A reunião terminou e a maior parte dos moradores já deixavam o auditório, embora algumas vozes ainda fossem ouvidas em conversas paralelas no espaço quase vazio do amplo salão.
Distraída, Emma guardava alguns documentos relacionados a obra do shopping em sua pasta, quando sentiu alguém chegando mais perto.
— Tive a impressão que você ficou bem satisfeita com o sucesso dessa reunião. — Gaston comentou se aproximando.
A prefeita virou o rosto para fitá-lo.
O alpha sorria de um jeito animado, exibindo todos os dentes enquanto encarava Emma com os olhos azuis brilhantes e cheios de expectativas.
— Claro, como não ficaria? Esse é um momento muito importante para mim. Muitas das pessoas que hoje estiveram aqui, precisam de emprego, de renda, e é bom trazer esperança para elas. Um novo empreendimento na cidade significa justamente oferecer a essas pessoas uma oportunidade de uma vida melhor — Emma respondeu como a política que era, desviando o olhar de novo para os papéis que segurava na mão.
O alpha mordeu sutilmente o lábio, sugerindo em seguida: — Então, acho que deveríamos comemorar o sucesso da reunião com um jantar hoje à noite no Palácio da Tiana… ou na sua mansão. O que me diz?
Emma sorriu de maneira desinteressada e guardou os últimos papéis na pasta, voltando a encara-lo.
— Já tenho compromisso para hoje à noite — a ômega dispensou o convite, mostrando também um falso ar de lamento.
— Sério? — ele cruzou os braços, franzindo o cenho — Não me diga que está namorando? Bem que senti um cheiro… — torceu o nariz — esquisito em você.
As entrelinhas na fala do homem não foram despercebidas por Emma. Ele parecia com dificuldades em acreditar que ela estivesse seriamente envolvida com outra pessoa. Para alphas como Gaston, deveria ser realmente surpreendente que alguém fosse capaz de enxergar nela um ser humano, e não somente uma ômega para foder.
— Sim, eu estou namorando — falou pausadamente todas as palavras, e não mentiu, pois apesar de nem Regina nem ela terem rotulado ainda o relacionamento que tinham, indubitavelmente Emma já pensava na alpha como sua namorada, principalmente depois do último fim de semana.
O homem entreabriu a boca, mas seguiu calado.
Com a cabeça erguida, Emma se aproximou e decidiu ser mais incisiva:
— Sendo bem honesta, mesmo que eu não estivesse namorando, não aceitaria seu convite — fez uma pausa, percebendo como o semblante dele murchava — Porque além de ter uma conversa desinteressante, você deixa a desejar em outros aspectos também.
De maneira altiva, ela o rodeou, passando de lado para sair logo de perto daquele idiota ruim de cama. Com passadas firmes, seguiu na direção da porta atrás do pequeno palco do auditório.
Quase no mesmo instante que desceu e contornou a estrutura, levou a mão livre ao peito, assustando-se com a presença inesperada de outra pessoa ali.
— Pensei que você já tinha ido — comentou, sorrindo para a alpha. Haviam feromônios irritados ainda pairando no ar e Emma os farejou. — Está tudo bem? — preocupou-se enquanto se aproximava mais.
Regina relaxou de uma vez, também inalando os feromônios tranquilizadores que a ômega começou a lançar no ar, instintivamente agindo para acalmar sua alpha.
Logo quando a reunião acabou, Regina foi para a parte de trás do palco esperar Emma, deduzindo que a ômega passaria por ali, pois era caminho para o gabinete. Do lugar onde estava esperando, deu para ouvir o tal Gaston puxar conversa com Emma, e a alpha não conseguiu se afastar. Já contrariada, escutou quando o idiota convidou a ômega para um jantar e sua alpha interior só amansou, quase ganindo de felicidade, no momento em que Emma o rejeitou.
— Agora está — a dona do bar sorriu mansamente — Achei melhor te esperar aqui, porque preciso conversar com você. — abriu a porta, pedindo — Mas é melhor que seja no seu gabinete.
Com o rosto franzido de preocupação, Emma acenou com a cabeça e passou pela porta que Regina segurava aberta. Elas seguiram pelo corredor e cruzaram a recepção, onde cumprimentaram brevemente Gideon, que acenou em resposta enquanto atendia uma ligação.
Entraram no gabinete e Regina fechou a porta, observando Emma deixar a pasta na mesa e tirar o sobretudo, colocando no assento da poltrona.
A ômega andou novamente para perto da alpha, passando as mãos na saia do vestido, alisando invisíveis amassados, embora isso fosse apenas um traço de ansiedade.
— E então, o que quer conversar comigo? — a ômega sorriu nervosamente. “Será que Regina veio dizer que não a queria mais? Que estava cansada dela?”
Identificando o cheiro ansioso da ômega, Regina tirou o envelope do bolso e o estendeu, dizendo:
— Sexta passada, encontrei essa carta anônima no bar — a alpha começou — Desde então, estou bem preocupada com a sua segurança.
Com a expressão agora confusa, Emma olhou do rosto para a mão de Regina, puxando vagarosamente o envelope dos dedos da outra, antes de abri-lo e tirar a carta de dentro.
A alpha ficou em silêncio e com o olhar fixo no semblante de Emma, assistindo as mudanças de expressão da loira enquanto ela lia o conteúdo da carta.
O tempo pareceu se arrastar e quando os olhos verdes se ergueram, magoados e úmidos, para encarar a alpha, Regina se movimentou rápido e pegou Emma protetoramente nos braços, murmurando palavras carinhosas.
— Sinto muito por você ter que ler essas coisas horríveis — Regina engoliu em seco, odiando cada vez mais o autor daquela carta doentia — Mas eu pensei que talvez você pudesse me ajudar a descobrir quem escreveu, porque tenho muitas suspeitas mas não posso sair por aí espancando qualquer um apenas por ser um suspeito — riu meio angustiada, à medida que Emma seguia num silêncio profundo. — Olhe para mim — Regina pediu, afastando-se um pouco para segurar o rosto da ômega entre as mãos, sentindo um aperto no peito ao encontrar sofrimento naqueles olhos lindos — Não me importo com o que está escrito nesta folha, Emma. Você é especial demais para mim e estou quase enlouquecendo com a possibilidade de você estar em perigo, por isso temos que descobrir quem é o covarde por trás desta carta. — repetiu de maneira gentil, mas firme.
Emma acenou com a cabeça, ainda fragilizada pela dureza e crueldade das palavras escritas anonimamente. Regina tinha razão em estar preocupada. Quem escreveu aquela carta parecia sentir muito rancor por ela.
Emma fechou os olhos e algumas lágrimas caíram sem que conseguisse impedir. Comovida, Regina encostou a testa na da prefeita, deixando que ela levasse o tempo que era preciso para se recompor.
Passaram-se alguns minutos e a ômega voltou a abrir os olhos com a expressão ainda meio entristecida, mas ao mesmo tempo segura.
— Você disse que tem algumas suspeitas — a ômega falou, afastando o rosto do de Regina para encara-la e permanecendo nos braços da alpha — Mas existe alguém de quem desconfie mais? — quis saber, curiosa.
Regina respirou fundo, considerando em silêncio todas as pessoas que estavam em sua lista de suspeitos.
— Talvez — respondeu, quando um nome se destacou no meio dos outros — Você sabe que desde que cheguei aqui, já ouvi muito sobre os seus supostos casos — mostrou uma expressão sem graça, mas Emma apenas assentiu, sorrindo de leve — E algumas pessoas insinuaram que você se relacionou com alguém que não foi mencionado nesta carta. Isso chamou minha atenção — afirmou.
— Quem?
— O professor August.
Emma sacudiu a cabeça, antes de falar: — Não, acho que deveria descarta-lo da lista.
Franzindo o cenho, Regina questionou: — Por quê?
— Conheço August desde a infância… Fomos melhores amigos até eu começar a namorar com Neal.
— E isso não faz dele ainda mais suspeito? — Regina não estava entendendo — Além do mais, tenho a impressão que esse covarde, mesmo que de uma forma bem distorcida, está apaixonado por você e me mandou essa carta como uma artimanha, querendo que eu me afastasse e deixasse o caminho livre para ele…
— Sim, você pode estar certa quanto a isso. A pessoa que te enviou essa carta parece ter alguma coisa mal resolvida comigo, embora eu não faça ideia de quem seja — a ômega se afastou, passando a mão pelos cabelos e andando a esmo pelo gabinete — Mas realmente sinto que não foi o August — sussurrou, virando-se para olhar Regina de novo. A alpha estava de braços cruzados e também tinha se virado para seguir a ômega com o olhar — August se afastou quando comecei a namorar, porque secretamente estava apaixonado por Neal, não por mim. — Emma revelou subitamente — Ele é gay, Regina. Me confidenciou isso aos prantos quando ainda éramos adolescentes, no dia que fui confronta-lo, tentando entender o motivo dele estar me evitando. August me fez jurar que eu jamais contaria isso para ninguém, nem me afastaria do Neal, pois não tinha coragem de se assumir por causa do pai.
Surpresa, Regina murmurou: — Está me dizendo que até hoje ele mantém a sexualidade em segredo?
— Sim.
— Mas, por quê? — Regina não acreditava no que acabara de ouvir — August é um homem adulto, independente… Por que nunca teve coragem de se assumir? Ele não deve ser o único gay nesta cidade. Zelena e Ruby estão acasaladas há anos, você e eu… — deixou no ar o que ia dizer e Emma olhou-a compreensivamente.
— Eu sei — a ômega sorriu — Mas se existem outros homens gays ou bissexuais nesta cidade, eles também estão vivendo discretamente, da mesma maneira que o August. Pode parecer inexplicável, mas acredito que ele ainda tem muito medo de decepcionar o pai. Marco o criou sozinho, porque a mãe de August morreu no parto. Então, imagino que ele deve ficar paralisado quando pensa que, se contar tudo para o Marco, vai desapontar a pessoa que mais ama. — Emma refletiu — Eu o entendo, pois sei que não é fácil ser diferente.
Com um sorriso doce, Regina se aproximou, pegando a ômega pela cintura para beija-la com uma paixão desmedida. Mesmo surpresa, Emma devolveu o beijo, encantada pela impetuosidade de sua alpha.
Quando o contato cessou, elas permaneceram com os corpos colados.
— Mas se não foi o August, quem mais poderia ter escrito essa carta? — Regina prosseguiu.
Emma ficou calada e por um tempo pensativa.
— Além de você, apenas Stella sabe sobre Alex. Mas do jeito que ela ficou ressentida comigo, não duvido que tenha contado a respeito dele para mais pessoas. — Emma ponderou.
Regina balançou a cabeça.
— Então, talvez eu devesse ter uma conversinha com sua ex. — a alpha afirmou num tom sério.
— Não — Emma protestou — Stella certamente já sabe que estamos juntas e…
Regina mostrou um ar convencido: — Sim, isso não deve ser mais segredo para ninguém, principalmente depois que eu te amarrei tantas vezes. Até o almofadinha do LeGume sentiu meu cheiro em você, não foi? — Arrastou o nariz na pele da outra, aspirando profundamente.
Emma revirou os olhos para as coisas alphas de Regina.
— Como eu estava dizendo… Duvido muito que ela colabore com a gente e admita que espalhou minha história com o Alex por aí.
— Eu poderia fazer ela colaborar — Regina insistiu.
— Não quero que vocês briguem — Emma retrucou com firmeza e olhou para a carta que ainda segurava em uma mão, não dando importância aos resmungos contrariados da alpha. — Tenho a impressão que conheço essa caligrafia. — comentou, deixando Regina atenta.
— Mesmo ele tendo escrito em letra de forma? — a dona do bar mencionou.
— Sim, porque o formato do T é diferente… Quando escrevemos com letra de forma, fazemos o T com um traço reto em cima e em baixo. Mas ele faz curvas nas linhas, deixando parecido com o T cursivo.
Regina olhou para a carta.
— É verdade — concordou, sorrindo para Emma.
A ômega se afastou de novo, coçando a cabeça.
— Mas isso ainda é muito pouco — sentou-se na poltrona desanimada, deixando a folha na mesa.
A alpha se aproximou e se agachou, ficando quase de joelhos na frente da ômega e segurando as mãos dela nas suas.
— Não, pode ser uma pista importante. — falou num tom esperançoso — Além disso, estou me sentindo mais segura agora que você já sabe. Juntando sua inteligência com o meu ímpeto crescente de esmurrar muito a cara de quem estiver por trás disso, acredito que logo descobriremos a identidade desse imbecil. — afirmou, trazendo um sorriso mais suave para o semblante preocupado de Emma.
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