1. Spirit Fanfics >
  2. Valentine >
  3. Papel cartão

História Valentine - Papel cartão


Escrita por: yunosuh

Notas do Autor


long time no see huh

Capítulo 1 - Papel cartão


“Viveram felizes para sempre” era a maior bobagem que eu, Jung Jaehyun, já tinha escrito na minha vida inteira de escritor. E olha que eu escrevo tem bons anos.


Sei que absolutamente nenhuma história de amor terminou com “felizes para sempre”. Esse tipo de pensamento é ridículo, já que na vida real, história alguma terminaria assim. Mas o que eu posso fazer? Tenho que vender, segundo minha chefe e meus próprios conceitos. E esse livro já tinha tirado muita paciência minha.


Minha chefe pediu de última hora outro livro de romance meu para lançar na semana do Dia dos Namorados. Argh, outra bobagem. Nunca gostei desse dia e provavelmente nunca vou gostar. É só uma besteira inventada por alguém para vender chocolates e ursinhos de pelúcia por um preço absurdo. Tenho muitos argumentos contra esse dia e todas as decorações ridículas que fizeram para ele, mas agora não é hora de citá-los.

 

Quando ela me pediu, eu não tinha nada além de alguns rascunhos salvos no meu one drive, então tive que trabalhar por horas sem dormir para obter um resultado que eu ficasse satisfeito antes de mandar para a corretora.


No momento, falta um capítulo só. Por isso, estou sentado na minha cadeira nada confortável do escritório, com uma caneca de café vazia pela metade e uma mão no queixo, tentando adivinhar como eu começaria a escrever. O bom de ser um escritor reconhecido na empresa, é ter seu próprio escritório e ninguém te enchendo o saco toda hora. Mas também tinham vários contras, como pessoas batendo na minha porta o tempo inteiro, abrindo e enfiando a cabeça para dentro sem minha permissão.


Me irritava.


— Jung? — olha lá. Era Taeyong, secretário da minha chefe, um homem com mãos de fada quando se trata de massagens depois de um longo dia e, também, meu ex. Nós não chegamos a ter nada oficializado, mas alguma coisa aconteceu e acabou como se não passasse de uma ficada de balada. Eu realmente tinha sentimentos por ele e ele os jogou no lixo como se fosse papel amassado. Lembra dos meus argumentos? Então, talvez esse seja um deles: eu nunca tive um romance se quer que tenha dado certo. Provavelmente todos funcionam assim. O amor só serve para vender em um único dia no ano inteiro, e foi um desperdício tentar levá-lo a sério por tanto tempo para, no final, ele não valer nada. Assim como foi com Taeyong, que hoje em dia me olha como se nada nunca tivesse de fato acontecido. — A Miyeon te quer na sala dela, tipo, agora. Ela disse que é urgente.


Bufei alto demais e me afastei da mesa, massageando as têmporas antes de murmurar um “já vou” e Taeyong sair da minha sala. Suspirei e peguei um remédio da gaveta, já que minha dor de cabeça estava mais do que insuportável, tirei um dos comprimidos e o engoli junto do café já gelado pelo tanto de tempo que ficou ali, intocado. Fiz uma careta. Quem suporta café gelado?


Levantei da cadeira e fiz um caminho lento até a porta e até a sala de Miyeon, onde dei duas batidas na porta e entrei.


— Me chamou?


— Jaehyun, eu pedi esse livro pronto ontem.


— Você me deu o prazo até dia oito.


— Hoje é dia seis! Você tem dois dias pra me entregar esse livro pronto pra eu conseguir mandar a tempo pra corretora. Sabe o que acontece se a gente não lançar esse livro até dia doze!?


Ela sempre diz isso. No final, nunca acontece o que ela disse. Miyeon é levemente dramática e viciada em chá de camomila, mesmo nunca estando calma. É minha chefe tem pelo menos cinco anos e eu não reclamo de nada, porque ela também é uma ótima companhia para certas coisas.


— A editora vai à falência — mentira. Já entregamos uns sete livros fora do prazo e nunca faliu.


— Exato. Eu quero metade desse capítulo amanhã no meu e-mail. Vou te dispensar mais cedo pra você ter mais concentração fora do escritório. E nada de enrolar, Jung.


Contive minha animação toda por ser liberado duas horas antes do trabalho e apenas sorri de leve, balançando a cabeça para cima e para baixo em forma de agradecimento.


— Obrigado.


Saí da sala dela e segui até a minha para pegar minhas coisas, meu sorriso largo logo desaparecendo ao ver um vaso de rosa com um cartão rosa em formato de coração pendurado no caule. Que porra era aquela!?


Me aproximei o suficiente para abrir o cartão e ver um “feliz Dia dos Namorados” em uma fonte bonita escrito dentro. Quase vomitei. Coloquei a cabeça para fora até alguém aparecer pelo corredor. O que não demorou muito para acontecer.


— Doyoung, quem deixou isso aqui? — não que eu tenha proximidade com Doyoung, mas ele era a única pessoa por perto na hora. 


— A Chaewon vai viajar hoje e só volta na segunda, ela que deixou. Deu pra todo mundo do escritório.


Suspirei.


— Faz um favor pra mim, por favor. Se você ver o Taeil por aí, fala pra ele se livrar disso pra mim e, sei lá, avisar pra todo mundo que eu não quero mais lembrancinhas de Dia dos Namorados. 


Doyoung me olhou estranho mas não demorou para assentir.


— Tá…


— Obrigado. Boa tarde, Doyoung, te vejo amanhã.


Voltei para pegar minhas coisas dentro da sala e preferi ignorar o bilhão de mensagens que Yuta havia me mandado. Chequei o horário e vi que tinha tempo de sobra, então pensei em passar na minha cafeteria favorita.


Todo dia passo de manhã pela cafeteria para comprar meu café e o primeiro donut que tiver na promoção. Os sabores variam a cada dia, mas são sempre bons e dão um up na minha manhã. Passar ali naquele horário deveria ser bom, então foi o que fiz.


Quando pisei os pés para fora da empresa, me permiti respirar fundo e afrouxar a gravata que quase me enforcou durante metade do dia — confesso que odeio roupas formais, mas o que eu posso fazer? Assinei um contrato dizendo que usaria aquilo todo dia.


Como a cafeteria não ficava muito longe da editora, não demorei até parar na frente dela e quase derreter com o cheiro gostoso de café vindo dela. Entrei pela porta, que fez um barulho clássico de sininho quando aberta, e meu sorriso sumiu.


Que. Porra. Era. Aquela.


Okay, os corações pendurados pelas paredes já estavam ali antes, mas aqueles outros quinhentos pendurados no teto não. E nem tocando aquela música horrível. Cadê o jazz que tocava antes? Era tão melhor e eu gostava. Olhei para o caixa em busca de respostas e, ao invés de ver Sungchan, o jovem bonito que trabalha de barista na cafeteria, vi um homem alto, muito alto, loiro, com óculos de grau e uma pulseira presa no pulso esquerdo, nas cores rosa, roxo e azul que claramente gritava “sou bissexual”. 


Ele era uma face nova, não vou mentir. Era bonitinho, mas o jeito que tinha um coração desenhado precariamente com lápis de olho na bochecha me irritou.


Me aproximei do caixa, chamando sua atenção e tentando não parecer tão ignorante.


— Com licença — chamei, vendo-o apoiar o cotovelo na bancada e me olhar com uma meia-lua nos lábios. — Que música é essa?


— É Five Seconds Of Summer, moço.


— É o quê?


— É uma banda pop, essa música se chama Lover of Mine. 


Olhei para os lados de forma inútil, já que nada aconteceria.


— Cadê o Sungchan?


— Pediu a conta. Agora virou confeiteiro e tá lá no centro.


Suspirei indignado. O cara — cujo nome ainda não sabia — girava uma caneta com os dedos de forma atraente, mexendo os lábios no ritmo daquela música que parecia não acabar nunca.


— Vai fazer algum pedido ou vai ficar aí?


Arregalei os olhos e abri e fechei a boca, mas nada saía dela. O cardápio pendurado atrás do caixa ainda era o mesmo. Não sei porquê acho que a cafeteria mudou por completo, sendo que só trocou de barista.


— Eu… Eu quero um cappuccino médio e um donut.


— Qual donut?


— Qualquer um.


— Qual seu nome?


Me deu vontade de mentir, mas eu não fiz isso.


— Jaehyun.


— Bonito nome. Vai ser pra levar ou comer aqui?


— Comer aqui.


— Então eu nem precisava do seu nome, mas tudo bem, obrigado do mesmo jeito.


Revirei os olhos. Devia ter mentido mesmo. Ele anotou meu pedido e me deu minha ficha junto com a maquininha do cartão. Paguei e fui sentar em qualquer mesa, já que a cafeteria estava completamente vazia, o que, pelo horário, me surpreendeu.


Assim que consegui relaxar minhas pernas, tirei o celular do bolso e conferi as mensagens de Yuta, que falavam sobre uma série qualquer que ele assistia e a morte de um personagem. Respondi tudo com uma figurinha, o que provavelmente deixaria Yuta puto. 


Deu uns dez minutos e o barista entregou meu pedido numa bandeja. Assim que olhei, senti vontade de vomitar com a quantidade de coração em um lugar só. Meu Deus, ainda nem é Dia dos Namorados, pra quê tudo aquilo? 


O prato do donut era em formato de coração, bandeja estava decorado com uma dúzia deles picotados em papel cartão e, para deixar tudo pior, meu cappuccino tinha a porra de um coração desenhado com o creme nele. Sim, aquilo me deixou nervoso.



Não pedi isso.


Peguei a xícara com cuidado e fui até o balcão, colocando-a em cima dele com tanta força que acabei derramando metade fora.


— Escuta — disse, chamando a atenção do barista que agora tinha um crachá. Johnny. — Johnny. Que porcaria é essa aqui?


— Ué — ele respondeu. — É um café.


— Tô falando do desenho.


— É um coração. Sei que ficou meio torto, ainda tô me especializando em latte art, mas não pensei que ficaria tão irreconhecível ass-


— Não pedi meu café com um coração.


— Ah — ele sorriu. Achei fofo, não vou mentir. A risada dele é gostosa de ouvir e o sorriso dele é bonito. Não, Jaehyun, não é hora de pensar nisso. — Eu tô fazendo pra todos em comemoração ao Dia dos Namorados, que tá chegando. O amor é um sentimento tão lindo e eu acho que ele deve ser lembrado pra sempre, sabe?


Não consegui conter uma risada. Desculpa.


— Por que é todo mundo obcecado por essa bosta?


— Perdão?


— O Dia dos Namorados é a data comemorativa mais ridícula que eu já vi na minha vida. Não faz sentido nenhum você comemorar o amor em só um dia do ano, até porque, ele nem existe de verdade. Esse dia só serve pra vender e pra todo mundo gastar dinheiro em besteiras e tentar provar que ama o parceiro ou parceira com dinheiro. Tudo gira ao redor de vendas, vendas e mais vendas. Quantas das pessoas estão pouco se fodendo pra companhia amorosa hoje e no Dia dos Namorados vai agir como se amasse ele ou ela mais que tudo? É tudo uma farsa.


Johnny me olhava incrédulo.


— Eu… Eu tenho muitos comentários a fazer… 


— Vai em frente — interrompi.


— …sobre como você tá errado — ele suspirou. — Mas eu tenho trabalho pra fazer e não tenho tempo de discutir com cliente. Fica com esse café mesmo… E deixa que eu limpo o balcão. Quando for embora, pode pegar uma balinha de café de brinde, tá? Tenha uma boa tarde.


Johnny desaparece pela porta da cozinha e me deixou ali, plantado no chão, com um cappuccino com um desenho destruído em cima do balcão sujo e várias coisas passando pela minha cabeça, coisas essas que eu prefiro não comentar agora.


Peguei a xícara, alguns guardanapos para limpar o balcão — mesmo Johnny tendo deixado claro que ele mesmo limpava, mas eu sou teimoso — e voltei para meu lugar. O donut já estava frio e o café pela metade, mas terminei meu lanche do mesmo jeito e, quando fui sair, realmente peguei as balinhas de café e deixei mais gorjetas do que eu normalmente deixaria.


E fui para casa. Precisava de um descanso.


[...]


Descanso o meu rabo, esqueci que preciso trabalhar igual um condenado.


— Yuta, eu não consigo colocar a Katie e o James se pegando em um arbusto qualquer! Não é tão simples assim.


Então não sei, Jaehyun! O escritor aqui é você, não eu. Eu só sou um viciado em dorama que trabalha com contabilidade e tenho 0 criatividade. E outra, quem me ligou pedindo ajuda com seu livro foi você.


Suspirei. Por que decidi virar escritor? Repenso minhas escolhas de vida até hoje.


Bato o olho no relógio digital que fica ao lado da televisão e vejo que já passou das onze horas. Eu já devia estar dormindo ao invés de escrever. Sentia meus olhos pesando e meus ombros cansados, mas precisava de metade do capítulo até amanhã.


Então, dormir é o último item da minha lista.


— Desculpa. Não devia ter tomado tanto tempo seu, já tá tarde pra caralho.


Nah, tudo bem. Eu tô esperando o Kun acabar a partida de RPG dele com os amigos pra gente poder assistir alguma coisa.


Esqueci que ele namora.


— Esqueci que você namora.


Todo mundo esquece, mas tá tudo bem. Vou desligar agora porque sinto que tô mais te atrapalhando do que te ajudando e você precisa de concentração pra escrever um livro. A gente se vê, Jae, até.


Com um rápido clique, ele desligou, me deixando sozinho mais uma vez. Fui olhar a quantidade de palavras que eu já tinha escrito e quase chorei ao ver apenas duas mil ali, levando ambas as mãos para o rosto e esfregando meus olhos. Precisava de cafeína no meu corpo o mais urgente possível.


E foi o que eu fiz. Bebi umas duas garrafas térmicas de café e consegui fazer três quartos do capítulo, deixando para terminar o resto no escritório. Olhei o relógio mais uma vez. Quatro da manhã. Eu ainda conseguia duas horas de sono.


[...]


Já imaginava acordar com olheiras enormes debaixo dos olhos.


E, para piorar, acordei dois minutos atrasado. 


Okay, dois minutos não eram grande coisa, mas foi o suficiente para me desesperar e me fazer sair de casa vinte minutos mais cedo. O que foi bom, já que me daria mais tempo para poder tomar café na cafeteria.


Não demorei para chegar. Um resquício minúsculo de esperança de que Sungchan estaria lá ainda restava em mim quando eu saí do táxi e entrei na cafeteria, mas foi em vão. Johnny, com o cabelo loiro mais-que-perfeito dele e os mesmos óculos de grau e a mesma pulseira no pulso ainda estavam ali, atendendo um cliente, já que a cafeteria estava mais cheia naquele dia. 


Acho que ele não demorou para me reconhecer, já que sorriu de novo, o que me surpreendeu já que eu quase fiz ele sair correndo ontem.


— Jaehyun! — meu Deus, ele sabe meu nome. Ah, sim, eu falei para ele ontem. — Que bom te ver. O que vai querer?


Quando ele se apoiou no balcão do mesmo jeito da outra vez, eu consegui notar a presença de outras duas pessoas novas ali junto dele. Uma eu consegui ler o crachá. “Chitta”. Já a outra estava de costas, então ignorei.


— O de sempre.


— Não faço ideia o que seja “o de sempre”. 


Esqueci que ele é novo.


— Um cappuccino médio e um donut.


— Ah, é a mesma coisa de ontem.


Ele sorriu de novo e anotou o pedido, me dando a ficha e a maquininha para eu pagar.


— Vai ser pra comer aqui ou pra levar? — ele perguntou, e normalmente eu pediria para levar, mas como estava com tempo de sobra, pedi:


— Comer aqui.


— Certo.


Depois disso, o tal do Chitta chegou do lado dele (com uma proximidade que eu não gostei) e apoiou a cabeça em seu ombro.


— Qual é o pedido dele?


— Pode deixar que eu faço esse, Ten. 


O moço franziu o cenho.


— Tá… 


Me afastei do balcão e fui para uma mesa, me sentando ali e batucando o cartão nela. Uma música pop britânica (ou americana) tocava nos alto-falantes, no mesmo ritmo da que tocava ontem, e eu resolvi tentar ignorar ela. Me arrependi de não ter trazido meus fones comigo para poder ouvir, em paz, minha playlist de jazz. 


É claro que eu não consegui ignorar. Só conseguia prestar atenção no refrão da música.


Get out, get out, get out of my head

And fall into my arms instead

I don’t, I don’t, don’t know what it is

But I need that one thing


E me amaldiçoar por ser fluente em inglês.


Fechei os olhos e respirei fundo. O cheiro gostoso de café entrando pelas minhas narinas e sons de passos se aproximando. Abri os olhos e vi Johnny chegando perto de mim, com o avental levemente sujo, deixando a bandeja sobre a mesa e sorrindo logo em seguida.


— Bom café da manhã, Jaehyun.


Sorri com a fala rápida e assisti ele se afastar antes de olhar para minha bandeja e meu sorriso sumir.


Era a mesma coisa de ontem, exatamente a mesma coisa, só que pior.


O cappuccino ainda tinha o coração e o prato ainda tinha o mesmo formato, mas os corações picotados aumentaram, e muito.


Suspirei e dei um gole no café quente, pronto para reclamar com Johnny assim que acabar de comer. Enquanto comia, fui pegando os corações de papel cartão e os rasgando, já que isso era um hábito comum — rasgar papéis ou os guardanapos enquanto como. Faço isso desde os sete anos de idade. 


Quando acabei, coloquei os papéis rasgados dentro do guardanapo e os embrulhei, colocando em cima do prato e me levantando, indo até o balcão vazio, sem nenhum cliente.


— Por que colocou os corações no meu pedido hoje de novo? 


— Coloquei? — ele respondeu, rindo em seguida e ajustando a pulseira em seu pulso. Cacete, por que tudo o que ele faz tem que ser atraente? — Ah, sim. Coloquei.


— Por quê?


— Você não me pediu pra não colocar — e nem ia — então não vi problema algum — ele sorriu e pegou alguma coisa debaixo do balcão, tirando dali um cartão em formato de coração e pegando algumas balinhas do pote. — Pra você. Tenha um bom dia!


Tirei algumas notas de baixo valor e moedas do meu bolso e deslizei eles pelo balcão, saindo sem dizer nada do estabelecimento.


Enfiei as balas no bolso do paletó e abri o cartão, revirando os olhos ao ler o que estava escrito.


“O amor está no ar!


Feliz Dia dos Namorados! ♥”


Minha vontade foi de amassar e jogar fora, mas por impulso, o coloquei no bolso junto das balas e continuei meu caminho para a editora.


Ainda tinha muito trabalho para fazer.


[...]


Consegui terminar o livro e o enviar para Miyeon, que o enviou para a corretora (eu espero) e só teremos resposta dia dez. Agora, estava relaxando na minha sala, bebendo um café e esperando mais alguém, seja lá quem seja, bater na minha porta e enfiar a cabeça para dentro.


O que não demorou para acontecer.


— Jae — era Sicheng, outro escritor muito bem reconhecido na empresa e uma das únicas pessoas daqui que eu posso confiar, contando com Taeil e Doyoung. — Posso entrar?


— Claro. Senta aí — falei e o vi fechar a porta e se sentar na cadeira na minha frente. — Quer um café?


— Não precisa, eu vou ser rápido — ele suspirou, retirou os óculos de grau do rosto e se encostou na cadeira. — É recadinho da Miyeon. Ela tá em reunião e me pediu pra falar com você — fiz um gesto de “vai em frente” enquanto enchia minha caneca que dizia “formado em letras” de café. — Ela disse que já mandou seu livro pra editora e recebeu a capa do capista. Essa ela vai te mandar por email. E, também, ela disse que você pode sair mais cedo já que fez o que ela pediu.


— Nossa, que beleza. Obrigado, Sicheng.


— De nada, e aliás, não sabia que você tava escrevendo um livro novo.


— A Miyeon me pediu de última hora e eu só peguei um rascunho da minha nuvem para continuar escrevendo.


— Te admiro por conseguir escrever tão rápido. Eu tô há uns três meses trabalhando sem parar no meu romance e ainda não acabei.


— Se você quiser uma ajuda, você tem meu número e, agora, eu tô disponível o dia inteiro.


— Obrigado. Me manda seu novo livro por email pra eu ser privilegiado de novo e ler antes de todo mundo — ele se levantou e deu uma piscadinha antes de pegar seus óculos e começar a andar para fora da sala.


Eu ri com o comentário e assenti.


— Mando já pra você rir com os quinhentos erros de coesão que eu devo ter cometido.


— Pff, duvido muito que exista algum erro de coesão em um livro seu.


Ele saiu da sala e eu sorri, começando a arrumar minhas coisas para sair do escritório.


[...]


— Tchau, meninas! — eu disse para as recepcionistas, que abriram um largo sorriso e acenaram exageradamente para mim. Acho que alguma delas é apaixonada por mim. Será que elas sabem que eu sou gay?


Comecei a andar para a cafeteria de modo automático, até parar onde o cheiro de café invadiu minhas narinas e pensar o que eu estava fazendo. Eu devia estar procurando um táxi para ir para a casa, por que eu estava indo para a cafeteria?


Enfim.


Entrei no estabelecimento e Johnny estava lá, sozinho dessa vez, mexendo no cordão do avental e olhando para mim quando o sininho da porta tocou.


— Jaehyun! Você com certeza é o cliente que mais vem aqui. O que vai querer?


— Um cappuccino médio…


— Só?


— Sim.


— Vai ser pra levar ou beber aqui?


— Beber aqui.


— Certo, me dá uns dez minutinhos que já levo ele pra você.


Me sentei em uma mesa perto da janela, estranhando o fato de Johnny não ter me dado a maquininha para pagar, mas tudo bem. Eu pagava depois de beber. Encarei os prédios altos de Seul e nem vi o tempo passar, logo a bandeja já estava na minha mesa.


Assim que a olhei, esperava ver um cappuccino normal e nada de corações, mas fui surpreendido pelo contrário. Uma pilha de corações cortados estava posicionada no meio da bandeja e meu café no canto, com um coração de creme desenhado. Em cima da pilha, um único coração estava com algo escrito recentemente de caneta preta, já que a tinha ainda estava molhada.


“love is in the air”


Bufei alto e desmontei a pilha, espalhando os corações pela bandeja e pela mesa, pegando o café e bebendo quase metade em um único gole. De longe, junto com a música pop melosa e romântica, consegui ouvir uma pequena discussão vinda da cozinha.


“Johnny, vou te bater por me fazer cortar tanto coração! Meus dedos já estão com calo, caralho!”


“Calma, Jungwoo, é por um bom motivo, te juro.”


Ignorei e comecei a rasgar os corações. 


E acabei caindo no sono.


[...]


— Jaehyun? — era a voz de Johnny, e ele me cutucava e balançava. Acabei despertando no susto, já que acabei não vendo o tempo passar (já que estava dormindo) e já estava de noite. A bandeja já não estava mais na minha frente e as cadeiras estavam em cima das mesas. — Vou fechar, preciso que você saia.


— O quê? Que horas são?


— Quase onze, hora da cafeteria fechar. Preciso que você saia se não quiser ficar trancado aí dentro.


Então me apressei. Ajeitei o terno e saí para fora da cafeteria. Um vento gelado e gotas de chuva me pegaram de surpresa, me fazendo voltar para debaixo de um teto. Ótimo. E eu ainda tinha que achar um táxi.


— Merda — sussurrei.


— O que foi? — e Johnny ouviu.


— Não tenho carro, tá frio e chovendo, e eu tenho certeza que nenhum táxi vai me pegar essa hora da noite.


— Posso te levar pra casa, se quiser. Eu tô de carro.


Não consegui responder, porque meu corpo todo tremia de frio. Ouvi um riso anasalado e um casaco pesou contra meus ombros.


— Bom, mesmo se não quiser a carona, aceita o casaco. Tá muito frio pra você ficar com pouca roupa agora.


Olhei para Johnny e o vi com uma jaqueta só. 


— Ah, sim, eu não passo frio, mas você passa!? Nem pensar, pega esse casaco de novo.


— Tenho outro no meu carro. Quer carona, sim ou não?


Que outra opção eu tinha? Ir embora a pé e ficar resfriado?


De jeito algum.


Balancei a cabeça e Johnny me guiou para seu carro, estacionado na frente da cafeteria. Eu entrei do lado do passageiro e ele deu a volta e entrou no banco do motorista, não demorando para iniciar o carro e sair dali. Dei meu endereço para ele e me ajeitei no banco.


— Obrigado. 


— Não precisa me agradecer.


Um silêncio se instalou entre a gente até eu, idiota como sempre, resolver quebrá-lo.


— Queria reclamar dos corações. Já disse que não gosto.


— Mas nunca me pediu pra parar.


É verdade.


— Por que você gosta tanto do Dia dos Namorados?


Johnny suspirou, passando os dedos pelos fios loiros e coçando a sobrancelha.


— Porque sempre foi uma data importante pra mim. Desde pequeno, eu sempre gostei de livros, filmes e séries de romance, eu sempre achei tão mágico. Era tudo tão lindo, e no Dia dos Namorados ficava mais lindo ainda. Os lugares todos decorados com corações e ursinhos gigantes… Eu adorava. Passei os Dias dos Namorados mais felizes com meus últimos relacionamentos, mas eles infelizmente acabaram e eu passei ele sozinho nos últimos cinco anos. Mas tá tudo bem, desde que outros casais estejam felizes, eu tô feliz também.


Eu quis rir. Nunca ouvi tanta besteira e agora eu realmente quero que ele pare com os corações. Mas eu não verbalizei aquilo.


— É besteira. É tudo feito pra vender e pras pessoas fingirem que se importam.


Silêncio.


— Ouvir você dizer isso me machuca, Jaehyun.


— Mas é a verdade. Odeio o amor e todas as suas datas comemorativas.


— Posso te fazer mudar de ideia, se quiser… 


O mindinho dele tocou minha coxa e todos os pelos do meu corpo se arrepiaram. Engoli em seco e respirei fundo, o que Johnny percebeu e logo se afastou de mim. Não gostei.


— Desculpa — ele murmurou. 


O resto da viagem foi em total silêncio, até ele parar na frente do meu prédio, eu entregar de volta seu casaco e sair do carro.


— Obrigado pela carona.


Naquela noite, fui dormir com todos os meus argumentos contra o amor falhando aos poucos.


[...]


Fui para a cafeteria todos os dias desde então, como faria normalmente. Hoje é sábado, dia onze, e meu livro será lançado amanhã, por incrível que pareça.


Todos os dias que eu fui na cafeteria, meu café veio com um coração e a pilha de papel cortado naquele formato crescia a cada dia, até que ontem, na sexta, eu me estressei. Acabei pegando um dos corações de papel, tirando uma caneta do bolso e escrevendo nele:


“vai se foder você e toda essa merda.”


Okay, sei que fui muito grosso, mas o sentimento de arrependimento estava batendo na minha porta, porém, não tinha entrado por completo ainda.


Acordei cedo demais para um sábado, dia que eu não trabalho. Levantei da cama e fiz o que estava na minha rotina matinal: trocar de roupa — dessa vez para uma confortável, suéter e calça jeans, sem ternos e gravatas apertadas —, ir ao banheiro e escovar os dentes. Mas nada de café.


Iria para a cafeteria de novo receber um cappuccino com coração e outra pilha de corações picados.


Peguei um táxi e cheguei na frente da cafeteria mais uma vez naquela semana. O cheiro já familiar de café estava forte naquela manhã. A cafeteria estava com algumas pessoas, mas não muito cheia. Entrei e o sininho fez barulho. Johnny, que estava no caixa mexendo em sua pulseira da bandeira bi, olhou para mim quando o sino tocou. Estava pronto para fazer o mesmo pedido com ele de novo, mas, para a minha surpresa, ele saiu do caixa.


— Chitta, atende ele, por favor — e foi para a cozinha.


O quê? Como assim nada de Johnny me atendendo?


Não entendi, mas talvez ele tivesse ido preparar os quinhentos corações que iria me mandar hoje.


— Oiê — o moço de cabelos castanhos me disse quando parou na frente do caixa. — Bem-vindo, já conhece a cafeteria?


— Já, sim…


— Então, qual vai ser o pedido?


— Um cappuccino médio e um donut. Qualquer sabor — falar o pedido depois de três ou quatro dias era muito estranho, já que estava acostumado a falar apenas “o de sempre” para Johnny. 


— Certo. Você vai comer aqui ou quer que eu embale?


— Vou comer aqui.


— Beleza. Certinho! Qual vai ser a forma de pagamento?


— Débito…


O tal do Chitta me deu a maquininha, eu paguei e recebi minha nota fiscal. Procurei uma mesa e me sentei ali. A música que tocava hoje nem era tão ruim assim. 


Não demorou muito para meu pedido ficar pronto e alguém — que não era a cabeleira loira de Johnny — deixar uma bandeja na minha mesa.


Bandeja essa sem coração nenhum.


O pratinho era branco, normal, redondo e chato.


E o cappuccino normal.


O que aconteceu? Que porcaria é essa?


Resolvi só comer e beber meu café e esperar Johnny aparecer na frente do balcão para largar as gorjetas em cima da mesa e andar rápido até ficar de frente para ele, com apenas o balcão nos separando.


— O que aconteceu?


— Hm?


Porra, Johnny. Cadê meus corações? O coração no café?


— Não tem. Sei lá, sai procurar. Aproveita e procura o seu junto, já que aparentemente você não tem.


Me senti ofendido.


— O que que…


— Sabe, Jaehyun, todo o seu papo de que amor só serve pra vender e que é tudo uma farsa e blá, blá, blá, realmente me deixou pra baixo. Não é tão difícil perceber que realmente existem pessoas que amam as outras, tá? O amor é… É algo incrível. É tão lindo e mágico, e eu queria que você pudesse enxergar dessa maneira. Mas não, né. O amor só serve pra vender, e ele é mais do que presentes. Amor são gestos, por mais pequenos que sejam. É preocupação, é carinho, é confiança. 


— Johnny, eu… 


— Mas enfim, o cliente tá certo, né? O amor só serve pra vender mesmo. 


Quando ele estava prestes a se virar para arrumar as xícaras limpas, eu segurei seu avental e o puxei perto demais, encostando seus lábios nos meus. O encaixe antes era meio estranho, mas ficou perfeito logo depois. Seus lábios macios dançavam junto dos meus em um ritmo único.


Acabamos nos separando por falta de ar e eu o encarei.


— Eu estava errado. 


— É claro que estava — ele ri e eu ri junto. — Talvez o amor não seja tão ruim assim. Você só tem que se permitir descobrir, Jae. 


— Talvez eu ame algo. Ou alguém.


Ele riu. Ele é muito fofo, sério.


— Isso é bom.


— Sim.


Ficamos em silêncio por pouco tempo, apenas eu e ele no nosso mundinho particular, até eu lançar o convite:


— Quer ir na estreia do meu livro amanhã?


— Já tá me chamando pra sair? Que rápido.


Revirei os olhos e sorri.


— Bocó. 





Notas Finais


eu queria agradecer o @reizinhojisung por me ajudar a plotar esse plot obg por thdo reizinho e feliz dia dos namorados pra quem namora ne (nao eh o meu caso)

bjaoo


Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...