Nagisa
- Quem era aquela garotinha? – Pergunta o Aoi, assim que o médico sai do quarto. Ele disse que ia precisar fazer alguns exames em mim e, para eu não fazer muito esforço, ele traria uma cadeira de rodas.
- É uma amiga minha. – Me limito a dizer, mas fica muito suspeito. – A mãe dela é muito amiga da minha mãe, mas nós quase não nos vemos, porque ela mora nesse estado.
Tento levantar, mas todos os meus músculos protestam. Meu primo vem pro meu lado e ajuda-me a sentar, nunca pensei que essa fosse a sensação de cair do topo de um prédio e sobreviver.
Ele me solta, porque agora vem a parte fácil, eu só preciso me virar e ficar sentado na beirada da cama. Tento fazer isso, mas minhas pernas não se mexem. Tento novamente, é então que sou tomado pelo pânico.
- A-Aoi. – Chamo, com minha voz trêmula. – E-Eu não consigo m-mover a-as minhas per-pernas.
Ele não diz nada, muito menos eu. Ficamos assim durante bastante tempo, a cada segundo eu fico mais desesperado.
- Feche os olhos. – Ele pede, não tenho forças para discordar, só faço o que ele disse. – Está sentindo alguma coisa?
- Não. – Nego, sem entender o motivo da pergunta.
- E agora? Sente alguma coisa? – Ele pergunta, faço que não com a cabeça. Abro os olhos, vejo-o com as duas mãos no meu pé, como se estivesse fazendo uma massagem.
- Você... Você estava tocando no meu pé? – Forço-me a falar, com minha respiração acelerada.
- Sim. – Ele responde, sem esconder a aflição.
Kin
Me aproximo da menina chorando, preciso pensar com cuidado o que vou dizer para ela.
- Você é a Tomiko, certo? – Interrogo, fazendo-a se virar para mim. – A que é amiga da Nagasaki e filha do Karma?
- Sou eu. – Ela responde, limpando as lágrimas. Seus olhos se arregalam quando ela me reconhece, até que estava demorando. – Deusa Afrodite.
A menina se curva, eu odeio essas formalidades.
- Eu quero te fazer uma proposta. – Sou direta, não posso ficar muito tempo aqui. – Você ama seu pai, não ama?
Algumas lágrimas silenciosas caem dos seus olhos, ela confirma.
- Você quer que ele seja feliz com uma pessoa boa, alguém que não seja a Kimi. – Dessa vez eu faço uma afirmação, mas ela concorda mesmo assim. – Sabe o Nagisa? Ele é o namorado do seu pai.
Espero ela ter uma reação, porém a garota continua em silêncio. Resolvo prosseguir.
- Sua mãe, como deve imaginar, odeia o Nagisa... E já tentou matá-lo diversas vezes. – Revelo, mas seu rosto continua inexpressivo. – Eu queria que você protegesse o Nagisa e, ao mesmo tempo, tentasse juntar os dois.
- Mas eles já não são namorados? – Ela pergunta, se eu for explicar a história inteira, eu não saio daqui hoje.
- São, mas a história é muito confusa. – Digo, pensando no que mais posso dizer. – Seu pai ama muito ele, só que, talvez, ele vá precisar de um empurrãozinho para perceber isso.
- Você disse que tinha uma proposta... – Ela afirma, o que é verdade. – O que eu ganharia em troca?
-No futuro, faço você reencarnar como filha adotiva dele. – Respondo, finalmente sua expressão muda, ficando surpresa. – Se eles acabarem juntos, não daria para você ser filha biológica dele. Porém, posso fazer você ser criada por ele, como uma filha de verdade.
- I-Isso é m-mesmo possível?! – Ela exclama, com a voz tão baixa que quase não a escutei.
- Sim. – Falo, sabendo que já consegui sua ajuda. – A única coisa que você precisa fazer é manter o Nagisa vivo, fazê-los se reconciliarem e tentar manter a sua mãe longe deles.
- Eu... Eu... – Ela olha para mim e respira fundo. – Eu vou poder contar que sou filha dele?
- A decisão é sua. – Digo, na verdade eu deveria responder que não, mas eu já fiz tanta coisa proibida... O que custa eu deixá-la contar?
- Eu aceito.
Me viro para ir embora, era só isso que eu queria fazer, porém me lembro de uma coisa que vem me incomodando.
- Seu pai... – Começo, sem me virar. –Qual o nome dele? Kaede Karma ou Akabane Karma?
- É sério que está me fazendo essa pergunta?! – Ela indaga, me fazendo virar para conseguir vê-la. – A resposta é óbvia!
- Para você, é claro que é óbvio. – Retruco, como ela ia ser filha dele, ela sabe seu verdadeiro nome.
- Ele foi adotado pela família Kaede. – Ela conta, como se eu não soubesse disso. – Então seu nome verdadeiro não pode ser Kaede.
- Então está dizendo que é Akabane? – Questiono, seria muito mais fácil se ela desse logo a resposta.
- Não é possível! – Ela fala, começando a me irritar. – Isso é lógica!
- O que é lógica?!
- O tipo sanguíneo de Akabane Akiko é O negativo. – Ela relata, não sei o que isso tem a ver com o assunto. – E o do meu pai é AB. Não tem alguma coisa errada?
Só então ligo os pontos, entendo o que ela quer dizer.
- Para nascer com tipo sanguíneo O, os dois pais devem ser O... – Raciocino, não entendo como não pensei nisso antes. – Então, seria impossível um casal ter um filho AB e uma filha O negativo...
- Acho difícil meu avô ter levado uma criança que não era filha da minha avó para morar com eles. – Afirma a Tomiko, e ela não está errada. – Então, se eu tivesse que chutar, diria que minha avó traiu o meu avô e fingiu que a criança era dele.
- Se isso for verdade... – Começo, tentando criar uma hipótese. – Quem seria a criança fora do casamento? Seria o Karma ou a Akiko?
- Deve ter algum motivo para você me perguntar o nome do meu pai. – Ela conta, até que a Tomiko é inteligente. – Eu acho que a criança fora do casamento foi o meu pai, até porque o nome dele não é Akabane.
- O nome dele é o nome do verdadeiro pai. – Deduzo, por isso que a Nix não achou nenhum arquivo, ela tentou com o nome errado. – Qual é o nome dele?
Ela anda até mim e sussurra no meu ouvido. Se eu fosse uma mortal, teria morrido do coração ao ouvir o que a Tomiko disse.
- Você está brincando. – Acuso, isso não pode ser sério.
- Eu não estou. – Ela rebate, sem parece estar mentindo. – Você deve ter meios de confirmar o que eu disse.
Eu realmente tenho, porém não quero acreditar.
- Meu Zeus, isso é sério! – Exclamo, dando-me conta do problema em que me encontro. – Se descobrirem... Se alguém descobrir sobre isso...
- Meu pai seria assassinado. – Ela completa, parecendo só se dar conta disso agora. – Por favor, não conte isso para ninguém. Se alguém descobrir... E-Ele é meu pai...
- Eu não vou contar para ninguém. – Tranquilizo-a, não posso nem deixar a Nix sonhar sobre essa informação. – A identidade dele está protegida.
Dou as costas para ela e vou embora, atordoada com a informação. A Nix estava certa, eu cometi um grande erro, e agora não tem mais volta.
Se o Nagisa e o Karma ficarem juntos... Se alguém descobrir a verdade...
- Eu arrastei o Nagisa pro meio de uma guerra. – Murmuro, começando a chorar. Não acredito que o amor, que eu pensei que seria a salvação do Nagisa, possa ser a causa de sua morte.
Nagisa
- Por favor... – Imploro ao médico, enfim chorando. – Me diga que eu não vou ficar assim para sempre.
- A queda foi muito grande. – Ele conta, não quero acreditar nisso. – Você deve fazer fisioterapia para recuperar um pouco dos movimentos... Mas é muito improvável que volte a andar.
- Pode nos deixar sozinhos? – Pede meu primo, o médico sai sem dizer mais nada.
- Por que? – Pergunto, com minha voz fraca e baixa. – O que eu fiz para merecer isso?
- Nada, você não fez nada. – Ele responde, se sentando ao meu lado. – Por isso mesmo que você vai voltar a andar. Só precisamos ter esperanças.
- Esperanças... – Repito, abraçando-o e chorando no seu ombro. Viro a cabeça quando escuto um barulho vindo na porta, significa que alguém entrou. Vejo o Hibiki parado na porta, com um buquê de rosas azuis na mão.
- Nagisa? Você está bem? – Ele interroga, colocando o buquê sobre uma cômoda larga e se sentando na minha frente. – O que aconteceu?!
Não sinto o mesmo desconforto que sentia antes quando ele estava por perto, isso não quer dizer que eu esqueci totalmente o que aconteceu na floresta.
Eu tento falar e explicar o que houve, mas eu não consigo colocar as palavras para fora. Se eu falar, é como se isso ficasse ainda mais real.
- Hibiki. – Chama o Aoi, levantando da cama. – Vamos conversar lá fora.
Meu primo vai até a porta antes que eu possa pensar, mas o Hibiki demora mais. Seguro sua mão antes que levante, causando muita dor no meu braço pelo movimento repentino.
- Não vai. – Soluço, apertando ainda mais sua mão. – Eu não quero ficar sozinho.
- Eu prometo que volto rápido. – Ele garante, limpando uma lágrima minha com sua mão livre. – Não chora. Você fica muito mais bonito quando está sorrindo.
Aoi
- O médico disse que o Nagisa ficou paraplégico. – Conto logo para ele, antes que eu perdesse a coragem.
- É O QUE?! – Ele grita, se descontrolando por um momento. – Ele não pode mais andar?
- É. – Confirmo, lembrando do que mais o médico me disse, dessa vez sem falar com o Nagisa. – O médico iria mandar o Nagisa tomar antidepressivos, até ver o histórico médico dele...
- O que tem o histórico médico do Nagisa? – Ele questiona, pelo visto o Hibiki também não sabia dessa parte da vida do meu primo.
- O Nagisa já tentou se suicidar, duas vezes. E ele toma antidepressivos, ou deveria tomar. – Relato, já que duvido que o Nagisa estivesse, realmente, tomando os medicamentos. – Agora, o médico quer interná-lo na ala psiquiátrica.
- Nem pensar. – Ele nega, porém eu discordo um pouco.
- Não acho que devemos descartar essa ideia... – Começo, esperando uma reação sua. – Talvez seja disso que o Nagisa precise.
- O Nagisa precisa ficar com pessoas que se importam com ele. – Rebate o Hibiki, parecendo controlar o máximo possível seu tom de voz.
- Se fosse isso, porque ele tentou se suicidar outras duas vezes?! – Exclamo, se tivesse sido só dessa vez eu até concordaria, mas ainda tiveram as outras duas tentativas.
- Você não conhece sua tia. – Ele afirma, deixando-me perdido. – Ela sempre me tratou bem, porém não é assim com o Nagisa. Sinceramente, quem deveria ser internada em um hospício é a mãe dele.
- Uma mãe não pode ser tão ruim a ponto de fazer o filho querer se suicidar. – Digo, lembrando de como a minha mãe era comigo, eu queria muito que ela ainda estivesse viva.
- A mãe dele pode.
Kin
Talvez essa tenha sido a pior ideia que eu já tive, juntar a guerra e a paz no mesmo lugar tem tudo para dar errado. Felizmente, a Irene é minha irmã e Ares meu amante, então acho que eles podem tentar uma conversa civilizada por mim.
- Quero que me falam tudo que sabem sobre a quase terceira guerra mundial. – Peço, sei que eles estavam efetivamente envolvidos nesse assunto.
- O que isso tem a ver com você? – Indaga minha irmã, só que eu não posso contar para ninguém.
- Nada, só estou curiosa. – Minto, estou começando a mentir com muita frequência. – Ainda bem que nós já passamos por esse período.
- Passar? – Repete o Ares, que parece segurar o riso. – Nós não passamos por esse período, ele ainda está acontecendo. E, agora, estamos muito mais perto de uma guerra do que antes.
- É sério que você não sabia disso? – Pergunta minha irmã, eu não fazia ideia. – Todos os deuses sabem disso. Por que você acha que o Japão criou um programa para jovens assassinos? São 10 mil crianças, uma divisão formada por crianças treinadas desde pequenas para se tornarem assassinas. Além de estarem tentando desenvolver soldados perfeitos e estarem investindo pesadamente em inteligências artificiais.
Eu vi risco quando achei que o período de guerra já tinha acabado, agora eu estou em pânico. Respiro fundo e fecho os olhos, não posso perder a calma perto deles.
- Mas nenhum dos dois lados vai atacar sem provas, certo? – Questiono, tentando me agarrar em alguma coisa.
- Provavelmente não... – Ela fala, menos mal. – Mas estão se esforçando para conseguir prov...
- Eles não vão conseguir provas. – O Ares a corta, espero que a Irene não se irrite com a interrupção. – Se nem mesmo nós sabemos o que aconteceu, como os mortais iriam descobrir?
- Não duvide da determinação de um pai. – Ela rebate, agora já era, eles começaram a brigar. – Ele fará até o impossível para descobrir o que aconteceu. Uma pista, por menor que seja, já é o suficiente para uma guerra.
- Do jeito que fala, até parece que quer uma guerra. – Ele provoca, fazendo-a se levantar.
- Você quer uma guerra. – Ela acusa, apontando o dedo na cara dele. Ares abre a boca para revidar, mas eu sou mais rápida.
- SILÊNCIO! – Berro, só assim para eu conseguir chamar a atenção deles.
- Sabe de uma coisa? Eu não deveria ter vindo. – Afirma a Irene, indo até a porta.
- Vocês precisam ficar. – Peço, não conseguindo esconder o pânico na minha voz. Ela para, em seguida se vira para mim. – E-Eu estou com um problema.
- O que você fez? – Ela interroga, se sentando, novamente, na cadeira.
- Eu o encontrei.
Os dois me encaram por muito tempo, como se não tivessem processado a informação.
- Você achou... Ele? – Pergunta a Irene, confirmo, vendo as expressões deles.
E, numa ação muito rápida, os dois se levantam e se curvam sobre a mesa.
- Quem é ele?
- Onde ele está?
- Ele está vivo?
Fico perdida nas perguntas e recuo com a cadeira, me sentindo sufocada pelas perguntas.
- Eu não vou responder. – Pronuncio calmamente, eles saem de cima da mesa e endireitam a postura.
- Como não? – Questiona Ares, dando um sorriso nervoso. – Todos nós estamos procurando ele há anos.
- É. – Concorda a Irene, com o mesmo sorriso. – Se você não quiser que os outros saibam, pode contar só para a gente. Nós não vamos espalhar.
- Não! – Exclamo, levantando da cadeira, compreendendo as intenções deles. – Vocês querem usá-lo.
- Não é assim. – Discorda minha irmã, tirando o sorriso do rosto. – Se ele estiver vivo, eu só quero matá-lo.
Meus olhos se arregalam ao ouvir isso, não pensei que ela fosse capaz de falar uma coisa dessas.
- Isso traria a paz! – Ela exclama, vendo o quão espantada eu fiquei. – Se ele morrer e nós sumirmos com o corpo, uma guerra nunca será começada.
- Conta para mim. – Pede o Ares, segurando a minha mão. – Eu não vou matá-lo, isso seria errado.
- Você também quer usá-lo. – Digo, puxando minha mão da dele. – Você quer usar ele para começar a guerra.
- Claro que não. – Ele fala, como se eu fosse idiota para acreditar nele. – Só quero levar o filho ao pai, juntar a família. Não ia ser maravilhoso?!
Passo por eles e saio correndo, sem saber direito para onde ir.
- Artêmis. – Penso em voz alta, mudando meu rumo para a floresta, posso me esconder deles lá.
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