História A Few Miles From The Sun - Catradora - Capítulo 7

Catra 

No sábado, eu acordei muito mais cedo do que gostaria. Olhei no relógio, vendo que eram 9:30. Quase voltei a dormir, mas tinha uma mensagem. Era de 12 minutos atrás, de Adora.

Adora
Oi, Catra! O pessoal vai fazer um piquenique hoje no Parque, lá pelas 13 horas
Vamo?   

Pessoal... provavelmente Mermista estaria lá. E com certeza eu iria ficar pensando na banda dela e na Scorpia. Pensei em não aceitar.   

“Ah, dane-se. Eu não tenho nada melhor pra fazer mesmo”.

Eu
Blz. Levo alguma coisa?

Adora
Pode levar algum salgado e bebidas
A gente se reúne em frente a farmácia e depois procura um lugar pra se instalar
Q bom q vc vai :3   

Ah não, o maldito emoji fofinho. Estapeei minha testa.   

“Essa menina deve tá entendendo tudo errado”.   

Me permiti dormir até quase meio dia depois daquilo. Eu podia passar em algum lugar e comprar as coisas no caminho.   

“Hum... O que eu visto?”   

Com o calor que fazia, optei por shorts pretos e uma camiseta de alças finas. Não me importei em usar sutiã.   

Faltando 15 minutos pro piquenique, eu saí de casa. O parque era relativamente perto, e tinha uma padaria no trajeto.   

De longe, vi que Mermista e Frosta já tinham chegado e estavam em frente à farmácia. Ótimo, nem um pouco estranho e constrangedor.    

– Oi, Catra! – Frosta cumprimentou, animada.    

– E aí – eu disse, meio friamente.   

Mermista apenas meneou a cabeça.   

Seguiu-se um silêncio ensurdecedor por alguns minutos. Mermista o quebrou, se aproximando de mim com um panfleto na mão.    

– Scorpia pediu pra eu te entregar. Ela não vai sossegar enquanto você não for falar com ela.   

No panfleto, uma foto da banda Crimson Rose se destacava, junto com as palavras “Crimson Rose no Salineas! 21 horas”   

Percebi que era a data daquele dia.    

– Ela quer muito que você vá ver a gente hoje – continuou, inexpressiva.    

– Valeu, eu vou pensar.  

*Eu realmente considerei a ideia. Não que eu quisesse conversar nem nada disso, só senti uma vontade genuína de ir.   

Nesse momento, o carro de Adora passou por nós. Dois minutos depois, Adora, Bow, Glimmer e Entrapta caminharam até a gente.

Adora usava um vestido amarelo, de botões. Tinha um decote discreto, que eu tinha certeza que gastaria toda a minha energia pra não encarar.    

– Hey, Adora.    

– Hey, Catra.    

– Hello? – Mermista disse, num tom sarcástico – eu também tô aqui, não sei se vocês perceberam.   

Depois de cumprimentos e essas coisas corriqueiras que eu não sou boa, nós encontramos um banco e mesa pra sentarmos.   

Logo a mesa estava com uma toalha, mini sanduíches, refrigerantes, suco, pratos de plástico e mais uns petiscos. Adora nem esperou tudo ficar pronto, já começou a comer antes de todo mundo.    

– Foi mal, gente – disse, com a boca cheia – eu tô morrendo de fome.    

– Quando que você não tá morrendo de fome, Dora? – Glimmer retrucou, revirando os olhos.    

– É – Bow completou – igual aquela vez que a Glimmer levou a gente pro casamento da tia dela, e você foi pega roubando a comida na cozinha, antes da festa começar.   

Adora bufou. O resto de nós, por outro lado, rimos com o relato.    

– Vocês nunca vão esquecer isso, né?    

– Não! – Glimmer passou o braço pelos ombros de Adora – a gente vai sempre lembrar e sempre te zoar por isso!   

Observei enquanto comia em silêncio. Esses três tinham boas memórias juntos. Senti uma pontada de ciúmes. Eu não conseguiria ser amiga das pessoas que estavam ali. Não de verdade, pelo menos. Não do jeito que eu os via.    

– Entããão – começou Frosta – Entrapta tá de caso proibido, hein?   

Entrapta quase cuspiu o suco que estava bebendo.    

– Você contou, Mermista?!    

– É minha irmã, Geekzinha, o que queria que eu fizesse?    

– Bom, acho que não tem como negar mais. Sim, o nome dele é Hordak, ele foi meu professor dois semestres atrás. Esse ano eu procurei ajuda pra um projeto e ele era a melhor pessoa pra me ajudar e bem... o resto vocês já sabem.    

– ENTRAPTA! – Glimmer tinha uma vontade incontrolável de deixar todos surdos – O PROFESSOR HORDAK NÃO É IRMÃO DO REITOR? VOCÊ TÁ DOIDA?    

– GLIMMER! – Adora gritou de volta, quase no mesmo volume de voz que Glimmer – Se alguém escutar ela tá frita! Fala baixo, o escândalo você já fez ontem!   

Bow começou a gargalhar e deu um tapinha na mesa.    

– A Glimmer é cinquenta por cento surto e cinquenta por cento glitter, Adora, você sabe.    

– Cala a boca, bibliotecário! – ela respondeu, mas riu logo em seguida.   

De novo, fui atingida por um sentimento de exclusão. Eles conversavam tão animadamente, e eu só observava.   

Depois de comer, Frosta disse que queria jogar alguma coisa. Ela até trouxe uma bola.    

– Não tô muito afim não – eu disse – vão vocês, eu fico aqui vigiando nossas coisas.   

Fiquei prestando atenção enquanto os outros jogavam a bola uns pros outros, e não podiam deixar a bola cair. Adora era muito boa, não deixou cair nenhuma vez.   

Observei enquanto ela rebatia a bola, com sua face concentrada. Quando a bola caía no chão, não por culpa dela, claro, sorria e ria escandalosa, fazendo aquele ronco esquisito, como um porco.   

Como tudo nela podia ser tão bonito?  

Afastei esses pensamentos quando Mermista veio até a mesa e pegou uma garrafinha de água. Depois de algumas goladas, ela puxou conversa.    

– Vai hoje?    

– Acho que vou sim. O pessoal não vai?    

– Não, Entrapta e Glimmer tão ocupadas com a faculdade, e parece que Bow e Adora têm compromisso com suas famílias.    

– Então vai ser só eu.   

Ela continuou tomando água, não respondendo em seguida.   

Por fim, disse:    

– Eu não ligo se você vai ser fria comigo nem nada, mas a Scorpia tá se esforçando. Ela sente falta da sua amizade.   

Soltei um riso pelo nariz.    

– É, ela não para de me ligar. Mas você não precisa fingir que se importa e ficar dando conselhos.    

– Ai, rude. Eu me importo com a Scorpia, essa conversa não é por você – ela se sentou do meu lado – eu tô cansada, se quiser ir jogar, eu fico olhando as coisas.   

Assisti o jogo por mais alguns segundos. Eles pareciam estar se divertindo.    

– Tá, eu vou. Valeu.   

Levantei e fui até o resto do pessoal. Adora me olhou do mesmo jeito daquele dia depois do ensaio. Eu realmente achei que ela fosse tentar alguma coisa. Mas eu não queria nada. Senão eu me machucaria, e a machucaria também, no processo. Eu evitava a todo custo me aproximar dela, era monossilábica. Por um tempo parecia funcionar, mas às vezes, a pegava olhando pra mim.   

Entrei no jogo, e era óbvio que todos tentavam me sacanear. Eles jogavam a bola na minha direção, longe demais, alto demais. Mas eu era rápida. Só deixei cair uma vez. Uma hora, dei uma manchete digna de campeonato de vôlei, e todos vibraram. Adora bateu palmas. Depois das 15, todos estavam cansados, e Mermista tinha um show pra fazer.

[...]

O Salineas ficava numa rua cheia de bares em Boston. Ele estava sempre lotado. Saí de casa bem cedo, tive que pegar ônibus e metrô.  

Cheguei oito e meia, e o bar estava lotado. Ouvi música, mas não era a Crimson Rose ainda.   

Quando entrei no bar, o espaço pra músicos estava montado, com o microfone de Scorpia ao centro, o cajon de Mermista à esquerda e o violão de Perfuma à direita. Não tinha nem uma mesa livre que eu pudesse sentar.   

Fiquei em pé, encostada na parede perto da porta.    

Tinha gente de todos os tipos lá. Meninas com pique de patricinha, caras com tatuagens cobrindo 100% da pele visível, casais melosos.   

Isso que é incrível sobre a música. Ela une.    

Eu tinha certeza que todos que estavam ali queriam ver a Crimson Rose. Elas estavam bem famosinhas.   

A música que tocava nas caixas de som parou, e as meninas apareceram. As pessoas do bar aplaudiram e gritaram. Quem sabe isso aconteceria com a Prime também.   

Scorpia usava coturnos, uma calça preta e uma camiseta vermelha transparente, que deixava à mostra um top preto. Mermista estava com uma calça de estampa militar larga e uma regata preta. Perfuma, uma saia longa branca e uma blusa tipo cigana rosada. Ninguém diria que elas faziam parte da mesma banda, se fossem julgar só pelas roupas.    

– Boa noite, Salineas! – Scorpia disse ao microfone – espero que todos tenham uma ótima noite!   

Aplausos e gritos foram ouvidos de novo.   

Perfuma começou a tocar no violão uma melodia conhecida. Eu nunca imaginei essa música sem o arranjo original, mas a Crimson Rose fazia funcionar perfeitamente. A introdução não foi tão longa quanto à gravação do 10cc. A voz grave de Scorpia tomou o ambiente.

I'm not in love
So don't forget it
It's just a silly phase I'm going through
And just because I call you up
Don't get me wrong
Don't think you've gotten me
I'm not in love
No, no
It's because   

Eu achava essa música um tanto cômica. Alguém que está claramente apaixonado, porém não quer admitir.

I'd like to see you
But then again
It doesn't mean you mean that much to me
So if I call you
Don't make a fuss
Don't tell your friends about the two of us
I'm not in love
No, no
It's because   

Na parte instrumental que se seguiu, Scorpia percebeu que eu tinha ido. Ela sorriu e acenou pra mim. Eu não soube lidar com a situação, pois algumas cabeças se viraram na minha direção, curiosos pra saber pra quem a incrível vocalista da Crimson Rose estava acenando. Meneei a cabeça timidamente de volta.

I keep your picture
Upon the wall
It hides a nasty stain that's lying there
So don't you ask me
To give it back
I know you know it doesn't mean that much to me
I'm not in love
No, no
It's because
Oh, you'll wait a long time for me
I'm not in love   

O estilo da CR era mais acústico, mas a presença delas era tão forte, marcante, que era suficiente pra todos os que assistiam amarem. Elas anunciaram o intervalo após algumas músicas, e Scorpia veio diretamente na minha direção.  

– Tô feliz que você veio, Wildcat!  

– Já pedi pra parar de me chamar assim.  

– Tá, foi mal – ela fez um biquinho.  

– Para, Scorpia – eu disse, rindo um pouco – parabéns, foi muito bom. Seu público te ama!  

– É, mas eu sempre acho que não é pra tanto – seguiu-se um silêncio breve, e ela desviou o olhar, e depois voltou a olhar pra mim – você veio pra fazer as pazes?  

– Não tão rápido. Eu vim pra assistir vocês.  

Ela sorriu.  

– Já é um começo.   

Nesse momento, Perfuma veio até nós.  

– Amor, vai tomar uma água antes que o intervalo acabe – ela disse, depois olhou pra mim e sorriu – Oi, Catra.  

Eu admirava muito a capacidade da Perfuma de tratar todos bem. Não era uma coisa que eu conseguia realizar.    

– Oi – respondi, meio envergonhada – foi muito legal!    

– Obrigada!    

– Bom, Wildcat, vou voltar lá.    

– Eu vou voltar pra casa. Tchau pra vocês, bom resto de show.   

Elas não responderam enquanto eu me virava pra porta. Eu ainda estava magoada, mas um pouco da raiva tinha passado. Eu ainda não estava pronta pras coisas voltarem ao normal, mas tinha caminhado um pouco.