História A Coroa de flores ( A Seleção -INTERATIVA ) - As cores do pôr-do-sol

III

SYRAH 

— É normal sonhar acordada? — perguntou Syrah, enquanto estalava distraidamente os dedos sobre a mesa com o formato de uma folha. 

Pandora mordeu a ponta da amora em suas mãos e entre uma mastigada e outra, murmurou: 

— Para falar a verdade, a Seleção deixa qualquer garota sonhando acordada. 

Kalenna fez que sim com a cabeça, enquanto fazia uma trança nos cabelos de Syrah. 

— É como se estivéssemos vivendo em um conto de fadas ligeiramente real. 

Pandora pegou outra amora.

— Pena que apenas uma de nós terá o prazer de continuar nesse conto de fadas — Scarlatte batucou as unhas na superfície da mesa gerando uma melodia feliz, e ao mesmo tempo melancólica.

Lua deu um leve tapinha nas mãos de Scarlatte.

— Ei, ei, ei. — Syrah sorriu para o jeito todo entusiasmado que Lua intrometeu-se na conversa. — Galera, mal começou a Seleção e vocês já estão pensando no final. Relaxem. Ainda tem muita história pela frente.

Kalenna pôs a última florzinha na trança e sorriu feito uma criança ao finalizar a sua primeira façanha.

— Gente, esqueçam os problemas e aproveitem o chá da tarde — disse Pandora, fazendo gestos aleatórios com o pequeno pedaço de amora em suas mãos. — Afinal não é todo dia que se tem uma mesa farta e pessoas legais por perto. 

As selecionadas se entreolharam. 

— Eu odeio admitir isso, mas... a garota da fruta está certa. — disse Scarlatte, dando de ombros. 

—Ok — murmurou Syrah, colocando alguns fios de seu cabelo achocolatado atrás da orelha.  — É melhor esquecermos esse papo de sonhos e focarmos somente nesses doces. 

Lua pegou um brigadeiro, dizendo: 

— Seria tão legal se ao invés de doces fossem guardas.

Pandora ficou tão nervosa que quase deixou o restante da sua amora cair no chão. 

— Hum... não — disse ela. — Não seria.

— Ah, por favor, é claro que seria — discordou Kalenna, rapidamente. — Imaginem essa cena: Bass, o guarda mais gostoso do palácio, sem roupa segurando apenas um chapeuzinho para cobrir o... Bem, vocês sabem. Dançado sensualmente encima dessa mesa. Teria sonho melhor? 

— É óbvio que não — respondeu Syrah, e várias garotas riram. 

— Planejando ter outra companhia além do príncipe? — Lua quis saber, com uma sobrancelha arqueada. 

— Hã?  — disse Syrah totalmente confusa, mas logo lembrou-se de que todos estavam olhando. — Quer dizer... mas é claro que isso nunca passou pela minha cabeça. 

Scarlatte revirou os olhos. 

E naquele momento aconteceu algo muito estranho: Um guarda de cabelos enrolados e feições encantadoras  aproximou-se da mesa. Só pode ser o tal guarda Bass, pensou Syrah. 

Todas pareciam confusas até que o homem pegou um papel no bolso do uniforme, desdobrou-o e entregou-o a Syrah. Era um bilhete escrito à mão. 

Querida Syrah Pavlovna,

Eu acho que não preciso dizer que você é ainda mais interessante quando está tentando não ser interessante. Estranho né?

P.S.: O Salão das Mulheres  está tão cheio. Que tal dar uma saída?

Beijos,

Ethan

Syrah notou que as outras selecionadas também a olhavam. Ela ficou pensando no que fizera de errado. Depois notou que o centro das atenções era o pedaço de papel em suas mãos. A curiosidade havia tomado conta do Salão das Mulheres. 

— Vá! — sussurrou Bass próximo ao seu ouvido. — Ele a aguarda no corredor. 

Syrah fez que sim. Depois levantou-se e saiu à procura do seu príncipe encantado. Ela sorria para o mundo, como se estivesse literalmente sonhando acordada. Porém, lembrou-se das ameaças de seu pai e aos poucos foi perdendo o ânimo. “ Como?”, disse Syrah para si mesma. “ Como diabos eu aceitei vir para cá?”. A sua visão aos poucos foi ficando turva.

 O corpo de Syrah tomou a decisão por ela. Correr. 

— Parada aí! — alguém disse. 

Para a surpresa de Syrah, aquela voz era de Ethan, que tentava alcançá-la a todo custo. Ela passou as mãos pelo rosto e esperou o príncipe se aproximar. Ele estava ofegante. 

Ethan a olhou e balançou a cabeça, admirado. 

— Você é bem rapidinha. 

Ouvir isso não fez Syrah sentir-se melhor, mas ela entendia o que Ethan queria dizer. Olhou para o caminho que levava ao jardim. Chegou a conclusão que havia tido mais um daqueles seus velhos surtos e saído correndo sem direção, como se estivesse em um transe profundo, ou melhor, hipnotizada. Syrah não queria contar a ele sobre esses seus problemas com sonambulismo. O medo de perder a oportunidade de conhecê-lo era maior que o seu próprio corpo. 

— Ah, obrigada por me lembrar desse pequeno detalhe — disse Syrah, com a voz trêmula. — Quer dizer... Vossa Alteza, desculpe por fazê-lo correr. — Ela fez o melhor para sorrir, ainda que tenha parecido um pouco forçado.  

— Tudo bem. 

Ethan sorriu. Seus olhos eram incríveis, e seu sorriso transmitia algo fora do comum. Ele definitivamente era o homem mais galanteador que ela havia conhecido. 

— Então... ainda quer dar uma volta por aí?  

— Eu adoraria — falou. 

— Bem... Vamos! —  disse Ethan, oferecendo o braço a Syrah, que aceitou depois de fazer uma breve reverência. 

Caminharam de braços dados em um silêncio confortável. Syrah podia sentir o calor que emanava do corpo de Ethan. Podia sentir os músculos dele por debaixo da roupa. Ela pensou em algo que Amy, sua criada, lhe contara há duas noites, momentos antes dela entrar no palco para a apresentação: Acho que Ethan fará um belo casal com você. Os dois possuem uma postura de liderança e sabem lidar com o povo. Além de se encaixarem perfeitamente, como uma chave numa fechadura. Vocês são tão parecidos, e ao mesmo tempo tão... tão diferentes.

Ethan espirrou e isso a trouxe de volta à Terra. 

 — Posso ficar com o bilhete, Alteza? — Syrah perguntou, esperando não estar corada. 

Ele riu, o que foi agradável. 

— É claro que...

Antes que ele pudesse terminar a frase, os dois chegaram na área verde do castelo. 

 O pôr-do-sol em Angeles era especial, e Syrah podia sentir no ar que tudo naquele lugar era mágico. Até mesmo o farfalhar das folhas produzia um vaivém gostoso de se observar. O jardim parecia coisa de outro mundo. As flores disputavam espaço com o muro alto feito para evitar os ataques dos rebeldes. A grama estava livre, leve e solta. Diferente dos guardas que mais pareciam estátuas do que homens. 

— Uau — disse ela. — Nunca pensei que poderia ser tão lindo ver o sol se pondo em Angeles. 

— E eu nunca pensei que poderia encontrar algo ou alguém mais bonito que isso — disse Ethan, apontando para o horizonte. 

— Ah, não? — perguntou Syrah, sorrindo. 

— Não — admitiu Ethan. — Às vezes é bem mais encantador ver uma pessoa corada do que o pôr-do-sol.

Ela deu um leve aperto na mão dele. Ethan corou.  

— Disso eu não tenho dúvidas — disse Syrah, enquanto admirava as cores quentes do pôr-do-sol no rosto do seu príncipe encantado.