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História A Reserva - Morte e perdão


Escrita por: Almaro

Capítulo 48 - Morte e perdão


O mundo não parou, a vida não parou, as rotinas continuavam a mesma e até a dele não tinha mudado desde que chegou a Xangai, doze dias atrás. 

Yuuri estava em coma e os médicos diziam que nesse estágio o que podiam fazer era aguardar até o corpo e o organismo reagirem, só isso. E em virtude disso o russo não arredava o pé do hospital e estava praticamente hospedado lá, depois de um tempo dormindo no corredor da UTI, a direção do hospital cedeu um quarto no alojamento dos funcionários e ele aceitou. 

Seus dias se resumiam a ir ver o japonês, conversar com as crianças pelo celular e rezar, essa era a sua rotina. E todos os dias no final do dia se sentia esgotado e chorava por tudo que aguentou e suportou até ali. Tentava não perder a esperança. Assuntos importantes não conseguiam ganhar o seu verdadeiro interesse, sem Yuuri, nada para o platinado fazia sentindo. 

Estava deitado olhando para o teto quando escutou batidas na porta do quarto e viu a Dra. Li colocar a cabeça na pequena abertura. O coração russo falhou uma batia ao se sentar com pressa. 

- Victor? - A mulher viu os olhos azuis se encherem de água e imaginou o que se passava por sua cabeça, por isso entrou e se sentou ao seu lado na cama. Médicos não andavam por esses corredores onde ficava o quarto do russo e entendia que sua visita era no mínimo estranha, só poderia significar uma coisa. Envolveu a mão do platinado com as suas. - Ele te escuto, Victor... Ele ouviu sua voz e achou o caminho de volta. - Victor balançou a cabeça, não entendia o que a médica dizia. - Ele acordou... ele acordou e chamou por você!

Victor começou a chorar alto e abraçou a mulher miúda. Yuuri saiu do coma!!! Sentiu a médica passar as mãos em suas costas e ele só sabia agradecer entre um soluço e outro. 

- Me escute Victor... - Ela disse se afastando dele gentilmente. - Sei que não foi fácil esses dias, sei que está cansado e, possivelmente, extenuado, mas Yuuri vai precisar de você e muito. - Secou as lágrimas que ainda desciam. - Você pode chorar e deve, mas não passe isso pra ele em forma de desespero... precisamos ir com calma, não sabemos como ele vai reagir às notícias e seu estado emocional é o que mais me preocupa agora que está acordado. - Sorriu apertando de forma carinhosa sua mão. - Quer ir vê-lo agora? 

- Sim... muito. 

Andou pelos corredores se controlando para não sair correndo e arrastar a médica junto com ele, no seu íntimo queria ir pulando até lá tamanha sua ansiedade e vontade de olhar para o seu homem. Segurou a aliança que estava pendurada no seu pescoço, sorria aliviado por seu Yuuri, tudo se resolveria, tudo voltaria ao normal. 

Chegaram a entrada da UTI e sabia de todos os procedimentos que passaria, não poderia pular nenhuma das etapas e tudo era para o bem do seu amor que se recuperava, mas mesmo assim o russo não conseguia parar de tremer, seus olhos não se concentravam em nada e a todo instante vagavam para a porta que daria acesso a sua vida. 

Todos da equipe médica acabaram se envolvendo de algum jeito com a situação, todos em algum momento se colocaram no lugar do russo e tentavam sentir o que ele sentia e passava. Então, não foi uma surpresa para o platinado, quando a auxiliar de enfermagem levantou os olhos rasos cheios de lágrimas prestes a cair.  - Senhor Nikiforov já sabe o caminho... pode entrar. 

Victor titubeou, sua mão parou o movimento no meio antes de tocar a maçaneta, o medo o invadiu igual a todas as outras vezes que fez o mesmo percurso, seu nervosismo era palpável para qualquer um que estava na enfermaria e o observava. Respirou fundo, levantou a cabeça e abriu a porta. 

Escutou os sons dos monitores, seus bipes viraram seus parceiros constantes em todos os momentos que passou com Yuuri nos últimos dias, mas no momento outro som se sobrepôs... o mais bonito, o que mais pediu para escutar todos esses dias, o mais importante para continuar sua vida. 

- Vitya? - A voz estava rouca e baixa, mas era o japonês que o chamava. - Vitya? - Yuuri virou a cabeça em direção da porta abrindo os olhos. 

- Sim, meu amor. - Estava chorando de novo, mas sorria e foi por entre as lágrimas que viu o moreno estender a mão pra si. A agarrou e beijou varias vezes. - Sim, estou aqui meu amor. 

Yuuri estava chorando também, não se lembrava de muita coisa e não tinha a mínima ideia de como foi parar no hospital e nem de quando o russo chegou, mas avaliou que pelo estado em que o Victor se encontrava muitas coisas haviam acontecido enquanto esteve ausente. 

 

Meia hora mais tarde a Dra. Li abria a porta do quarto para buscar Victor. Yuuri, ainda, estava convalescendo e precisava de muito descanso, mas se surpreendeu com a cena inusitada que viu. 

Victor e Yuuri dormiam juntos no leito. Na verdade, o russo estava quase caindo, mas mesmo assim mantinha o corpo enroscado no do japonês e esse por sua vez repousava a cabeça no peito largo do mais alto. Sorriu... mais dez minutos não vão fazer mal. 

Antes de sair levantou as duas alças laterais do leito para que nenhum dos dois caíssem. Foi ver os outros pacientes, embora fosse médica da UTI e tivesse que lidar com a morte todos os dias, hoje estava sendo diferente e se sentia leve de uma maneira ímpar. 

 

Depois de mais um dia na unidade de terapia intensiva, Yuuri teve alta e foi para um quarto que tinha vista para a rua. Nesse novo espaço, acabaria sua recuperação e seria informado de suas novas condições com os cuidados necessários para levar uma vida normal. 

O russo, agora poderia ficar com ele o tempo todo e isso era bom, mas as perguntas começaram e respondê-las era penoso demais, ainda mais quando se via encurralado a falar uma quase verdade. E determinado assunto de suma importância estava tirando o sono do platinado... Anna e Noah. 

Acreditava que o estado debilitado de Yuuri não era somente físico, o corpo estava se regenerando, mas passou por uma agressão severa e isso geraria um trauma sem sombra de dúvidas.  O fato era que o japonês havia emagrecido muito, estava pálido e careca, tudo isso lhe conferia uma aparência de doente, só que a mente encontrava-se uma confusão com muitas lacunas em branco e sempre que podia fazia os seus questionamentos ao russo. Por isso quando entraram no quarto a Dra. Li, Taylor, o investigador e o psicólogo Dr. Chang, Yuuri encarou o platinado sabendo que ele havia lhe escondido alguma informação. 

- Como você está se sentindo hoje, senhor Katsuki? - Começou a doutora.  

- Bem... eu acho. - Olhou para todos e voltou a encarar o russo que segurava sua mão. - Como estão os meus filhos? - Não sabia o porquê, mas tinha uma certeza dentro do coração de que o assunto envolvia seus pequenos. 

- Estão bem em São Petersburgo. - Focalizou seus dedos entrelaçados e em um fio de voz completou. - Me perdoe... eu não consegui... eles estão no orfanato São Nicolau.

Yuuri o soltou, não tinha escutado direito... - Onde? - Mas o russo não respondeu mais, seu pranto já tomava conta do seu ser e o moreno observava seus ombros sacudindo vez ou outra. 

- Pequeno as crianças foram recolhidas e acolhidas no São Nicolau, mas elas estão bem... o pai de Otabek impediu que elas fossem transferidas... - Yuuri parou os olhos em fúria no rosto do Taylor. A tempestade chegou. 

- Houve uma denúncia senhor Katsuki e desconfiamos que foi por isso que Emílio Fredricksen viajou para Moscou. - O investigador tentava esclarecer, mas...

A menção ao nome do empresário desencadeou uma avalanche de sentimentos no coração e mente de Yuuri que sem pensar duas vezes, virou-se para o braço e arrancou a agulha que estava na veia fazendo escorrer um filete de sangue do local, jogou longe o lençol que o cobria e tentou se colocar de pé. Precisava ir embora, precisava proteger seus filhos. Na sua cabeça a imagem do empresário sorrindo e falando o que faria a suas crianças se repetia sem parar. 

O primeiro que o tentou segurar foi o psicólogo e embora o japonês estivesse fraco o golpe com o pulso foi certeiro e o doutor caiu, agora era a vez do investigador que teve o braço torcido e jogado contra a parede. Victor o abraçou por trás enquanto pedia perdão por não ter conseguido cuidar das crianças, mas Yuuri não escutava mais, seu choro e gritos eram insanos e a médica não teve alternativa senão aplicar um sedativo. 

Taylor o deitou novamente na cama com pesar, sabia que a tormenta estava só começando. 

 

No dia que se seguiu, Yuuri se tornou mais recluso e o único que conseguia tirar dele mais que algumas palavras era o russo, por isso Victor foi orientado a conversar sobre amenidades. 

Só que a polícia precisava esclarecer alguns pontos e a médica pediu para o psicólogo falar com o moreno primeiro. A conversa foi acompanhada apenas pelo russo que se manteve ao lado do noivo calado. 

- Me desculpe... - O doutor apenas balançou a cabeça afirmativamente. 

- Senhor Katsuki... não vou falar que tenho ideia pelo que passou, porque não tenho e não estou aqui para dopa-lo ou qualquer coisa do tipo, não é minha função. - Respirou fundo. - Mas quero deixar claro que sou contra a conversa que precisam ter com o senhor e preciso que esteja o mais confortável possível para isso, então, quero que pense em um local que lhe traga paz, segurança e conforto. - Yuuri fechou os olhos e sua mente fugiu para a reserva, seu lar e seu porto seguro. - Achou? Bom... esse lugar é seu e todas as vezes que precisar use isso ao seu favor, lembre-se dos sentimentos bons que lhe traz. Não vai ser fácil, a conversa vai lhe trazer sentimentos e sensações que seu corpo e mente não querem sentir, por isso preciso que se concentre nesse lugar... não quero que se machuque e fale quando estiver cansado ou senão irem interferir para que nada de ruim aconteça. Ok? Acha que está preparado? Acha que consegue? 

- Tudo bem, eu... eu vou tentar, mas... quero falar com meus filhos e minha família primeiro. 

O moreno conseguiu falar com os filhos atrás de Yurio e ligou para a família no Japão, foram conversas curtas e recheadas de muita emoção. 

O quarto mais uma vez estava cheio de pessoas e o investigador começou, informou sobre o incêndio no galpão e o japonês confirmou que foi o local que serviu de cativeiro, soube, também, que os bombeiros acharam quatro corpos carbornizado e que eles acreditavam ser os homens que trabalhavam para o empresário. Descobriu que o Fred foi quem fez a denúncia sobre seus filhos e, que muito possivelmente, foi para a Rússia buscar as crianças, mas como um juiz aposentado interferiu não teve sucesso e que o mesmo foi preso quando saiu fugindo de Moscou em direção ao Brasil, após ver no noticiário sobre o resgate no porto de Xangai. Foi informado que o demônio loiro, Jason Cruz, era o único foragido e que tinha uma extensa lista de crimes na ficha que começava quando recebeu baixa desonrosa do exército americano. E por último, perguntou sobre o Dr. Edgar Elliot e a doutora Li o colocou a par da situação. O médico estava em coma desde o dia da fuga  e que seu quadro era irreversível. 

No final, Yuuri estava as lágrimas, mas conseguiu se controlar e não teve nenhum surto, muito embora as suas mãos estivessem vermelhas de tanto que apertou e torceu no decorrer da conversa. 

- Quando posso ir embora? - Queria ver os filhos, queria tomar as rédeas de sua vida de volta. Tinha perdido um mês de sua vida e não queria perder mais nenhum segundo. Segurou firme a mão do russo. 

- Yuuri, se tudo continuar bem acredito que na próxima semana. - Dra. Li estava otimista. 

Victor o beijou na testa antes de juntá-las. - Você está bem?

- Sim. Quero ver meus filhos. 

- E nós vamos. 

- Você ainda me ama? - A pergunta pareceu ao platinado fora de propósito e mesmo não entendendo respondeu. 

- Com todo o meu coração. - Yuuri se recostou nele e fechou os olhos, o dia foi longo demais. 

 

Dois dias depois a Dra. Li bateu na porta, seu semblante sério se suavizou um pouco quando viu Yuuri sentado de frente pra janela com os olhos fechados e foi assim que ele a cumprimentou. 

- Oi. 

- Como está Yuuri?

Ele se voltou pra ela, seus olhos continham uma tristeza, mas mesmo assim sorria. - Melhor. 

Victor e Taylor estavam no mesmo recinto e só acenaram com as cabeças. 

- Yuuri preciso conversar com você. - O assunto era delicado, lidar com morte sempre foi. - O Dr. Elliot teve morte cerebral, foi confirmado agora a pouco e... - Olhou para os outros homens. - O Taylor colocou o hospital em contato com seu advogado e não me pergunte o porquê das escolhas, mas Edgar não tinha família ou qualquer pessoa que considerasse uma. Só tinha... você. - O japonês a encarou com surpresa. 

- Como é? Mas... mas... - Respirou forte. - Continue. 

- O seu advogado está vindo e está trazendo os documentos necessários, mas preciso que você autorize a doação dos órgãos. Sabe que alguns se deterioram rápido. 

Yuuri não sabia o que dizer, o médico infernizou sua vida, participou do seu sequestro, quase o matou e agora isso... no fim deu sua vida para salvá-lo. E agora? O que fazer?

- Yuuri?

- Traga os formulários, vou assinar. - Voltou-se para a janela. - Posso vê-lo?

O silêncio que caiu sobre o quarto era ensurdecedor, a médica olhava para os acompanhantes como se tentasse entender o pedido e Yuuri se levantou da cadeira. 

- Estou pronto para perdoa-lo.



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