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História 1860 - Capítulo 11 Contos de Fada não são Reais


Escrita por: Doidorotto

Notas do Autor


A Fic "1860" busca esclarecer pontos que ficaram obscuros durante o episódio especial de Halloween de 2011 do jogo Amor Doce. Por isso, os personagens do jogo terão nomes e papéis levemente alterados, para encaixar-se nesse novo contexto.

Neste especial, sua docete é enviada ao passado, no ano de 1860, e conhece um morcego falante chamado Noir. Ele fala sobre o lorde vampiro do castelo, Dimitry, e a história de Mary Magdaleine.

Dimitry e Noir apresentam fragmentos do que aconteceu naquele lugar. Mary, e todos da cidade, foram infectados por uma misteriosa doença e a única esperança de salvá-la era levar a moça para o castelo, o único lugar seguro e livre da doença.
Dimitry se transforma em um vampiro e deseja transformá-la, mas, por algum motivo, ele não chegou a tempo e a garota morreu.

Qual foi a origem da doença? Quem era o vampiro que transformou Dimitry? Por que ele não chegou a tempo? Por que o castelo era o único lugar seguro? Estas são algumas respostas que a fic "1860" busca esclarecer.

Espero que gostem.

Esta fic é um spin-off da Fic, "Você é Meu Amor Doce", mas funciona em um universo único e separado, não sendo necessário a leitura de uma para a compreensão da outra. Mas, eu recomendo você ler. É uma fic muito boa! ;)
http://www.amordoce.com/forum/t31179,1-gl-iris-voc%C3%AA-%C3%A9-meu-amor-doce-parte-2-por-realdoido.htm

Capítulo 11 - Capítulo 11 Contos de Fada não são Reais



Quando você pensa que não há nada que possa piorar uma situação, a vida mostra que você se enganou da pior forma que ela pode. E, no caso de Sucré Hollow, não foi diferente.


Se o padre Lysandro era, como Airis descobriu, uma criatura das trevas, infiltrada no ventre da comunidade e ocupando um cargo altamente influente, orientando que seu rebanho se tornasse cada vez mais manso para que, em algum momento, eles fossem entregues como sacrifício para alguém.


A situação ainda era melhor do que a que estava acontecendo nos dias que se seguiram.


Primeiro: O fogo consumiu o interior da igreja.
Como o lugar era muito fechado e o fogo começou em uma câmara subterrânea, demorou muito até que o incêndio fosse perceptível do lado de fora. O que significava que o lado de dentro já estava destruído quando alguém viu que havia algo errado na igreja e a fumaça começou a escapar pela torre do sino.
Claro, aquilo foi um erro de cálculo de Airis, que imaginou que após a morte de Lysandro, o fogo consumiria todo o ar dentro da catacumba e se extinguiria. Porém, ela não contava com outra coisa.


Segundo: O corpo do padre.
Lysandro não morreu sem lutar. Ele não simplesmente ficou paralisado e aceitando ser queimado como um cordeiro no churrasco. Por ser muito fina e velha, a cruz de madeira que Airis usou para estocar o coração do vampiro queimou mais rápido do que o resto do corpo, permitindo que ele saísse da paralisia.
Livre da madeira, Lysandro usou sua força sobrenatural e o desespero do medo da morte para destruir a porta da catacumba e tentar fugir. Com isso, ele conseguia apenas espalhar as chamas para fora da área contida e destruir a pequena igreja da cidade.


Terceiro: A assassina
Não demorou muito para que alguém associasse o crime a única pessoa de fora da comunidade que havia frequentado a missa naquele dia. A bruxa francesa (ou inglesa, dependendo de para quem você perguntasse), que o Duque Olav levou para seu castelo.
Ela e a aquela outra bruxa que chegou com ela. Entraram na cidade, arrumaram brigas e chegaram carregando cabeças monstruosas. Tudo o que deu errado na cidade, começou exatamente no dia em que elas chegaram. Claro, isso se ignorarmos todos os inúmeros problemas já existem, mas, mesmo esses poderiam ser, de alguma forma, atribuídos a elas se os cidadãos pensassem um pouco.


Em sua defesa, Airis apenas dizia: “Nem inglesa e nem francesa. Sou irlandesa!”


Então, todos esses fatores combinados, resultaram na degradação da (pouca) moral que (ainda) havia na cidade.


Por pior que fosse, a igreja de Sucré Hollow ainda era o último bastião de decência que restava naquela cidade. Sem ela para guiar os passos daquelas almas para a luz, só sobrou desespero, caos e violência. Essas três coisas resultavam em mais trabalho para o capitão Nathan e os poucos soldados que restavam na guarda, por que, mesmo eles, começaram a se estranhar e começarem a querer resolver as diferenças entre eles.


– Quero ordem e disciplina nesse pelotão! – Nathan gritava com os soldados da guarda. – Eu quero decência e... cóf.. cóf...cóf... ordem! Entenderam?


Ele olhava para seus soldados e verificava suas vestes e aparência. Eles pareciam cansados e maltrapilhos. Com as vestes rotas e desarrumadas, além das barbas mal aparadas e o rosto sujo. Além de vários deles terem manchas de sangue na boca e nas vestes.


– Que desleixo! – Nathan segurou um dos soldados pela gola da camisa. – O que é isso? Esteve na guerra? Foi ferido por uma arma?


– Senhor... – O soldado ficou um pouco apreensivo. – Esse sangue não é meu!


– É mesmo? E então...


– Os prisioneiros! – Respondeu o rapaz. – Parece que estão brigando entre si nas próprias celas. Muitos tem manchas nas roupas e cospem sangue quando tossem.


– Neste caso, apenas cuidem para que eles não se matem! – Nathan ajeitou a gola do rapaz. – Mas, isso ainda não é desculpa para desleixo! Vão para os alojamentos, cortem essas barbas e coloquem roupas limpas! Quero que a cidade veja que está tudo bem e que somos capazes de cuidar da ordem e decência desse lugar. Dispensados!


Os soldados bateram continência e saíram, deixando Nathan sozinho no pátio. Ele tirou um lenço branco do bolso e limpou o canto da boca, que estava manchado de sangue. De surpresa, Lady Melody surgiu por trás dele e aplicou um beijo estalado em seus lábios. Nathan ficou nervoso e encabulado.


– Milady! – Nathan olhou para os lados, procurando algum de seus homens que poderia ter visto aquele gesto indiscreto. – No quartel não! Por favor...


– Não beijei o quartel! – Lady Melody respondeu rindo. – Beijei meu noivo. E mal posso esperar pelo dia de nosso casamento e quando poderemos partir desse fim de mundo.


– Então, é verdade mesmo isso... – Lady Ambre, muito descontente, observou a felicidade de seu irmão e sua “noiva”. – Já vou lhe avisando que, se eu puder intervir, meu pai não enviará um Franco Francês como dote.


– Fique com seu dote, Lady Ambre. – Melody grudou no braço de Nathan. – Casaria com seu irmão mesmo que fosse um homem completamente falido.


Ambre revirou os olhos e suspirou, até por que, sabia que lady Melody e sua família eram apenas nobres de fachada e que estavam entalados em dívidas. Casar com Nathan era uma forma de subir na hierarquia social novamente. Contudo, aquilo nem era o que mais a perturbava. O que mais a deixava furiosa era que Melody tinha um noivo e ela não.


– E quanto ao lorde Dimitry? – Melody falou. – Ouvi dizer que ele agora tem uma bela acompanhante... Qual o nome dela? Ambre? Ah... não... não é esse.


Ambre fulminou a garota com o olhar e Nathan apenas revirou os olhos, imaginando-se em meio daquela conversa. Precisava sair daquilo o mais urgentemente possível.


– Miladys, eu peço desculpas, mas vocês precisam se retirar. – Nathan deu o braço para Melody e Ambre, que esnobou a oferta. – Como sabem estão havendo conflitos entre as pessoas da cidade e não é seguro para vocês ficarem por aí.


– É verdade que lady Airis matou o padre Lysandro? – Melody perguntou. – Quer dizer, ela parecia tão valente e audaz na noite da festa, mas... por que ela faria isso?


– Talvez por causa da outra bruxa excomungada! – Ambre respondeu. – Matou o padre quando descobriram que não importam o que façam, estão condenadas ao inferno.


– Não sei as razões por trás das ações de Lady Airis... – Nathan disse. – Mas, certamente não é por medo de ir para o inferno. Além disso, elas ainda estão sob ordens e contrato do Duque, portanto, qualquer coisa que nós julgarmos justo fazer deverá esperar que elas terminem o que vieram fazer.


– O que for acontecer, por favor, que seja uma fogueira ou uma guilhotina. – Ambre respondeu. – A última vez que você tentou enforcar alguém não foi muito bonito.


– Matar alguém nunca é bonito, Ambre. – Nathan chegou até a entrada do quartel com as moças. – Às vezes se faz necessário, mas nunca é bonito. Vão direto para suas casas e evitem sair desacompanhadas. Uma boa tarde, irmã... – E deu um beijo delicado na mão da irmã.


– E lady Melody... – A garota deu um sorriso e colocou as mãos para trás, esperando seu beijo. Nathan suspirou derrotado e deu um rápido selinho nos lábios da noiva. – ...Cuide-se. Visitarei você hoje à noite, no jantar.


–  Aguardarei ansiosa. – Melody respondeu.


– Espere... – Nathan tirou do bolso seu lenço e limpou a pequena mancha vermelha no canto do lábio de Melody e mostrou para ela. – ...acho que me machuquei nos treinos, peço perdão.


– Não se preocupe, apenas chegue inteiro em casa. – Melody e Ambre foram embora, deixando Nathan na porta do Quartel.


O capitão respirou fundo e voltou para suas funções. Antes de ir para seu escritório, Nathan passou pela ala das celas e, para seu desgosto, ela estava lotada. Diversos cidadãos, ingleses e franceses, presos e divididos por suas nacionalidades, empurrando as grades da cela, batendo nelas e xingando. Quando algum deles tentava botar a mão para fora das grades, um dos soldados próximos agredia o prisioneiro com um bastão de madeira, ordenando-os que se mantivessem dentro das celas.


De onde estava, Nathan conseguiu ouvir os ossos dos dedos do prisioneiro francês que urrou de dor. Não era a conduta esperada ou encorajada pelo capitão, mas ele precisava manter a ordem.


****************************************************************************************************


– Que absurdo... O padre morto! A cidade se afundando em caos e, ainda por cima, tem marcas de bruxaria pintadas na parede do meu castelo! – Faraize de Olav estava furioso em seu escritório. – Eu me arrependo a cada minuto que penso que mandei chamar essas bru...


A porta do escritório abriu-se com violência, dando passagem para Deedra que arrastava uma carcaça de um lobo gigantesco, similar ao que atacou o castelo nos dias anteriores. O duque encolheu-se na cadeira em desespero, derrubando papeis da mesa e caindo no chão, tentando se proteger embaixo do móvel.


– Tentou entrar hoje... – A caçadora jogou a carcaça no chão. – ...agradeça as marcas de bruxaria depois.


– Ahh... ohh... ah... 


– Pare de se tremer como uma vara ao vento, duque! – Deedra girou o machado e encravou na cabeça do lobo, fazendo o sangue escurecido do animal voar pela mesa e manchar os papéis do duque. – Ele está morto!


– Bom... mas ainda assim... – Faraize cobriu o nariz com um lencinho perfumado. – Eu ainda insisto que remova essas marcas amaldiçoadas. Depois daquela noite, mandei reforçar a segurança em meus muros. Como posso ter certeza que a besta não foi morta por um dos meus homens?


– Esses aqui? – Airis entrou logo em seguida, arrastando dois corpos e fazendo uma listra de sangue no chão. – Eu acho que não...


– Arrrgghhh... – O duque Olav escondeu-se embaixo da mesa e o som que veio a seguir deixou claro que o estomago dele não aguentou a visão dos corpos.


– Eu disse que ele ia duvidar e precisar ver pessoalmente. – Airis olhou para Deedra e estendeu a mão. A contragosto, Deedra abriu a aljava e colocou duas moedas na mão dela.


– Pai? O que está acontece... Oh... meu Deus!! – Dimitry chegou correndo na sala do pai e quase tropeçou nos cadáveres. – Eu posso saber o que aconteceu?


– Viemos negociar com seu pai os termos do nosso acordo. – Deedra falou. – Estamos trabalhando muito aqui pelo que estão nos pagando.


– O que? Negociar? – Faraize de Olav saiu imediatamente de baixo da mesa. – Eu deveria cobrar de vocês o piso imundo de sangue e tripas! Não fizeram nada exceto encher a minha sala de corpos! O que vocês querem afinal?


– Pai, não se esqueça que elas salvaram nossas vidas mais de uma vez! – Dimitry tentou acalmar o duque. – Contudo, devo concordar que renegociar acordos no meio da execução do serviço não é...


– Não estamos querendo nada de mais, Duque. – Airis fez uma curvatura gentil. – Só uma carroça com dois cavalos para puxá-la!


O duque Olav olhou para Dimitry e depois para as caçadoras.


– Só isso? – Faraize perguntou com um pouco de desdém.


– Só isso. – Deedra falou.


– Podemos saber o motivo? – Dimitry disse. – É um pedido muito repentino.


– Planejávamos matar todos vocês e saquear o castelo. – Airis disse sorrindo. – Precisamos de algo para carregar o saque.


Faraize ficou branco e abriu a boca para gritar, mas foi interrompido pelas gargalhadas de Airis.


– Não ligue, duque! – Deedra empurrou Airis, que caiu no chão rindo. – Ela está bêbada!


– São 10 da manhã!


– Ela está um pouco atrasada. – Deedra deu de ombros. – Mas, o motivo é simples: Estamos de partida para o Grande Castelo no Alto do Morro e temos alguns equipamentos para levar. Muito peso para carregarmos conosco. Precisamos de cavalos e um carro.


– Só os cavalos não são suficientes? – Faraize ainda tinha um pouco de desconfiança.


– Mostramos para eles? – Deedra olhou para Airis, que ainda rolava no chão de rir. A ruiva apenas ergueu o polegar positivamente. – Bom, então ok. Querem nos acompanhar?


Deedra, seguida por Faraize e Dimitry saíram do escritório, desviando dos corpos e da carcaça do lobo. Poucos segundos depois, a caçadora voltou e pegou Airis pelo colarinho e a puxando para fora da sala de reunião. A ruiva levantou-se do chão ainda rindo e foi cambaleando para fora do salão. Os guardas ficaram intrigados com o que havia de tão engraçado naquela sala.


Não foi agradável quando eles descobriram.


O grupo foi em direção a um velho estábulo que estava largado a alguns meses. Quando elas chegaram ao castelo, rapidamente dominaram o lugar, impedindo qualquer um de entrar. Nem mesmo os duques sabiam da “invasão” do local, já que após a construção de um novo e maior local para os cavalos, aquele barraco seria demolido.


– Compramos isso em uma viagem à América… – Deedra abriu uma das portas menores do celeiro. – ...É um projeto meio novidade, até mesmo por lá! Parece que ainda nem foi patenteado.


Eles foram até o fundo do barracão, onde, alguma coisa estranha estava coberta por uma lona pesada. Tinha a altura de uma mesa, o comprimento de cavalo e era um pouco mais largo do que um cano de chaminé.


– E o que é isso? – Dimitry estava receoso com a coisa coberta. – E por que está aqui nesse galpão. Nós iriamos demolir ele.


– Mais um motivo para ele estar aqui! – Airis falou. – Porque, se estivesse em outro lugar, vocês provavelmente teriam que demolir esse lugar também!


– Em nossa viagem para cá, perdemos nossa carroça e as rodas dele. Ele ficou atolado e precisou ser desmontado. – Deedra continuou. – Conseguimos recebê-lo de volta e ficamos um tempo para limpar e consertar!


– E aprimorar… claro! – Airis interrompeu.


– Mas, agora... Precisamos de uma carroça para usar na nossa próxima missão e levá-lo embora. – Deedra bateu no embrulho. – E então, tem algo que sirva? 


– E podemos ver? – Faraize torcia o nariz para o objeto. – Uma demonstração?


Deedra e Airis se entreolharam por alguns segundos. Olharam em volta para o celeiro velho e deram de ombros.


– Preciso de toda a munição dos seus soldados e de bastante pólvora. – Deedra respondeu. – E dois cavaletes de madeira.


– Munição e pólvora? Quer dizer que isso é uma arma? – Faraize olhava para o embrulho sem entender muito bem. – Bom, posso conseguir algumas coisas dessas, mas é bom que valha a pena.


– Valerá!


Não demorou muito para que os soldados de Faraize levassem a pólvora e as balas pedidas por Deedra. Com tudo em mãos, o cavalete foi armado a mais de 200 passos do velho celeiro, de onde as caçadoras saíram carregando o embrulho de lona. Dimitry correu para ajudar, mas elas dispensaram o auxílio do rapaz.


Elas colocaram o pesado embrulho sob os cavaletes e respiraram fundo. Poucos minutos depois, Mary Magdalene chegou ao campo aberto. Dimitry explicou que a chamou para ver o que seria demonstrado. Airis e Deedra deram de ombros. Apenas Faraize parecia incomodado com a presença da moça, mas depois, voltou a atenção para o embrulho.


– E então?


– Tem certeza que o galpão não será mais usado? – Airis falou. – Por que acho que ele será um bom alvo.


Faraize apenas abanou a mão indicando que fossem em frente. Deedra e Airis começaram a desembrulhar a máquina. Era um grande tubo de metal, com oito tubos menores por dentro, unidos por um aro de metal e uma armação metálica em forma de caixa na traseira com um mastro de metal, além de uma manivela dourada na lateral. Haviam também armações em forma de eixo que sustentavam a engenhoca, onde, suspeitavam, deveriam estar as rodas e um tipo de assento.


– Mas, o que é isso? – Mary Magdalene chegou perto do estranho objeto. – Parece fascinante!


– Isso é o futuro! – Airis falou e sentou-se no assento da máquina. – Bom, talvez eu não consigo muita precisão por que meu aprimoramento na mira dependia das rodas e, bom, estou sem elas aqui. – E colocou nas orelhas pedaços grandes de algodão. – Deedra…


– Coloquem nas orelhas, por favor. – Deedra entregou os pedaços de algodão aos espectadores. – E, aconteça o que acontecer, não corram. Principalmente em direção a Airis. Estarão seguros aqui. Mandem seus soldados ficarem longe!


– Mas, por que?


– Porque eles certamente virão para cá correndo! – Deedra colocou seus pedaços de algodão nos ouvidos. – E não vai ficar bom para eles se tentarem parar a demonstração no meio.


– Bom, pode começar quando quiser! – Faraize gritou, já com as orelhas cobertas. – Espero que isso valha meu tempo e uma carroça.


Airis grudou em um apoio com a mão esquerda e na manivela com a direita, começando a girá-la com força. Nada aconteceu. Então, ela olhou para trás e deu de ombros para Deedra. A caçadora suspirou e correu até a máquina, debateu algo aos gritos com a companheira e mexeu na manivela. Faraize suspirou de desgosto.


– Pronto! – Deedra berrou para os presentes. – Agora vai funcionar.


Novamente, Airis começou a girar a manivela do maquinário com toda sua força, mas, dessa vez, os canos de aço começaram a girar e fazer um barulho metálico alto, como se fossem enormes rodas de um trem em uma superfície irregular.


– É só… – Fariaze disse. – Ele gira e…


BRÁBRÁBRÁBRÁBRÁBRÁBRÁBRÁBRÁBRÁBRÁBRÁBRÁBRÁ...


O inferno começou a soar alto no campo e as paredes do velho estábulo despedaçavam rapidamente numa linha reta de destruição. O duque caiu no chão e cobriu a cabeça tentando se proteger do barulho insuportável. Mary agarrou-se a Dimitry e escondeu a cabeça no peito do rapaz. Dimitry e Deedra foram os únicos que continuaram assistindo a cena.


Quase todos os soldados do Duque vieram correndo para ver de onde veio o barulho absurdo, e Dimitry teve que correr e sinalizar para que eles parassem e recuassem. Por mais que ele gritasse que eles recuassem, os soldados também não pareciam muito animados em tentar impedir aquela estranha garota estava fazendo.


Airis continuava girando a manivela e forçava com que a máquina se deslocasse, tentando não a derrubar dos cavaletes. A parede do estábulo era consumida por diversos buracos, cada vez maiores, fazendo com que as lascas de madeira chovessem para todos os lados.


Depois de alguns minutos de barulho insuportável, Airis soltou a manivela e os tubos pararam de rodar e o barulho parou. Ela saiu do assento e começou a pular de alegria. Deedra correu até ela e a abraçou, ambas comemorando o funcionamento da máquina.


Tanto Dimitry quanto Mary ficaram surpresos ao ver a felicidade das caçadoras. Principalmente depois da noite do aniversário da morte dos sobrinhos de Deedra.


– Espera que ainda não terminou! – Airis gritou e foi novamente até a máquina. – Agora vem a minha modificação.


Ela mexeu em algo e o tubo rugiu um barulho infernal e lançou uma enorme labareda de fogo que atingiu a parede do estábulo e manchou de preto a pintura velha e desgastada. Em poucos segundos, a madeira estava em chamas e a a estrutura do celeiro não aguentou e cedeu em uma pilha de madeira e fogo.


– Vocês não iam usar mais ele, não é? – Airis perguntou ao duque que levantava do chão, assustado e tremendo. – Porque agora não tem mais volta.


– Mas, o que é isso? – Dimitry tirava os algodões dos ouvidos. – O que é essa coisa?


– Os americanos chamam de “Gatling Gun” ou metralhadora. – Airis disse. – Dispara mais de 1000 projéteis por minuto! É quase como uma artilharia completa! O fogo foi uma modificação minha.


– Se usado contra humanos… Isso seria suficiente para um genocídio. – Mary falou. – Uma coisa destas não deveria existir! Isso não pode ser o futuro!


– Lamento milady, mas, se tem algo que nós somos bons em fazer… – Deedra respondeu. – ...É criar formas de matar! E, infelizmente, tenho a certeza de que isso não terminará aqui!


– Vocês… vão usar… isso contra os inimigos do Castelo da Colina? – O Duque de Olav finalmente recuperou sua postura e aproximou-se da arma. – Irão destruí-los com isso?


– Se tivermos a oportunidade... Sim! – Airis respondeu.


– Senhoras, vocês terão sua carroça e seus cavalos. – Faraize curvou-se brevemente.


– Pai? Mesmo os homens que possam estar cometendo quaisquer atrocidades naquele lugar não merecem enfrentar uma coisa destas! – Dimitry tomou a frente. – São humanos! Tem coração!


– Não, Dimitry! – Faraize respondeu. – Eles não têm. – E foi embora, levando os soldados com eles.


**************************************************************


A tarde foi toda dedicada a levar e montar a arma infernal na carroça de viagem e reunir os suprimentos necessários. Precisavam levar apenas o essencial e muitas armas pois, segundo o duque, enfrentariam um grupo bem treinado e armado. Mas as caçadoras temiam algo ainda maior.


Deedra caminhava apressada pelos corredores do Castelo, rastreando e procurando algo. Abrindo todas as portas do castelo e colocando a cabeça para dentro, como um predador caçando. Porém, foi na cozinha que ela localizou suas presas.


– Mary Magdalene! Senhora Shermansky! – Deedra foi até as duas mulheres que estavam sentadas próximo a mesa e debatendo sobre o jantar. – Preciso de ajuda.


Mary e Shermansky olharam-se surpresas.


– Você? Precisa da nossa ajuda? – Shermansky disse.


– É outro lobo? – Mary respondeu, um pouco nervosa e um pouco animada. – Se for, estou pronta para lutar!


– Não é nada disso! – Deedra puxou as duas de suas cadeiras. – Venham comigo!


***************************************************************************************************


Como soldados, as três mulheres caminharam em direção ao novo estábulo do castelo, esse sim, bem forte e arrumado, com cavalos e éguas presas em suas baias, recebendo os cuidados necessários dos tratadores. Alguns ajudavam Airis com a armação da metralhadora, usando a força e seguindo suas instruções.


Apesar de ela ser a única garota naquele lugar, nenhum deles ousou questionar a moça e nem tentar algum galanteio ou conversa mais indiscreta. Eles já tinham visto o que aconteceu ao celeiro velho e preferiam manter a atitude mais profissional. Airis, por outro lado, imaginava se aquelas armações e vigas de madeira suportariam uma boa rajada de tiros de sua arma. Se tivesse tomado mais uma garrafa de vinho naquele dia...


Dimitry também estava presente, sem seu casaco de veludo e colete refinado. O rapaz havia prendido os cabelos com uma fita de cetim vermelha e arregaçado as mangas da camisa para pegar o peso da metralhadora e ajudar na montagem do projeto. Suado e com sua camisa aberta, Dimitry não se diferenciava daqueles outros homens, exceto pela barba muito bem-feita e pelos olhos brilhantes.


Até Airis não conseguiu deixar de reparar no peito forte e braços bem torneados de Dimitry, apesar do corpo magro e esbelto. Ela só lamentava o fato do rapaz ser muito pálido. Ficou pensando se não lhe faria bem alguns dias no sol e deixar aquela pele branca um pouco mais dourada. Ela iria, acidentalmente, comentar isso com Mary e os benefícios da luz solar na saúde das pessoas. Mas, depois, por enquanto, ela iria aproveitar a visão para ela mesma (“por questões cientificas, é claro!” ela pensou).


Deedra, Mary e Shermansky chegaram ao estábulo, como se fosse soldados prontos para a guerra. Airis e os homens do duque ficaram até um pouco intimidados com a postura das mulheres. A caçadora apenas encarou os homens e acenou com a cabeça para que eles saíssem. Ninguém questionou a ordem silenciosa.


– Bom, com licença... eu vou indo também... – Dimitry desenrolou as mangas aos poucos. Mary não pode deixar de notar o peitoral exposto do rapaz e ficou vermelha na hora. – Tenho outras coisas a resolver...


– Pode ficar, Duque! – Deedra levantou a mão para ele.


– Por que eu estou me sentindo como se fosse uma criança que foi pega fazendo alguma traquinagem e agora eu devo confessar isso aos meus pais? – Airis olhou para a tropa de mulheres. – Juro que aquela garrafa de bordô já estava vazia pela metade!


– Airis... – Deedra estendeu para ela um lenço. – Eu fiz isso para você.


– Nossa... Estava mesmo precisando. – Airis pegou o lenço e começou a secar o suor do rosto. – Obrigada!


– Senhorita?? – Shermansky ficou horrorizada com atitude.


– Milady Airis... por favor... – Mary correu para pegar o braço dela e fazê-la parar. – Olhe com atenção!


– Mas, o que? Eu só... – Airis olhou o lenço e ficou em choque. – Oh... ai caramba! Deedra... Mas, eu... oohhh... Eu...


– Posso saber o que está acontecendo? – Dimitry terminou de arrumar a camisa e vestir o colete (para decepção de Mary).


– É um pedido de casamento, duque. – Mary sussurrou para o rapaz. – É uma coisa tradicional do país dela. Ela costura um lenço, com uma marca bordada e oferece a noiva.


– Deedra... Eu... – Airis olhava para o lenço e para ela. – É claro que eu aceito!


Ela sorriu, pegou a mão de Airis e enrolou o lenço bordado em torno das mãos delas. Deedra puxou o rosto da noiva para mais perto de lhe deu um beijo. Shermansky, apesar de seu estranhamento e discordância daquela relação, achou aquela cena bonita. Dimitry sorriu e olhou para Mary, mas a moça parecia muito entretida com a situação entre as caçadoras e não o encarou de volta.


– Mas, não tem um padre aqui e... Bom, mesmo que houvesse... – Airis olhava o lenço e sorria. – Eu não sei o que fazer... Não sei o que dizer.


– Me permitam... – Dimitry tomou a frente. – Legalmente, meu pai tem a autoridade para realizar casamentos.


– Ele... não nos aprova! – Deedra falou. – Eu... tentei conversar com ele sobre isso, mas... Ele não aceitou.


– Isso é um fato, milady. – Dimitry respondeu. – Porém, essa mesma autoridade se estende a mim e, se vocês quiserem...


– Ficaríamos honradas! – Airis respondeu. – Muito obrigada.


****************************************************************************************************


Naquela mesma noite, Airis, Deedra, Dimitry e a senhora Shermansky se juntaram próximo a uma fogueira e realizaram uma simples e bonita cerimônia de casamento. Simples, discreta, mas muito bonita. Apenas uma coisa faltava: a presença de Mary.


Poucas horas antes da cerimônia, Mary estava ajudando Airis a colocar um vestido branco, simples, justo no corpo e uma humilde guirlanda que Shermansky trançou com algumas flores do jardim. Mary elogiou a atitude de Deedra e parabenizou as moças por sua união, mas quando Airis entregou o buquê e pediu que Mary fosse sua madrinha.


– Eu não posso! – Mary rejeitou o presente. – Sinto muito. Não posso lhe dar mais falsas ilusões do que o que ele já cultiva.


– É claro que pode! – Airis respondeu. – Olhe para mim! O mundo inteiro me condenaria hoje. Me jogariam na fogueira... quer dizer, seria mais um motivo dos milhares que eles já têm para me jogar numa fogueira, mas, mesmo assim... Por que não?


– Meu destino não é livre como o de vocês! – Mary falou. – Preciso cumprir promessas e acordos que foram feitos a muito tempo e, se eu tentar fugir dele... Eu preciso ir!


– Venham vocês dois com a gente! – Airis respondeu. – Largue tudo! Venham conosco e vamos sair caçado criaturas sobrenaturais! Você foi ótima com aquele rifle!


– Gostaria que fosse tão simples, mas não é! – Mary sorriu para a possibilidade de largar tudo. – Minha mãe ficaria sozinha no mundo e não sei o que seria dela sem mim. E além disso, não acho que milady Deedra apoiaria essa sua ideia.


– Com ela eu me viro! – Airis pegou a mão de Mary e apertou com carinho. – Mas, eu entendo. Então, tudo bem. Eu só lamento pelo duque... E por você!


– Lamente apenas por ele! Eu sempre soube da verdade e nunca me deixei enganar. – Mary respondeu. – Só queria que ele não tivesse sido arrastado para isso comigo.


– De que verdade você está falando?


– Contos de fada não são reais.


****************************************************************************************************


Pouco depois da meia-noite, quando apenas os ratos magros e doentes corriam pelas ruas procurando algo para morder, os soldados do Capitão Nathan patrulhavam a cidade, em busca de possíveis brigas e problemas. Nathan estava decidido a impedir a eminente guerra civil que se alastrava entre os cidadãos de Sucré Hollow.


Com pouco mais da metade dos homens da cidade na cadeia, apenas algumas mulheres e meretrizes passeavam pelas calçadas em busca de alguma forma de ganhar a vida, mas sem muito sucesso. Nathan vigiava pessoalmente seus soldados e não permitia distrações. Naquela noite, a ordem reinaria absoluta.


Porém, não era ali que o problema estava.


Toc Toc Toc


O soldado acordou assustado, pulando de sua cadeira e correndo em direção a porta da prisão. Não esperava que o capitão Nathan voltasse tão cedo. Graças a Deus, seja lá pelo motivo que for, ele resolveu bater na porta.


O jovem de cabelos pretos que fazia a segurança do quartel e da cadeia arrumou apressadamente suas roupas e limpou a baba que escorria pelo canto da boca, deu alguns tapinhas nas bochechas para despertar e estufou o peito. Colocou sua espada na bainha e marchou orgulho para a porta.


– Boa noite, Capitão! – O rapaz abriu a porta e fez uma continência. – Tudo está em ordem e...


Um cano metálico surgiu em frente ao rosto do soldado.


– Muito bem soldado... – Dakota surgiu na porta do quartel. – Agora, você pode descansar.


Continua...



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