Isabella deu uma olhada ao redor e observou os clientes. Em seguida, desviou a atenção para a rua, através do vidro da janela da frente.
O sol de primavera esparramava-se pelo chão como uma promessa do verão que se aproximava. Observou os transeuntes andando nas calçadas. A cidade estava movimentada, e tudo o que desejava fazer era fechar a padaria e correr para a fazenda.
Apoiando os cotovelos sobre o balcão, imaginou-se assistindo a Rafael trabalhar com os cavalos. O dorso másculo molhado de suor. Os cabelos em desalinho, caindo-lhe sobre a testa.
Sua postura transmitia força e poder. Se tentasse, poderia até sentir o calor do sol na pele e ouvir o sibilar do vento entre as árvores. O Rafael imaginário virando-se e fitando-a com o mais devastador dos sorrisos. Sem poder se conter, sentiu um arrepio na espinha.
- Olá, boneca.
Isabella foi arrancada daquele agradável devaneio para deparar com Diego Herrera. Os lascivos olhos castanhos a percorreram da cabeça aos pés, fazendo-a sentir ímpetos de cobrir os seios com as mãos.
- Como está, Diego. Em que posso ajudá-lo? - Quase estremeceu ao fazer aquela simples indagação que empregava todos os dias.
- Bem, eu... - Diego se inclinou sobre o display de vidro e lhe lançou um olhar que considerava uma de suas melhores armas de sedução. - Ouça, meu anjo, creio que haja uma infinidade de coisas interessantes que possa fazer por mim.
Isabella esboçou um sorriso cortês, mas se manteve a distância. Seu coração não estava mais interessado em flertar.
[♡]
Rafael parou do lado de fora da panificação e ensaiou pela décima vez naqueles últimos quinze minutos o que pretendia dizer a Isabella. Isso, é claro, se ela estivesse com disposição para ouvi-lo.
Por fim, decidiu entrar. Aprumou a coluna e alcançou a maçaneta. Foi quando avistou Diego inclinando-se em direção a sua Bella. Uma gigantesca advertência soou em seu íntimo. Sabia que a decisão estava em suas mãos. Se não lutasse pelo que queria naquele momento, passaria o resto de seus dias se lamentando por isso.
Assim, observou os movimentos galanteadores de Diego e, em resposta, frustração e raiva se misturaram dentro dele.
“Eis ali seu futuro, Vitti.” Se não pudesse convencer Isabella de que a amava, estaria fadado a vê-la nos braços de outro homem. Um que teria o direito de tocá-la, amá-la. Que ouviria os seus segredos e compartilharia seus sonhos. Um homem que não era ele.
Abrindo a porta com força, entrou. Ignorando o burburinho dos clientes sentados às pequenas mesas, olhou direto para o balcão.
Seus olhares se encontraram, mas Isabella conseguiu esconder tudo que estava sentindo. E isso o preocupou. Entretanto, o simples fato de fitar aqueles olhos azuis era suficiente para convencê-lo a permanecer firme e lutar para consegui-la de volta. Sentia que toda sua vida dependia daquele momento.
Mas primeiro era necessário cuidar de alguns detalhes.
Aproximando-se, pousou uma mão sobre o ombro de Diego. Quando o homem se voltou, surpreso, Rafael foi sucinto:
- Dê o fora daqui, Diego.
- O quê? - Deu um passo atrás. - Ora, não me amole! Não pode me mandar embora. Este lugar pertence a Isabella, e sou um cliente.
Ao redor deles, as pessoas começaram a prestar atenção. Rafael percebeu os olhares interessados, mas parecia não dar a mínima. De súbito, era como se no mundo só existissem duas pessoas: ele e a mulher maravilhosa que o fitava, muito surpresa.
- A única pessoa aqui que pode me mandar embora é Isabella! - bradou Diego.
Ambos a fitaram.
Isabella encarou Rafal.
- Vá embora, Diego. - disse ela, convicta.
Muitíssimo desgostoso, Diego bateu ambas as mãos sobre o display e, com um giro de calcanhares, se afastou.
No silêncio aterrador que se seguiu à saída de Diego, Rafael fixou o olhar em Isabella, enquanto contornava o balcão, aproximando-se o suficiente para segurar-lhe o rosto entre as mãos e beijá-la com todo ímpeto.
Quando os clientes começaram a aplaudir, interrompeu o beijo, e, ignorando a multidão, afirmou, ofegante:
- Preciso falar com você.
Os joelhos dela babearam, mas, afinal, os beijos de Rafael sempre a deixaram tonta. Acrescentando isso ao choque total de vê-lo adentrar a padaria e beija-la na frente de quase metade da população de Tesoro, não era o suficiente para deixá-la um pouco trêmula?
E agora ele queria lhe falar. Falar sobre o quê? Que a queria? Que sentira sua falta? Era maravilhoso, mas queria mais do que isso, agora que descobrira o quando Rafael a desejava. Ansiava ouvir as palavras mágicas que a transportariam ao paraíso.
Esfregando os dedos nos lábios, fingiu-se de muito segura e incitou-o:
- Então, fale.
Rafael indicou os clientes.
- Em particular.
Ora! Quando a cidade inteira já sabia o que estava acontecendo entre os dois!
Isabella a fitou os clientes, que os observavam com ávido interesse, e de novo Rafael. Tudo o que tivesse para lhe dizer poderia ser dito ali. Perante testemunhas.
- Não.
- Não?
Alguém atrás deles soltou uma gargalhada.
Isabella meneou a cabeça e prosseguiu:
- Se tem algo para me dizer, diga logo.
Rafael deslizou a mão pela face e esfregou a nuca. Agora não havia como retroceder. Se queria reconquistar a mulher que amava, precisava aceitar o desafio.
- Não vai mesmo mudar de idéia, não é?
- Não.
- Certo. - Assentiu com a cabeça, acenou aos clientes e disse: - Se é necessário falar na frente de toda esta gente simpática, é isso mesmo o que farei.
- Estou ouvindo. - Isabella o encarou, sem piscar.
- Eu estava errado – revelou, imaginando que o melhor modo para começar era admitir o pior.
- Sobre o quê?
- Acho que você deveria explicar... - murmurou.
- Não, Rafael – retrucou, inclinando a cabeça. - Creio que você deve fazer isso.
- Tem toda a razão. - Sorriu, meneou a cabeça, ergueu as mãos e, em seguida, deixou-as cair ao longo do corpo. - Bem, outra vez... Você estava certa acerca de tudo o que me falou, também.
As pupilas de Isabella brilharam, e o sorriso se alargou. Aquela pequena centelha de esperança que se instalara em seu coração no momento em que ele entrara na panificação agora parecia transbordar por seus poros.
- Muito bem, estou gostando dessa conversa.
- E tem mais – continuou ele. No mesmo instante, segurou-a pelos ombros. Os dedos fortes pressionaram a pele macia, e uma quentura intensa apoderou-se dela, espalhando-se pelo corpo todo.
- Até que enfim compreendi que preciso de você. Minha vida não tem o menos sentido se não estiver a meu lado, Bella. Desde que partiu de meu rancho, não tive um minuto sequer de sossego. Não consigo me concentrar no trabalho. Meus dias são vazios e sem cor.
Isabella engoliu em seco e mordeu o lábio inferior, abstendo-se de falar. Agora era hora de escutar e rezar para que Rafael dissesse o que tanto precisava ouvir.
- Nada do que aconteceu antes tem a ver com você. Tudo fica melhor quando está por perto, querida. Sou melhor quando estou a seu lado. Eu te amo, Isabella.
Suspirando de felicidade, ela saboreou aquelas frases.
- Eu não esperava... Não queria... - Rafael torceu a boca e a segurou com mais força, como se ela pudesse tentar escapar. - Contudo, não pude evitar. Isto é amor verdadeiro, e é mais intenso do que julguei ser capaz de sentir.
Mordendo o lábio com mais força, Isabella se conteve. Ainda precisava ouvir mais uma coisa, aquilo que era imprescindível para ela.
- Por favor, case-se comigo. Seja a mãe de Emily e me ajude a lhe dar um monte de irmãozinhos. Vamos constituir uma família sólida e feliz.
Isabella sentiu uma alegria tamanha que achou que ia desmaiar. De uma hora para outra, seu mundo se tornara colorido. Podia antever o porvir fantástico que tanto almejara, agora finalmente a seu alcance. Poderia sonhar em ter sua própria família e ser feliz.
Por um instante, estudou aqueles irresistíveis olhos castanhos e, pela primeira vez, notou um brilho apaixonado. Mas, mesmo assim, não conseguiu evitar a pergunta:
- Antes de lhe responder, tenho de saber, Rafael. O que o fez mudar de opinião?
Rafael dirigiu um olhar rápido à platéia, e mudou de posição, de forma que só pudesse ver o rosto dela.
- Acabei de compreender algo que estava muito evidente.
- O quê?
- Eu tinha... medo de amá-la. - Foi como se acabasse de tirar um peso de cima dos ombros. - Estava assustado com a idéia de acreditar outra vez... de me arriscar. E então, hoje percebi que, se não corresse esse risco, perderia você para sempre.
Puxando-a, enlaçou-a pela cintura. Quando Isabella inclinou a cabeça, ele disse com suavidade:
- Não posso mais viver sem você.
- Oh, Rafael, eu...
Ele riu.
- Ei, sei o quanto lhe custou ficar calada durante os últimos minutos! Mas aguente só mais um pouquinho, para que eu possa fazer tudo como manda o figurino, certo?
Isabella fez que sim, entre risos e lágrimas.
- Eu te amo, Isabella Santoni. - A sinceridade estampava-se em seu semblante. - Quer se casar comigo?
O pulso dela disparou, e Isabella achou que não conseguiria se manter de pé. Tinha vontade de beliscar-se para se certificar de que não estava em sua cama, sonhando. Ouvir Rafael dizer tudo aquilo significava que, enfim, realizaria o grande sonho que sempre alimentara, e que concretizaria esse sonho em grande estilo.
- Posso falar agora?
- Depende do que irá dizer.
- Quero dizer “sim”, caubói.
Rafael abriu os lábios num sorriso radiante, fazendo-a sentir aquele frio no estômago tão familiar.
- Então fale, Isabella.
- Sim!
Com um gesto súbito, Rafael a tomou nos braços como se fosse uma criança.
- Acho que foi a resposta mais curta que já ouvi de você.
Isabella enlaçou-o pelo pescoço e o beijou de leve. Então, muito sorridente, afirmou:
- Não se acostume com isso, porque preciso falar. Ficar calada este tempo todo foi um verdadeiro martírio... já que... que tenho tanta coisa para lhe dizer e saber... Para lhe contar... Senti tanto sua falta e a de Emily... Não pode imaginar o esforço supremo que tive de fazer para não sair correndo daqui e ir para a fazenda e...
Ele gargalhou.
- Está gaguejando, Bella.
- Nesse caso, beije-me, caubói. E não ouse parar!
Suspirando de felicidade, Isabella sentiu os lábios quentes de Rafael sobre os seus. A princípio, com carinho, e depois com volúpia. Sentiu um prazer inigualável tomar conta de seus sentidos.
A platéia, enternecida, foi ao delírio.
FIM
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