— Eu levo para você — ofereceu-se Draco.
Potter virou-se, tentando disfarçar o sobressalto, contrariado porque o som da voz dele fazia seu coração disparar. Draco se aproximou, o olhar azul firme e indecifrável. Harry olhou para ele e, como sempre, não pôde deixar de sorrir. A boca de Draco estava longe de ser perfeita, refletiu ele. Os lábios eram finos demais, e a expressão normalmente séria fazia com que os cantos se curvassem para baixo. Mas Potter sabia do que aquela boca era capaz! E era justamente esse o problema, pensou ele. A atração inexplicável que sentia cada vez que estava perto de Malfoy. A única solução seria manter distância, e um lugar como uma fazenda, naquele momento, vinha a calhar.
— Estou feliz por Theo e Newt — disse Draco. — A ocasião é que não foi propícia, para mim. Theo decidiu ficar mais alguns dias em Dorset, e eu precisaria dele na corrida, na próxima semana.
— Corrida?
— A corrida de veleiros em Weymont. Começa na segunda-feira e se prolonga até o fim de semana. Não é um campeonato de futebol, mas é divertido. Com uma tripulação adequada, teríamos uma boa chance de ganhar.
— E agora, o que pretende fazer? Malfoy deu de ombros.
— Não sei, darei um jeito. Em último caso, irei com um homem a menos. — Ele gesticulou na direção dos balões.
— É melhor você me dar isso, se quer encontrar uma mesa no Caldeirão Furado.
Draco segurou os cordões.
— Quero falar com você, quando voltar do almoço.
— Não pretendo voltar — Harry apressou-se a dizer.
— Tenho planos para esta tarde. Preciso fazer pesquisa.
— Só quero trocar uma idéia com você. Mas podemos conversar numa outra hora, por telefone.
Harry viu-o afastar-se, esperando sentir a onda de alívio que deveria invadi-lo por ter conseguido se livrar de Draco pelo resto do dia. O único sentimento que o acometeu, porém, foi um aperto no coração, um vazio que ele não sabia explicar.
— Que pena, essa história do barco — sussurrou Luna.
— Espero que ele encontre alguém — murmurou Harry, distraidamente.
— Talvez Crew.
— Será?
— Ouvi dizer que ele gosta de velejar. E Draco não precisa de uma pessoa muito experiente, seja tem outros ajudantes. Desde que ele arrume alguém com destreza, e que saiba puxar uma corda...
— Se está insinuando que eu me junte à tripulação, esqueça. Draco não sugeriu, e eu não vou me oferecer.
— É uma pena, porque, se não por outro motivo, a Semana da Corrida é a ocasião perfeita para conhecer candidatos ricos, de ponta a ponta do litoral. Uma oportunidade de ouro, eu diria. Aposto que o solteiro cobiçado não perderia, por nada.
— O solteiro estará ocupado, aprendendo a cavalgar e a cuidar do gado — retrucou Harry. — Não terá tempo para pensar em corridas de veleiros.
Luna chamou o elevador.
— Está bem, desisto. Vamos almoçar?
— Preciso pegar minha carteira na gaveta. — disse ele, correndo em direção a seu cubículo. — Só um segundo!
A secretária de Draco, Minerva, uma mulher de meia-idade que ele herdara de Pio, sorriu quando Harry passou.
— Como vai a busca?
— Bem — mentiu Potter. — Devo anunciar o noivado em poucos dias.
— Assim espero! — exclamou Minerva, exultante. —O solteiro cobiçado é o assunto do momento. Em todo lugar, ouço comentários. No clube, no ponto de ônibus, no salão de cabeleireiro... Ele não pode decepcionar o público.
— E alguma vez ele decepcionou? — Harry tirou o disquete do bolso. — Por falar nisso, pode entregar isto para Malfoy? É a próxima coluna.
— Claro. — Minerva pegou o disquete com avidez. — Posso dar uma olhada, antes? Estou morrendo de curiosidade para saber o que vai acontecer.
— Desde que chegue às mãos de dele, tudo bem — concordou Harry.
Depois de pegar a carteira, ele voltou para o corredor, em direção ao hall. Minerva ergueu os dois polegares, quando ele passou.
— Ah, esqueci de lhe dizer — chamou ela. — Já que estou fazendo a triagem das cartas e telefonemas para a coluna...
Potter congelou.
— Triagem? — interrompeu ele. — Eu pensei que os telefonemas e a correspondência viessem para mim.
— E vão — garantiu Minerva. — A recepcionista só passa por aqui, primeiro, para que eu faça um levantamento informal. Você sabe, quantos torcem para que o solteiro encontre alguém rico, quantos querem que ele dê com os burros n'água... Esse tipo de coisa. Até agora, temos seis a um, a favor.
Potter esforçou-se para controlar o tom de voz.
— Que ótimo. E quem deu autorização para isso?
— Malfoy, claro. Ele deve ter esquecido de lhe dizer. De qualquer forma, ele já providenciou para que seja publicada a pergunta, na próxima semana, com o número do telefone ao lado. As segundas-feiras, uma das linhas será destinada exclusivamente a atender esses recados.
— É mesmo? — murmurou Harry, com dificuldade para aparentar calma.
— E, sim — continuou Minerva. —Draco tem grandes planos para a sua coluna. Ele quer fazer propaganda em jornais, rádio, afixar cartazes...
Potter conseguiu esboçar um sorriso, embora a raiva o consumisse, por dentro. Uma longa conversa sobre o assunto teria sido demais para esperar de Draco, mas uma referência, pelo menos, ele poderia ter feito!
O telefone de MacGonagall tocou, dois trinados curtos que indicavam uma chamada interna. Ela pressionou o botão de viva-voz.
— Minerva MacGonagall.
A voz de Malfoy ecoou no ar, seca e distante.
— Minerva, o relatório semanal está pronto?
— Está, sim. Levo para você em um minuto.
— Pode deixar que eu levo — ofereceu-se Potter, depois que ela desligou. — Só preciso de um favor seu. Ligue para a recepção e peça para avisar Luna de que vou demorar mais um minuto.
— Pode deixar — assentiu Minerva, tirando o receptor do gancho.
Harry não se deu ao trabalho de bater na porta, antes de entrar no escritório de Malfoy.
— Quero falar com você.
Ele parou de escrever, enquanto Harry fechava a porta.
— Pensei que tivesse ido almoçar.
— Mudei de ideia — Ele deixou o relatório sobre a poltrona. — Acabei de saber que minhas cartas e telefonemas estão sendo triados por Minerva, por ordem sua. E quero saber por que. — Potter avançou lentamente, reunindo forças pelo som da própria voz. — Também quero saber por que não fui consultado sobre o plano de explorar a série com cartazes, anúncios, e sei lá mais o quê. — Ele apoiou as mãos na escrivaninha. — Quero algumas respostas, Draco Malfoy, e quero-as agora.
Draco lançou a ele um olhar gélido.
— Deixe-me lembrar apenas que você ainda não é meu sócio, Potter.
— Mas sou o solteiro cobiçado — afirmou ele, com veemência. — E tenho o direito de saber o que se passa.
Depois de uma breve hesitação, Draco empurrou uma pasta para ele, sobre a mesa.
— Aqui está tudo o que você precisa saber.
Por um momento, Harry ficou desconcertado, porém virou a pasta para si e abriu-a. Diante de seus olhos, encontravam-se páginas e páginas de anotações, um rascunho de uma campanha de publicidade para sua coluna. Idéias para cartazes, jornais, rádio, tudo que MacGonagall mencionara e muito mais. Aparentemente, no entanto, nada concreto havia sido feito ainda. A ideia estava em fase de planejamento.
Potter fechou a pasta e devolveu-a a Draco.
— Você fez mal em não falar comigo sobre isso.
— Compreendo como se sente — disse Malfoy, com ar indiferente. — Mas, já que ficou sabendo, gostaria de ouvir sua opinião.
— Primeiro, acho que vai custar uma fortuna.
— O retorno compensará. Segundo minhas previsões, "O matrimônio perfeito" atingirá o pico em cerca de seis semanas. Depois disso, o solteiro deve perder um pouco o ritmo e a popularidade, a menos que esteja com o casamento marcado. Não temos muito tempo, mas a campanha foi planejada para conceder o tom mais dramático possível à busca dele. Se tudo correr como espero, mais leitores começarão a ler a revista por causa da coluna e continuarão a ler depois que ela se for. O que acha?
Potter olhou para a pasta fechada, sobre a mesa.
— Acho que é uma ideia brilhante — admitiu Harry.
— Também acho. Minha única dúvida é se você não vai se sentir pressionado demais.
— Não se preocupe com isso.. A campanha será benéfica para o solteiro cobiçado.
— Mas, e para você? — perguntou Draco. — Acredite, ou não, eu não poria nada em prática sem, antes, consultá-lo. E se você preferir adiar, ou mesmo cancelar, eu entenderei.
— Por que você ainda não acredita que eu consiga?
— Porque tenho medo que você consiga.
— A ideia de me ter como sócio é tão terrível, assim?
— Não. A ideia de você se casar para ganhar é que é terrível.
— Eu não faria isso.
— É o que você diz, agora. — Malfoy gesticulou na direção da pasta. —Mas como se sentiria se a pressão aumentasse demais?
— A publicidade não vai fazer diferença para mim. Estou empenhado em ganhar, de qualquer maneira. Fará diferença para você. Essa campanha fortalecerá o novo formato da coluna, antes de sua partida. Chegou no momento exato.
Draco assentiu.
— Foi o que pensei.
— Quando pensa em começar?
— Se você não tiver nada contra, devemos começar o quanto antes. Infelizmente, vou para Weymont, daqui a pouco, e passarei a semana inteira fora. Mas podemos trabalhar por fax e whatsapp. Na verdade, o ideal seria que você fosse comigo.
— Draco, eu não posso...
— Escute só, Harry —- interrompeu ele. — A corrida só começa na segunda-feira. Até lá, já teremos terminado, e você poderá voltar para Londres para dar andamento à campanha.
— Eu...
— Harry, estou lhe pedindo que me acompanhe, como colega de trabalho, em uma viagem de negócios, apenas isso.
Harry hesitou, por um momento. A Semana da Corrida seria uma oportunidade excelente para ele, refletiu. Todos aqueles homens ricos, com suas lanchas e iates... Sem dúvida, ele teria assunto de sobra, para enriquecer sua coluna.
— Está bem — concordou, finalmente. — Irei com você. Mas não por dois dias, apenas. Quero ficar até sexta-feira. Quero fazer parte da tripulação. Você não está precisando de uma pessoa?
— E você sabe velejar, por acaso?
— Posso aprender. Deve haver alguma coisa fácil de se fazer, como puxar uma corda, por exemplo.
— Posso saber qual a causa desse súbito interesse?
— É simples. A Semana da Corrida atrai homens de toda a costa. Homens ricos. Todo mundo sabe disso. É uma oportunidade que eu não posso perder.
Os lábios de Draco curvaram-se, num sorriso cínico.
— Como não percebi, antes?
— Também não sei. Agora, só preciso que você me indique um hotel.
— Estarão todos lotados, a esta altura. Mas você pode ficar em minha casa de praia. — Draco ergueu uma mão, quando Harry começou a protestar. — Vou ficar no barco! Não precisa se preocupar. Eu o deixarei em paz.
Harry assentiu.
— Certo. Está combinado, então. Quando partimos?
— Às seis horas. Será uma longa viagem, portanto vista uma roupa confortável e não se esqueça de levar roupas de frio, para usar no barco.
— Está bem — Potter entregou a ele o relatório e pegou a pasta. — Importa-se se eu levar comigo? Quero dar mais uma olhada, antes de ir.
— É seu. — Draco abriu uma gaveta da escrivaninha, pegou uma brochura e jogou-a para Potter. — Leve isso, também.
Ele leu o título.
— "Manual do Velejador"?
Malfoy levantou-se e abriu a porta para ele.
— Você vai precisar da máxima orientação possível.
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