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História 1968 - Péssimo negócio


Escrita por: 0Pantsu0

Capítulo 2 - Péssimo negócio


 

Péssimo negócio

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Mal funcionamento

 

Bonnibel não estava agindo corretamente. Ela era a melhor aluna da turma, aquela que tinha méritos e honras dos professores, que todos queriam ser parceiros nos laboratórios, porque a garota era uma enciclopédia humana. A garota diligente, séria em seus estudos, que tinha o mínimo de contato social, e analisava tudo numa questão de custo e benefício estava meio estranha. Nas últimas duas semanas ela estava mal funcionando. Alguma parte do seu corpo devia estar com mal contato e isso estava danificando seu sistema. Só podia ser isso. Ela errou uma questão simples de química e se esqueceu do ano da independência do próprio país. Tirou a primeira nota abaixo de nove (um 8.8, diga-se de passagem) porque esqueceu que poderia simplificar uma expressão. E toda essa bagunça começou por causa de uma certa vampira que estava atazanando seus sonhos e acabando com suas noites de sono.

Uma semana. Três encontros. Com Marceline. A bendita vampira. Marceline Abadeer era o seu nome completo. Essa era a pessoa que estava destruindo sua vida escolar atualmente. Ridículo. Isso tudo era ridículo. Bonnibel não admitia, pois ela não tinha uma paixonite em uma garota que aparecia em seus sonhos. Ela nem sabia se tudo aquilo era um sonho completamente maluco de sua cabeça! Porque, sério, sonhos compartilhados? Com alguém que alega viver mais de noventa anos atrás? Em outro país? Sério?

Não importava. Ela não tinha paixonites. Não tinha tempo para isso. Ela só tinha tempo para livros. Aulas. Laboratórios. Em encher sua mente com mais e mais informações, decorar cada vez mais datas, nomes, acontecimentos, fórmulas, até tudo aquilo estar em sua memória muscular. Ela não tinha paixonites. Sua única paixão era a ciência. E não vampiras com longos cabelos negros, pele pálida, atitudes faceiras e ousadas, com um riso frouxo e fofo, e que tinha uma voz maravilhosa quando resolvia cantar, com uma marca de presas no seu pescoço, além de uma personalidade cativante, fora que-

Bonnibel não tinha paixonites.

 

A vida não era tão fácil

 

Bonnibel aprendeu da maneira mais difícil de que a vida não era tão fácil. Duas semanas. Cinco encontros. E as coisas estavam começando a ficar intragáveis. Quem era ela? Bonnibel? Não, não podia ser. Bonnibel era um poço de inteligência, alguém que todos ficavam boquiabertos e batiam palmas. Uma garota desejada, não só por conta de sua aparência, mas por conta de seu sobrenome e do que ela conquistou dentro daquela academia. Essa pessoa que se encontrava surtando, e pensando em uma tal de Marceline, nos seus sorrisos, trejeitos, atitudes irritantes, em como seria fascinante tocar na pele fria da vampira, sentir o choque térmico entre seus corpos, no meio da aula de história sobre a Alemanha (que ironia) não era Bonnibel. Era alguém muito parecido com ela, mas não era ela.

Seu rosto não era uma máquina de virar tomate toda vez que pensava em Marceline. Quem era essa garota para lhe fazer passar por isso? Tinha que dar um basta. Tinha que arrumar alguma forma para acabar com aquele sonho. Bonnibel era uma cientista nata, uma líder natural. Ela iria comandar equipes científicas, pesquisas de cunho secreto e que mudariam o mundo. Quem Marceline Abadeer pensa que é para invadir seus sonhos, seu momento de maior privacidade, momento esse que antes era permeado por resoluções de exercícios e prêmios Nobel sendo recebidos, e corrompê-los por inteiro? Se fosse com qualquer outra vítima de sua sedução poderia ser diferente, mas ela era Bonnibel! Uma mulher do futuro, que não seria uma mera dona de casa! Uma mulher de atitude! E que não se rebaixaria aos encantos de uma vampira qualquer.

Vampiros, haha. Eles nem existiam.

 

Ah, o primeiro amor.

 

Seria fácil esquecer de Marceline, se a garota não vivesse dentro da sua cabeça. Fizesse parte da sua vida. O que ela iria dizer para as poucas amizades que tinha? Ou para a psicóloga? Uma vampira sedutora está atrapalhando meus sonhos? Era capaz de mandarem ela para um psiquiatra. O que ela já estava cogitando.

Ah, o primeiro amor. Veio forte na vida da doce Bonnibel. Ela ainda se encontrava em negação. Iria demorar para admitir. Para uma pessoa que sempre pensou de forma bastante lógica, o amor era realmente um misticismo para Bonnibel. Ela amava os pais dela, mas não entendia. Porém foi um amor cultivado ao longo de anos, e um amor parental. Agora, amar uma outra pessoa? Um estranho? O cérebro de Bonnibel não estava atualizado para isso. Não havia sido treinado para essa situação, era uma situação que não estava nos livros. Ela já havia visto filmes de romance, viu James Dean e principalmente Marilyn Monroe arrasar corações. Ela sentia coisas por Marlene Dietrich. Mas era algo tão distante, tão fora da sua realidade. Parecia pouco palpável. E diferente da física e da química, onde a matemática estava ali para provar que sim, era possível, no amor, Bonnibel não podia contar com os números. No amor tudo era um axioma, nada era derivado em nada, não havia lógica nas proposições.

É por isso que aos dezessete anos, Bonnibel, ao experimentar o amor pela primeira vez, pifou. Ela se sentia numa prova, sem nunca ter visto o assunto. Qual seria resposta correta? Aliás, ela não queria estar fazendo essa prova. Pois ela não tinha uma paixonite em Marceline Abadeer. Nunca. E mesmo se talvez, só assim, se talvez nutrisse algo do tipo - o que ela não nutria - ela nunca admitiria.

Ah, o primeiro amor.

 

Terceiro encontro

 

A terceira vez em que elas se encontraram foi um momento chave. Pois foi o primeiro momento em que Bonnibel pifou. Marceline continuava a flertar indiscriminadamente com ela, e apesar de se convencer que aquilo era apenas parte de uma sedução barata da vampira, Bonnibel aos poucos foi cedendo.

E a vampira nem parecia tentar. Muitas vezes, a Abadeer apenas ficava a observando, vendo cada movimento seu, admirando como se fosse um filme do Billy Wilder.

 

“Tem como parar de me encarar? Eu quero que tudo isso aqui se torne mais suportável e você não tá ajudando”.

 

“Eu posso ajudar a fazer desse sonho mais suportável…”  O tom de Marceline carregava segundas e terceiras intenções. “Você tá namorando? É por isso que tá sendo tão chata comigo?”

 

“Eu não vou lhe responder isso, monstro. ” Bonnibel ainda estava pensando em como usar de forma eficiente aquele tempo em que estava sonhando lucidamente.

 

“Oh, então você não tá… como uma garota bonita que nem você tá solteira? Tem alguma lei aí nos EUA que impeça garotas de cabelo rosa pastel de namorarem? ” Bonnibel não deu ouvidos, gastando seu tempo em desenhar um projeto de torre de destilação bem mais aprimorado. Uma luz acendeu em cima da cabeça de Marceline. “Ah, é por isso que você não consegue lidar com flertes… você é solitária, não é? Não deixa ninguém se aproximar de você. ”

 

A humana começou a desenhar com mais força, marcando o papel. Essa vampira era insuportável. “E daí se eu não namoro?! E daí se eu quiser ser uma mulher independente, os tempos mudaram, eu não preciso de um marido para viver! Eu já sou casada com a ciência e-”

 

“Você realmente precisa dar uns amassos em alguém. E talvez você precise de uma esposa. Você tá olhando pra uma candidata agora mesmo. Quer que eu mande meu currículo, eu posso escrever um agora mesmo. ”

 

E lá estava a visão preferida de Marceline nos últimos dias. Uma Bonnibel vermelha, atropelando as palavras, resmungando qualquer coisa para si. A vampira se acostumou tão rapidamente em ver essa cena, e apesar de já ter visto tantas vezes e em tão pouco tempo, ainda não havia enjoado. Aquela garota realmente lhe atraía, sabe-se lá o motivo.

 

“Você fica adorável quando parece um tomate…”

 

“Para de fazer isso comigo! ” Aí estava uma outra visão que Marceline não sabia se gostava. Bonnibel irritada.

 

E dessa vez ela parecia tão furiosa que magicamente uma estaca apareceu em suas mãos e foi jogada em direção a Marceline, que conseguiu desviar.

 

Aquela tinha sido a primeira vez que algo do tipo havia acontecido. “Como você fez isso? ” Perguntou Marceline, boquiaberta.

 

Bonnibel não lhe respondeu, no lugar disso, fez aparecer ainda mais estacas e continuou a jogá-las na vampira. Ela também não sabia o que estava causando aquilo, mas agradeceu por finalmente poder revidar as provocações da garota.

 

“Para de jogar isso, você vai acabar me machucando, ei! ”

 

Marceline não teve opção, a não ser assustar Bonnie, transformando-se em algo parecido com um lobisomem. Aquilo fez a rosinha se tremer de medo, o suficiente para que ela parasse de lhe jogar estacas.

 

“E eu que sou a insuportável…” Retrucou, voltando a sua forma humanoide.

 

Bonnibel estava mais tranquila, mas não menos irritada. "Porque você é tão insistente?!"

 

"Porque? Porque você é obcecada com essa coisa de ciência?" Deu um riso jocoso. "Provavelmente deve ser o mesmo motivo pra eu ser tão insistente. Quando a gente encontra algo que gosta, é natural você querer fazer de tudo pra se aproximar..."

 

Bonnibel voltou-se para a mesa, ela não queria lidar com vampiras, os livros e filmes que havia assistido não lhe davam nenhum guia.

 

"Eu tô tentando me concentrar. Tem como por favor ficar calada? E é engraçado ver você falar que algo é natural, já que, se você existe mesmo, é tudo menos isso... "

 

Marceline não respondeu. Continuou admirando a humana do seu lado do quarto. Essa era outra visão que adorava. Quando Bonnibel estava concentrada, sentia que a mente da garota estava divagando em fórmulas, referências e livros. E quando não entendia, não sabia para onde ir, ela colocava seus cabelos para trás da orelha, como um tique.

 

"Eu sinto que você tá olhando pra mim. Tem como parar isso?"

 

Marceline arquejou. Como aquela garota era difícil. "Quando você vai parar de fingir que não gosta de mim? Até onde vai levar esse personagem?"

 

Bonnibel forçou uma risada, tentando esconder que estava ruborizada. "Até onde você vai se enganar que eu tenho algum interesse em você? Nós só estamos juntas por causa desse sonho idiota. Eu não gosto de você. Me deixe em paz." Buscou falar do jeito mais ríspido e no tom mais sério que tinha. Acabou saindo uma imitação do que seria um tom sério.

 

"Pfft, princesa, eu consigo ver que você tá vermelha. Sabe, sendo alguém com a pele fria, é fácil eu perceber qualquer mudança na temperatura. E quando você me vê… seu corpo fica mais quente. Você pode negar quantas vezes quiser, mas seu rosto e seu corpo vão acabar dizendo a verdade." Marceline voltou a flutuar, na posição de lótus.

 

Bonnibel era um tipo de pessoa que gostaria de ter controle de tudo em sua vida. De todas as situações, dos pensamentos, do seu futuro, dos seus sentimentos. Esse último era bem mais difícil. Bonnibel achava que tinha conseguido domá-los. Achava. Até uma tal de Marceline jogar por água abaixo seus achismos.

 

"Eu. Não. Estou. Interessada. Eu não gosto de garotas, para começar." Mentiu. Repetiu o que havia dito. Qualquer coisa para se manter no personagem.

 

As gargalhadas da vampira eram altas, o ar chegava a sair até pelo nariz. "1968 e isso ainda é um tabu? Você é péssima em mentir sabia, nunca pense em seguir carreira na política."

 

"Porque você não acredita em mim?"

 

"Quanto mais você nega e quanto mais você precisa da minha aceitação, mais fica na cara que você está interessada. Não precisa se desgastar com isso Bonnie. Eu não estaria flertando com você se eu não soubesse que é recíproco."

 

Bonnibel estava travando uma luta ali. Entre sua parte racional e sua parte sentimental, negligenciada por tanto tempo. Era a tal dicotomia de Apolíneo e Dionísio que Nietzsche sempre discorria em seus livros. A razão subverteu tanto a loucura na cabeça de Bonnibel, que quando a loucura teve uma brecha para escapar, ela era um monstro reprimido, que não esperava para recuperar o tempo perdido.

 

“Nos seus sonhos talvez seja recíproco. Oh, veja só, estamos nos seus sonhos. É por isso que você tá se enganando. ” Tentou soar sarcástica.

 

“Pare de esconder seu rosto e olha pra mim. Diga nos meus olhos que você não gosta de mim. Se você fizer isso, eu paro de lhe importunar. ”

 

Bonnibel olhou para a vampira, a encarando. Marceline arqueou suas sobrancelhas, desafiando a humana a realmente dizer aquelas palavras. Uma pequena parte da vampira acreditava que Bonnie poderia ser tão cabeça dura ao ponto de negar que estava atraída por ela.

O tempo corria e Bonnibel não conseguia responder. Havia alguma coisa dentro dela que a impedia, as palavras morriam na garganta e elas tinham um gosto amargo. Não queria proferi-las. Mas era o mais lógico a se fazer, porque Bonnibel não estava afim de Marceline. Ela já tinha deixado isso bem claro, porque infernos os sentimentos dela não a escutavam?

 

“Viu, você não consegue dizer. Então deixa eu te dizer algo… você fica bem fofa quando tá confusa. ”

 

Marceline conseguiu se desviar da segunda chuva de estacas que veio depois.

 

Quinto encontro

 

O último encontro das duas foi bem menos agressivo. Também teve bem menos conversas. Bonnibel procurava evitar ao máximo engajar em conversações com Marceline. Entrar em suas provocações. Era um esforço gigantesco, mas a partir do momento em que Bonnibel começou a usar aquele sonho para estudar, as coisas melhoraram. Ela conseguia fazer algo que nenhuma outra pessoa conseguia, estudar enquanto dormia. Isso iria poupar seu tempo acordada, adiantar a matéria e garantir suas notas máximas. E ela poderia, talvez, aproveitar o tempo livre para socializar.

Mas Marceline não a deixaria em paz, não assim tão fácil. E Bonnibel estava tão frustrada com seu boletim, com suas notas, em como aquela garota estava conseguindo aos poucos entrar na cabeça dela e atrapalhar sua vida.

 

"Hey, o que você está estudando?"

 

"Algo que você não se importa e deve achar chato."

 

“Wow, não precisa ser rude. ” Marceline brincava com aquele instrumento chamado baixo. No meio de suas conversas com Bonnibel, a vampira acabou descobrindo algumas novidades sobre o futuro. “Eu só fiz uma pergunta. ”

 

“Rude? Você tá me importunando desde o momento que esse sonho começou! Flertando comigo…”

 

“Não é como se você não gostasse…” Marceline testava algumas notas e um dedilhado.

 

“Eu não gosto! Quem disse que eu gosto?! Isso… isso… isso é assédio! É isso que você tá fazendo. ”

 

“OK, se acalma, eu não tô nem tocando em você, eu nem consigo. E você tá exagerando. Eu não sou uma tarada. Você gosta de mim, mas tem vergonha de dizer. ”

 

Bonnibel levantou-se, suas duas mãos na mesa. Como que uma vampira conseguia lhe enfurecer tão rapidamente? Bastava algumas palavras, um tom de voz errado e ela já estava a ponto de enlouquecer. “O que eu tenho que fazer pra você parar? ” Disse a encarando firmemente.

 

Marceline fez desaparecer o seu baixo. “Nada. Você não pode fazer nada. Talvez um encontro, quem sabe se eu entrar no seu lado do quarto…”

 

Não adiantava. Tudo que saía da boca de Marceline eram cantadas e flertes. Ela não conseguia sustentar uma conversa com a vampira. E isso era a culpa da vampira. Não do seu cérebro que hiperventilava e que acabava balbuciando palavras, ou por não conseguir encarar ela nos olhos sem ficar vermelha. Culpa dos seus truques de sedução baratos.

Ela não entendia como funcionava essas feitiçarias de vampiro, mas uma pessoa para cair nelas precisava estar fraca da cabeça, não é? Tipo, estar predisposta? Por isso que os vampiros seduziam. E Bonnibel não tinha a mente fraca, essa Marceline nunca iria afetar a cabeça dela com suas magias ou seus olhares, ou seu rosto, ou seu sorriso, ou como o corpo dela parecia se encaixar perfeitamente no seu, ou suas péssimas cantadas ou…

Ela tinha uma prova para estudar. E era isso que iria fazer. Estudar.

Marceline notou a mudança de humor de Bonnibel, voltando a ficar focada em alguns livros e cadernos e não tornou a tocar o baixo. Aqueles sonhos que estava tendo passavam bem mais rápidos, e eram bem melhores, quando a rosinha resolvia conversar. Mesmo que a maioria das conversas fossem mais discussões. Marceline gostava delas. Elas tinham uma dinâmica de duas senhoras velhas, que sentavam na calçada e só sabiam brigar entre si. Mas uma não vivia sem a outra.

Um dos seus passatempos prediletos era observar Bonnibel focada em algo. Marceline não sabia apontar o que a atraía tanto naquela garota, mas na primeira vez que sonhou com ela, ainda naquela perseguição, sabia que se por acaso a pegasse, não iria mordê-la, mas beijá-la. Havia alguma coisa no jeito dela, em suas expressões, na forma estranha como levava a vida que Marceline ficava fascinada. Algumas vezes o universo lhe pregava peças e numa dessas ele te deixa caidinha por uma garota completamente exótica.

Bonnibel percebeu os olhos da vampira nela. Isso era algo comum, mas ela ainda não havia se acostumado. Não conseguia deixar de notar. Se virou e logo viu a vampira lhe admirando. Marceline lhe deu um sorriso de orelha a orelha, um sorriso genuíno, fechando os olhos.

Aquilo era demais para Bonnibel.

 

“Para de fazer isso! Para de me azucrinar! ” Voltou a se levantar, e dessa vez andou em direção a Marceline.

 

“O que foi que eu fiz, eu só estava olhando pra você. ”

 

“Para de me olhar assim! ”

 

Era a primeira vez que Bonnibel estava se aproximando. E a cada passo que dava era mais um insulto para a vampira, mais algum sentimento sendo reprimido.

 

“Você não percebe que você insuportável? Que eu não quero nada com você, que eu nem queria que você estivesse aqui! O que você está fazendo aqui?! Quem é você?!” Cuspia aqueles insultos no automático, não deixando sua mente respirar.

 

Marceline cerrou os olhos e deu alguns passos para trás, Bonnie já estava na divisa entre seus quartos. Era a primeira vez que via ela realmente furiosa, do tipo, sério mesmo. Na verdade, ela estava mais angustiada com aquilo do que com raiva, mas todas essas sensações ruins estavam misturadas.

 

“Calma, eu não sei porque eu tô presa em um sonho com você-”

 

“Você só sabe fazer piadinhas e flertar! Eu não quero sua presença, eu não quero ter você bagunçando minha cabeça, você não tem outras garotas para incomodar não?!” Bonnibel carregava algumas lágrimas em seu rosto.

 

A cena fez Marceline se assustar. O que poderia fazer para acalmá-la?

 

“Bonnie, você tá com a cabeça quente, me desculpa se eu estou te incomodando, sério, eu não-”

 

Bonnibel a interrompeu. Uma última vez. “Não me chame de Bonnie. Sua… sua… sua monstra estúpida e irritante! Sai da minha frente! ”

 

Marceline não teve tempo de gritar quando uma estaca invadiu seu peito e fez sua visão escurecer por completo. A última coisa que viu foi Bonnibel, alarmada, com a mão no rosto.

 

Marceline

 

Marceline não estava mais presente em seus sonhos. Não desde o incidente. Quando sonhava, sempre voltava para aquele mesmo cenário. Seu quarto. O quarto de Marceline. Mas a vampira não estava lá.  E Bonnibel se sentia… culpada. Algo que ela nunca havia se sentido.

Ela não tinha matado a garota, não é? Tipo, aquela estaca, foi em um sonho. E Marceline podia deixar ela nos nervos, mas nunca passou por sua cabeça desejar a morte dela. Então, porque a vampira não estava aqui, a irritando?

Uma dor aguda rodava pelo seu estômago. Bonnibel só queria saber se Marceline estava bem. Não queria tê-la de volta em seus sonhos. Em sua vida, de certa forma.

No primeiro sonho que teve, depois do acontecido, ela até se sentiu feliz. Finalmente. Foi a sensação que teve. Mas conforme ia passando as semanas, aquele quarto ficou maior. Mais espaçoso. Ou Bonnibel que ficou pequena para ele.

Era solitário. Tal como ela. E entediante, por mais que ela se esforçasse para estudar. Diversas vezes chegou a se virar, na esperança de que aquela garota de cabelos negros pudesse estar lhe observando. Nada.

 

“Não tem problema nenhum, ela deve estar bem e você recuperou suas notas. Sua vida está perfeita Bonnibel, e você tem um tempo que nenhuma outra pessoa tem aqui nesse sonho. Essas fórmulas de química não vão ser decoradas sozinhas. ”

 

De alguma forma, suas preocupações foram ouvidas. Numa das vezes, antes de entrar naquele sonho, pode ouvir claramente uma voz lhe dizendo ela está bem. Depois, uma faixa apareceu no quarto da vampira, com as mesmas palavras. Por último um livro na prateleira de Bonnibel apareceu tendo essas palavras como título.

Ela está bem. O universo estava lhe dizendo. Então… não precisava mais se preocupar, correto? Não tinha mais com que se importar. Marceline estava ótima, fora de seus sonhos, importunando alguma outra garota.

Estava tudo bem.

 

Vida real

 

Com mais tempo livre, devido aos seus estudos em momentos que devia estar dormindo, Bonnibel deixou-se levar um pouco para se socializar. E no maior ato, em uma festa. Alguns de seus poucos amigos estavam lá, como o carismático Finn, um rapaz que sempre lhe contava piadas. Ficou na cola do garoto praticamente durante a festa inteira, ele era o seu porto seguro ali.

Festas não agradavam Bonnibel. Pessoas. Barulhos. Gritos. Bebidas. Beer-pong. Tudo isso não lhe atraía. Mas todos ao seu redor, todos na sua idade pareciam ter um apreço por esse evento. E Bonnibel nunca foi em uma festa, então não poderia afirmar que realmente não gostava.

 

"Jogo da garrafa!" Finn gritou para um pequeno grupo, enquanto tinha em sua mão uma garrafa vazia de cerveja.

 

Logo Bonnibel se viu em uma rodinha, com mais algumas pessoas. Ela não entendia a convenção social jogo da garrafa. Mas bastou um exemplo para perceber. Não, ela não iria fazer parte daquilo.

 

"Body shot!" Algum rapaz desconhecido esbravejou enquanto outro grupo de adolescentes corria para a cozinha.

 

Com o passar do tempo, Bonnibel foi gostando cada vez menos. Lhe empurraram algum garoto para beijar. Tentaram lhe empurrar bebidas, chegou a tomar uns dois drinques, que apesar de não descer tão mal em sua garganta, achou melhor não beber mais daquilo. Pois não queria acabar como algumas outras garotas, completamente desnorteadas. Tentaram lhe empurrar para dançar, o que não de todo ruim, mas não precisavam lhe empurrar.

E a atenção que estava recebendo de todos, ela até imaginava, mas era demais. Buscavam conversar com ela sobre qualquer coisa. Perguntaram o que estava fazendo.

 

"Eu tive sonhando com uma vampira, acredita…" Bonnibel culpava seu cérebro meio alcoolizado.

 

As pessoas não entenderam muito bem. Mas não importava. Ela estava se divertindo. Não estava? Pensava que sim.

Marceline.

Sua mente tratou de lembrar da vampira. Não! Ela estava aqui para se esquecer dela. Para viver sua vida, aproveitar sua adolescência. Não para se desgastar com vampiras que só existiam em seus sonhos. Uma vampira que só fez lhe irritar.

Ela estava se divertindo. Sua mente estava um pouco embriagada, e ela estava contente dançando. Até lhe empurrarem mais coisas.

Tentaram lhe empurrar mais outro rapaz, que a garota negou prontamente. Ouviu algumas piadas, que não discerniu bem.

 

"Sete minutos no paraíso!" Uma garota gritou.

 

Outra brincadeira que não sabia. Mas assim como no jogo da garrafa, não precisou muito. Uma mão segurou a dela e lhe arrastou até um quarto. Bonnibel aceitou. Passaram alguns segundos até uma outra pessoa ser enxotada para o mesmo quarto. Outro rapaz, pensou.

Mas não. Não era. Era uma garota. Da sua classe.

 

"Vamos ver se agora a gente acertou seu gosto…" Conseguiu ouvir ao fundo uma voz feminina, seguida de algumas risadas. "Vemos vocês em sete minutos."  Fecharam a porta.

 

A garota estava tão quieta e assustada quanto Bonnie. O clima era estranho. Pesado. A luz era fraca naquele quarto, então ela não conseguia distinguir bem as feições da moça. Mas lembrava vagamente dela, na aula. Era mais alta que ela. Bonnie a considerava bonita. Usava um perfume meio forte. Lembrava que tinha cabelos loiros e curtos.

 

"Então, você se importa?" Ouviu a voz da garota, meio embargada. Ela também parecia meio bêbada.

 

"Me importar com…"

 

A garota deu algumas risadinhas. Percebeu que Bonnibel não tinha noção nenhuma. Resolveu se aproximar, passos altos e fortes, até se abraçar em Bonnie, escorando todo seu peso nela. Bonnibel chegou a dar alguns passos pra trás, suas costas batendo na parede.

 

"Eu faço seu tipo?" A loira cantarolava. E ria.

 

Descansou a cabeça no ombro de Bonnie e aproveitou para sentir o perfume dela. Era mais doce do que o dela e bem mais leve.

Bonnibel juntou seus últimos neurônios, aqueles que não estavam embebidos em álcool, para ler aquela situação.

Bonnibel já havia iniciado sua vida amorosa, por assim dizer. Tudo com base em convenções sociais. Quando começaram a lhe importunar sobre um primeiro beijo, não demorou muito para ir atrás de um garoto. Idem em relação a um namorado, com quem se separou menos de dois meses depois. Bonnibel fez tudo aquilo para que ninguém reclamasse, ninguém a incomodasse.

Agora, as pessoas queriam que ela ficasse com aquela garota. Bonnibel não sabia se isso era o certo. Afinal, era uma garota. O que não era comum, não era normal. Os tempos estavam mudando, mas…

 

"Não pense muito sobre isso… basta dizer que você estava bêbada. Você é a Bonnibel, pode fazer qualquer coisa." A garota beijou sua bochecha e seu queixo. "Meu nome é Ashley, aliás."

 

Ela já tinha ouvido uma introdução parecida com aquela.

Ashley começou a beijá-la, agarrando sua cintura. Bonnibel não estava correspondendo em nada, mas a garota sabia beijar e seus lábios eram macios e tentadores. Não demorou muito para Bonnibel começar a corresponder. Ela culpava a bebida por estar agindo assim e pensava que era apenas mais alguma coisa que as pessoas impuseram a ela fazer. Ela tinha uma ansiedade tremenda com relação ao que as outras pessoas pensavam. Ashley percorreu com a mão todo o seu torso, passando pelo seu rosto, até agarrar seus cabelos, enquanto aprofundava mais aquele beijo.

Bonnibel não tinha que fazer muita coisa ali. E elas ficaram nessa dinâmica confortável, entre beijos mais curtos e outros mais demorados, sem dar um próximo passo. Até Ashley resolver morder próximo da orelha de Bonnie, e sussurrar em seu ouvido.

 

“Você realmente ficou mais bonita com esse cabelo rosa, princesa…”

 

Princesa. Alguém já havia lhe chamado assim antes.

Marceline.

Aquele apelido era o gatilho para que as memórias sobre Marceline voltassem com toda a força. Marceline. Lembrava do que a vampira disse. Que queria lhe beijar. Como seria o beijo de um vampiro? As presas atrapalhariam? Teria um gosto ruim? Vampiros tem mau hálito? Lembrava de Marceline contando sobre sua vida, quando estava entediada. Pelos eventos históricos que passou. Ela tinha quase mil anos, viu desde o começo do Tratado de Verdun até a ascensão do Sacro Império. Viu Napoleão ser derrotado. Vivia nos tempos de Bismarck.

Marceline.

Ela não devia estar ali. Aquele ambiente, aquele lugar. Não era pra ela.

Se desvencilhou de Ashley, sem olhar para trás, sem escutar o que a garota tinha para lhe dizer. Quando abriu a porta, viu um grupo espreitando pela fresta da porta. Também não lhe deu atenção.

Correu dali direto para sua cama.

 

Tristeza

 

Demorou a dormir, porque se esforçou para não chorar. Bonnibel não era uma garota para chorar. E quando voltou ao seu sonho… Marceline ainda não estava lá. De novo. A vampira foi embora de vez.

Marceline não fazia sentido nenhum na sua vida. Uma vampira, que apareceu de gaiata nos seus sonhos. Mas quando a perdeu, parecia que sua vida também tinha perdido algum sentido. Pois aqueles momentos entre elas haviam entrado na sua rotina. E Bonnie não iria admitir em voz alta, mas ela ainda estava bêbada, então podia confessar isso na sua cabeça. Ela… até que gostava de Marceline. Ela se afeiçoou pela vampira, bizarro ou não. Mas claro, isso era seu cérebro não sóbrio falando. A Bonnibel de verdade nunca falaria isso.

 

Dentro daquele estranho recinto ela se deu ao luxo de chorar aquilo que não pôde. As lágrimas não eram muitas, anos de autodisciplina, mas estavam presentes. Os olhos marejados, a boca vermelha e tremida.

Foi dando passos em direção ao quarto de Marceline. Porque aquele sonho a torturava, ainda permitindo que o quarto da moça pudesse ser visto? Encostou na parede invisível. Sentiu mais algumas lágrimas descerem.

 

"Marceline…" Chamou pela garota. "Marceline, eu… desculpe. Marceline." Falou mais pra ela, numa forma de se sentir melhor. "Eu não penso direito nas coisas, eu não sei medir as palavras. Eu não sei estar próxima de pessoas, ainda mais vampiras irritantes que nem você"

 

Todo aquele discurso era para as paredes, suas grandes confidentes. Mas precisava daquilo. Para se sentir bem, e aos poucos, deixar-se esquecer daquela experiência maluca que ela teve, se afeiçoando por um ser sobrenatural dentro de um sonho. Amanhã, ao acordar, era um novo dia. E uma nova Bonnibel.

 

"Marceline…" Disse uma última vez. A sua cabeça queria completar com aquela garota não foi nada, não significou nada. Pode continuar me notando...

 

Ficou com seu corpo encostado no ar, naquela parede entre seus quartos. Primeira coisa que ia descobrir era como se livrar daquele sonho. Talvez ir no psicólogo, pedir algum remédio. Estava focada nos seus pensamentos com o futuro, quando a temperatura subitamente diminuiu e uma voz decidiu se fazer presente.

 

"Olá, princesa."

 

Entre

 

A mente alcoolizada de Bonnibel ainda estava processando o que sua visão estava lhe mostrando. Marceline. Ali. Na sua frente. A uma parede invisível de distância.

 

"Sabe, você me irrita. Eu estava em um sonho muito bom até ser arrastada pra cá." Parecia estar brava. Tinha motivos. Aquela garota tinha enfiado uma estaca nela, ela realmente achou que tinha morrido. Disse que não queria saber mais dela. E… agora estava lhe chamando. "O que você quer Bonnibel?" Perguntou num tom seco.

 

Marceline tinha notado o rosto vermelho e molhado de Bonnie. Tinha chorado.

 

"Você… é realmente você?" A rosinha colocou as mãos sobre a boca, surpresa.

 

"Sim, sou eu, a rainha dos vampiros. E sua tentativa de assassinato não funcionou." Continuava a responder de forma meio rude. "Veio tentar me matar de novo? O que eu fiz de errado dessa vez?"

 

Bonnibel tocou naquele bando de tijolos imperceptível, que separava as duas. Marceline focou melhor nas expressões da garota e percebeu que ela estava aflita, angustiada. E que havia uma ponta de contentamento, de euforia, ao ver a vampira. Percebeu que o modo insensível de falar não havia sido a melhor abordagem.

 

“O que aconteceu? ” Marceline perguntou, mais inquieta.

 

Bonnibel tentou se aproximar ainda mais, em vão, pois, ahem, barreiras invisíveis. Marceline até achou que a garota iria abraçá-la, mas era imaginar demais.

Bonnibel deu alguns passos para trás, fechando seus punhos, e colocando-os próximo ao peito.

 

“Você pode entrar. ” Estava apreensiva, com medo, porém compeliu todos aqueles sentimentos.

 

Marceline ainda não estava acreditando. Aquela garota era a Bonnibel? De verdade? A ponto de aceitar que ela, a rainha dos vampiros, entrasse no seu lado do quarto?

Decidiu não pensar muito nisso. E deu dois passos tentadores, incertos, em direção a Bonnie. Não haviam mais barreiras. Ela estava agora na metade que era da humana.

Marceline não conseguiu assimilar totalmente essa nova informação, pois no segundo seguinte, Bonnibel correu para os seus braços, invadindo seu espaço pessoal, o calor da garota contrastando com o frio de sua pele. Sentiu o cheiro de álcool. Não questionou nenhuma ação, nenhum motivo. Apenas abraçou-a de volta, às mãos de Marceline relaxadas, próximas a cintura da garota.

 

“Me desculpe, não foi nada demais. O que aconteceu…” O cheiro de bebida era bem mais preponderante ao sair de seus lábios. Sua voz era frágil. Bonnibel parecia frágil como um todo.

 

E a garota parecia lhe confessar algo, o quê, não sabia. Como se tivesse feito algo errado. E Marceline tinha a impressão que não falava da estaca.

Bonnie estava se comportando cento e oitenta graus diferente. Porque Marceline então se surpreendeu quando ela tomou seus lábios de assalto?

Nem a garota captou ou absorveu o que fez. Os beijos eram curtos, desleixados, sem ângulo. A presença de Marceline era o suficiente. Os beijos agiam como um tranquilizante, um sonífero para Bonnibel, que aos poucos deixou de tremer, apoiando cada vez mais seu peso no corpo da vampira. Foi um momento…. Doce, se a vampira quisesse descrever aquilo em uma palavra.

 

“Você é um caso e tanto, princesa. ”

 

Bonnibel não escutou. Estava relaxada, dormindo. Dentro de um sonho. Nada fazia sentido. Tal como seus pensamentos por Marceline.

E estava tudo bem, por enquanto.


Notas Finais


isso ficou maior do que esperava. já terminei de ver aquele arco especial da historia da marceline e desperdiçaram bastante a chance de desenvolver mais as duas, ali era oportunidade perfeita. pelo menos tem o especial na hbo como futuro alento.

obrigada pelo comentário.

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~spacibo


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