- Hinata, você é tão fofo - comentou o moreno, apertando as bochechas do garoto. - Tem certeza que está indo para o ensino médio?
- Tenho, Grande rei. - Sorriu para o maior. Estava, estranhamente, entre Iwaizumi e Oikawa. Sentia que não devia estar ali no meio. - Hajime-san, está tudo bem?
O vice capitão era razoavelmente quieto, e tinha uma aura tranquilizante. Shouyou não estava acostumado com isso, já que até Kageyama conseguia ser barulhento às vezes, e estranhou ver o maior tão calado.
- Pode me chamar de Iwa, é assim que meus amigos me chamam - disse, afagando o cabelo do mais novo. - Mas está tudo ótimo.
- Você é tão quieto...
- Ele sempre foi assim - Interveio Kageyama, se lembrando de quando eram mais novos. - Antigamente, ele era muito tímido, e vivia tentando separar minhas brigas com o Oikawa.
- Nós brigávamos demais - comentou o outro, nostálgico. - E ainda brigamos, não é?
- Hinata - Saeko chamou, mas sem tirar seus olhos da pista em sua frente -, você é filho único? Como foi sua infância?
- Eu tive uma irmã - o baixinho respondeu, um pouco cabisbaixo. - Ela era muito parecida com você, Tobio, durona e irônica, mesmo sendo mais nova que eu. Mas ela era muito doente, nascida de uma gravidez complicada e com a saúde bem sensível. - Lembrou-se do corpo pequeno deitado no quarto, com toalhas frias em sua testa para afastar a febre alta. - Até os dez anos, as doenças nunca tinham levado a melhor, ela era uma garota forte, minha irmãzinha. Mas um dia ela foi diagnosticada com câncer nos pulmões, e sua saúde foi de mal à pior. Não pudemos fazer nada quando ela morreu.
O clima no carro se tornou um pouco tenso, e Kageyama reprimia a amiga por ter tocado no assunto. A verdade era que ela não tinha como saber que se tratava de um terreno delicado, e o ruivinho não a culpava.
- Eu não estou triste - Assegurou o pequeno, com uma das mãos no ombro da mulher que dirigia. - Não se preocupe, nossa família prometeu que não iria lamentar a morte dela, mas celebrar sua vida.
- Uma boa decisão - comentou Hajime, que com suas poucas palavras conseguia dizer muita coisa.
- Eu também achei.
A viagem de carro continuou com o clima pesado se dissipando aos poucos, enquanto Saeko e Oikawa cantavam - ou assassinavam - a letra de uma canção de ritmo estranhamente dançante. Os dois mais animados do carro se divertiam de maneira barulhenta, enquanto os outros conversavam.
- Kageyama, Você decidiu mesmo ir para o Karasuno? - indagou Hinata, vendo o amigo olhar em sua direção como se não entendesse como sabia daquilo.
- Oikawa, não foi? - Um pergunta retórica, já sabia que havia sido ele.
- Deve ter sido quando ele te viu perto da escola, não é? - o Hajime sugeriu, recebendo um aceno do ruivo. - Eu soube que vocês tiveram uma conversa e tanto. Não se assuste, Oikawa pode ser um idiota, mas é um idiota de bom coração.
- É, eu posso ver isso agora. O grande rei faz de tudo pelos amigos - comentou o baixinho.
- E você agora é um dos nossos - Tooru se pronunciou, seguido pelo coro da concordância de todos no carro. - Não tem escape.
- Como se qualquer um fosse capaz de se esquivar de você, Oikawa - Tobio retrucou.
- Mas não fuja da pergunta - Repreendeu Shouyou. - Está mesmo decidido?
- Estou. É o que eu quero, e é para lá que eu vou.
Kageyama não deixava espaço para discussões quando estava decidido sobre algum assunto, e aquele parecia ser o caso. Por isso, Hinata não insistiu. De qualquer maneira, bastava que o moreno estivesse feliz com as próprias decisões.
A inércia surpreendeu a todos quando Saeko parou o carro em frente à uma pequena loja de conveniência daquelas que ficam abertas 24/7.
- Hinata e Hajime, vão comprar alguns salgados para nós naquela lojinha - a mulher apontou para o pequeno estabelecimento -, nós lhe daremos o dinheiro.
Com as escolhas feitas e o dinheiro necessário em mãos, os dois deixaram o carro e entraram no local, se direcionando até a área desejada. Como todos os itens na lista eram um tanto semelhantes, não precisaram se separar para ter eficiência.
Iwaizumi o olhava como se quisesse perguntar alguma coisa ou fazer um comentário, mas sempre que era percebido, continuava à procura dos produtos. Até que Shouyou começou a ficar preocupado com o assunto, e não conseguia segurar sua ansiedade.
- Iwa, o que aconteceu? - indagou, subitamente, enquanto o outra pegava um saco de salgadinhos em uma estante alta além do alcance do menor - Você quer me perguntar alguma coisa?
- Na verdade, eu só queria saber qual exatamente é a sua relação com o Tobio. - Depois de colocar o objeto na cesta, ambos foram para a sessão ao lado, a de bebidas, para continuar a compra. - Não acho que está muito claro.
- Eu também não sei...talvez bons amigos? - disse o ruivinho, incerto sobre a própria resposta.
- Ninguém nos engana melhor que nós mesmos. - Hajime riu, por que já estivera no lugar dele, mesmo que em uma situação um pouco diferente. - Só espero que se decidam antes que seja tarde demais, e o destino tenha decidido por vocês.
Seguiram para o caixa sem trocarem outras palavras, deixando que a fala do outro se assentasse em sua mente. Pagaram pelas compras rapidamente, indo ao carro em que os amigos estavam, e aparentemente Kageyama estava sendo importunado.
- Eu já disse que não vou servir de babá para o seu irmão, Saeko! - ele gritou, irritado pela insistência da loira.
- Não é exatamente uma babá, o Ryu é mais velho que você! Eu só quero que ensine alguns truques a ele, nada mais.
- Por que não? - questionou Hinata, entrando no carro e sendo imitado pelo Hajime. - Qual é o problema em ajudar ele?
Kageyama ficou desconcertado com a fala do menor, pensando que não poderia ter chegado em pior hora. Olhou para o estacionamento da lojinha através da janela do carro, resmungando um "nada" em resposta.
- Se o Hinata ajudasse, você viria. - A loira estava agora dando partida no carro, uma vez que todos já se encontravam em seus lugares. - Você ajudaria, Shouyou?
- Claro! - ele concordou animado.
- Está vendo, Kageyama? Vou marcar com meu irmão, ele vai gostar de treinar com vocês. E ele está na escola que você quer ir, Hinata.
A viagem continuou enquanto o carro era tomado por discussões sobre a qualidade do time de vôlei do Karasuno, e como eles eram conhecidos por "corvos caídos". Alheio à conversa estava um Kageyama emburrado, que logo desistiu de se excluir do grupo, finalmente participando do diálogo.
- Obrigado, gente.
Sua voz se elevou acima dos burburinhos no carro e todos pararam de conversar, olhando para ele como se estivesse ficando louco, já que não era de agradecer assim, do nada.
Saeko, a única que não podia tirar os olhos da estrada, ou poderia perder a direção do carro e causar um acidente, pousou uma de suas mãos na coxa esquerda do maior. Apertou o local amigavelmente, como se dissesse que entendia o que queria dizer. Logo depois, voltou a mão ao volante, sem dizer uma palavra.
Hajime também não precisava de muito para entender o moreno, afinal, tinham personalidades parecidas. Por outro lado, Oikawa e Hinata eram pessoas mais literais e só entendiam o que lhes era dito com palavras exatas, nada de significados soltos no ar, nada de interpretação ou subjetividade. Isso não funcionava com eles.
- Obrigada por quê? - indagou o menor entre todos no carro, com sua inocência.
- Você nunca foi de agradecer assim, tão de repente... - comentou Tooru, sem entender o comportamento do amigo de infância.
- Vocês são dois lerdos - Kageyama Riu, juntamente com os outros que entendiam a situação. - Eu estou agradecendo por tudo. Por terem estado ao meu lado, não importa quando; por terem me apoiando, sem desistir de alguém como eu - Pausou, olhando para os olhos do ruivo. - Shouyou, obrigada por existir aqui. Você me salvou primeiro, e nada do que aconteceu depois vai mudar o fato de você ter sido um anjo para mim. Talvez eu não estivesse vivo, ou feliz, se não fosse por você.
Viu os olhos de baixinho começarem a lacrimejar, enquanto um sorriso sincero se formava em seus pequenos lábios rosados e perfeitos. Movendo sua boca, sussurrou algo que Tobio não conseguiu entender. Decidiu deixar de lado e continuar seu discurso, pois outra hora talvez não tivesse a coragem necessária. Há coisas que um adolescente rabugento só diz em momentos como aquele.
- Oikawa, obrigado por ser essa pessoa estúpida que me encheu o saco desde pequeno - sorriu para o amigo que, sensível demais, já estava começando a segurar as lágrimas que o tentavam assaltar. - Eu sei que você se culpa pelo que aconteceu antes, mas eu não te culpo, e a minha opinião é o que importa. - Risos soaram pelo carro em movimento, até mesmo daquele que não entendia a referência. - Nós nos reencontramos, e você está mais idiota agora, mas eu nunca disse que não amava isso em você.
O mais velho não durou nem até a metade do discurso, e já estava em prantos nos braços de Hinata, recebendo um cafuné de Iwaizumi. Soluçava, chingando o amigo com a palavra que parecia a única em seu dicionário : 'estúpido'.
- Saeko e Iwa, acho que vocês não precisam de explicações, mas isso não faz de vocês menos importantes. Apenas mais inteligentes - falou, recebendo resmungos em respostas dos dois ingênuos. - Vocês são tão importantes para mim que eu os considero como uma família desequilibrada e estranhamente fora de ordem. Só não esperem que eu repita essas palavras antes de morrer.
Mesmo que contra a vontade do grupo, sorrisos apareceram em suas faces, contagiando o clima do carro, que se encontrava em um estado de silêncio confortável e melódico, seguindo o ritmo das respirações e dos soluços daqueles que ainda choravam um pouco.
Minutos depois estavam saindo do carro com as compras - da pequena lojinha de conveniência que haviam visitado - divididas em sacolas; uma para cada pessoa, com excessão de Kageyama, a estrela do dia. Andaram um pouco, até que o primeiro da fila, no caso, Oikawa, estancou no lugar, finalmente percebendo aonde Saeko os estava levando.
- Sua retardada loira, eu te amo - ele falou, abraçando a amiga. - Nunca imaginei que fosse nos trazer aqui...
- Bem, eu senpre soube que essa praça era especial para vocês, e que lugar melhor para se celebrar o presente senão um marco do passado?
- Com essa eu até acreditava que você é inteligente - Tobio levou um tapa na cabeça, e Hinata riu, parando ao ser fuzilado pelos olhos do garoto.
- Onde ficaram aquelas palavras bonitas, Tobio? - indagou Hajime, com um sorrisinho de canto. Ele era quieto, mas quando falava, suas palavras tinham peso. Ou uma ironia que irritava o garoto.
- Vamos logo antes que alguém se machuque - A loira recomendou, puxando Hinata pelo braço, enquanto Tooru e Iwaizumi iam de braços dados atrás do grupo.
Kageyama ficou por último, observando os amigos atravessarem o gramado da praça, ao lado do estacionamento, para alcançarem o centro do local, onde ficavam os brinquedos e alguns bancos de pedra. Os garotos riam de alguma coisa que Saeko dizia, enquanto outros grupos de pessoas passavam por ali, se divertindo à sua própria maneira.
Estava de volta àquele lugar. Não completamente igual ao que se lembrava de sua infância com os outros dois garotos, mas similar o bastante para desenterrar momentos do passado dos quais, às vezes, mal se lembrava.
Seguiu-os, mancando levemente, á que não podia colocar muita força em uma das pernas, e acariciando o braço enfaixado por causa dos ferimentos dos cacos de vidro, já curado da torção. Alguns cortes em seu antebraço foram profundos ao ponto de se inflamarem facilmente, o que prolongou o período de cura, além das feridas terem se reaberto por causa de um choque que teve por causa de certo medicamente que não se lembrava.
Tocar na gaze que envolvia o membro fazia com que não esquecesse do acidente, e também o lembrava da garota estranha que o visitava pelas noites. Não queria esquecê-la, pois sentia que era errado fazer tal coisa, mas, naquele momento, queria aproveitar os amigos e se esquecer um pouco daquele quarto de hospital. Por isso, acelerou o passo e tentou alcançar o resto do grupo, que já estavam se sentando nos bancos e preparando os lanches na superfície liza da pedra.
Obrigado por tudo, garotinha irritante. Ele riu ao ver que falava sozinho, mas esperava que ela pudesse ouví-lo de sua mente. - Eu entendi seus conselhos agora, e sei que tenho amigos com quem contar. Espero que não esteja rindo de mim, mas ainda quero agradecer por todas suas palavras estranhas e enigmáticas tarde da noite. Obrigado, Garota das Visitas Noturnas.
Viu seus amigos acenando em sua direção, rindo e gritando para que se apressasse ou não sobraria comida, pois comeriam tudo. Aquela era sua família, e aquele era o único lugar de que precisava para retornar após um dia horrível. Seriam eles que segurariam suas mãos, ou amparariam seu desespero, e caçoariam quando fosse estúpido. Seriam eles que ririam consigo, mas também chorariam ao seu lado.
- Vamos, Tobio, ou eu vou chutar sua bunda magra no meio dessa praça!- A voz de Oikawa soou extremamente alta.
- Ele está doente! - Repreendeu Hinata, que recebeu um "quem se importa?" como resposta.
Em algum lugar de sua cabeça, uma garota sorria.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.