História Where You Are. Taekook, Vkook. - Capítulo 50

Eu estava petrificado.

Coração acelerado.

As sobrancelhas juntas.

Os lábios entreabertos.

Eu sinceramente não acreditava que Jungkook tinha sido tão franco comigo, sido tão aberto.

Porque eu tentei levar o assunto bem pra longe.

Pra longe das minhas mãos.

Longe o suficiente pra ele não me alcançar.

Mas ele me alcançou.

Jungkook o trouxe de volta.

Mesmo percebendo que eu estava tentando ignorar aquele papo, ele foi corajoso e o puxou novamente.

Mas eu não achava que ele ia me dizer que gostava de mim.

Que pensava em mim.

Que estava apaixonado.

Que me olhava de uma maneira.

Através da lente de um homem apaixonado.

Por mim.

Suspirei, deixando o copo de milkshake na mesa antes de encarar seu rosto novamente, encarando as lágrimas que estavam se secando em seu rosto.

Suspirei outra vez.

Não era um assunto fácil.

Eu ainda tinha um pé atrás com ele.

Deixar o passado no passado não acontecia num passe de mágica.

— é complicado. — murmuro, tornando a fita-lo, mesmo que fosse complicado no momento. Eu queria, no entanto, mostrar a firmeza que sempre mostrei a Jeon. — é complicado falar isso. Eu te detestei por muito tempo. Detesto o que você já fez comigo. Detesto os sentimentos ruins que você já causou dentro de mim. Detesto quando você tocava nos assuntos que mais me machucavam porque sabia que sangravam. Eu confesso que achei que nunca ia me livrar dessas dores, confesso que por você achei que ia sentir apenas empatia após o acidente, mas eu vou estar mentindo se não disser que as coisas mudaram.

— mudaram?

Pergunta, esfregando suas mãos em seus olhos, secando os últimos resquícios de lágrima.

— mudaram. Eu comecei a te ver como alguém sensível. Como alguém que se preocupa. Com alguém que elogia pra ganhar um sorriso. Alguém que chora fácil. Alguém que quer sentir, que quer sentir afeto por alguém, seja amizade ou não, e quer que sintam por você. Não como algo tóxico, como se fosse dever da pessoa, mas, sim, porque você quer cativa-la e ser cativado. Não vou passar pano pro que você me fez, porque eu não sou assim, você sabe muito bem, mas posso dizer que o sentimento ruim que eu tive por você foi substituído por uma paixão também. Eu queŕia fingir que isso não aconteceu. Queria ter permanecido afastado, mentindo, mas eu sempre fui muito sincero e guardar esse segredo me deixava agoniado. Acontece que eu tive e tenho medo de que tudo aquilo volte. Você sabe muito bem o que aconteceu. A gente brigava, a gente se detestava de verdade, sem farsas ou romantização como os livros de romance costumam fazer, e eu tenho medo de que em qualquer briga aquilo volte, aquela hostilidade.

Jungkook piscou rapidamente, olhando para a mesa. As sobrancelhas juntas, cenho franzido, o rosto pensativo.

Ele parecia não saber o que falar. O que dizer.

— eu não posso prometer que ao ficar ao meu lado como um casal vai te livrar da minha hostilidade. Eu sou hostil quando me sinto ameaçado. Vamos brigar por isso e por muitas outras coisas, mas acho que isso é normal em qualquer relacionamento, seja familiar, de amizade ou romântico. Eu não quero brigar como antes, não quero te machucar, não quero me machucar, portanto, sim, vamos brigar, mas pode ter certeza que nada vai ser como antes, nenhum detalhe, nem um fio de cabelo.

— vai ficar calvo?

Eu perguntei, vendo a cara de tédio de Jungkook, que foi o suficiente pra me fazer rir.

Me ajeitei na cadeira, deixando a mão sobre minha barriga, a massageando levemente enquanto olhava para a vamisa marrom.

— eu espero que dê certo, seja lá o que fomos ser e tentar ser. Eu só quero que todo aquele passado cruel, negativo e real não venha mais a tona. Se nos perdoamos sob todas aquelas circunstâncias, eu não quero que o que rolou venha quando a gente brigar. Não quero que joguemos na cara um do outro o que já fizemos ou deixamos de fazer. Não que estaremos passando um pano naquilo tudo, mas já que escolhemos ficar juntos precisamos falar do agora e do que faremos daqui pra frente, e não do que- Jungkook, para de chorar...

Eu ri, juntando as sobrancelhas, mexido também. Mexido com aquilo porque Jungkook não estava se controlando pra não chorar, pra fingir que não estava, pra evitar.

Ele estava mostrando o que ele era.

Estava sendo honesto.

E, sim, aquilo estava mexendo comigo, que era tão durão e não chorava facilmente.

— tá tudo bem, ok? — eu assegurei, passando a mão por seu ombro, tentando acalma-lo.

— é quê... é que eu realmente não achava que você gostava de mim. Isso nunca passou pela minha cabeça e eu sou uma pessoa que não tem muita expectativa do futuro, não tem nada positivo, e eu me senti tão mal quando percebi que gostava de você, porque na minha cabeça nem você nem minha ia se interessar por uma pessoa tão incompleta como eu, tanto emocional quanto fisicamente falando. Eu olhava para as minhas pernas amputadas, e eu sabia que eu não era um homem completo. Na minha cabeça eu lembrava a fala da minha psicóloga dizendo que nosso físico não é nada, é apenas nossa carcaça e o que importa é o que está dentro dela e o que isso transmite, mas eu ainda estava e estou inseguro sobre essa nova realidade, sobre o que te fiz e... — ele respirou fundo, limpando mais uma lágrima que havia escorrido de seu olho. — eu fiquei com medo também porque eu não estou bem ainda, Taehyung. Eu nunca estive. Eu sempre desejei a morte. Pra mim, era o único remédio. Eu ainda não tive a cura. Eu ainda choro sem motivo aparente, eu ainda não tenho apetite, às vezes eu só quero ficar na cama pelo resto do dia, não me vejo no futuro, como se eu não fosse existir. Eu ainda preciso dos meus remédios pra me sentir bem, mas eu não estou bem. Eu estou doente. Sei muito disso. Lembro muito bem das noites que eu ficava me olhando no espelho e vendo sangue escorrer dos meus pulsos, das minhas pernas, do meu rosto, das mãos, porque eu sentia que eu merecia. Eu fiquei com medo de me apaixonar por você porque eu sou um cara completamente quebrado por dentro e tive medo de não poder te dar o amor e compreensão que você precisa, mas quando isso rolou justamente por sofrer por tudo isso eu senti que deveria te apoiar desde uma unha quebrada até a perda de uma pessoa querida, do extremo ao básico, porque eu sei o quanto importante é. Como eu disse, não estou bem, a vida ainda me é um peso nas costas, e ela dói e sangra, mas com você, com os amigos que estou fazendo, com meu filho, com a esperança de eu poder andar normalmente, me faz melhor. Queria que soubesse disso antes de entrar na minha vida como meu companheiro, meu namorado. Queria que soubesse que vai ter dias que eu não vou querer nem sair da cama e da minha boca não vai sair um mínimo sorriso, mas da mesma forma ao seu lado a minha vida fica muito melhor porque- não, não chora. Agora é você que tá chorando!

Ele riu, deitando minha cabeça em seu pescoço, começando a afagar minhas costas.

Deus.

Onde esse menino aprendeu a falar tão profundamente?

Aquilo doía.

Saber que ele estava naquele poço sem fundo que mal tinha saída.

Então, sim, imagina-lo com aquele tamanho de dor me doía também, mas o fato de eu ajuda-lo me deixava mais feliz.

— eu... — funguei, abraçando seu pescoço com força, inspirando seu perfume bom. — eu sei que você não tá bem. Eu sei disso há muito tempo, mas eu não ligo, quero estar com você e com todos esses traumas e demônios interiores que você tem. Se você me deixar ajudar, a gente consegue resolver tudo isso juntos, mesmo que demore um bom tempo. E não, eu não me importo com nada físico, Jungkook.  Não ligo se suas pernas são de carne ou ferro. Eu te acho lindo de todos os jeitos.   

Ele riu contra minha testa, me dando um beijo leve.          

— eu deixo você me ajudar, sim. — responde, dando um beijo estalado em meus cabelos cacheados, me fazendo suspirar. — eu deixo com muito prazer. Não vou te afastar, não quero isso. Não vou afastar nenhum dos seus amigos que você me apresentou, não vou afastar Jin também, porque eu me sinto bem com eles. Prometo que não vou.

Jurou, me dando mais alguns beijos nas madeixas, carinhoso.

E eu gostava desse seu lado.

Eu não precisava falar mais nada.

Nem ele.

Nem fizemos um pedido formal de namoro.

Mas por hora estava bom.

Ouvir da sua boca tudo aquilo tinha me feito bem.

Tinha o feito bem.

Era o mais importante.

E agora eu só queria continuar com o rosto deitado em seu pescoço, sentindo seu aroma amadeirado enquanto sentia o carinho em minhas costas.

Era tudo que eu precisava.