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História Valente - Parte I - Capítulo III - Revisado


Escrita por: Aella

Notas do Autor


Pequeno atraso por causa do dia dos pais, mas tudo bem. Aqui vem um capítulo longo, com duas narrativas para vocês e muuuita história sobre o universo Dominante!
Espero muitíssimo que gostem ♥

Capítulo 3 - Parte I - Capítulo III - Revisado


Fanfic / Fanfiction Valente - Parte I - Capítulo III - Revisado

 

Scarlet

 

Tudo havia começado nesse hotel. Àquela altura, eu não saberia dizer exatamente o que era tudo, mas havia certamente começado nesse hotel. Ou pelo menos eu nunca havia notado outros acontecimentos parecidos antes e em outros lugares.

Eram coisas pequenas, no início, que passariam despercebidas por qualquer pessoa um pouco mais agitada. Eu, porém, havia percebido e estava cada vez mais apreensiva. Quando chegamos ao hotel, eu acreditava, convicta, de que havia uma explicação racional para tudo que acontecia.

Por isso não mencionei a ninguém quando fui pegar um panfleto do balcão e ele caiu no chão bem quando fui pegá-lo, como se um vento tivesse o soprado, mesmo não havendo sequer uma janela aberta. Não mencionei quando fui ao banheiro do saguão e pensei ter visto, por meio segundo, um vulto no canto do banheiro pelo espelho. Não mencionei como, sozinha e indo em direção ao meu quarto, as luzes do corredor falhavam e ficavam piscando até eu chegar a minha porta, quando finalmente se estabilizavam de novo.

Portanto, eu não achei relevante mencionar como, ao sair da suíte de Aidan – onde George e Bexi estavam tendo uma sessão de terapia – eu caminhava pelos corredores do hotel com calafrios. Aidan me esperava na área das refeições do hotel, querendo fazer um lanchinho antes de partirmos para o centro da cidade. Assim que eu havia saído da suíte e começado a caminhar, parecia que algo estava me empurrando para frente, como um vento forte quase me carregando. Porém, tão repentinamente quanto veio, parou, e fiquei no meio do corredor, atônita por alguns minutos antes de conseguir voltar a andar.

Essas coisas pareciam só acontecer quando eu estava só e, apesar de terem começado cerca dois dias atrás, somente aconteciam quando eu já havia abaixado a guarda e não esperava tão cedo por outro incidente.

Eu ainda debatia comigo mesma se deveria discutir isso com alguém. Por um lado, eu tentava manter meus pensamentos longe disso, dispensando preocupações com a desculpa de que tinha de haver uma explicação plausível para todos os ocorridos e que eu iria parecer uma tola me preocupando com esse tipo de coisa. Imagine se eu revelasse ou demonstrasse qualquer medo dessas coisas, tão bobas? Esses lobisomens todos iriam voltar a me enxergar como a raposinha que acreditavam que eu era, mas não somente isso. Enxergar-me-iam como uma pequena raposa amedrontada. Ah, eu iria morrer antes de admitir medo a qualquer um deles, até mesmo a Riley. Poderia contar à Becca, se ela estivesse aqui, mas justamente por causa dela precisava ser forte para a ajudar.

Quando eu parava para refletir sobre a pequena parte de mim que se amedrontava com essas coisinhas, sentia-me mais frívola ainda. O que eu era, afinal, se não um ser sobrenatural? Desconhecida pelo mundo, pela ciência? Tanto eu, quanto os lobisomens que me cercavam e eu chamava de amigos, de amantes; O que éramos, do que éramos capazes? Minha própria melhor amiga, parte dela era literalmente um fantasma! Se fôssemos maus, podíamos realmente tornar a realidade de muitas pessoas em um filme de terror, grotesco e assustador.

Então por que passar tanto tempo remoendo essas coisas? Por que, de repente, ficar com o corpo todo tenso quando eu percebia que estava sem a companhia de alguém?

Sem a companhia de alguém visível, pelo menos…

Era irritante, em parte, não saber o que estava acontecendo comigo, ou se havia, de fato, algo acontecendo. Eu repetia em minha mente: Era inexplicável? Não, não era. Eu apenas não tinha as respostas, mas alguém teria.

Mesmo assim, mesmo com todas as minhas tentativas de me convencer de que tudo não se passava de imaginação fértil, problemas elétricos no prédio, a luz brincando com minha visão, eu ficava estalando meus dedos de forma nervosa e olhando por detrás do meu ombro enquanto caminhava.

Apenas consegui relaxar quando encontrei Aidan. Ele não era meu Alfa nem nunca representaria para mim nada parecido com um líder. Porém, ele era companhia, e aquela parte de mim que insistia em temer se aliviou.

Pegamos um táxi até o endereço no centro da cidade, um museu, o qual Robert havia passado para Aidan. Robert já havia ido ao encontro dos Selvagens horas antes, para cumprir seu papel político, muito tedioso a meu ver. O caminho até lá permaneceu em silêncio, mas eu sentia que não era voluntário. Aidan, no passageiro, parecia inquieto. Era de se esperar, iríamos descobrir as respostas às perguntas que, há semanas, precisávamos responder. Porém eu estava no banco de trás e não tinha como conversar sobre esses assuntos na frente do taxista.

Quando finalmente chegamos ao nosso destino e Aidan pagou e mandou o taxi embora, ele grudou do meu lado enquanto entrávamos.

– O que você acha que vão nos dizer? – perguntou rápido, quase vomitando as palavras. Era visível a necessidade que esteve passando dentro do carro para discutir o assunto. Agora que estávamos cada passo mais perto das respostas, ficávamos mais sedentos e mais especulativos.

– Honestamente, – falei com um suspiro. – não faço a menor ideia. Posso ser uma Selvagem como eles, mas estou tão no escuro quanto você.

Ele bufou, inquieto e apressando o passo. Acompanhei-o.

– Tentei pensar mais a respeito, mas não consigo imaginar nada que uma tribo de Selvagens possa saber ou como podem nos ajudar – acrescentei, agradecendo com um aceno quando ele segurou a porta para mim. O ar-condicionado do museu era refrescante e fiz uma anotação mental para reclamar ao Riley sobre ainda não estar tão fresco no fim de tarde como ele prometera.

– Sua posição é compreensível – respondeu sem me olhar, ocupado tentando descobrir para onde deveríamos ir em seguida. – Cresceu sem conviver com ninguém de sua espécie – prosseguiu, parecendo ter achado um caminho. – Imagino como seria se eu estivesse em seu lugar. Provavelmente me surpreenderia com as coisas que tenho o potencial de fazer, de saber, mas que nunca foram ensinadas a mim.

As palavras dele me deixaram mais esperançosa, inclusive pensando nos acontecimentos bizarros do hotel. Talvez meu povo pudesse me ajudar. Ou talvez eu nem precisasse de ajuda, pois, como ele dissera, talvez eu não soubesse meu real potencial. Talvez eu mesma conseguisse desvendar meus próprios mistérios. Ao mesmo tempo, contudo, esses pensamentos me deixaram tristes.

– Pode ser, – continuei, observando as obras de arte típicas da região enquanto passávamos. – mas eu me sentiria um verdadeiro lixo se soubesse que, esse tempo todo, eu poderia ter feito algo pela Rebecca que não fiz até agora. Algo pelas duas.

Nessa hora, ele parou pela primeira vez e me encarou nos olhos. Puxou-me para me fazer parar, pois estávamos andando apressados, e me segurou pelos ombros.

– Scarlet, se tem uma pessoa que não precisa sentir culpa, é você. Você esteve ao lado dela desde a luta com a Roman. Ao lado tanto de Bexi, quanto de Rebecca. Tem sido uma grande ajuda para todos, principalmente para mim. Sabe que você é a única em quem tenho plena confiança em relação ao corpo de Rebecca e aos seus cuidados? Sei que cuidará dela como se fosse seu próprio corpo.

Meu rosto começou a esquentar e senti um peso dentro do me peito teimando em me fazer chorar.

– Você não deve se torturar por coisas que estiveram longe de seu alcance por causa de terceiros. Se você deixou de fazer algo, não é porque decidiu não dar o seu melhor, disso tenho certeza.

Notei que ele não quis mencionar quem eram esses terceiros, mas seu tom deixava claro que estava se referindo ao próprio Alfa dele, homem que estivera perdendo o prestígio de Aidan desde nossa estadia em Las Vegas.

– Sem rastro de dúvidas sei que você faria e fará de tudo para salvar Rebecca, desde situações drásticas como essa, como coisas mais banais, como pintar as unhas dela. – Ele riu baixinho, e me dei conta de que ele provavelmente notava cada detalha que eu fazia com Rebecca, até mesmo quando eu trocava a cor das unhas de minha melhor amiga inconsciente. Será que sabia que eu aparava suas sobrancelhas, também?

Tive que rir e me forcei a engolir o choro. Ele tinha razão, eu faria de tudo, e chorar agora não faria bem algum à Becca. Precisava seguir em frente e pensar nela, tornar-me a melhor Selvagem possível para poder ajudá-la.

– Obrigada, Aidan. Você tem razão. – Sorri e o puxei de volta para continuarmos a andar. – Mas agora vamos, pois temos uma loba para salvar.

 

~X~

 

Aidan

 

O escritório dele era como nada que eu havia visto antes. Nem parecia um escritório, mas sim uma ala a mais de exposições do museu. Suas prateleiras e estantes estavam cheias de ornamentos antiquíssimos dos povos latinos, enfeites feitos de ouro pelos Astecas, Maias e alguns poucos dos Incas. Havia um par de brincos de ouro, enormes e triangulares, de tanto tamanho que facilmente ocupava metade de minha palma – que não era pequena. Estava em destaque em sua mesa, protegido por uma caixa de vidro, mas não havia nenhuma inscrição ou placa com informações.

– Belo, não é?

Virei-me para cumprimentar o dono daquela voz rouca e carregada de sotaque, arrependendo-me um pouco de não ter dado tanto atenção à língua espanhola no meu ensino médio. O Sr. Gutierrez, gerente do museu, fechou a porta atrás de si. Já estava perto de se aposentar, ou pelo menos aparentava estar, e usava um bigode branco que, apesar de eu ter achado um pouco cômico, combinava com sua aparência e sua posição.

Demorou um pouco a retornar a sua sala, onde havia me deixado, mas era compreensível. Ele tinha levado Scarlet para conhecer os outros funcionários do museu, alguns sendo seus próprios filhos. Eu tinha a impressão de que pelo menos alguns desses funcionários também eram Selvagens como ela. Tinha certeza de que ela também achava, pois escondeu seu nervosismo muito mal quando nos despedimos.

– É uma peça e tanto – respondi, verdadeiramente impressionado em como, desde antigamente, os humanos conseguiam produzir acessórios tão belos.

– É muito valiosa, feita de ouro puro e maciço. De um ponto de vista histórico, não tem nada de muito especial, não mais do que qualquer outro par de brincos da época. – Ouvia com atenção, agora não mais olhando para o par de brincos, mas para os olhos gentis do Sr. Gutierrez. – Porém, particularmente para mim, é a peça mais rara do museu inteiro.

Fiquei extremamente curioso quanto a isso, e tinha certeza de que minha curiosidade transbordava pela minha expressão. Isso ou Sr. Gutierrez já era experiente o suficiente trabalhando no museu para saber quando um visitante estava sedento por mais conhecimento.

– Deve estar confuso, Sr. Rucker, sobre o motivo de essa peça não ter nenhuma placa informativa, se é tão valiosa para mim, não é mesmo? Por que ela permanece no anonimato? – Assenti, virando-me novamente para o brinco enquanto o senhor se dirigia até sua mesa e se sentava em sua poltrona. – Por favor, sente-se, Sr. Rucker.

Sentei-me como pedira e esperei por sua explicação. Ele abriu uma gaveta e retirou uma caixinha de charutos. Ofereceu um para mim antes de acender o seu, mas educadamente recusei.

– Sei que essas coisas não têm muita graça para vocês, – falou dando sua primeira tragada e soltando a fumaça lentamente. – mas alguns gostam apenas para manter o hábito ou as aparências.

Fiquei pensando se Robert não teria aceitado um anteriormente, devido ao comentário.

– Acontece que essa peça possui, para mim, um valor diferente do esperado – continuou a me explicar. – Não é, como falei antes, mais valiosa monetariamente do que outras várias peças que temos expostas. Também não pertenceu a ninguém historicamente relevante. Porém, para meu povo, é um símbolo do nosso nascimento.

Imediatamente entendi o que ele quis dizer. Robert não havia me confirmado, mas eu supunha que o gerente com o qual ele queria que eu falasse fosse um Selvagem. Quando o Sr. Gutierrez mencionou seu povo, só podia estar falando de sua raça sobrenatural, e não sobre o povo da região.

– Sr. Gutierrez, – aproveitei a pausa que ele deu para perguntar. – o senhor é um Selvagem, ou apenas um historiador com conhecimentos sobre o sobrenatural?

– Por favor, pode me chamar de Miguel – pediu, e em seguida riu de minha pergunta.

– Tudo bem, o senhor pode igualmente me chamar apenas de Aidan. – Retribuí com um sorriso.

– Sou ambos, Aidan – explicou então. – Contudo, admito que antes de me tornar historiador com especialidade no sobrenatural, nasci com a habilidade de me transformar em uma ágil águia. Habilidade não tão incomum aqui, pelo que sua jovem colega me confessou, quanto é no seu país. – Concordei com um aceno de minha cabeça.

– Scarlet cresceu sozinha e sem saber que havia outros como ela.

– Bem, iremos remediar isso, pode ter certeza. Ela já deve estar se sentindo em casa a essa hora, ou ao menos espero que esteja. – Com isso, confirmou minhas suspeitas de que ele a havia levado para conhecer seus familiares, da mesma forma que uma alcateia é a família de um lobo. – Esses brincos, Aidan, – voltou ao assunto anterior. – pertenciam à grandiosa Erandi, a primeira Selvagem.

‘Erandi, primeira Selvagem.’ Refleti junto com meu lobo.

Posicionei-me mais a frente, apoiando meus cotovelos em meus joelhos, prestando o máximo de atenção possível. Achava que Scarlet também deveria estar ouvindo esta história, mas queria gravar cada detalhe para compartilhar com a raposa, caso ainda não tivessem contado a ela por algum motivo.

– Erandi não era uma moça importante em sua sociedade, era apenas mais uma jovem na civilização Asteca. – Assenti, lembrando que na América Pré-Colombiana, o atual México tinha sido ocupado principalmente pelo Império Asteca. – Contudo, seu avô era um sacerdote, um senhor tão ligado aos espíritos e à natureza que era o homem mais velho de sua cidade e considerado o mais sábio. Quando os europeus chegaram, os outros sacerdotes, preocupados, buscaram o conselho do avô de Erandi, pois todos tinham um grande respeito por ele. Seu conselho havia sido de, se os europeus se mostrassem vilões, fazerem uma oração coletiva, um apelo aos deuses e aos espíritos por ajuda, pois era a única coisa que poderiam fazer. Acreditavam fortemente em destino e nas decisões divinas. O que os deuses quisessem, iria acontecer, por isso decidiram que rezar e fazer sacrifícios iria deixar os deuses satisfeitos com seu povo, dando a eles proteção e triunfo.

O Sr. Gutierrez fez uma pequena pausa, mas eu não quis interrompê-lo. Portanto, continuou:

– Claro que sabemos, pelo que a história nos contou, que nenhum dos povos originários das Américas foram triunfantes, mas realmente tentaram. Erandi não era a única neta do grande sacerdote, tampouco era a única jovem. Muitos jovens da cidade foram escolhidos, mas, por ela ser a neta mais velha do sacerdote, foi a primeira a ser sacrificada.

Fiz uma cara surpresa, o que arrancou um sorriso do homem.

– Eram um povo bastante impiedoso, mas em geral apenas com seus inimigos. Para eles, a morte era fundamental para a perpetuação da vida – explicou, acostumado, sem dúvidas, a lidar com turistas carregando estereótipos e deu mais uma tragada em seu charuto. – Faziam sacrifícios para certificar a contínua permanência do Sol, assim como para agradecer à boas colheitas. Dessa vez, porém, sacrificaram os próprios netos, numa tentativa de mostrar aos deuses que estavam dispostos a perder muito em troca de proteção contra os invasores. Reuniram-se todos os sacerdotes da cidade em torno de uma fogueira gigante no Templo Maior, a maior já feita no local. Todos os cidadãos também foram chamados, rezando aos deuses durante todo o processo. Os selecionados, começando por Erandi, esperavam em pé sua vez de atuar, ao lado dos sacerdotes. O avô de Erandi, então, iniciou uma prece que todos acompanharam, inclusive os selecionados, pedindo aos deuses, à natureza e aos espíritos para dar a eles a essencial força e proteção contra os invasores.

Apontou para o vidro com o par de brincos, abrindo um sorriso.

– Ela estava usando esses brincos durante o ritual.

Voltei minha atenção aos brincos mais uma vez, agora olhando para eles com novos olhos, sabendo das coisas que aquela joia havia presenciado.

– Após a oração, Erandi foi incentivada a andar até as chamas. Sim, – falou antes de eu poder interrompê-lo para confirmar se havia entendido direito. – ela literalmente adentrou a fogueira, sem medo e sem hesitar. Ao menos assim foi passado por gerações. Contudo, não foi bem como eles imaginaram.

Soltou uma risada para si mesmo, como se a piada fosse somente dele, e abriu a gaveta para pegar mais um charuto. O Sr. Gutierrez parecia ter um vício, então. Agradeci por ser da raça dos lobisomens e ser imune a esses perigos.

– Erandi, para a surpresa e maravilha de todos, não gritou, não queimou ao adentrar as chamas. Saiu da fogueira, sem um arranhão, sem ter sentido dor. Também não saiu com seu corpo habitual, nem com nenhuma forma humanoide. No lugar de Erandi, estava um lindo jaguar pintado. O povo ficou espantado, mas logo perceberam que essa era a bênção escolhida pelos seus deuses. Essa era o sacrifício que os jovens deram: cederam sua humanidade para se tornarem as armas que iriam usar para vencer os europeus. Um por um, os selecionados atravessaram a fogueira, cada um assumindo uma forma diferente de predador local.

– E assim nasceram os Selvagens – adivinhei.

– E assim nasceram os Selvagens – repetiu, assentindo. Notei que ele parecia orgulhoso de suas origens, mesmo com sua raça tendo declinado muito ao longo dos séculos. – Essa história é passada de geração em geração, mas apenas pelas famílias que carregam esse sangue nas veias. Entretanto, não somos exclusividade nem do Império Asteca, nem dessa época na história do mundo! O maior surgimento de Selvagens veio, de fato, da leva de Erandi, e daí para a frente de seus descendentes. Mas há relatos sobre os índios norte-americanos terem Selvagens, os Incas nos Andes, os Guarani no Brasil. Meus netos em algumas viagens para a Austrália e para a Rússia, descobriram que os aborígenes e coriacos da região também possuíam Selvagens. Tudo sendo uma espécie de arma para se defenderem de seus respectivos invasores.

– Mas os primeiros, a primeira de fato, foi Erandi?

– Não é possível termos certeza, Aidan, mas temos uma forte suspeita de que sim. De qualquer forma, para mim e para minha tribo de Selvagens, esses brincos são o símbolo de nossa origem, de nosso começo. Temos muito orgulho de sermos descendentes diretos daqueles que podem ser os primeiros de nossa espécie. – Assenti, conseguia compreender o sentimento. Apostava que a família Landon deveria se sentir de forma semelhante. – Mas, enfim, não foi por causa disso que você veio até aqui. Por mais feliz que eu fique em dividir a história de nossa mãe maior e nossa espécie, sei que deve estar muito preocupado com sua amiga.

– Ela é mais que uma amiga – falei, de forma bastante séria, notando que não falávamos mais de Scarlet. – é minha responsabilidade. Como Alfa dela, eu já não devia ter permitido que algo tão horrível lhe acontecesse, mas deixei. Agora irei consertar as coisas a qualquer custo.

– Claro, entendo. Robert me deixou a par de tudo que aconteceu anteriormente. – Olhou me com empatia. – Sinto muito por tudo que passaram. Mal consigo imaginar como deve ter sido assustador, principalmente para a pobre moça.

– Ainda está sendo assustador. – Decidi ser sincero com ele. Era bom poder ser franco com um líder de outra espécie, uma espécie aliada, sem ter de diminuir os problemas internos para não demonstrar fraqueza. – Não sabemos o que podemos fazer, não sabemos se podemos fazer qualquer coisa. Viemos com a esperança de que vocês tivessem as respostas, mas mesmo assim, não sabemos como ela ficará depois de tudo, se ela será a mesma Rebecca de antes… – Abaixei minha cabeça, tentando esconder minha preocupação. Não podia fraquejar agora, não quando estávamos a meses atrás de uma solução.

– Iremos ajudá-los sim, Aidan. Não se preocupe quanto a isso. Como contei a você, viemos da natureza, dos deuses, dos espíritos. Nascemos deles. Temos uma boa ideia do que fazer. – Levantei a cabeça para encará-lo. – Os lobisomens não são tão diferentes de nós quando se olha atentamente. O que ligou Erandi ao seu lado animal, seu jaguar, foram os espíritos. Quem ligará sua amiga a sua loba, também serão os espíritos.

Encarei-o confuso.

– Como assim?

– É difícil de explicar, principalmente para alguém que não vive a cultura e nunca vivenciou nada do tipo. – Suspirou, mas então tentou me explicar. – Tudo que nos liga, os Selvagens, a esse mundo está no mundo espiritual. Nunca vivenciei casos como o de vocês, de um lobisomem perder sua habilidade de se transformar, mas estamos apostando que seja similar.

– Selvagens perdem a habilidade de se transformar? – perguntei. – Que eu saiba, os Selvagens não têm, como nós, um espírito dentro deles.

– É verdade, somos um só. Mas, enquanto vocês são sempre dois, nós somos um e ao mesmo tempo vários.

Pisquei algumas vezes, deixando minha completa confusão transparecer para ver se ele me explicava melhor tudo isso. Segurei-me para não bufar de impaciência.

– Você não sabe sobre isso, pois sua única conhecida da espécie também não sabe. – Sorriu, achando graça de minha confusão. – Scarlet irá aprender isso logo.

Pude notar em sua expressão que ele estava genuinamente feliz por outra Selvagem – outra dos seus – ter achado seu caminho de volta para casa, e agora aprenderia o que podia realmente fazer com suas habilidades.

– Nós, Selvagens, nascemos com o dom de virarmos um animal, certo? – Concordei. – Esse animal é o que melhor nos representa, com o qual nos identificamos mais e, claro, dependendo de onde nascemos, recebemos um animal compatível com aquele habitat. Porém, não precisamos ficar presos a uma forma só. – Arregalei meus olhos ao ouvir essa informação e o Sr. Gutierrez achou graça novamente. –  É verdade, Aidan. Com o tempo e a fortificação de nossos laços espirituais, podemos adquirir a habilidade de nos transformar em animais além daquele nosso de origem, vários outros.

– Isso é… incrível – lutei para achar a palavra certa, mas somente essa descrevia o que realmente estava passando pela minha cabeça.

– Obrigado, Aidan. – Apagou seu segundo charuto e agora parecia estar satisfeito. – Entretanto, o método que temos para desenvolver nossa espiritualidade é através da meditação – continuou a explicar. – Para quem está apenas observando, não enxergam nada além do Selvagem parado, imóvel, em seu estado de paz. Ali, porém, está apenas o corpo. A alma está no mundo espiritual, adquirindo conhecimento e passando por testes para provar aos espíritos de que é merecedor. Entende onde quero chegar?

– Mais ou menos, Miguel. – Tudo isso era muito interessante, de fato, e eu certamente levaria Scarlet para comer fora antes de voltarmos para o hotel para dividirmos nossas descobertas. Mas eu não estava, na verdade, entendendo o que isso tinha a ver com a Rebecca.

– Acredito que o espírito humano de sua amiga esteja preso no mundo espiritual.

Não teve como eu não reagir mal a isso. Ela estava presa sei lá eu onde, e sei lá como iria fazer para pegá-la de volta. Não era um sentimento que eu ou me lobo gostamos de sentir.

– O quê?!

– Calma, não se desespere. Não é nada fácil de se fazer, mas não é impossível.

‘Calma? Calma?! Como esse cara espere que eu fique calmo em uma situação dessas?’ – Meu lobo urrava internamente, tendo se controlado até aquele momento e ficado apenas a ouvir. – ‘É da Rebecca que estamos falando! Como vamos fazer isso? Não sabemos por mais quanto tempo o corpo dela irá aguentar esperar, e não sabemos o que pode acontecer com Bexi enquanto está fora. E se ela sumir? Ela é um fantasma agora, Aidan, não é normal ela ficar aqui dessa forma. Uma hora ela vai embora, não poderá viver como um espectro até o fim dos tempos. E se a perdermos? Ambas?’

Tive que respirar fundo para não transmitir nossos sentimentos de raiva e desespero para o Sr. Gutierrez.

– Desculpe-me, Miguel, mas ainda não entendi como isso seria possível – murmurei entredentes, tentando ao máximo não deixar o nervosismo do meu lobo fazer-me perder o controle. – Não sei como entrar no mundo espiritual, e muito menos como achar Rebecca se conseguir entrar lá. Não tenho muito tempo para o senhor me ensinar, não tenho tempo a perder-

Eu pretendia continuar, mas ele me interrompeu no meio da frase, algo que por si só demonstrava a coragem do Selvagem em interromper o quinto lobo mais dominante do continente.

– Desculpe, Aidan, mas acho que você realmente não entendeu o processo. – Encarei-o esperando logo respostas concretas, decidindo que ele estava apenas tentando me ajudar, de sua própria maneira misteriosa.

– Por favor, Miguel – falei com um suspiro, reprimindo meu lobo de volta para o fundo de minha mente por ora. Ele estava muito agitado, não parava de martelar minha cabeça com perguntas para as quais eu não tinha as respostas nem forças para ouvir. – Eu preciso saber o que fazer, deve haver uma maneira mais fácil, mais rápida.

– Aidan, – Quem suspirou dessa vez foi o Selvagem e, antes de continuar, apoiou seus cotovelos em sua mesa para se aproximar de mim. – não é você quem vai salvá-la. Para poder encontrar sua amiga em meio aos espíritos, precisa-se sim ser uma pessoa próxima a ela, com uma forte ligação com a moça em questão. Mas essa pessoa… Sinto, Aidan, mas não deverá ser você. Selvagens, por serem filhos dos deuses da natureza e abençoados pelos espíritos, têm facilidade em adentrar seu mundo. Podemos até encontrar uma forma para você entrar na planície dos espíritos, mas um Selvagem terá mais facilidade e mais sucesso em se comunicar com os habitantes daquele lugar.

Fiquei imóvel, estático. Eu não poderia fazer nada pela Rebecca? Seria inútil mais uma vez, como quando permiti que ela fugisse com o idiota do Mathias e fosse levada embora por Roman e seus capangas?

– Aidan – chamou-me novamente, percebendo certamente meu desespero e conflito interior. Eu era seu Alfa, maldição! Eu deveria poder salvá-la! – Iremos treinar Scarlet bem, disso pode ter absoluta certeza. Quando ela estiver pronta, e prometo que isso também não irá demorar, ela se conectará ao mundo espiritual, e lá achará sua amiga.

Meu olhar caiu de volta à peça protegida pela caixa de vidro. Erandi, a mãe dos Selvagens… Eu estava em seu território agora. Ela era uma Alfa invisível em um território invisível. Estava imerso agora em seu mundo, sua cultura. Querendo ou não, eu precisava obedecer às regras dela. Precisava respirar fundo, dar dois passos para trás e deixar Scarlet assumir as rédeas, independente de quão impotente isso me fizesse sentir.


Notas Finais


Obrigada pessoal pela leitura e pelos comentários, como sempre *--* Vocês me deixam radiante!
Peço, de coração, que vocês deem uma olhada nos links que estarão aqui no fim das notas. A primeira fic, She Wolf, é nova e escrita por uma fã de Dominante, com o mesmo tema de lobisomens e inspirada em Dom e Val! Vale a pena conferir, hein! *-*
A segunda, Inocência, é de uma amiga. Os fãs de Yaoi, vão adorar! É da categoria Bangtan Boys!
Por favor gente, deem uma chance para essas ótimas histórias!

Não esqueçam de curtir a página de Dominante no facebook e, quem quiser, pode me pedir o link do grupo privado da fic no face também. Mandarei por mp. Beijos *-*
https://www.facebook.com/LivroDominante/

She Wolf: https://spiritfanfics.com/fanfics/historia/fanfiction-originais-she-wolf-6203111
Inocência: https://spiritfanfics.com/fanfics/historia/fanfiction-bangtan-boys-bts-inocencia-4779068


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