E quando pretende chamá-la? – perguntei, com um sorriso bobo estampado na cara. Feliz pela minha amiga, e feliz pelo meu Alfa.

 

– Para ser sincero? Não faço ideia. Se dependesse de meu lado lupino, eu já teria feito isso há semanas, provavelmente no dia que fomos ao dojô juntos e ficamos sozinhos por horas. Mas também não quero encurralá-la.

 

Aproximei-me dele e apertei seu braço, num sinal de que eu, assim como Trevor, desejava a ele boa sorte.

 

– Só não espere demais. Caso contrário é capaz de ela chamar você antes de você chamar ela...

 

– Aposto cem dólares que você está errada. – Passou a mão por sua nuca, mas soltou uma baixa risada. Seu comentário me deu uma ideia, e Clayton e eu trocamos um olhar travesso. Para minha felicidade, porém, Aidan estava preocupado demais para perceber. – Não sei nem se ela sente a mesma coisa que eu, pelo menos na mesma intensidade. – Suspirou. – Bem, ao menos meu lobo está menos agitado. Talvez até me dê um pouco de sossego – falou, logo em seguida deixando a sala, permitindo que Clayton esfregasse uma mão na outra sem pudores, como se não estivesse aprontando coisa boa.

 

– É senhorita Kenna, parece que eu e você temos algo de extrema importância para organizar.


Notas Finais


Espero do fundo do coração que tenham apreciado esse capítulo! Acho que vocês vão gostar e muito de descobrir o que o Aidan tem a dizer sobre as perguntas de vocês! Confiram o Jornal!
https://www.spiritfanfiction.com/jornais/entrevista-dominante--aidan-rucker-vol-1-11661740


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