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  3. Ex-petacular

História 03 ( beyond the love - choni ) - Ex-petacular


Escrita por: chxnidale

Capítulo 25 - Ex-petacular


Fanfic / Fanfiction 03 ( beyond the love - choni ) - Ex-petacular

 

Cheryl B. Topaz – Point Of View

Três dias da ultima vez que vi minha esposa, aquela que me pediu um tempo e espaço, estava lhe dando, mas não tenho como explicar o quão torturante é ficar longe de Toni. 

Era um sábado bonito, o sol aparecia em Seattle e resolvi caminhar já que não fazia a muito tempo. Havia prometido a Sabrina que procuraria o AA, estava cumprindo a promessa. Não recordo da última vez que participei de uma reunião ou tive contato com meus parceiros de vício, talvez tenha sido no último aniversário de sobriedade ou em algum momento que me vi próxima de ter uma crise.

Deveria mudar esses meus hábitos, antes tinha um agenda para ir ao AA e minha psicóloga frequentemente, agora só os procuro quando preciso, é... Realmente necessito mudar.

Quando sentei na cadeira da pequena roda dos Alcoólicos Anônimos, reparei em várias pessoas novas, percebi que o tempo que fiquei longe foi significativamente grande. A nossa orientadora ficou surpresa em me ver, mas todos receberam minha presença bem e a reunião seguiu normalmente. Eu falei sobre o que estava passando, até me desculpei pela faltas, era bom estar de volta, o meu coração aliviou ao ouvir os conselhos que os colegas me davam, uma pequena esperança de que no final tudo ficaria bem.

Assim que o papo se encerrou uma confraternização se iniciou, alguns doces e salgados, chás, café e refrigerante, deixava o clima um pouco mais leve. Nunca fui de conversar muito com as pessoas, mal lembro o nome de todos, ficar em meu canto era sempre uma opção boa. Principalmente em pé, ao lado da mesa com os alimentos, observando a todos de uma certa distância.

— Estou feliz em te ver aqui. 

Margaret apareceu sorridente. 

A orientadora de no máximo cinquenta anos se aproximou de mim me acolhendo em um curto abraço. Desde que comecei a frequentar esse AA de Seattle, ela tem sido a única com quem tenho uma troca de palavras a mais do que somente pela reunião.

— É bom estar de volta.

Abri um pequeno sorriso ao falar.

— Ouvi você hoje. – tocou na alça de seu óculos redondo de grau, uma mania que havia reparado em seu jeito. — Fazia algum tempo que não havia problemas com a Toni, não um tão grande...

Suspirei, segurando a xícara em minha mão com mais firmeza. Lembrar da minha mulher me deixa nervosa, não saber o que o futuro nos reserva era assustador. Eu sentia sua falta, tanto que para matar um pouco a saudade usava roupas suas, talvez nem tenha ideia de que as peguei, mas é uma maneira de mantê-la perto. 

— Nós... Acho que não soubemos muito bem lidar com o casamento. 

— Relacionamentos são complicados, sempre tem altos e baixos, acredito que irão se acertar logo. – confortou-me colocando a mão em meu ombro. — Eu só... Espero que volte a vir frequentemente.

— Virei, é uma promessa. 

Usei meu tom firme ao falar, Margaret balançou a cabeça.

— Enfim, não vim falar com você apenas por isso. 

— Não?!

Franzi a testa.

Normalmente tínhamos esse papo ao final da reunião.

— Você é a única entre nós que nunca teve um padrinho ou amadrinhou alguém.

— Deus... 

Murmurei, pedindo ajuda aos céus.

Sabia que um dia esse momento chegaria, mas agora? O AA tem etapas, regras e regulamentos a seguir. Quando morei em Boston, tive um padrinho, era o meu suporte emocional, aquele que compartilhava comigo suas histórias e tentava me manter sóbria. Sinceramente? Ele era um péssimo padrinho. Considero que Sabrina sempre foi minha madrinha, ela estava lá por mim. O meu padrinho de Boston provavelmente era mais instável que eu, a experiência com ele foi horrível e nem lembro seu nome. Resumindo, cheguei em Seattle dizendo que já havia tido um padrinho, o meu estado vicioso era muito melhor então, me aceitaram de braços abertos. 

O apadrinhamento do AA funciona com frequentadores a mais tempo sóbrios ajudando os que estão no início da sobriedade. Nunca tive a vontade de ser madrinha de alguém, talvez nem ao menos procurei ter um afilhado, mas aparentemente Margaret acha que chegou a hora.

— Cheryl, todos precisam passar por essa etapa e tenho certeza que só irá te fortalecer. Você já está sóbria a anos, confio que pode finalmente ajudar alguém. 

Margaret soou, o meu olhar rapidamente desviou do seu. 

— Não acho uma boa ideia, ainda mais agora que estou sensível...

— Para mim, é o momento perfeito. – interrompeu-me, a mão escorregando por meu braço. — Ele irá te distrair, você fará uma nova amizade, vai ocupar um pouco seu tempo. 

— Ele?

Arqueei as sobrancelhas.

— Cheryl, é uma escolha totalmente sua querer ou não, mas nós temos um que acabou de chegar. A primeira reunião foi hoje... – ela virou seu corpo, buscando alguém com o olhar. — Aquele. 

Sua cabeça apontou em direção ao adolescente sentado na cadeira, sua cabeça baixa, uma xícara em uma mão e pedaço de bolo em outra. Seu cabelo era escuro, mal cortado, não havia barba, uma tatuagem no pescoço. A maçã do seu rosto no lado esquerdo estava com um hematoma bem abaixo do seu olho. 

É difícil não ter um pré-julgamento de cara.

— O nome dele é...

— Não, nem me fale. – a interrompi. — Margaret, só de olhar para ele já vejo problemas, ainda não é o momento certo.

— Cheryl, pense pelo menos. – pediu, o olhar suplicante. — Será bom pra você e pra ele, aliás nunca te colocaria em algo que não tenha certeza que vá te ajudar.

Puxei o ar, mordendo os lábios.

— Pense. – repetiu, o meu olhar foi ao garoto sozinho. — Ele virá a todas reuniões a partir de hoje, você sabe os dias e horários, sabe meu numero também...

— Ok, irei pensar. – me rendi. — Mas não crie expectativas.

A encarei, ela abriu um sorriso.

— Não criarei. 

×××

 

— Ela só pode estar ficando louca.

Desabafei com Sabrina que tinha os pés em cima das minhas pernas, o corpo esticado no sofá, várias almofadas embaixo do mesmo. Sua barriga a cansava cada vez mais, enquanto Nicholas a cada cinco minutos perguntava como a loira se sentia, no momento ele estava concentrado demais na tela da televisão jogando vídeo game.

— Não cuido nem de mim mesma imagina de outra pessoa. 

Balancei a cabeça em negação. 

— Você pode massagear meus pés enquanto fala? – minha amiga usou seu tom manhoso, revirei os olhos. — E essa pizza que não chega?

— Sabrina, preciso de conselhos aqui. 

Chamei sua atenção.

O fato é que depois da reunião, ir para minha casa e ficar o resto do sábado sozinha não era uma opção. Bom, a outra e única seria visitar meus amigos, e aqui estou eu. 

— Cheryl, você deveria ouvir a Margaret. – arregalei os olhos em sua direção. — É a única do grupo a não ter amadrinhado ninguém. 

— Mas aquele garoto cheira a problema! 

— Já se perguntou se eu tivesse pensado nisso quando você voltou pra Boston? Quer dizer, pensei. Tinha certeza que me traria problemas, muita dor de cabeça e irritação, mas precisava de mim, te ajudei e sinto orgulho por ser alguém que esteve no seu processo de ser uma pessoa melhor. 

— Sabrina... 

Murmurei, melancólica ao sentir as lágrimas virem. 

A loira soltou um suspiro, segurou a barriga e esforçou o próprio corpo para sentar, a ajudei, é claro. Sabrina ficou ao meu lado, uma mão segurando a minha enquanto a outra estava apoiada no sofá.

— Olha, essa situação com a Toni é muito ruim e sei que se ficar somente em casa irá sentir saudade do seu vício. Aliás, precisa parar de passar tanto tempo na escola, não é saudável trabalhar mais que o normal então, sim, acho que amadrinhar esse garoto seria bom.

— Agora acho que você e Margaret estão ficando loucas.

Enxuguei as lágrimas que queriam sair.

— É uma decisão sua, ok? – assenti. — Mas você mesma disse que Toni te sufocava por te tratar como alguém que não tem controle, é uma ótima oportunidade de mostrar a ela e a si o quanto tem certeza de sua sobriedade. 

— Tem razão...

Sussurrei, soltando o ar.

— Falando em controle...

Iniciou, minha amiga engoliu a seco e percebi a mesma trocando um olhar com Nicholas que deixou o vídeo game de lado e sentou a nossa frente no tapete. Franzi a testa, estreitando o olhar para os dois que pareciam receosos.

— Qual o problema? Ou, mais problemas? 

Arqueei as sobrancelhas.

— Não é um problema, só preciso que acalme suas emoções e reações. – seu toque em minha mão firmou. — Amanhã a família do Nicholas vai vir nos ver, trazer mais presentes para a Gracie e etc...

— Uhn, outra festa?

Franzi o nariz.

— Não, é que... 

— Ah, vou falar logo!

Nicholas interrompeu, o encarei.

— A Barbara está vindo amanhã, ela vai ficar em Seattle até a Gracie nascer. – falou de uma vez só. — Viu, foi fácil.

Olhou para a namorada.

Minha boca abriu, mas não saiu nada. No momento nem havia pensado em Toni, mas sim, que a outra madrinha da minha afilhada vai poder chegar no nascimento dela primeiro que eu... Isso não é uma competição, eu sei, mas... É Barbara Palvin, a modelo e ex da minha esposa.

É claro que é uma competição.

— Cadê essa pizza, ein?!

Nicholas levantou demonstrando o nervosismo.

— Cheryl?! – Sabrina me chamou. — Achei melhor te contar, antes que a encontrasse por ai e...

— Será que não tinha outro momento pra vir? – interrompi demonstrando minha irritação. — E precisa ficar tão perto da minha afilhada? Se você deixar ela pegar a Gracie primeiro que eu...

— Ei, é a minha irmã! 

Nicholas me repreendeu.

— Só cale a boca. – retruquei, um tom ríspido saindo por entre meus lábios. — Sabe que temos nossas diferenças, Barbara me odeia tanto quanto a odeio.

— Talvez a Gracie faça vocês se entenderem.

Sabrina soou esperançosa.

— Nunca. – trinquei o maxilar. — É a minha afilhada. 

— Por que odeia tanto a Barbara? Você que transou com a namorada dela. 

Nicholas cruzou os braços, juntando as sobrancelhas em curiosidade.

— Se você falar o que vai sair por minha boca agora, eu te mato. – ameacei, levantando meu corpo e ficando de frente para o homem. — Aquela mulher é a definição pura de beleza, ela esteve com a Toni nos melhores momentos da vida dela e sinto inveja porque poderia ser eu no lugar, se não tivesse sido imatura o suficiente para não aceitar a profissão de lutadora. 

— Uhn, a Barbara vai adorar saber que tem inveja dela... 

— Nicholas.

Rosnei, estalando um tapa em seu braço. 

— Brincadeira, Red. – riu, alisando o local. — Então, minha irmã te deixa insegura? 

— Scratch, se isso sair daqui, eu juro que... 

— Cheryl. – ele segurou-me. — A Toni sempre amou você, por favor, todos sabemos disso inclusive a Barbara. 

— O problema é que agora não tenho tanta certeza se ainda me ama.

Meu tom saiu baixo, o corpo caiu de volta no sofá e suspirei, olhando para qualquer canto. Ouvi um grito de felicidade do meu amigo quando a campainha tocou anunciando a chegada da pizza, senti meu coração apertado e uma angustia tomando conta, era como se o destino estivesse colaborando para que Toni nunca mais fosse minha. 

— Cheryl, vai ficar tudo bem...

Sabrina tentou me consolar. 

— Sinceramente? – a encarei. — Não consigo acreditar nisso. 

Suspirei, jogando minha cabeça para trás.

×××

 

Estava sendo difícil dormir, sentia tanta falta de Toni que doía, o meu corpo rolava na cama e não achava uma posição certa, já deveria ser início da madrugada. Isso significa que é domingo, aquele dia que combinamos de ser nosso, mas que nunca foi. 

As coisas se tornaram complicadas tão rápido, nós éramos o casal invejado por nossos amigos em um dia e no outro, o espelho do que não queriam no relacionamento deles. Nos tornamos imaturas, insensíveis, parecíamos aquelas adolescentes de Riverdale completamente orgulhosas. 

Orgulho, sempre tive e muito. Minha sorte é que por um longo período de tempo, Toni não foi, porque ela realmente não é orgulhosa. Aquela mulher só quer o bem, de todos e não importa quem. Deus, minha esposa é claramente o reflexo de pessoa que se coloca no lugar da outra, que pensa primeiro nos outros do que em si, mas consegui fazer com que deixasse essa personalidade de lado, que tivesse mais orgulho e acabamos aqui. 

Os pensamentos me faziam quase surtar, o sono não chegava e sem perceber, tinha o celular em mãos. Eu estava morrendo de saudade dela, talvez não fosse o momento para ser orgulhosa e sim, ceder um pouco. Faria isso, deixar o orgulho de lado. Procurei por seu número, o “minha tee” parecia tão possessivo, não poderia negar que boa parte dessa ligação também tem haver com a chegada de Barbara. 

Coloquei o aparelho na orelha, a cada toque que dava e não era atendido aumentava minha vontade de desistir, respirei com um pouco mais de força e sentei na cama, ela demorou a atender. 

— Cheryl? Aconteceu alguma coisa? 

Disparou demonstrando preocupação, meu coração aqueceu com uma possível possibilidade da minha esposa ainda se importar, ainda me querer como antes.

— Oi, não, não... – balancei a cabeça. — Só queria saber do Leo... E de você.

Murmurei as últimas palavras. 

— As duas da manhã? 

Me encolhi com seu tom rude. 

— Desculpa, não deveria ter ligado...

— O Lion está bem. – interrompeu-me, lambi os lábios ao ouvi-la suspirar do outro lado. — Pode vir pega-lo ou visitar quando quiser.

— Posso? – arqueei as sobrancelhas, juntando os joelhos ao meu peito enquanto abraçava os mesmo com o braço livre. — Não sabia, a gente não esclareceu muitas coisas. 

— É, somos boas em omitir. 

Seu tom regado de sarcasmo não me agradava, ficamos alguns segundos em silêncio, Toni não parecia interessada em prolongar o assunto, queria a ouvir mais e saber como está sem mim, mas não seria hoje. 

— Acho que era isso, vou desligar... Quer dizer, está tarde e desculpa te incomodar, se te acordei e...

— Tudo bem, mas realmente é muito tarde e amanhã tenho compromisso cedo. – o seu tom era frio, mal se importando com o que causaria. — Então, boa noite, Cheryl.

— Boa noite. 

Foi o máximo que consegui responder antes da mesma desligar, demonstrando todo seu bloqueio. Encarei o celular apagado pensando em inúmeras possibilidades do compromisso de Toni amanhã. E se ela fosse encontrar Barbara? Busca-la no aeroporto? Odiava minha mente tão paranoica, sempre foi e vai ser. Para mim, não exista uma mulher que não queira ter alguém como minha esposa por perto. 

Pensei que a ligação melhoria minha confusão, mas piorou, sinto que se chegar perto da Toni, ela irá se afastar como proteção. Teria que esperar a mesma decidir o que será de nós daqui pra frente, inclusive que começar uma nova história possa ser uma opção. 

×××

 

Uma semana após a última vez que vi minha esposa, uma semana que sai de nossa casa sem data para voltar e ainda não havia uma. Sabrina estava certa, precisava ocupar minha cabeça e não somente com trabalho, ficar na escola sozinha não estava me fazendo bem. 

A ideia de procurar Margaret surgiu em um final de expediente, comecei a me sentir curiosa sobre o garoto, sua história e se poderia ajuda-lo da maneira que a mesma disse. Quando me vi parada em frente a cede onde temos as reuniões, respirei fundo, adentrando o prédio e posteriormente nosso pequeno salão. 

Dificilmente você chega e não vê a orientadora, mas hoje era um desses dias. As cadeiras posicionadas em uma roda, a mesa no canto sempre oferecendo café ou algo pra comer. Os meus passos pararam quando aviatei o garoto que Margaret queria me apresentar, ele estava comendo e servindo um café. Claro que notou minha presença, seria impossível não notar com o barulho de meus saltos ecoando naquele silêncio. 

— Você está procurando a Margaret? – seu tom rouco me obrigou a encara-lo, ele coçou a nuca. — Ela está falando com alguém na sala. 

Apontou para a porta próxima a mesa, era como um escritório da nossa orientadora. Bom, ela precisa ter o controle de todos nós, acredito que seja uma vida bem cansativa. 

— Café? 

Ele me ofereceu, apontando para uma das xícaras. 

Percebi que estava completamente estática, mãos no bolso do casaco e parada ainda na entrada. Vergonhoso, parecia uma garotinha amedrontada. Continuei meus passos. 

— Sem açúcar, por favor.

Pedi, ele assentiu. 

Geralmente uso açúcar, mas acho que precisava de um choque de realidade. Onde estava com a cabeça? Como vou ajudar uma pessoa se tenho medo dela? Como tenho medo de alguém que me oferece café? Balancei a cabeça, chegando próxima o suficiente para pegar a xícara.

— Aqui.

Ele estendeu a mesma. 

Pela primeira vez encarei seus olhos verdes, o hematoma no rosto bem menor, mas ainda estava ali e não havia como negar o quanto chamava minha atenção. Peguei a xícara em mãos, bebendo um gole do quente e forte café, uma careta apareceu.

— Foi você que pediu...

Riu ao perceber minha desaprovação.

— Está ótimo. 

Balancei os ombros, mentindo.

Ele me deu um olhar julgador, não acreditando em minhas palavras, mas deixando de lado. Nós ficamos em um silêncio, lado a lado e infelizmente não conseguia evitar o olhar curioso que caia sobre seu rosto machucado. 

— Uhn, você é uma daquelas mães preocupadas? – franzi a testa com a pergunta. — Sabe, está encarando meu rosto desde que chegou. 

— Oh, não, não... – desviei o olhar, voltando a encara-lo no segundo seguinte. — Ei, sou muito nova pra ser mãe, não acha? 

Meu tom era repreensivo. 

— Sim, você só é muito curiosa mesmo. – ele riu, estava zombando de mim. — Alias, eu cai. 

— Está mentindo. 

Analisei. 

— E você não está bebendo seu café sem açúcar. 

— Porque está horrível.

Respondi como se fosse óbvio.

— Então, agora estamos sendo sinceros. 

Ele sorriu. 

Era a primeira vez que o via sorrir, não muito grande, mas a ponto de ver seus dentes brancos. O meu julgamento pareceu ter acabado ali, estava com medo do que viria, das histórias que tem pra contar ou que me coloque em perigo, mas por que senti o oposto a partir desse sorriso? Não tenho ideia, mas gostei da nossa conversa, ele me lembrava o Nick e a Toni, me fez pensar que os três virariam  grandes amigos. 

— Cheryl?

Devo ter divagado, estar sentimental demais pra me deixar levar apenas por um pequeno sorriso de um adolescente. Quer dizer, só acordei quando Margaret me chamou da sala, sua testa franzida me dava sensação de que já havia pronunciado meu nome outras vezes.

— Desculpa, eu... – deixei a xícara acima da mesa, o garoto me analisava. — Estou indo. 

Caminhei para a sala junto de Margaret que me recebeu com um sorriso.

— Você decidiu? 

Ela parecia ansiosa ao fechar a porta. 

Sentei na cadeira a frente da sua mesa, senti uma pequena adrenalina correndo por minhas veias, poderia estar sendo impulsiva e se esse menino me matar? Roubar? Sequestrar? Ok, não. Ele sorriu pra você, lembra? Encarei a orientadora que agora estava a minha frente sentada. 

— Ele já usou drogas? Foi preso? Machucou alguém?

As palavras pularam para fora de minha boca. 

— Cheryl, ele é uma boa pessoa. – seu tom era calmo. — Olha, ele já passou pelos doze passos, está aqui porque veio de outro grupo e está sóbrio a um mês, poderia te contar tudo, mas seria ótimo se descobrisse sozinha. 

— Você não negou nada... – observei, estreitando o olhar. — Ele fez tudo o que falei? 

Margaret riu.

— Acho que você é um pouco curiosa, não irei responder nenhuma das perguntas, ok? Se quiser, terá que ser a madrinha dele e descobrir.

— Pode pelo menos me dizer a idade?

— Dezoito, quase dezenove. – sorriu ao falar. — Vamos, sei que gostou dele.

Suspirei. 

— Infelizmente, é exatamente o tipo de pessoa que mantenho por perto. – revirei os olhos. — Tudo bem, mas se não der certo... Posso devolve-lo? 

— Sabe que ele é um ser humano, não é? 

Margaret tinha um sorriso divertido.

— Desculpa, serei mais cautelosa.

— Poderá desistir do apadrinhamento, só precisa me informar que não está funcionando. O correto é os dois se beneficiarem e se manterem sóbrios. 

— Entendi. 

Relaxei os ombros, soltando o ar. 

— Vamos dar a notícia a ele? 

Arqueou as sobrancelhas.

Concordei, balançando a cabeça e levantando da cadeira extremamente confortável, qualquer coisa era mais confortável do que dizer a um adolescente que serei o suporte dele. Margaret estava sorridente, sinto que estava feliz por finalmente conseguir alguém para ajudar.

O garoto ainda se mantinha perto da mesa e comendo, a última reunião já deve ter acabado a no mínimo trinta minutos, me perguntava quanto tempo ele passa na cede dos alcoólicos anônimos.

— Nathan. – chamou a atenção do adolescente, ele virou mastigando algo. — Essa é Cheryl, vai ser sua madrinha a partir de agora. 

Engoliu o alimento com dificuldade.

— Ela? – arqueou as sobrancelhas, semicerrei os olhos em sua direção. — Minha madrinha é uma madame?

Madame?!

Troquei um olhar com Margaret me sentindo ofendida.

— Nathan. 

Ela o repreendeu. 

— Desculpa, é que não parece o tipo de pessoa que frequenta o grupo. 

— Cheryl estava na reunião de sábado, a sua primeira... Você não lembra? 

O garoto me analisou de cima a baixo.

— Ah, verdade, mas você usava roupas pretas. 

— São da minha esposa.

Justifiquei mesmo sem precisar.

— Bom, ela tem um estilo melhor que o seu.

— Oh, céus...

Margaret murmurou, deveria estar arrependida da ideia maluca de sermos madrinha e afilhado. Digo, esse menino pareceu legal, mas agora vi que não tem papas na língua. 

— Antes de dizer qualquer coisa. – a mais velha me interrompeu assim que abri a boca. — Tentem começar novamente, ok? Se apresentem. 

Fez gestos com as mãos.

Suspirei, encarando o garoto.

— Nathan Price.

Estendeu a mão.

— Cheryl Topaz. 

Forcei um sorriso, segurando na mão do mesmo. 

— Continuem. 

Margaret incentivou.

— Então, o que você faz? É advogada?

— Por que? – franzi a testa. — Você precisa de uma? 

Balancei as sobrancelhas. 

— Ela está me provocando.

Nathan olhou pra Margaret.

A orientadora revirou os olhos, abri um sorriso no canto dos lábios.

— Cheryl não é madame. – explicou olhando para o adolescente. — Nathan não é perigoso. – me olhou. — É hora de irem e me deixarem em paz. 

— O que? – entrei em alerta. — E o que vamos fazer agora? 

— Não sei. – franziu o nariz. — Qualquer coisa que não envolva bebida?!

Sugeriu. Troquei um olhar com Nathan, ele balançou os ombros e eu suspirei, enfiando as mãos no bolso do meu casaco. 

Seria uma longa jornada. 

Fora do prédio do AA nos encontrávamos na calçada, silêncio absoluto enquanto ninguém sabia como realmente começar uma conversa, a noite estava chegando e me vi obrigada a encerrar nosso contato por hoje.

— Acho que você precisa do meu número. – falei, ele me encarou. — Pra me ligar se tiver alguma dificuldade.

— Claro.

Pegou seu aparelho, alcançando-me para anotar o meu numero, a tela rachada dificultava um pouco minha digitação, mas consegui salvar. “Cheryl Topaz”. Formal, simples e com o sobrenome que fazia meu coração doer um pouco pelo medo de talvez não ser mais meu.

— Nós podemos fazer alguma coisa amanhã, eu trabalho, mas no fim de tarde estou livre.

Continuei o diálogo ao entregar o celular.

— Pode ser. 

— Veja, nós precisamos disso. – falei, cansada do clima chato. — No início não vai ser fácil, mas podemos ser legais um com o outro? Tentar nos conhecer e se ajudar?

— Aceito.

Ele estendeu a mão como se fosse um acordo, um sorriso crescendo em seus lábios. Segurei sua mão, abrindo um sorriso pequeno.

— Ótimo, até amanhã então.

 

Toni Topaz – Point Of View

A minha mente e sentimentos estavam uma confusão, mas sabia que não poderia deixar minha vida parar, principalmente a profissional. Minha maneira de passar tempo e não pensar tanto na ruiva que está sempre em minha cabeça é ficando na academia, interagindo com as pessoas e ganhando o carinho de alguns admiradores.

Hoje seria um grande dia, iria ter uma conversa com Willian, depois que ganhei o cinturão tive ainda mais certeza que não o queria mais como treinador. Estava cega por todos problemas que passei, acabei aceitando suas drogas e Deus me protegeu ao não aparecer nada no exame. Só que agora tinha a confirmação de que não merecia mais ser da minha equipe, nunca mais tomaria aqueles remédios.

— Qual o problema, Toni? 

Willian franziu a testa, sentando na cadeira a minha frente. Estávamos em minha pequena sala na academia, precisávamos ter essa conversa em particular. 

— Aqui está seu contrato quero encerra-lo. 

Falei, colocando os papeis a sua frente. 

— O que? Está me demitindo? 

— Sim, podemos fazer um acordo...

— Piada. – riu ironicamente. — Você pagará a multa por quebra de contrato, não haverá acordo. 

Ameaçou, provavelmente para que desistisse.

— Tudo bem, eu pago. 

Dei de ombros, Willian bufou irritado.

— Por que está me demitindo? Acabamos de ganhar o cinturão! 

— Porque você me ofereceu remédios. – cruzei as mãos acima da mesa. — Aproveitou de minha fragilidade para influenciar-me com essas merdas.

— Aceitou porque quis! 

Cuspiu as palavras.

— Não importa, tenho sorte que nada apareceu e não quero que isso nunca mais se repita. – decretei. — Fora que você nunca foi realmente um treinador, certo? 

— Nunca fui porque você não me deixava ser, reclamava de todas minhas orientações, Topaz.

— É, porque você é um merda que não sabe de nada, muito menos como tornar alguém campeã. Só ganhei a maldita luta por causa do meu talento.

Willian soltou uma risada alta, levantando o corpo e balançando a cabeça em negação. Puxei o ar, controlando minha vontade de acabar com seu ar completamente debochado. Ele apoiou as mãos na mesa, aproximando-se.

— Você só ganhou porque te dei remédios, do contrário Peaches acabaria a luta em cinco segundos. – sorriu de forma sarcástica. — Mas quer saber? Foda-se você e esse cinturão, mandarei meu advogado para a quebra de contrato. 

Bateu com a mão na mesa, virando o corpo e saindo do escritório. Respirei fundo, com força, fechando os punhos para acalmar-me. Não queria que as coisas acabassem assim, mas parecia que não havia outro jeito. 

Joguei meu corpo um pouco mais contra a cadeira, relaxando da pequena discussão que se tornou a demissão do meu treinador. Sim, teria novamente que iniciar a busca por algum profissional da área, mas era melhor do que alguém que me oferece remédios. Não o culpo totalmente, a culpa é minha de tomar, mas não quero alguém assim por perto. 

O meu celular vibrou no bolso da jaqueta, minhas mãos que estavam massageando as próprias têmporas pegaram o aparelho em mãos. Assim que olhei para a tela, vi o nome “Ex-petacular”, acabei rindo, era Barbara e recordei que foi a mesma quem digitou o número no meu celular na festa da Gracie. 

“Oi, Toni. Estou em Seattle por um tempo, queria te encontrar pra conversar, podemos?”

Reli a mensagem, se estivesse tudo bem com Cheryl, provavelmente negaria na hora e a ruiva estaria surtando apenas pelo nome gravado em minha agenda. Não tenho tanta certeza se esse ciúmes ainda existe, confesso que amava a possessividade dela, o “minha” saindo pela sua boca com tanta confiança. 

Porra, como sinto falta dessa Cheryl. 

Mas agora ela não estava aqui, nem sei se ficaria tão enciumada quanto antes então, sair com Barbara não era uma má ideia, precisava ver pessoas além da academia, Debora e Lion. 

“Hey. Só me dizer o lugar e horário que estarei lá.”

×××

 

Quando estacionei em frente a cafeteria que encontraria minha ex, infelizmente meu pensamento foi direto a Cheryl, do dia em que nos reencontramos em uma cafeteria de Los Angeles, o quão boba fiquei ao vê-la mudada e ainda mais linda. Sentia muito sua falta, todos os dias, mas ainda não era o suficiente para acabar com o tempo que pedi. 

Sinceramente não tinha tanta raiva da ruiva, mas tristeza, as vezes penso que minha esposa está com Maeve e se sente bem com ela, que talvez não seja mais o suficiente, não tenha o que precise. Afinal, já faz dias desde a ligação onde disse que poderia visitar nosso cachorro, mas nunca apareceu. 

É, o orgulho nunca vai embora, nem mesmo quando está errada.

Soltei um longo suspiro, adentrando a cafeteria e procurando Barbara com o olhar, um aceno discreto chamou minha atenção. Arqueei as sobrancelhas ao ver seus cabelos mais curtos que o normal, estava na altura dos ombros, mais castanhos e ondulados. 

— Me atrasei? 

Perguntei, ela levantou para beijar minha bochecha.

— Não, eu que cheguei cedo. – deu de ombros, voltando ao seu lugar. — Como está? 

— Estou bem. – sentei a sua frente. — E você cortou os cabelos. 

Observei mais de perto, não poderia negar que minha ex fica bonita de qualquer maneira. Vi um sorriso abrir em seus lábios ao perceber que reparei no corte, Barbara adora ser notada.

— Gostou? 

Balançou os fios, nós rimos. 

— Está linda. 

Elogiei, a modelo sorriu ainda mais. 

Forcei a garganta. 

— Pediu alguma coisa? 

— Só café, mas já quero outro. 

Seu tom era animado. 

Concordei, fazendo um sinal para o garçom que se aproximou, fizemos nossos pedidos e em pouco tempo estávamos sozinhas novamente. Barbara parecia realmente alegre, a conheço o suficiente para saber que se encontra em um momento bom, sua expressão leve e distribuindo sorrisos. 

— Então, o que te traz a Seattle?

Perguntei demonstrando minha curiosidade.

— Minha sobrinha, barra, afilhada. – sorriu ao falar. — Sabrina está com quase nove meses, quero estar aqui quando nascer. 

— Ah, isso é incrível. – sorri com sua animação. — Faz algum tempo que não vejo aquele casal.

— Sério? Estou ficando na casa deles, já senti a Gracie chutar na barriga da Sabrina, a sensação é estranhamente boa. 

Acabei rindo do seu jeito de falar.

Antes que pudéssemos iniciar outro assunto, os nossos pedidos chegaram, apenas cafés puros e fortes. O garçom muito simpático saiu após nossos agradecimentos, um pequeno silêncio se fez presente entre nós duas. 

— Bom... – Barbara voltou a falar, soltando sua xícara no pires depois de beber um gole. — Você sabe o quanto cuido do meu corpo, não tenho ideia quanto tempo ficarei em Seattle e estive pensando sobre achar uma academia para me manter em forma.

Me encarou, os azuis penetrando. 

— Isso é ótimo! – a incentivei, a modelo continuou a me olhar enquanto bebia meu café. — Oh...

Só então raciocinei o que estava acontecendo.

— T, não quero te trazer problemas, mas não conheço ninguém aqui além do meu irmão, Sabrina e você. – justificou, o sorriso não aparecia mais em seu rosto. — É claro que se não der, acho outro lugar e...

— O que? Não. 

A interrompi, devolvendo minha xícara ao pires.

— Barbara, claro que pode ir pra minha academia, não terá problema nenhum. 

— Tem certeza? – encarou-me, assenti. — Mas... Como está a Cheryl?

— Bem. – respondi de forma simples voltando minha atenção ao café. — Focada no trabalho. 

Dei de ombros. 

— Como ela está em relação a Gracie?

— Uhn... Tranquila. 

— Entendi.

Murmurou, balançando a cabeça. 

— Quando você quer começar na academia? 

Mudei o rumo da conversa. 

— Amanhã mesmo se possível.

— Ótimo, estarei lá o dia todo amanhã. 

— Me diz como é ser dona da Team Topaz...

Pronunciou o nome de minha academia como se fosse um show, nós rimos e o clima ficou agradável de maneira que não sairia daquela cafeteria tão cedo. Barbara era boa em puxar assuntos, perdi a conta de quantos cafés tomamos, desabafei com ela até mesmo sobre a demissão do meu treinador. Foi um papo bom, gostoso, me fez esquecer o conflito por algumas horas. 

Só que bem, quando deitei na minha cama, exausta, a única coisa que queria para o dia ter sido perfeito era o corpo de uma certa ruiva para abraçar. É, apesar de tudo, ainda é ela.


Notas Finais


Um personagem novo e uma que já conhecemos muito bem, principalmente a Toni.


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