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História Wicked Souls - Fogo e enxofre


Escrita por: Chrissy_RDC03

Notas do Autor


Boa leitura!

Capítulo 4 - Fogo e enxofre


Fanfic / Fanfiction Wicked Souls - Fogo e enxofre

"Mas, quanto aos tímidos, e aos incrédulos, e aos abomináveis, e aos homicidas, e aos que se prostituem, e aos feiticeiros, e aos idólatras e a todos os mentirosos, a sua parte será no lago que arde com fogo e enxofre; o que é a segunda morte."

(Apocalipse 21:8)

*Zayn*

Assim que passei rapidamente pelo portão da cerca do clube, eu já esperava que aquele lugar estivesse em pleno caos. Grande parte dos membros estavam no pátio, do lado de fora dos apartamentos e da Boca del Diablo, apesar de eu saber que a outra parte não dava a mínima e provavelmente estava enchendo a cara enquanto tinha as mãos em cima de alguma garota qualquer. Percorri os últimos cinco minutos debaixo de uma nevasca que só parecia piorar com o passar do tempo e estava realmente começando a ficar preocupado pra cacete se estivesse carregando um cadáver em meus braços agora mesmo. Mal estacionei a moto, saindo de cima dela enquanto apertava a garota com força contra o meu peito, tentando protege-la da neve. Enquanto andava rapidamente rumo ao meu apartamento, Harry me abordou, assim como outros membros do clube. Podia ouvi-los sussurrando suas teorias.

— Para onde você está levando ela?! Que porra é essa, Zayn?! O que deu em você?! — Styles gritava por conta do barulho do vento forte que parecia silenciar qualquer som, mas não o suficiente para impedir que todos se aproximassem, curiosos para ouvirem as respostas das perguntas dele. Eu apontei com a cabeça para o meu apartamento privado em cima da garagem, determinado a chegar lá o mais rápido possível, mas de repente, Lori surgiu na minha frente, com os braços cruzados e uma expressão incrédula no rosto.

O seu apartamento?! — Quando eu desviei dela, a ignorando como se fosse um simples obstáculo, ela começou a acompanhar os meus passos rápidos ao meu lado, tentando chamar minha atenção. — Está levando a desconhecida para o seu quarto?! Ninguém vai lá, só você! Você mesmo disse isso!

Parando de repente, com a mandíbula trincada, olhei para ela com os meus olhos semicerrados.

— Eu não lhe devo satisfação alguma da minha vida, Lorraine. Eu levo quem eu quiser para a porra do meu apartamento porque ele é meu.

— E ela está usando a sua jaqueta?! Você não pode estar falando sério! — Ela grunhiu, indignada, antes de ver a minha expressão irritada e afastar-se rapidamente de volta para o bar.

Harry me ladeou enquanto eu corria pelas escadas e chutava a porta do meu quarto, que se abriu com um baque. Colocando a garota na minha cama, eu me inclinei e empurrei para trás a moita de cabelo de seu rosto. Lama e sangue instantaneamente mancharam os meus lençóis.

— Malik, você precisa começar a explicar o que está acontecendo! Eu não consigo acreditar que no meio desse buraco de merda que a nossa situação se encontra agora, você está se distraindo pela droga de uma boceta!

— Não agora, porra! Chame a Savannah! Ou o Jayden! Tanto faz! — Eu examinei o ferimento que parecia ser o mais grave na lateral da barriga dela e que parecia nunca parar de sangrar.

— Ela está sangrando tanto que parece que tomou um tiro! — Harry resmungou e de repente eu congelei, endireitando a minha postura.

— Porra, Styles, vá chamar a Savannah!

— Ela foi baleada mesmo?! Eu não...

— Agora, Harry! — Exclamei, sentindo que toda a paciência que eu sequer tinha já havia se esgotado há um bom tempo.

Não demorou muito para que Savannah e Jayden chegassem ali. Ela era um pouco mais velha que eu, apesar da baixa estatura. Tinha longos cabelos castanhos claros, olhos grandes e um rosto rechonchudo que podia enganar qualquer um, mas se você olhasse para ela de canto, eu jurava que ela podia rosnar como um cão feroz. Ela estava fazendo a sua residência médica em um hospital quando conheceu Tank, que havia feito uma manobra de alto risco em sua moto (a qual eu disse para ele não fazer, deixando claro) e acabou quebrando a perna. Foi então que ela percebeu que aquilo não era o que ela queria, e então Tank tornou-a a sua Old Lady. Agora que estava aqui, eu precisava admitir que era uma enorme quebra-galho para o clube. Mas ninguém sabia muito sobre o passado de Jayden. Ele era muito discreto, mas cada um ali tinha um tipo de segredo que guardava à sete chaves e isso não era da porra da conta de ninguém, mas eu sabia que ele também entendia de primeiros socorros ou algo assim.

— Onde ela está? — Ouvi Savannah perguntando antes de entrar pelo batente da porta. Fez um rápido aceno com a cabeça para mim e então se aproximou da cama com toda a prepotência que uma garota de um e cinquenta de altura poderia ter. Ela começou a examinar a garota enquanto eu observava. Em toda a minha vida, eu só cheguei a ficar tão desesperado em uma única situação a ponto de rezar e jurei a mim mesmo que nunca mais faria algo assim quando não adiantou de nada. Mas lá estava eu novamente, apelando para o cara de barba branca em um trono lá em cima. Eu confesso que não estava em bons termos com ele e não poderia julga-lo se simplesmente optasse por me ignorar mais uma vez. Eu não merecia a sua misericórdia, mas aquela garota ali? Eu tinha certeza que ela merecia, e era por isso que eu supliquei para que ela saísse viva dessa. Ela tinha que sobreviver. Isso eu sabia. A verdade era que eu precisava saber se era ela ou não. Precisava acabar com aquela droga de capítulo confuso da minha vida e tirar Evangeline de uma vez por todas da minha cabeça. Mesmo rezando pela sua vida, eu também prometi a mim mesmo que sendo ela ou não, assim que ela melhorasse, ela cairia fora dali. Harry estava certo. Eu realmente não precisava de mais problemas, e acredite, garotas aqui tendem a causa-los diversas vezes.

— Que merda é essa? — Eu apontei para o punho dela quando Jayden arregaçou uma das suas mangas para checar o seu pulso. Ele franziu as sobrancelhas enquanto lia. — É uma tatuagem?

— Apocalipse 21:8. — Savannah fez uma careta ao ler aquilo. — É a porra de uma passagem bíblica. O que isso significa?

Mas, quanto aos tímidos, e aos incrédulos, e aos abomináveis, e aos homicidas, e aos que se prostituem, e aos feiticeiros, e aos idólatras e a todos os mentirosos, a sua parte será no lago que arde com fogo e enxofre; o que é a segunda morte. — Savannah, Harry e eu congelamos quando Jayden começou a jorrar alguma coisa Bíblica como um pregador, sequer parando uma única fez para recuperar o fôlego ou resgatar algo da memória. Era algo que ele claramente havia decorado. Ao nos ver encarando, ele limpou a garganta, ficando um pouco vermelho e desconfortável, com os olhos castanhos correndo entre nós e o chão. — É a escritura sobre os pecadores que vão para o inferno. — Ele deu de ombros e logo colocou-se de volta ao trabalho. Styles me deu uma cotovelada em minhas costelas e ergueu as sobrancelhas em questão, parecendo confuso e em alerta. Eu dei de ombros. O que quer que um irmão acreditava em privado era seu negócio. Eu não tinha nada a ver com aquilo.

De qualquer forma, se realmente funcionasse assim, a minha parte (e da maioria dos membros desse clube, devo dizer) definitivamente seria no meio do fogo e do enxofre.

Savannah tocou o ferimento mais grave na barriga dela, o analisando com cuidado enquanto Jayden se encarregava de esterilizar e cuidar dos cortes mais superficiais.

— Não parece bom, Malik. Ela claramente perdeu muito sangue e o pulso está fraco. Ela vai precisar de sangue. Eu tenho um contato. O fornecedor normalmente pode estar aqui dentro de trinta minutos, mas eu não tenho certeza se ela vai sobreviver a noite. Ela precisaria ser muito forte, mas claramente está subnutrida. — Savannah explicou, sem tirar os olhos da garota inconsciente na cama. — Isso tudo é muito estranho. Quero dizer, de onde ela surgiu? As roupas e a tatuagem...parece que ela é de uma outra época.

Eu continuei quieto. Eu nunca havia contado a ninguém sobre o lugar em que vi Evangeline pela primeira vez. Eu ainda não fazia ideia do que aquilo se tratava já que ela não me disse, mas também me parecia muito estranho.

 

[...]

 

Enquanto Savannah fazia o que podia para tratar do ferimento mais grave da garota e esperávamos pelo tal fornecedor que ela havia me falado sobre, eu fui para o bar. Paranoid, do Black Sabbath, estava tão alto nas caixas de som que até o chão parecia vibrar. Como de costume, assim que eu entrava ali, todos pareciam se endireitar em seus bancos, levantando as mãos para me cumprimentar enquanto eu apenas fazia um breve aceno com a cabeça. Assim que eu me sentei em um dos bancos disponíveis na frente do bar e pedi pelo whisky de sempre, Harry surgiu ao meu lado em instantes, se sentando no banco de madeira e apoiando os dois braços tatuados ali.

— Você vai me explicar tudo, aqui e agora. — Ele pediu o mesmo que eu a uma das garotas que trabalhavam ali quando não estava ocupada rejeitando as investidas de alguns homens ao seu redor.

— Não fode. — Eu resmunguei, levando o copo aos meus lábios.

— Não, Zayn, é você que está fodendo com tudo. O que aconteceu com o “nada de segredos entre nós”, parceiro?! Além disso, essa situação estranha está assustando a todos aqui. Essas pessoas confiam em você, Malik, e sinceramente, você não me parece alguém muito confiável agora.

Eu bufei, fechando os meus olhos e soltando os meus punhos antes fechados com força e tensos.

— Eu a conheço.

— O que? — Ele exclamou, fazendo uma careta, confuso.

— Quero dizer, eu não sei, mas tenho quase certeza de que conheço aquela garota.

— De onde?!

— Essa é a parte estranha. — Eu ingeri mais um gole, me virando para ele. — Há dez anos atrás, o meu pai costumava fechar alguns negócios ilegais nas florestas há quilômetros daqui porque literalmente funciona como uma terra sem lei. Todos do centro de Austin acreditam que é apenas tomado de ursos e lobos, mas nós sabemos que isso é papo furado. Todo tipo de crime acontece por lá e o governo não faz nada porque também está envolvido até o pescoço em algumas questões. Se eles não mexerem com a gente, nós não mexemos com eles.

— E aquela garota estava lá?!

— Eu a encontrei por três dias atrás da cerca de um lugar que parecia um campo de concentração. Eu sei que era algo religioso, um tipo de culto estranho do caralho. Isso explica o versículo bíblico que ela tem tatuado no pulso. Ela usava o mesmo tipo de roupa que a garota em meu quarto. — Eu desviei o olhar e engoli em seco. — O nome dela era Evangeline.

— Bom, pelo menos nós teremos como confirmar se é ela mesmo agora. Isso se ela sequer sobreviver. — Eu o olhei com uma carranca e Harry ergueu as mãos em rendição. — Você sabe que eu só estou falando a verdade.

— A verdade ainda vai fazer o meu punho encontrar a sua cara qualquer dia desses.

— Um culto, então?

— Era o que parecia. Nunca descobri o que estava por trás daquela cerca. Tentei obter informações e não encontrei nada. Ninguém nem mesmo ouviu falar do lugar. A fodida Auschwitz do Texas. De onde quer que ela venha, é revestido de ferro. Protegido. Só posso dizer que há alguma merda séria por trás de tudo isso. O tipo de merda que é protegida por pessoas poderosas e que sem dúvida devem estar procurando por ela agora mesmo. Ela não me contou sobre o que se tratava, mas eu tirei as minhas próprias conclusões quando ela me disse que pecou, e que como punição, eles a machucaram.

— Porra. — Ele resmungou, passando a mão sobre o queixo.

— Era bizarro pra caralho.

— E nesses três dias vocês apenas conversaram? — Um sorriso pequeno insistiu em crescer em meu rosto, e para disfarçar, eu bebi mais um pouco. — Zayn, o que você fez?

— Eu beijei ela. — Eu dei de ombros, sem conseguir me segurar.

— Malik!

— O que foi?! Ela era muito gata e eu tinha quinze anos!

— Você beijou a garota do culto! A garota deve ter se apavorado!

— Pelo contrário. — Eu balancei a cabeça, me lembrando exatamente da reação de Evangeline. Talvez eu esperasse que ela saísse correndo, já que no começo ela se mostrou tão arisca, mas o que eu vi nos olhos dela quando nos afastamos passava longe de medo. — Ela gostou. Eu vi que ela gostou.

— Então, você acha que é ela mesmo? — Ele mordeu o lábio inferior, parecendo preocupado.

— Os olhos, Harry. Eu juro que são os mesmos olhos. — Eu suspirei, passando as minhas mãos pelo meu rosto. — Eles me assombram desde que eu a vi pela primeira vez. Eu não me enganaria com algo assim.

— Quer dizer que você vai ficar mole por uma boceta agora? Eu sinto muito por acabar com o seu conto de fadas, mas temos problemas de gente grande para enfrentar aqui, Zayn.

— Eu não vou ficar mole por ela, porra. Talvez ela nem sobreviva. — Eu pigarrei, notando como aquilo saiu em um tom estranho pela minha garganta. Eu não gostava nem um pouco da ideia de olhos tão incríveis como aqueles nunca mais se abrirem novamente. — Eu sei que temos problemas maiores no momento.

— Temos a porra de um rato entre nós, não temos? — Ele me olhou com cautela, temeroso. Quando eu assenti de forma discreta, ele grunhiu. — Eu quero esquartejar esse maldito. Se a polícia chegasse perto da nossa bunda hoje...

— Eu daria um jeito. Eu sempre dou. — Ergui o dedo e pedi mais uma dose para a garota do bar. — Arranje uma reunião para mim em meia hora. Eu vou colocar um pouco de juízo na cabeça de quem quer que esteja conspirando contra os Wolves.

— E o que você vai fazer nessa meia hora? Porque tem uma gostosa do cacete encarando você há um bom tempo. Foi até desconcertante conversar com você quando ela está tão inclinada a dar pra você aqui e agora. — Eu não resisti e ri, negando com a cabeça. Não importava se às vezes Styles dava nos meus nervos. Eu nunca poderia ter chegado onde eu cheguei sem o meu melhor amigo, já que além de tudo, ele era o meu braço direito, o vice-presidente do clube, que todos chamávamos de VP.

— Então você sabe que essa é a sua deixa. — Ele revirou os olhos mas assentiu, descendo do banco e fazendo um toque rápido de mãos comigo. Assim que ele deu o fora, mal virei para a frente novamente e não demorou muito para que uma mão feminina aparecesse em meu ombro.

— E aí, chefe? Você parece estressado essa noite. — Eu encarei o rosto da garota de cabelos negros e curtos, tentando me lembrar do seu nome, mas nada me veio à mente. Eu olhei para baixo, para o seu corpo, o que fez ela sorrir. — Anne. Parece que você não lembra de mim.

— Não, eu não lembro. — Eu levei o copo de vidro grosso à boca, bebendo todo o líquido âmbar do copo, logo pedindo por mais.

— Tudo bem, eu não me importo. Você estava bêbado demais naquela noite e eu também. — Ela continuava mostrando um sorriso enorme, passando as mãos pelo meu ombro e o meu braço sem parar, mordendo o lábio inferior manchado com o batom vermelho. — Eu ouvi alguns rumores sobre a garota que você trouxe pra cá hoje.

Eu bati o copo grosso contra a madeira do bar e me virei para ela, farto.

— Você está sonhando se acha que vai arrancar alguma informação de mim. Se você quer foder, diga de uma vez, porque isso é tudo que eu estaria interessado vindo de você.

Ela piscou algumas vezes, parecendo ter sido pega de surpresa, mas então voltou a sorrir ainda mais.

— Tão direto. É que assim que eu gosto.

Tudo que eu fiz foi apontar para a porta com a cabeça enquanto terminava com o terceiro copo de whisky. Quando eu me levantei, a tal Anne pareceu desfilar por entre as pessoas enquanto eu ia atrás dela, o que me irritava um pouco. Todas elas tratavam uma simples foda como algo muito maior. Assim que saímos pela porta e fomos atingidos pelo ar gélido da noite fria, Anne começou a caminhar na direção dos quartos, mas eu estava sem paciência para aquilo. Tudo que fiz foi puxa-la pelo braço até um canto escondido e escuro e encurrala-la contra a parede. A garota agarrou a minha nuca e me trouxe para perto, me beijando com tanta força que tudo que eu pude fazer foi corresponder com o dobro, agarrando-a pelo pescoço. Ela gemia e tremia sob o meu toque como se tivesse ganho a porra do seu dia, enquanto eu agradecia às doses de whisky que deixaram a minha mente um pouco nublada. Encontrei a camisinha no meu bolso de trás logo antes da garota puxar as minhas calças para baixo e colocá-la em mim. Com um único impulso, peguei a garota no colo, facilmente entrando dentro dela, já que aquele vestido minúsculo e vermelho não oferecia resistência alguma. Eu não tinha o costume de encarar as garotas que eu fodia, então eu soube que eu estava fodido no minuto que eu imaginei longos cabelos castanhos no lugar dos negros e curtos dela, e quando os olhos castanhos de Anne me enfrentaram, eu só vi um par de íris azul-gelo me encarando diretamente, as pálpebras encapuzadas em prazer. Uma onda de arrepios inédita tomou conta de mim e eu aumentei a velocidade, indo mais longe, mais fundo, ouvindo a garota quase gritar os seus pulmões para fora a cada estocada. Fechei os olhos com força, tentando me livrar do fantasma de Evangeline, mas ao mesmo tempo adorando pra caralho o que estava sentindo ao simplesmente imagina-la no lugar da outra garota, me tocando como ela tocava, gemendo o meu nome e me olhando com aquela mesma adoração. Eu cheguei ao limite sentindo espasmos percorrendo pelo meu corpo inteiro.

— Ah...isso foi...incrível. — Meus olhos se abriram e toda a magia pareceu acabar ali mesmo quando vi Anne novamente, completamente ofegante e com um enorme sorriso em seus lábios quando olhou para mim.

Merda.

Eu estava tão fodido.

Só podia mesmo ter enlouquecido.

Coloquei a garota no chão e arranquei a camisinha, fechando o zíper da minha calça jeans logo depois.

— Nós...nós podemos repetir isso em algum outro dia, não acha? — Ela me encarou, esperançosa, tentando recuperar o fôlego enquanto tinha as costas apoiadas na parede como se não conseguisse se manter em cima das próprias pernas.

— Quem sabe. — Eu fui vago, precisando da porcaria de um cigarro.

Deixei Anne para trás enquanto ia até a minha moto e encontrava o maço e o isqueiro no compartimento embaixo do banco, me sentando nele logo em seguida e acendendo um cigarro o mais rápido que eu podia. De onde estava, eu podia ter a visão da janela do meu apartamento ali, onde havia a luz baixa e amarela do abajur. Eu prendi a fumaça e fechei os meus olhos, sentindo a nicotina fazer o seu trabalho de me deixar menos pilhado. Depois de alguns segundos, soltei a mesma, sentindo o meu corpo mais relaxado, mas sem deixar de olhar para aquela maldita janela, onde eu sabia que a garota de olhos de gelo estava.

 

[...]

 

Harry fechou a porta, o que assinalou que todos os membros do clube estavam presentes. Eu me sentei no assento superior da mesa e Styles se sentou à minha direita enquanto trocávamos olhares cúmplices sobre o que aconteceria ali. O modo como mexeu as sobrancelhas dizia algo como “assuste a porra do rato pra longe”. Eu puxei a faca da minha bota e a cravei na madeira da mesa diante de mim, a lâmina cortando o carvalho grosso como carne. E de repente, olhos arregalados. Ponto feito.

— Se alguém sabe que diabos aconteceu esta noite, é melhor começar a falar agora.

Nenhuma conversa e nenhum contato visual comigo ou com qualquer outra pessoa. Eu pigarrei e apoiei os meus cotovelos na mesa, semicerrando os meus olhos e encarando cada rosto dali com seriedade.

— O acordo foi negociado por quatro meses. Cada detalhe foi planejado para perfeição, e principalmente, em sigilo. Todos vocês sabem como tudo é extremamente secreto por aqui. A pergunta é... — Eu bati o meu punho com força contra a mesa, causando um estrondo e fazendo ela pular. — Quem é?! Quem está roubando o nosso negócio?! Mais importante ainda, como diabos eles sabem sobre ele?! Não há outra maneira. Alguém aqui é a porra de um rato traidor e está vazando a porcaria das nossas informações!

Eu podia sentir o cheiro podre de traição na sala. Intimidação sempre lavava um rato para fora. Era isso que eu pai costumava dizer o tempo todo.

— Nós vamos encontrar um novo comprador em breve e então descobriremos quem ousou foder com o clube.

— Posso falar, Prez? — Eu cedi a palavra a Harry, apoiando as minhas costas na poltrona de couro marrom. — Minha suspeita será sempre os Renegades, mas agora qualquer um é uma maldita possibilidade, já que agora a porcaria da nossa lista de inimigos é tão longa quanto a droga da Pennsylvania Avenue.

Só de ouvir o nome daquela merda de clube, os meus punhos se fecharam com força e eu trinquei a minha mandíbula.

— Quem mais poderia ser uma possibilidade? Nós estamos bem com os membros locais de Austin?

— Eles são tranquilos. Pagam um bom dinheiro para atravessar o território. Sem rancor com eles. — Viking, de trinta e poucos anos, cabelos ruivos, pele pálida e uma longa barba ruiva, acenou com a cabeça.

— E os Warriors?

— Mantenho contato com um dos membros. Eles podem estar interessados. Eles estão em guerra com os Red Devils. Algumas armas roubadas poderiam vir a calhar. Posso tentar arrancar alguma informação dele. — Flame, o sargento das Forças Armadas e ex-atirador da marinha, que era alto como uma torre, respondeu.

— Faça isso. — Eu balancei a cabeça, uma lasca de alívio em meus ossos. Droga, eu não aguentava mais. Era muita informação para um dia só. — Mais alguém tem algo a dizer?

Encarei todos eles e fiz a varredura para ver contrações musculares ou qualquer outro sinal de medo.

Nada.

Porra.

— Acabamos aqui por hoje.

Em meio a cadeiras sendo arrastadas com força contra o chão de madeiras e murmúrios como “vou encher a cara agora”, eu e Harry nos levantamos ao mesmo tempo. Eu passei uma das mãos pelo meu cabelo, estressado e Styles tocou o meu ombro.

— Nós vamos pegá-los, Malik. Ninguém nos atravessa. Todo mundo sabe como nós fazemos as coisas no Texas. O filho da puta acabou de assinar sua própria sentença de morte.

— Ótimo.

— Você vai ver a sua garota agora? — Eu me virei para ele no mesmo momento, com as sobrancelhas franzidas.

— Que porra é essa?

— A garota. Evangeline.

— Ela não é minha garota. — Eu fiz uma careta que fez ele rir, com as mãos espalmadas em sua barriga. — Além disso, eu sequer sei se é ela mesmo.

— Eu achei que fosse depois de todo aquele papo de “olhos de gelo”. — O filho da puta fez um biquinho.

— Harry, o meu punho...

— Eu sei, eu sei! Anda logo porque eu quero uma cerveja.

 

[...]

 

Assim que entrei em meu quarto, encontrei apenas Savannah cuidando da garota. Eu fechei a porta rapidamente atrás de mim para que a temperatura baixa não entrasse, agora que o quarto parecia aquecido como nunca com um aquecedor que eu não faço ideia de onde surgiu. Eu olhei para a cama, vendo que a garota estava completamente livre de qualquer mancha de lama e sangue agora, com roupas novas e limpas. A pele pálida e lisa, parecendo até mais rosada agora que estava aquecido e que haviam tomado os devidos cuidados com ela, incluindo aqueles lábios que tinham potencial para ser a perdição de qualquer homem. O longo cabelo castanho parecia cair em ondas pelo meu travesseiro e eu senti como se os meus dedos coçassem para tocar aqueles fios que pareciam ser tão macios. O cabelo solto, natural e selvagem com o qual eu havia sonhado tanto. O fôlego simplesmente me escapou.

Linda para um inferno.

Tinha que ser ela. Só podia ser ela.

Apesar de eu mesmo ter me torturado ao tentar imaginar como Evangeline ficaria se adicionasse mais dez anos a ela, a minha imaginação não chegava nem aos pés daquela garota. Ela havia superado todos os níveis de beleza possíveis. Eu tinha a impressão que se ficasse encarando-a mais do que já estava, eu cairia em tentação.

— Ela é linda. — Savannah disse, me tirando do meu transe ao erguer a cabeça, recolhendo todo o seu material. Ela ficou em pé e colocou as mãos nos bolsos de trás da calça jeans. — Ela está aguentando firme agora. Descobri que o ferimento na barriga era, de fato, um tiro, mas foi de raspão e precisou só de alguns pontos. Foram três litros de sangue e uma intravenosa de antibióticos fortes. A temperatura corporal subiu e os sinais vitais estão estabilizados. Ela é saudável, apesar de eu temer que ela esteja passando por um caso grave de subnutrição e anemia. Deve ter cerca de vinte e poucos anos, eu acho. — Ela suspirou, colocando a franja castanha atrás da orelha. — Vamos ver como ela vai passar a noite. Se o seu estado permanecer assim pelas próximas vinte e quatro horas, ela provavelmente vai sobreviver.

“Provavelmente” nunca é bom o suficiente. Eu definitivamente não gostava daquela palavra.

— Sabe, ela realmente parece uma princesa, Malik. O cabelo escuro, a pele pálida, lábios vermelhos. Ela é impressionante. Sem maquiagem, mas ainda assim parece que tem. Acredite, eu fui checar e, porra, não é justo! Não é de admirar que as vagabundas do clube estão reclamando sobre você mantê-la aqui para si mesmo. Elas não têm comparação com ela.

Eu odiei concordar com ela. Se alguém me dissesse que aquela garota havia saído diretamente de uma das obras de Émile Vernon, eu acreditaria. Soltei um suspiro reprimido ao olhar para a garota inconsciente na cama. Maldito rosto perfeito.

De repente, eu percebi que Savannah olhou para os próprios pés, parecendo ter se lembrado de algo, mordendo o lábio inferior, nervosa.

— Qual o problema? — Observei ela fechando os olhos por alguns instantes antes abri-los novamente com um suspiro. E então eu soube que eu tinha um grande problema pela frente quando ela balançou a cabeça, com os lábios entreabertos em surpresa, parecendo ter perdido o fôlego por alguns instantes.

— Ela tem muitas cicatrizes no corpo, Malik.

Eu travei, sentindo a tensão me dominando por inteiro em alerta, e depois, de raiva. Franzi as sobrancelhas e dei um passo para a frente, com os punhos cerrados.

— Como?! Onde?!

— São incontáveis nas costas. Parecem marcas de chicote e são muito graves, mas quem diabos faria isso hoje em dia?!

— Onde mais? — Ela me olhou por alguns segundos, passando a língua pelos lábios e diminuindo o volume da voz, apesar de estarmos sozinhos.

— Tem alguns no interior das coxas também. Parecem cortes antigos, como marcas de lâmina. Eu nunca vi algo assim antes. 

Eu engoli em seco sentindo a minha própria mandíbula estalar pela pressão que eu estava aplicando nela.

Savannah caminhou em direção a porta, mas parou com a mão na maçaneta e me olhou com os olhos tristes.

— Espero que ela supere isso. Eu acredito que ela mereça uma vida melhor do que a que ela com certeza teve até agora. 

Eu não podia responder. Não conseguia pensar em mais nada. Cicatrizes na parte interna das coxas. Como foi que ela conseguiu aquilo fazendo parte da porra de um culto religioso?!

Eu me aproximei da cama e me sentei na beirada do colchão, encarando o rosto que havia atormentado a minha memória por dez anos. Em meio a tantas perguntas que eu tinha para fazer a ela, só uma me vinha à cabeça naquele momento.

— Quem é você? — O sussurro saiu pelos meus lábios, mas ela continuava desacordada.

Suspirando, eu me levantei. Eu definitivamente precisava de um banho. Enquanto andava até a porta do banheiro, no entanto, vi o vestido azul e sujo que ela usava antes dobrado em cima do sofá. Em cima dele estava um único terço de contas marrons e a foto de uma garota que se parecia um pouco com ela, mas mais jovem. Talvez uma irmã? Eu não fazia a mínima ideia. Peguei tudo aquilo para colocar em cima da cômoda, prevendo que teria que dormir ali naquela noite, mas então algo caiu no chão de dentro de um bolso do vestido.

E eu juro que a porra do meu coração quase parou ali mesmo.

Em cima do meu tapete, eu olhei para aquele isqueiro com a letra Z encravada nele. O isqueiro que eu ganhei do meu pai e que eu lembro muito bem de ter colocado nas mãos de Evangeline quando eu estava indo embora. Virando a cabeça na direção da garota dormindo na cama, eu subitamente soube a resposta da minha própria pergunta.

Evangeline.

Ela era mesmo Evangeline.


Notas Finais


Esse capítulo é mais explicativo, prometo que o próximo está muito melhor porque a Eva vai acordar!

Espero que tenham gostado! Não deixem de comentar, me ajuda demais :) e obrigada por tudo até agora!

Até o próximo capítulo!


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