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História Amor de Mentirinha - Casar.


Escrita por: Taenshi

Notas do Autor


Oi! Bem vindos ao primeiro capítulo xD
Como prometido, são caps beeeeeem grandes, então espero que gostem <3
Obrigada pelos comentários e favoritos até aqui, e tbm a quem só deu uma lidinha, vcs me fazem feliz~

Como vocês vão ver, cada capítulo traz um trecho da música que usei como trilha pra história, o nome dela tá na sinopse da fic. Ouçam, é muito boa :3

Capítulo 2 - Casar.



I never thought that I was so blind
Eu nunca pensei que eu fosse tão cego
I can finally see the truth
Eu posso finalmente ver a verdade
It's me for you
Sou eu para você
Tonight you can't imagine
Essa noite você não pode imaginar
That I'm by your side
Que eu estou ao seu lado
'Cause it's never gonna be the truth
Porque isso nunca será a verdade
So far for you
Muito longe para você

Cheguei ao aeroporto com alguns minutos de antecedência e vários quilos de ansiedade na mala. Ansiedade boa, claro. Fiz meu check-in e fui para a sala de embarque, onde o Potter já se encontrava. Passei por um breve segundo de choque ao vê-lo vestido casualmente: um suéter preto com as mangas arregaçadas até os cotovelos, jeans escuros, tênis branco e uma mochila pendurada em um ombro só. Ele estava parado em pé, com as mãos nos bolsos, olhando para a tela que anunciava os voos. Por mais que eu o odeie, não há como negar: ele é muito bonito. Bom, transposta a surpresa, passei a mão pelos cabelos e me aproximei.

– Oi – cumprimentou-me com um sorriso.

– Oi. Ansioso?

Ele encolheu os ombros.

– Sim. E você?

Morrendo. – Eu estava quase saltitando. – Como você pode estar tão calmo? Estamos indo viajar!

– É. E estamos indo juntos.

Revirei os olhos e bufei.

– Primeiro: não estamos indo juntos, que coisa. Tem dezenas de pessoas nesse avião, só por isso estamos indo junto com todas elas? Segundo: você fala como se fosse o único descontente com isso.

– Você disse que não tinha problema. – Ele se afastou para se sentar.

– É, eu disse, mas é porque não estamos indo juntos! Que coisa! Argh, Potter, como você consegue ser tão irritante? – Sentei-me a duas cadeiras de distância.

Respirei fundo algumas vezes para me acalmar, afinal, ele não ia estragar a minha viagem perfeita, não ia.

Enquanto esperava, novamente tive uma sensação de que estava esquecendo algo... Conferi minha bolsa, pensei no que tinha colocado na mala, mas não conseguia descobrir o que estava faltando... Aparentemente nada, então resolvi deixar para lá: com certeza era algo que eu poderia substituir se precisasse, certo?

Peguei um livro e me esqueci do Potter. Após alguns minutos, a voz nos alto-falantes anunciou nosso voo, então me dirigi para o portão indicado, ainda sem me dar ao trabalho de procurar o moreno, que tinha saído de perto de mim. Entrei no avião, encontrei meu assento, na janela, e me acomodei devidamente, retomando a leitura do livro. Estava lá, alegre e satisfeita, esperando a decolagem, quando alguém ocupou a poltrona ao meu lado, a do meio. De início, estava tão concentrada no livro que não olhei para o indivíduo, mas quando um perfume levemente familiar alcançou minhas narinas, finalmente encarei meu vizinho, só para dar de cara com nada menos que duas íris – muito – verdes me encarando de volta.

– Oi – disse Potter, com um sorriso sem dentes e um jeito de quem estava se divertindo internamente.

– O que você está fazendo aqui? – reagi, indignada.

– Hã... Estou esperando o avião decolar – falou, como se fosse óbvio. E era, mas enfim.

– Não, pessoa irritante, quero saber o que está fazendo aqui, ao meu lado!

– Não tenho culpa se meu assento é esse.

– Mas eu não quero viajar com você!

– Primeiro: você mesma disse que não está viajando comigo. Segundo: azar o seu. Terceiro: foi você quem disse que sentaria longe de mim no avião, eu não prometi nada. – Ele piscou para mim e colocou seus fones de ouvido, ignorando-me.

Fiquei lá, incrédula, sem acreditar no que estava acontecendo. Já me bastava ter que passar esses cinco dias no paraíso com o Potter, ainda teria que aturá-lo durante todo o voo? Abri a boca para continuar protestando, bem na hora que um homem sentou do outro lado de Potter.

Mas não era um homem qualquer. Era um deus. Cabelos castanhos com as pontas levemente clareadas pelo sol, a pele com um bronzeado saudável, olhos profundamente azuis e um sorriso branco – sim, ele estava sorrindo para mim enquanto se sentava – magnífico. Isso sem contar o peitoral definido, sem exageros, moldando a camisa xadrez de mangas compridas. Perdi a fala.

– Você quer parar com isso?

Olhei para o Potter ainda meio abobada, e ele me fitava de volta como se eu fosse uma doida varrida.

– Hã?

– Não sou obrigado a ficar olhando para o fundo da sua garganta – resmungou ele.

Pisquei algumas vezes, mas só despertei mesmo quando o bonitão riu de leve, e percebi que ainda estava de boca aberta. Tratei de fechá-la e dei um sorrisinho sem graça para o deus grego, ganhando uma piscadela em troca. Vibrei por dentro.

O avião finalmente decolou, e eu tive que dar o braço a torcer. Queria era que o Potter saísse dali – porque agora eu não sairia por nada nesse mundo –, mas o voo estava lotado, e aviões não são o melhor lugar para se armar uma confusão. Bufei alto, extremamente contrariada. Olhei para o Potter, que já estava de olhos fechados por trás dos óculos redondos, os fones despejando alguma música em seus ouvidos. Ele parecia tranquilo demais para estar acordado, e alheio demais para ser um incômodo. Bom, se ele permanecesse assim a viagem toda, eu não me importaria, e poderia até planejar alguma forma de chamar a atenção do bonitão.

– E aí? Fugindo do frio natalino?

Ok, ele lê pensamentos. Olhei para o lado e retribuí o sorriso que o deus grego me lançava.

– É por aí – falei, simpática. Desejei com vontade que o Potter sumisse de repente e me permitisse chegar mais perto da perfeição em pessoa. – Ganhei uma folga do trabalho. E você?

– Acredite: vou a um casamento. – Ele assentiu com a cabeça, depois deu de ombros. – Amigo é amigo, não é?

Sorrimos mais uma vez, e eu quase virei manteiga. Que homem era aquele, meu Deus?

O bonitão estendeu a mão para mim, na frente do Potter, que continuava de olhos fechados, distraído.

– Charles. – Deu um sorrisinho de canto. – Charles Penker.

Imediatamente estiquei o braço também, tentando não parecer tão desesperada quanto meu ato indicou.

– Deus grego... – disse, hipnotizada. Ele ergueu as sobrancelhas. – Di-digo, Gina Weasley.

E, mais uma vez, ele sorriu. Ai, coração...

Charles, digo, Penker tirou seu laptop da bolsa e virou sua atenção para ele. Voltei a minha para o livro, mas agora meus olhos pediam por outra coisa mais interessante de se olhar. Mas eu não podia dar tanta bandeira, não é, precisava deixar que ele mostrasse interesse também. Após algum tempo consegui retomar a concentração, apesar de vez ou outra ainda dar uma olhadela para o lado, como quem não quer nada... Já tinha até esquecido que o homem que eu mais odiava estava entre nós dois – só não esquecia o fato que ele estava entre nós dois.

Entortei a boca, contrariada outra vez. Olhei para o lado de novo e Penker estava absorto em seu laptop, então me inclinei para perto do odioso e aparentemente desacordado Potter, e sussurrei, mesmo que não fosse servir de muita coisa, seu perfume inundando-me as narinas:

– Pelo amor de Deus, seja útil, faça alguma coisa!

E rapidamente me endireitei, no momento em que o bonitão olhou casualmente para mim, e piscou um olho, agradável. Sorri para disfarçar e voltei a ler. Alguns minutos depois ele voltou a chamar minha atenção.

– O que está achando do livro?

Fechei meu exemplar de Dom Casmurro, uma versão do livro brasileiro adaptada para o inglês, de Machado de Assis, e olhei para a capa.

– É ótimo, a leitura é muito envolvente. Pena que Bentinho seja tão cego.

– Então você acha que Capitu é inocente?

– Acho, mas é difícil dizer, não é? Só temos a visão limitada do Bentinho, e como ele acha que ela o traiu, fica complicado encontrar provas a favor. – Dei de ombros e o encarei. – Você já leu?

– Já, não só esse, como várias outras obras do autor. É impossível parar no primeiro. – Ele sorriu pela enésima vez, e eu senti vontade de me livrar do casaco.

Meu Deus, além de lindo, simpático e amigo fiel, ele é culto! Mamãe, quero casar!

Penker discorreu brevemente sobre sua opinião acerca da inocência ou não de Capitu, porém, mesmo que tentasse falar de forma imparcial, ele acabava tendendo para o veredito de culpada, sua opinião. Isso nos rendeu alguns momentos divertidos, onde ríamos da ingenuidade e obstinação um do outro.

– Mas, ainda assim – dizia Penker –, talvez se o pequeno Ezequiel não fosse tão parecido com Escobar, ele parasse com os ciúmes por ali.

– Quem disse que ele era parecido? Bentinho estava cego de ciúmes; sabe o que cego significa? – rebati, com um sorriso. Ele riu.

– Ora, Gina, esse é o único argumento que você...

ROOOOOOOOONC!

Não, isso não foi a turbina entrando em colapso. Isso foi o som gutural que saiu da boca do Potter, bem no meio da nossa conversa – mais exatamente bem na hora em que Charles me chamou de forma mais íntima, pelo apelido.

Ambos olhamos para o moreno entre nós, momentaneamente surpresos ao lembrar que ele ainda estava ali, já que tínhamos praticamente esquecido de todo o resto – bom, pelo menos eu tinha –, tão imersos estávamos na conversa. Potter continuou roncando anormalmente alto, o que meio que nos impedia de continuar debatendo. Charles me deu um sorrisinho amarelo, como quem se conforma se divertindo, e voltou ao seu laptop, enquanto eu olhava para meu exemplar de Dom Casmurro com palpável desapontamento e chateação.

Até queria, mas não podia culpar Potter pela interrupção, afinal, ele estava dormindo e não tinha consciência do obstáculo que estava sendo. Porém, ainda podia culpá-lo e amaldiçoá-lo mentalmente por ter sido teimoso e detestável se recusando a sair dali.

De qualquer forma, cerca de uma hora depois – durante a qual Potter voltava a roncar de forma exagerada coincidentemente toda vez que Charles e eu tentávamos nos falar –, finalmente a paisagem fora da janela mudou. Dava para perceber que estava quente e ensolarado no litoral, e nem parecia que era dezembro. Fiquei maravilhada com todas as cores e brilhos e aquele mar azul, imenso e infinito no horizonte. Olhei para Charles e sorri, o que ele retribuiu, e só então percebi que Potter enfim despertara. Olhei para ele ainda sorrindo, e ele curvou um canto da boca para cima, o sol atravessando as lentes de seus óculos e fazendo seus olhos cintilarem tanto quanto o mar, vários metros abaixo de nós. Encolhi os ombros de forma afável, gesto que Harry Potter imitou, e me fez imaginar se ele estaria pensando a mesma coisa que eu: que estávamos viajando praticamente juntos, sentados lado a lado e, principalmente, nos odiávamos intensa e mutuamente, mas, ainda assim, tínhamos ganhado aquela viagem maravilhosa para o paraíso, com toda aquela beleza, então tínhamos o dever de aproveitar.

E... É. Talvez não fosse tão ruim assim.

♥♥♥

Finalmente, o avião pousou. A agitação de pessoas acordando, se espreguiçando, levantando e procurando por suas coisas encheu o lugar. Charles guardou seu laptop na bolsa e também se levantou, tirando a bagagem de mão do compartimento. Então, ele se infiltrou na fila de pessoas que seguia para fora do avião e sumiu de vista. Eu estava louca para ir atrás dele, antes que ele enveredasse pelo salão de embarque e eu provavelmente nunca mais o encontrasse, porém algo estava me impedindo.

– Anda, Potter! Resolveu dar uma de lesma justo agora? – reclamei, já irritada, enquanto o homem se arrumava com toda a calma do mundo.

– O que foi? – retrucou ele, indiferente. – Estou me arrumando, dá licença?

– Não, você não está se arrumando, está só me atrapalhando, como sempre!

Ele me olhou com raiva.

– Fica quieta aí, apressadinha, nasceu de sete meses?

Bufei. Então, tomei uma atitude muito madura e o empurrei, forçando-o a sair do lugar. Bom, eu tentei empurrá-lo, mas ele era bem mais alto e forte, e praticamente não se moveu. Potter olhou para mim e entortou a boca, como se eu fosse uma criança birrenta com quem ele já estava se aborrecendo. Me enfadei de vez e resisti ao impulso de espernear e bater o pé, realmente como uma criança birrenta.

– Argh, faça alguma coisa útil, Potter!

– De novo? – Ele uniu as sobrancelhas. – Você me pediu para ser útil e eu te ajudei, te livrei do papo sem graça daquele cara. Você já está me devendo um favor, e ainda quer pedir outro?

Olhei para ele, incrédula. Senti a ira subindo gradativa e rapidamente por cada poro do meu corpo, e explodiria a qualquer momento. Potter pareceu ter pressentido o perigo, pois levantou as sobrancelhas e imediatamente liberou o caminho. Tive que fechar os olhos para me controlar e não arrancar a cabeça dele. Senti que as pessoas ao redor começavam a olhar para mim, então respirei bem fundo, peguei minha bolsa e saí calmamente, passando pelo moreno detestável sem nem olhá-lo. Eu não ia me rebaixar ao nível dele, mas mais cedo ou mais tarde ainda daria uns bons tabefes naquele rosto bonitinho. Ele ia ter o que merecia.

Enfim, uma vez no salão de desembarque e livre da presença do Potter, pus-me a procurar Charles. Um homem tão bonito como aquele não deveria ser tão fácil de se perder... Olhei para os lados, buscando as mechas claras entre a multidão, até que o vi perto das esteiras de bagagem. Meio sem querer, o imaginei pegando também as minhas malas, depois vindo em minha direção com todo o seu esplendor e aquele sorriso de deus grego no rosto... Sacudi a cabeça bem a tempo de ver o Potter também retirando suas coisas da esteira. Olhei para Charles outra vez, mas ele sumira outra vez! Bufei contrariada, pronta para bater o pé de frustração, quando ouvi:

– Achei você.

Girei nos calcanhares já com um sorriso estampado, que esmoreceu um pouco ao ver que o bonitão trazia apenas sua própria bagagem. Não que eu estivesse desapontada, mas...

– E você estava me procurando? – devolvi, passando a mão no cabelo fingindo alguma inocência. Ele riu.

– Não poderia me dar ao luxo de perder algo tão bonito.

Bingo! Corei de leve, e Charles piscou para mim. Então, vi Potter por cima de seu ombro, já quase deixando o salão. Ele ia empurrando o carrinho tranquilamente com suas malas e...

– Hã, Charles? – chamei, piscando duas vezes para retomar o raciocínio. – Desculpe, mas eu preciso ir. Vamos nos ver de novo?

– Bom, Dom Casmurro é um livro complexo...

Sorri de canto. Ele me entregou um cartão, lançando uma corrente elétrica pelo meu braço ao encostar os dedos nos meus.

– Pode deixar que eu encontro você – garantiu ele.

– Estarei esperando. – Beijei sua bochecha. – Bom casamento.

– Boas férias! – desejou, enquanto eu já ia correndo atrás do Potter.

Quando finalmente o encontrei – ô, aeroporto para me fazer perder as pessoas de vista! –, ele já estava acenando para um táxi.

– Ei, Potter!

Ele olhou para trás e me viu correndo, e pareceu momentaneamente surpreso por algum motivo que não sei qual, então se virou para o carro que parara ao seu lado. Cheguei lá e falei ao motorista, que guardava a bagagem no porta-malas:

– Hã... Senhor, essas coisas são minhas. – Apontei para a mala em suas mãos.

- Sim, sim, seu marido já me falou. – Ele assentiu e continuou o que estava fazendo, enquanto o sangue me subia à cabeça vertiginosamente.

Enfiei a cabeça na janela e fuzilei Potter com os olhos.

– Olá, querido marido, posso saber que diabos você pensa que está fazendo?

Ele riu com gosto.

– Estou indo para o hotel, querida esposa.

– Potter. Eu vou arrancar cada um dos seus fios de cabelo.

– Faça isso, mas primeiro vamos para o hotel? Estou cansado.

– Eu não vou com você!

– Ah, não? Então, por favor, peça ao motorista para deixar sua bagagem aí na calçada com você, para que eu possa ir embora, ok? – Ele deu um sorrisinho. – Ah, e boa sorte para conseguir outro táxi.

Tirei a cabeça da janela e olhei em volta. O motorista já guardava a última mala, e não havia nenhum outro táxi livre por perto. Eu levaria, no mínimo, uns quarenta minutos até conseguir um carro, arrastando aquelas malas pesadas para lá e para cá. No momento que pensei em procurar Charles e pedir uma carona na maior cara-de-pau, o taxista bateu a tampa do porta-malas e entrou no carro.

Apertei os dedos na borda da janela, fazendo um esforço sobre-humano para não cometer um crime ali mesmo. Dei a volta no carro e entrei com o nariz empinado, sem dizer nada nem olhar para o moreno. Ele disse o endereço ao motorista e se acomodou no banco outra vez, e foi aí que eu tive que rosnar:

– Tira esse sorrisinho da cara, Harry Potter!

♥♥♥

No caminho para o hotel, pensei no que tinha acontecido. Primeiro: Potter sentou ao meu lado no avião. No fundo, isso não me surpreendeu muito: como nos odiávamos profundamente, estávamos sempre por perto, o destino ou o acaso sempre nos colocava juntos. E também, mesmo que seja horrível admitir, não foi tão ruim assim. Confesso que não gostaria de não saber onde ele estava que não ao meu lado, pois já somos mais que acostumados a sempre saber. Segundo: ele atrapalhou minha maravilhosa conversa com o deus grego Charles Penker. Senti o ódio subir outra vez ao lembrar isso, mas logo em seguida me acalmei. Foi até bom, sabe? Se tivéssemos continuado conversando, não sobraria assunto para usar como desculpa para um próximo encontro.

No final, Potter realmente foi útil, quase uma ajuda. Bufei contrariada ao perceber que não dava para sentir raiva dele. Bom, não por isso, mas por ter me atrapalhado na saída do avião, sim! Ah, isso sim! Isso sim! Isso... Droga. Isso não. Ele quase me ajudou também: se eu tivesse saído correndo atrás de Charles ia parecer uma louca carente e obcecada. Por causa do tempo que demorei para chegar ao salão de desembarque, foi ele quem veio atrás de mim, e ele quem me deu um cartão, e ele quem disse “Eu encontro você”. E o Potter ainda teve a... a... Ok, a generosidade de pegar minhas malas e dividir um táxi comigo.

Conclusão: droga. Se eu não odiasse o Potter com todas as minhas forças, eu seria inevitavelmente apaixonada por ele.

Sacudi a cabeça e resolvi parar por aí, antes que acabasse dando atenção à pergunta que surgira latejando no fundo do meu cérebro: por que é mesmo que eu odeio o Potter?

♥♥♥

– Boa tarde! Sejam muitíssimo bem vindos ao Paradise Hotel! – cumprimentou-nos uma sorridente recepcionista, com todos os seus pontos de exclamação, quando eu e Potter nos aproximamos do balcão na entrada. – Em que posso ajudá-los?

Potter remexeu na sua mochila e tirou um papel dobrado idêntico ao que me dera na véspera da viagem, e o entregou à mulher.

Foi bem nessa hora que meu coração parou.

– Ah, sim, sim, senhor Potter! – exclamou a recepcionista, sem nunca tirar o sorriso da cara. – Parabéns por ganhar a excursão! Nós do Paradise Hotel estávamos ansiosos por sua chegada! Torcemos fervorosamente para que o senhor desfrute de sua estadia conosco! O cartão de seu quarto. – Ela estendeu o objeto. A mulher falava tanto e tão entusiasmadamente que nem percebemos que ela já havia digitado os dados do Potter no computador e chamado um carregador de malas para pegar a bagagem. Bom, na verdade eu não estava prestando atenção em nada mesmo, não estava nem respirando.

Potter agradeceu com um sorriso gentil, pegou o cartão e olhou para mim. Suas sobrancelhas se uniram.

– Ginevra? Você está bem?

O som de sua voz me despertou – eram pouquíssimas as vezes que ele me chamava pelo primeiro nome –, e eu arquejei, voltando a respirar. Arregalei os olhos para ele, agarrei seu braço, fiz sinal para a recepcionista esperar um minuto e arrastei o moreno para longe.

Eu esqueci! – guinchei, a voz estrangulada.

Ele me olhou sem entender por dois segundos, então seus olhos se arregalaram também.

– Weasley! Eu disse para você que não podia esquecer aquele papel de jeito nenhum!

Eu sei! – Desesperada, apertei mais os dedos em seu braço, mas ele pareceu não se importar. – E agora? O que eu faço?

– Sei lá! Eu avisei você! Ou você volta ou paga o hotel.

– Tá louco? Isso aqui é uma fortuna!

Potter arregalou os olhos outra vez, como se enfatizasse que não tinha o que dizer. Minha vontade era de me jogar de uma janela. Olhei para os lados, tentando encontrar uma saída, a respiração curta. Minha cabeça só podia ter vento, vou te contar!

– Vou... Vou falar a verdade para ela – decidi –, explicar que eu tenho uma reserva aqui, mas esqueci o maldito papel, vai ver ela tem meu nome em algum lugar lá do sistema.

Potter lançou uma olhadela na direção do balcão e ergueu uma sobrancelha. Só quando ele me olhou de novo foi que percebi quão perto nossos rostos estavam.

– Vamos torcer para que ela acredite e realmente tenha seu nome por lá, mas digo desde já: aquela mulher me dá medo.

É sério que ele conseguiu me fazer rir numa hora dessas?

Puxei-o de volta para o balcão e novamente fomos recebidos pela Eu-tenho-duzentos-e-trinta-dentes. Me apoiei na madeira reluzente que nos separava e respirei fundo.

– Olha, eu tenho uma reserva nesse hotel, só que esqueci meu comprovante em casa – comecei, tentando não soar tão aflita quanto me sentia. – Se você puder, por favor, procurar meu nome aí no seu computador vai ver que estou falando a verdade. – Uni as sobrancelhas formando uma expressão suplicante, mas era difícil dizer se estava funcionando, já que o sorriso exagerado da mulher não se abalava.

– Nome, por favor?

Suspirei.

– Ginevra Molly We...

– Sim, sim, Potter!

Congelei olhando para ela.

– Hã?

– Ginevra Molly Potter, certo? Senhor e senhora Potter! – Ela nos indicou com as mãos, enquanto eu e o moreno olhávamos para ela questionando sua sanidade mental.

– Não, não, me desculpe, está havendo algum engano... – tentei explicar, mas ela não me deu ouvidos.

– Que bom que os senhores vieram juntos, assim poderão desfrutar da nossa programação de Natal para casais! Teremos passeios maravilhosos e até espetáculos teatrais! Tudo de graça, mesmo não estando incluído no seu pacote! Um presente especial de nós do Paradise Hotel para um casal especial! Tenho certeza que os senhores aproveitarão magnificamente!

Continuei encarando-a, piscando feito uma idiota.

– A senhora gostaria de dizer alguma coisa? – ela acrescentou para mim, como se me desafiasse a falar a verdade e perder a oportunidade. Droga, eu já estava ficando louca.

– Na verdade, nós gostaríamos sim – Potter respondeu, num meio riso descrente. – Sinto muito, mas nós não...

– NÃO! – gritei, jogando-me em cima dele, impedindo-o de continuar. – Hã... Você nos dá licença de novo? – Acenei para a mulher e mais uma vez levei Potter para longe.

– Você quer me matar ou o quê? – reclamou ele.

– Não pergunte duas vezes. – Apertei seu braço. – Você vai dizer que nós somos sim casados. Não foi isso que você falou para o taxista? Mantenha a maldita mentira agora, você me deve essa.

– Tá louca? – revoltou-se Potter. – Eu falei aquilo para não deixar você largada lá no aeroporto, mas não vou me “comprometer” durante cinco dias no paraíso, literalmente! Faz ideia do número de mulheres lindas que eu posso perder a chance de conhecer enquanto finjo que somos casados?

– Não estou ligando para sua falta de umazinha, Potter, você me deve um favor! Por ter estragado minha conversa com Charles, e por todos esses anos que você vem me irritando!

Acho que eu não queria – nem devia – dizer aquilo, mas acabei soltando. Potter me encarou com uma expressão insondável por três segundos, depois deu de ombros, e eu soltei o ar com força.

– Mas isso está muito, muito estranho. Se ela tem seu nome no computador, de onde ela tirou essa história de Ginevra Potter? – ponderou o moreno, com o cenho franzido.

– Eu sei lá, Potter! – exasperei-me. – Poxa, são cinco dias, só cinco dias e nunca mais veremos a cara dela, não importa se é mentira ou se ela pode descobrir a qualquer momento, só... por favor?

Outra vez ele me encarou inexpressivo, seu rosto tão próximo do meu que sua respiração quente tocava minhas maçãs do rosto. Finalmente, Potter meneou a cabeça.

– Ok.

Abri um sorriso enorme e quase o abracei, mas me contive a tempo. Puxei-o de novo, mal ouvindo quando ele ainda disse:

– Mas você não está pensando nas consequências!

– Olá! – saudei a recepcionista outra vez, sorrindo tanto quanto ela. Passei a mão pelos cabelos para me recompor e respirei fundo. – Então, é isso mesmo. Eu vim com meu... marido... Nós viemos jun-juntos... Exatamente, senhor e senhora... Potter. É. – Acenei com a cabeça.

– É claro que sim! – Ela piscou rapidamente umas quatro vezes, o que me fez concordar mentalmente com Potter: ela dava medo. O moreno, por sua vez, estava de costas para o balcão, apoiado com os cotovelos nele e olhando para o saguão de entrada. – Desculpe-me não ter percebido antes! É que eu senti falta das alianças... e os senhores pareciam um pouco distantes quando chegaram... Não que isso seja da minha conta!

Sustentei o sorriso, nervosa, o cérebro trabalhando a mil para inventar alguma desculpa.

– É que nós... hã... estamos... brigados, estamos brigados, é isso! É, é, nó-nós estamos brigados, e resolvemos fazer essa viagem para fazermos as pazes, sabe como é. – Encolhi os ombros. – Ele foi um menino muuuuito malvado... – Dei tapinhas no braço de Potter, mas ele permaneceu indiferente. – Até tiramos as alianças, para você ver como a briga foi feia! E... E eu até o chamo pelo sobrenome às vezes, para dar aquela, você sabe, aquela chamada de atenção... – Pisquei para a recepcionista, como se compartilhássemos algo. Ela continuou sorrindo, claro.

– Sei, sim, sei, sim, é claro! Mais uma vez, espero que os senhores desfrutem da estadia no Paradise Hotel! Como o senhor Potter é um gerente ilustre da tão célebre linha de lingeries Luna, e os senhores estão precisando “clarear a mente”, serão tratados com toda a comodidade que merecem! Poderão usufruir dos nossos passeios e almoços especiais de graça! Acredito que no final da semana os senhores já estejam com as alianças de volta e o amor revigorado!

Continuei olhando para ela, sem reação por alguns segundos, então sacudi a cabeça e abri um grande sorriso amarelo. Ela falava tanta coisa que me deixava meio zonza.

O carregador de bagagens pegou também as minhas coisas, e eu e Potter já íamos nos distanciando quando um senhor com uma máquina fotográfica nas mãos entrou em nosso caminho. Ai, ai...

– Uma foto do casal! – exclamou ele, alegre como a recepcionista, um sorriso caloroso no rosto enquanto apontava a lente de sua máquina para nós. – Vamos, vamos, mais perto, uma foto do casal, vamos!

Olhei para Potter, apreensiva, mas ele apenas revirou os olhos e se aproximou um pouco mais de mim. O fotógrafo feliz não gostou.

– Não, não, assim está muito distante! Vamos lá, um beijinho, um beijinho! Ora, vamos, não se acanhem, apenas um beijinho para marcar esse momento!

Arregalei os olhos. Ok, isso está passando dos limites!

– Não, senhor, obrigada, nós precisamos ir – falei, já meio irritada, mas Potter pôs a mão na minha cintura e me puxou de volta para seu lado.

– Ele não vai nos deixar em paz até fazermos – disse ele, o rosto outra vez a poucos centímetros do meu.

– Mas eu não quero beijar você!

– Nem eu quero beijar você! Mas quero ir para o quarto e dormir por um bom tempo.

Uni as sobrancelhas.

– Você dormiu a viagem toda.

Ele sorriu de canto.

– Eu não.

Quando eu ia retrucar, porém, ele cobriu meus lábios com os seus. Só tive tempo de fechar os olhos por dois segundos, o tempo que o beijo durou, e o tempo que o flash precisou para ser disparado, antes de o moreno já ter afastado o corpo do meu.

– Muito bem, muito bem! – exclamou o fotógrafo, ainda mais alegre, se é que era possível. – Obrigado, obrigado! Espero que se divirtam! – E sumiu de vista.

Potter voltou a andar, mas quando percebeu que eu ainda estava parada no mesmo canto, voltou-se para mim com uma sobrancelha erguida.

– Você não vem?

Pisquei duas vezes, aturdida.

– C-claro.

♥♥♥

Andamos em silêncio até o elevador, e continuamos mudos dentro dele. Aquela situação era constrangedora de uma forma estranha só para mim? Eu estava imaginando coisas? Devia estar...

Mas... Mas... Foi um beijo! Nós acabamos de nos beijar! Não é algo assim tão normal, principalmente entre pessoas que se odeiam, não dá para simplesmente ficar indiferente depois de... depois de algo como aquilo!

As portas reluzentes do elevador se abriram para um corredor acarpetado e suntuoso, por onde eu e Potter começamos a caminhar. Observei sua nuca enquanto ele procurava o quarto certo. Como ele conseguia agir tão normal, tão tranquilo depois de me beijar? Tudo bem, estávamos fingindo ser casados, mas ainda assim...! Será que... para ele...

Foi tão insignificante assim?

– Tem alguém aí? – Ouvi a voz do Potter me despertando dos devaneios, ao mesmo tempo em que a palma de sua mão encontrava minha testa, empurrando de leve. Sacudi a cabeça.

– O que foi? – Notei que estávamos parados diante de um quarto, em cuja porta de madeira cintilava um 532 dourado.

Potter recostou-se à parede e olhou para o outro lado do corredor vazio. Então, virou para mim.

– Olha. – Eu não conseguia distinguir o que o tom de voz dele expressava. Por que diabos minhas orelhas estão quentes? – É sério, tem alguma coisa muito errada acontecendo aqui.

Ele fez uma pausa breve.

– Primeiro, ela tem todos os meus dados, inclusive meu estado civil. Depois, mesmo a gente estando ali, dizendo que era um engano, ela continuou “achando” que somos casados. Daí, você de repente muda de atitude e, ta-da, estamos casados, e ela acredita. Tá na cara que ela tem os seus dados lá também, um Ginevra Weasley bem bonito lá, e ela te chama de senhora Potter? – O moreno sacudiu a cabeça, desconfiado. Tentei ignorar o levíssimo arrepio que me assaltou quando ele voltou aquelas orbes verdes para mim outra vez. – Tem alguma coisa errada aqui, Weasley. Estou preocupado, principalmente com você. – Droga. Pare de se arrepiar, Ginevra! – E se eles, do nada, “resolvem descobrir” que estamos mentindo? – Ele abaixou o tom de voz no final da frase. Então, entortou a boca e bufou uma vez, sem mais argumentos.

Não que precisasse, eu também estava pensando tudo aquilo – alguma parte do meu cérebro que ainda não estava entorpecida pela sensação dos lábios do Potter nos meus estava pensando tudo aquilo. O problema era conseguir me concentrar.

– E-eu sei, Potter, sei que parece estranho e tudo mais, mas... – Apertei os lábios. – Estamos aqui, não é? Não fomos barrados até agora, não tivemos problemas. Vamos levar até onde der e... rezar para dar certo.

Potter me encarou por uns segundos, depois passou a mão pelos cabelos, ainda preocupado demais. Minha viagem dependia da total entrega dele à mentira, ou tudo iria por água abaixo – e de um jeito bem desastroso. Resolvi apelar.

– Ei, Potter. Sei que meti você em uma enrascada das grandes, mas... Poxa, olha esse lugar! – Fiz um gesto abrangendo o corredor. – Modéstia à parte, eu mereço estar aqui, tanto quanto você! Trabalhei duro para isso. Se algo der errado, você vai pagar o pato por minha culpa, eu sei, mas eu vou achar um jeito de te recompensar, vou sim! Mesmo que não sejamos descobertos, eu vou te pagar. – Fiz uma pausa, olhando para qualquer lugar menos os olhos profundos do Potter, que me encaravam fixamente. Respirei fundo. – Me desculpe por toda essa confusão, mas, por favor... faz isso por mim?

Sustentei o olhar de Potter. Era uma sensação nova aquela de ofegar levemente ao focar em seu belo rosto, depois de anos o odiando e nem prestando atenção no homem que ele era. Que droga, aquele beijinho de nada despertou tanta coisa! Tanta coisa que não devia!

Eu devo estar só impressionada, pensei. Surpresa com sua atitude repentina, não é como se eu tivesse, sei lá, começado a sentir algo por ele. Afinal, eu já sinto, não é? Sinto ódio. Profundo. Cruel. Eu o odeio.

O moreno expirou, baixando a guarda. Suspirei de alívio.

– Ok. Mas há outro problema – disse Potter, agora quase sorrindo, como se zombasse da minha cara. Gemi.

– O quê?

– Você definitivamente não pensou nas consequências, pensou? Querida.

Arregalei os olhos enquanto a compreensão me alcançava e Potter passava o cartão na fechadura. A porta abriu revelando um quarto lindo, amplo, em cores claras e com grandes janelas de vidro, além de uma sacada com vista para o mar azul. Perfeito. Tinha um banheiro reluzente, um guarda-roupa enorme, uma televisão de tela plana, um frigobar, um espelho sem moldura na parede, um tapete fofinho e...

Uma cama.

Uma branca, king-size, aparentemente fofa e única cama.

Droga.

Potter foi o primeiro a falar, parado em pé ao meu lado, contemplando aquele amontoado branco de espumas e penas:

– Estamos casados.

– Você dorme no chão.

– Negativo!

– É claro que sim! Acha mesmo que eu vou submeter meu corpo a ficar perto do seu? Só Deus sabe o que sua pele guarda...

– Costumava ser seu perfume, mas sumiu. Quer pôr de volta?

Levei dois segundos para assimilar o que ele dissera, então virei os olhos arregalados de novo para ele. Ele tinha mesmo dito aquilo?

– O... Como é?

Potter riu, despreocupado, indo em direção ao banheiro.

– É verdade – falou de lá, sua voz reverberando nas paredes de mármore. – A pessoa que eu mais odeio no mundo vive me abraçando, sei lá por que, não tenho culpa se seu perfume grudento fica no meu corpo pelo resto do dia.

Apesar das palavras, apesar do tom de brincadeira, apesar de estar adorando tirar sarro da minha cara por ser minha culpa essa história de casamento... ele tinha mesmo dito aquilo.

Eu não gosto de quando meu coração acelera sem motivo. Como ele fez naquele exato momento.

♥♥♥

– Você vai ficar aí? – Eu quis saber, olhando para o corpo inerte do Potter estirado de qualquer jeito no meio dos travesseiros fofos.

Ele grunhiu algo ininteligível. Considerei como um sim.

– Ok, problema seu, eu vou sair – disse, e deixei o quarto.

Após algumas pequenas discussões sobre nossa acomodação no quarto – quem ficava com qual lado do guarda-roupa, regras quanto a respeitar o espaço um do outro, a separação dos sabonetes e toalhas, uso do frigobar e da televisão e o ainda não resolvido dilema da cama, entre outras –, eu decidi dar uma volta. Os passeios oferecidos pelo hotel só começariam no outro dia, então me restava aquela tarde para bater perna pelo centro da cidade litorânea, aproveitar o sol e ver pessoas bonitas. Pensei em ligar para Charles, mas talvez fosse melhor esperar. Não fazia muito tempo que tínhamos nos falado, então eu ainda pareceria uma carente desesperada. Resolvi começar com um merecido almoço, afinal, eram quase três da tarde e ainda eu não comera nada, além de o fuso horário já ter mexido com meu estômago.

Passei rapidamente pela recepção, quase correndo na verdade, para evitar mais perguntas da Eu-sou-toda-sorrisos, e me lancei para fora do hotel, ilesa. Beijei meu cartão de crédito e finalmente comecei de verdade minha excursão.

♥♥♥

– Senhora Potter! Uhuu! Senhora Potter! – gritava a recepcionista sorridente, tentando chamar minha atenção. Resolvi que era melhor parar de ignorá-la ou poderia vir algo pior do que uhuu. Aproximei-me do balcão.

– Boa noite... – falei, com um sorrisinho amarelo. Foi quando percebi que ainda não sabia o nome dela.

– Boa noite, senhora Potter! Acho que esqueci de me apresentar devidamente, não foi? – Ah, meu Deus, estou começando a ficar seriamente com medo! Agora ela lê pensamentos? – Tina Smiling, sempre a seu dispor! – Smiling? Agora tá explicado por que ela fica com aquele sorriso de partir os lábios o tempo todo.

– Olá, Tina. – Dei outro sorriso, mais simpático.

– Aqui, senhora Potter – ela me entregou um panfleto verde –, esse é o roteiro do passeio de amanhã! Os senhores desfrutarão de uma volta no maior parque arborizado da cidade! Haverá piqueniques e atividades para se envolver com a natureza! Tenho certeza que os senhores não vão se decepcionar!

Passei os olhos pelo panfleto. Hm, interessante.

– Obrigada, Tina – agradeci, já começando a me afastar. – Vou para o quarto agora, você sabe, dormir cedo para ter disposição para amanhã...

- Ah, claro, claro, senhora Potter! – Além de não conseguir me acostumar com o sobrenome falso, era pior quando ela ficava repetindo o tempo todo. – Diga isso ao senhor Potter também! Dormir cedo, hã? – Ela me lançou um olhar diferente, ainda sorrido, claro. – Tenham cuidado para não aproveitarem demais a noite e perderem o passeio de amanhã!

Fiquei olhando para ela. Sem dizer mais nada, me virei e saí dali.

Só quando cheguei ao quarto, lembrei que o cartão ficara com Potter. Bati na porta algumas vezes, sem receber resposta do outro lado. Revirei os olhos; ele ainda deveria estar dormindo. Quando já me preparava para bater com mais força, a fim de acordá-lo, a porta se abriu e uma senhora com roupa de camareira surgiu.

– Ah, olá, desculpe – falei, dando espaço para que ela passasse com seu carrinho de limpeza. – Esqueci o cartão – menti.

A senhora sorriu simpática e acenou com a cabeça uma vez, antes de se afastar. Entrei no quarto, joguei a bolsa na cama e fui para o banheiro. Me perguntei onde Potter estaria; ele disse que não ia sair. Pelo visto ele mudou de ideia. O que importava era que eu precisava de um cartão também, não achava que teria a sorte de sempre chegar quando a camareira estava saindo. Além do mais, o quarto não era só dele.

Saí do banheiro enrolada na toalha, e estava procurando uma roupa de dormir no guarda-roupa quando a porta foi aberta sem aviso, sobressaltando-me. Me escondi atrás da porta do armário.

– Potter! – exclamei, irada. – Custa bater primeiro?

– Bater para entrar no meu próprio quarto? – reclamou ele, jogando o cartão sobre o criado-mudo e tirando os sapatos.

– Claro que sim! O quarto não é só seu, tá lembrado?

– Tô. Divido com minha esposa – falou, pesando a última palavra de propósito, só para me irritar.

– Não me faça ir aí, Potter...

– Vem. Vem, toalhinha, vem – provocou ele, fazendo-me corar da cabeça aos pés.

Enfadei-me de vez, agarrei a primeira roupa que vi, fechei a porta do armário com força e rapidamente voltei para o banheiro. Ouvi Potter rir pelo nariz do lado de fora. Argh, que ódio! Algo me diz que teremos alguns probleminhas por aqui.

Enxuta e vestida, voltei para o quarto, parando de chofre ao me deparar com as costas recém-desnudas de Potter viradas para mim. Ele estava terminando de tirar a camisa, e quando o fez, olhou para mim.

– Que foi?

Prendi a respiração e o ignorei, indo até a penteadeira. Peguei uma escova e comecei a passá-la nos cabelos vermelhos, tentando tirar dos olhos a visão daqueles músculos flexionados de segundos atrás. Pelo espelho, vi Potter – só de samba-canção – andar para lá e para cá no quarto, se arrumando para dormir.

– Estava entediado, e sua voz tinha me dado dor de cabeça, então resolvi sair – contou ele, deliberadamente, enquanto guardava seus óculos na mochila. Não me surpreendi: eu disse que nós sempre contávamos um para o outro o que tínhamos feito quando estávamos separados. Coisa de quem se odeia. – Dei uma volta pela cidade, bebi alguma coisa, conheci algumas pessoas... – O tom dele mudou na última palavra. Revirei os olhos. – Até pensei em trazê-la aqui, mas...

– Epa, epa, epa! – exclamei, levantando-me do banquinho e olhando para ele. – Pode parar por aí! Você não pode trazer uma mulherzinha qualquer aqui para dentro, somos casados, lembra? – Fechei a cara.

– Primeiro que ela não é uma mulherzinha qualquer, ok? – bufou ele. – Segundo: eu disse que até pensei em trazê-la aqui, mas lembrei que estou amarrado por livre e espontânea pressão.

– Eu pedi para você, não te obriguei a nada – retruquei. – Você poderia ter dito não.

- Ah, é? E ser obrigado a ver você se desfazendo em lágrimas lá no saguão de entrada, implorando ainda mais para que eu te ajudasse porque você não poderia perder essa viagem por nada, e blá, blá, blá?

Fiz uma pausa, emburrada.

– Eu não implorei para você – retruquei de novo, com raiva do calor nas bochechas. – Eu pedi para você. Sabia que você não ia me deixar na mão, você é legal demais. – Menos comigo, é claro, completei mentalmente.

– Que ótimo. – Ele revirou os olhos, rindo sem achar graça. – Agora já sei o que é casar com uma mulher interesseira.

Fechei mais a cara para ele, que me deu as costas e sentou na beira da cama.

– E você? – perguntou, afofando o travesseiro.

– Também dei uma volta, fiz umas compras, comi uns doces incríveis e... Ei, o que você pensa que tá fazendo?

O moreno já tinha se acomodado confortavelmente, deitado na cama em que eu iria dormir.

– Hã... Esperando você parar de tagarelar para conseguir dormir.

– Nada disso! – Fui até lá e o puxei pelo braço; como se fizesse alguma diferença. – Sai já daí, Potter! Você não vai dormir na cama comigo!

– Não, não vou – falou ele. Parei de puxá-lo e o olhei. – Eu vou dormir na cama sozinho, enquanto você aproveita o colchãozinho. Até rimou! – Ele me deu um sorrisinho sem dentes, cínico. Comecei a dar tapas no seu braço.

– Nem no inferno! Eu sou a dama aqui, é você quem dorme no chão!

– Foi você quem me meteu nessa história toda, se vira para me agradar agora!

Eu o soltei, bufando, e coloquei as mãos na cintura. Potter colocou as mãos na nuca e olhou para mim, de baixo para cima, as sobrancelhas erguidas. Além da discussão, meu cérebro também tinha que se concentrar em evitar que meus olhos escorregassem do rosto do moreno para o abdômen nu do moreno... o que seria bem perigoso. Expirei com força.

– Ah, é? Então tudo bem. – Afastei-me da cama, andando de volta para a penteadeira. Potter me seguiu com os olhos, desconfiado. – Se você quer dormir aí, fique à vontade. Mas... – Com movimentos leves e delicados e a voz suave, peguei um dos meus potes de creme noturno e comecei a desenroscar a tampa. – Não reclame se amanhã acordar e, puf!, estiver com o rosto todo cheio de uma gosma azul... – Enfiei o dedo no creme e apontei para ele, aproximando-me de forma ameaçadora.

– Grandes coisas – riu-se Potter, indiferente. – Como se isso não saísse com água.

– É, sai. – Assenti com a cabeça, olhando para o troço azul na mão. – Claro, depois de uma noite inteira abrindo seus poros, penetrando na sua pele e queimando todo e qualquer resquício de células mortas, preenchendo cada mínimo espaço com colágeno, esticando seus traços de forma impiedosa... Não, não, é claro que não dói, imagina. Quer dizer, não sei, né, normalmente estou dormindo enquanto o creme faz seu trabalho.

Potter uniu as sobrancelhas para mim, já desconfiado. É sério que ele caiu nessa?

– Você está mentindo – afirmou ele, acho que mais para si do que para mim.

– Quer tirar a prova? – Ergui as sobrancelhas de forma inocente, passando o dedo melecado em frente ao seu rosto. – Dorme aí, Potter, me faça dormir no chão, aí quem sabe amanhã de manhã você não acorda... com as calças queimando... E não estou falando queimar de uma forma boa.

O moreno me encarou por mais alguns segundos, então agarrou um travesseiro e se levantou, irado. Gargalhei com gosto.

– Você me paga, Weasley – rosnou ele, enquanto puxava a cama de baixo com violência.

– Pago, pago sim, Potter, pago com prazer – ironizei, limpando o dedo e guardando o pote, depois me joguei na cama, abraçando-me com as almofadas macias.

Potter mergulhou em silêncio, e permaneceu assim pelos próximos minutos. Fiquei encarando o teto no escuro, sem conseguir dormir, com cenas, informações, sensações demais rodando na minha cabeça. Virei para um lado e para o outro na espaçosa cama, sentindo falta de alguma coisa que não sabia o quê. Então, sorrateiramente, estiquei-me até a beirada e olhei para baixo, para o Potter adormecido na segunda cama.

Ele dormia de peito para cima, com um braço sobre os olhos. O lençol estava enroscado em sua perna esquerda. Seu peito desnudo subia e descia, acompanhando sua respiração tranquila. O observei sem ser vista por alguns segundos, acompanhando com os olhos as linhas de sua barriga, de seu peitoral, os músculos flexionados do braço, a boca rosada que era a única coisa de seu rosto à vista... Caramba, ele era muito lindo. Em que bolso do uniforme da loja ele tinha escondido esse corpo por todo esse tempo? Quase agradeci por estarmos naquela confusão, só por ter o... o prazer de poder contemplar em segredo seus belos traços masculinos.

Entortei a boca.

Pottardado – sussurrei, distraída.

O moreno inspirou fundo uma vez, acordando, então tirou o braço do rosto. Ele olhou para mim com as sobrancelhas unidas. Suas íris adquiriam uma tonalidade cinza no escuro.

– Você disse alguma coisa? – perguntou.

Pottardado – repeti, com o queixo apoiado no dorso da mão, em cima de um travesseiro.

– O quê...?

– Mistura de Potter com retardado – expliquei, em voz baixa. – Como se não fosse redundância te chamar de Potter e retardado.

O moreno fechou a cara.

– Insulto gratuito a essa hora da noite?

Dei de ombros.

– Vai dormir, Ginenta. – Ele recolocou o braço onde estava.

Ginenta?

– É. Mistura de Ginevra com pimenta.

Fiz uma pausa.

– E desde quando isso é xingamento que se preze, idiota?

– Eu não estava te xingando.

Não respondi. Que joguinho era aquele?

Potter não falou mais nada, e depois de alguns minutos tive certeza que ele já tinha voltado a dormir. Continuei olhando para ele por mais alguns segundos; como inventor de xingamentos ele era um ótimo...

Um ótimo...

Meu “marido”.

Mas que nunca seria meu.


Notas Finais


Que primeiro dia movimentado, não? Mas só esperem pelos próximos, só esperem...

É isso, queridos, espero que tenham gostado <3
Obrigada mais uma vez!
Nos vemos no próximo~


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